ARTIGO
ORIGINAL
Conhecimento
da enfermeira do Programa de Saúde da Família sobre o vírus linfotrópico
de células T humanas
Danielle de Jesus
Soares*, Ana Clarissa Cerqueira dos Santos**, Maria da Conceição Costa Rivemales, D.Sc.***
*Enfermeira,
graduada pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Especialista
em Clínica da Pessoa e da Família pela Faculdade Bahiana
de Medicina e Saúde Pública, Pós-graduanda em Gestão em Saúde pela UFRB,
**Enfermeira, graduada pela UFRB, Especialista em Gestão em Saúde Pública pelo
Instituto Pró Saber, Universidade Cândido Mendes, ***Enfermeira, Professora
Adjunto II da UFRB, Especialista em Gestão em Saúde pela UNIFESP, Especialista
em Docência na Saúde pela UFRGS, orientadora do estudo
Recebido em 30 de
maio de 2017; aceito em 4 de dezembro de 2017.
Endereço
de correspondência:
Danielle de Jesus Soares, Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)
44380-000 Cruz das Almas BA, E-mail: dany.sol22@hotmail.com, Ana Clarissa
Cerqueira dos Santos: santosanjoclarissa@gmail.com; Maria da Conceição Costa Rivemales: mariarivemales@hotmail.com
Resumo
O presente trabalho
tem por objetivo verificar o conhecimento das enfermeiras atuantes no Programa
Saúde da Família de Santo Antônio de Jesus/Bahia sobre o Vírus Linfotrópico de Células T Humanas (HTLV). Trata-se de uma
pesquisa qualitativa, de caráter descritivo e exploratório, realizada com 14
enfermeiras das Unidades de Saúde da Família (USF) de um município do Recôncavo
Baiano, no período de julho a agosto de 2014. Os dados foram coletados através
da entrevista semiestruturada e analisados a partir da Análise de Conteúdo
Temática. O estudo revelou que o primeiro contato com a temática HTLV ocorreu a
partir de duas situações específicas: durante o curso de graduação ou durante o
exercício laboral. As narrativas revelaram que as enfermeiras possuem um
conhecimento incipiente em relação ao vírus; sendo o medo e a insegurança os
sentimentos destacados pelas mesmas; uma vez que o conhecimento apreendido
sobre o vírus mostra-se insuficiente para o desenvolvimento de atividades na
rotina da USF. Sugere-se o desenvolvimento de estudos como este, a fim de
levantar as reais necessidades dos profissionais, desse e de outros serviços de
saúde, em se tratando da abordagem sobre o HTLV.
Palavras-chave: vírus 1 linfotrópico T humano, vírus 2 linfotrópico T humano, Enfermagem.
Abstract
Knowledge of Family Health Program nurse about human T-lymphotropic virus
This work aims to verify the knowledge of nurses working in Santo Antônio de Jesus/Bahia Family Health Program about the
Human T-lymphotropic virus (HTLV). This is a
qualitative, descriptive and exploratory study, conducted with 14 nurses of
Family Health Units in a Reconcavo Baiano town, from July to August 2014. The data were
collected through semi-structured interviews and analyzed from the qualitative
analysis. The study revealed that the first contact with the theme HTLV
occurred from two specific situations: during the course of graduation or
during working period. The narratives also revealed that nurses have an
incipient knowledge on the virus; the fear and insecurity feelings were
highlighted by them; since the knowledge gained about the virus proves to be
insufficient for the development activities in the Family Health Units routine.
It is suggested the development of studies like this one in order to raise the
real professional needs, this and other health services, in the case of the
approach to HTLV.
Key-words: Human T-lymphotropic virus 1, Human T-lymphotropic
virus 2, Nursing.
Resumen
Conocimiento de la enfermera
del Programa de Salud de la Familia sobre el virus linfotrópico
de células T humanas
El presente trabajo tiene por objetivo
verificar el conocimiento de las enfermeras actuantes en el Programa Salud de la Familia
de Santo Antônio de Jesús/Bahia sobre el virus linfotrópico
de células T humanas (HTLV). Se trata de una investigación
cualitativa, de carácter descriptivo
y exploratorio, realizada con
14 enfermeras de las
Unidades de Salud de la Familia de un municipio del
Recôncavo Baiano, en el
período de julio a agosto de 2014. Los datos fueron recolectados
a través de entrevista semiestructurada y se analizaron a partir del
análisis de contenido
temático. El estudio reveló
que el primer contacto con la
temática HTLV ocurrió a partir de dos situaciones específicas: durante el
curso de graduación o durante el
ejercicio laboral. Las narraciones revelaron que las enfermeras poseen un conocimiento
incipiente en relación al virus; siendo
el miedo y la inseguridad los sentimientos destacados por las mismas; una vez que el conocimiento aprendido sobre el virus se muestra
insuficiente para el desarrollo
de actividades en la rutina de la USF. Se sugiere el
desarrollo de estudios como
éste, a fin de levantar las reales necesidades
de los profesionales, de ese y de otros servicios de salud, en lo que se refiere
al abordaje sobre el HTLV.
Palabras-clave: virus
1 linfotrópico de células T
humanas, virus 2 linfotrópico
T humano, Enfermería.
O Vírus Linfotrópico de Células T Humanas (HTLV) foi o primeiro
retrovírus humano descrito. Foram identificados dois tipos de vírus, o tipo 1 associado a doenças em seres humanos, como a
Leucemia/Linfoma de células T do Adulto (LLTA) e a Paraparesia Espástica Tropical/Mielopatia
Associada ao HTLV (HAM/TSP); e o tipo 2 não associado a doenças em seres
humanos [1]. Essa infecção pode ser transmitida tanto por via vertical, através
da amamentação, como horizontal, por via sexual e parenteral [2].
Pressupõe-se que mais
de 20 milhões de pessoas estejam infectadas por HTLV no mundo, no entanto esta
prevalência irá variar de acordo com a região geográfica [3]. Estimativas
apontam que existam no Brasil aproximadamente 2,5 milhões de pessoas infectadas
o que torna o país de maior número absoluto de pessoas infectadas [4]. Porém
dados relativos à sua prevalência e incidência no país são dificilmente encontrados,
isso se relaciona a falta de uma de uma política pública específica de
prevenção e controle da disseminação do vírus [5].
Desta forma existe um
desconhecimento a respeito do vírus e sua infecção, não só pela população em
geral, mas também pelos profissionais de saúde. É observada uma confusão do
HTLV com o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), este fato pode ser explicado
pelas semelhanças de suas siglas e por ambos os vírus pertencerem à mesma
família. Porém o HIV, destrói as células de defesas do organismo causando a Aids, enquanto o HTLV multiplica as células de defesa
podendo transformá-las em câncer ou outras doenças [6,7].
Torna-se necessário
uma maior atenção para este vírus, que vem infectando os indivíduos de forma
silenciosa, causando doenças graves que poderiam ser evitadas com medidas
preventivas simples, dentre elas o uso do preservativo nas relações sexuais [7].
É função da Atenção Básica atuar de forma conjunta aos serviços
especializados no atendimento às pessoas acometidas pelo HTLV, para isso é
necessário que os profissionais envolvidos detenham informações sobre os meios
de prevenção e controle da infecção pelo vírus [8]). Neste cenário o enfermeiro
enquanto membro da equipe que compõe a Unidade de Saúde da Família (USF)
mostra-se atuante em funções que vão desde os cuidados técnicos às orientações
psicológicas e comportamentais [9].
Considerando a
importância do papel do enfermeiro enquanto membro da Equipe de Saúde da
Família, torna-se imprescindível identificar o conhecimento que estes
profissionais possuem sobre o vírus. Desta maneira este estudo objetivou
verificar o conhecimento das enfermeiras do PSF sobre o vírus HTLV.
Trata-se de um estudo
exploratório com abordagem qualitativa. O estudo qualitativo tem por objetivo
traduzir e expressar o sentido dos fenômenos do mundo social além de reduzir a
distância entre teoria e dados, indicador e indicado e entre contexto e ação
[10].
O lócus da pesquisa
foram as Unidades de Saúde da Família (USF) de Santo Antônio de Jesus/Bahia. A
atenção básica deste município está composta por duas Unidades Básicas de Saúde
localizadas no centro da cidade e vinte e uma Equipes de Saúde da Família [11].
Foram selecionadas as
unidades situadas na zona urbana do município citado, o que correspondeu a 16
USF. Porém devido à saturação dos dados no decorrer das entrevistas, 14
unidades efetivamente foram incluídas. Como todas USF possuíam apenas uma
Equipe de Saúde da Família, quatorze enfermeiras participaram
do estudo.
A coleta dos dados
foi iniciada mediante aprovação no Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade
Federal do Recôncavo da Bahia sob o número do CAAE 28034814800000056, de 05 de
junho de 2014. Todas entrevistadas assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido e foi garantido o anonimato e autonomia das participantes em
interromper sua participação em qualquer momento da entrevista sem prejuízo
para ambas às partes; atendendo assim as recomendações da Resolução 466/2012
que versa sobre as pesquisas envolvendo seres humanos.
Os dados foram
coletados em três etapas, entre os meses de julho a agosto de 2014. Primeiro
foi feita uma aproximação com o campo de estudo para apresentação da proposta e
agendamento do dia para a realização das entrevistas. Posteriormente foram
coletadas as narrativas através da entrevista semiestruturada e em seguida foi
aplicado o questionário. As entrevistas foram gravadas para então serem
transcritas, possibilitando um melhor entendimento e organização das ideias.
Para o tratamento dos
dados selecionou-se como técnica a análise de conteúdo. Os dados empíricos obtidos
a partir das entrevistas e questionário foram agrupados em categorias de
análise temática. A partir da análise do conteúdo das falas das participantes
do estudo, emergiram as seguintes categorias: Contato com a temática HTLV; O
que se sabe sobre o HTLV.
Contato
com a temática HTLV
A maioria das
entrevistadas refere ter ouvido falar pela primeira vez sobre o HTLV, de modo
superficial, durante o curso de graduação. Vejamos os relatos a seguir:
Na
faculdade, raramente assim, superficial, e também aqui no trabalho, no ambiente
de trabalho. (E6)
Na
faculdade e bem sucinto, né, as pessoas não dão tanta importância como dão ao
HIV, a hepatite, até assim quando a gente é estudante a gente não vê tanta
ênfase nesse assunto. (E4)
Ah,
faz tempo, não sei te falar assim... foi durante a
graduação. (E1)
Historicamente os
currículos aplicados no campo da saúde possuem relações com o modelo de atenção
médico-curativo, trazendo assim uma visão tecnicista do trabalho, centrado na
cura em detrimento do olhar voltado a realidade social,
empobrecendo, assim, a relação entre as necessidades de saúde e a integração
das práticas nos diferentes níveis de atenção [12].
Acrescenta-se ainda o
reflexo gerado na vida do paciente pela falta de conhecimentos
técnico-científicos do profissional que o assiste, sendo mais uma barreira que
as pessoas com HTLV precisam enfrentar [13]. Esse fato pode ser explicado pelo
baixo número de pesquisas que abordam o tema e por não ser esta uma doença de
notificação compulsória, o que reflete na não obtenção de dados oficiais sobre
o tema [14].
Por ser a Bahia um
estado de alta prevalência para o HTLV [15], os profissionais de saúde atuantes
nesse Estado necessitam ter subsídios para a atuação/intervenção mais efetiva
sobre o vírus. Sugere-se então a inclusão, mais concreta, de conteúdos sobre
HTLV nos cursos de graduação em enfermagem.
As narrativas revelam
que algumas enfermeiras apenas tiveram o contato com a temática HTLV durante as
atividades laborais, a partir do momento em que foi incluída a solicitação da
sorologia na triagem pré-natal.
Aqui
na unidade, na verdade não ouvi falar, é um dos exames que a gente pede do pré-natal
[...]
(E10)
[...]
Agora no dia a dia do posto na rotina tem uns dois anos mais ou menos que a
gente começou a pedir o HTLV. (pra todos os pacientes?) R: só para gestante.
(E8)
Os relatos evidenciam
que a inclusão da pesquisa sorológica para o HTLV na triagem pré-natal do
município estudado, fez com que as enfermeiras tivessem conhecimento sobre a
existência do vírus, mesmo que de forma incipiente, a partir da experiência
cotidiana do trabalho.
É notável o
desconhecimento dos profissionais de saúde e também da população acerca do
HTLV, o que favorece um diagnóstico e tratamento errados; a infecção muitas
vezes é confundida com outras doenças [16]. Apesar disso, foi possível perceber
que a partir do momento em que a sorologia para diagnóstico do HTLV passou a
ser realizada na triagem pré-natal, no município estudado, houve uma maior
apreensão de determinadas informações sobre o vírus. Infere-se, portanto, que
os conhecimentos captados na prática diária permitiu
às entrevistadas que adquirissem algum tipo de conhecimento sobre o HTLV [14].
Faz parte do elenco
de ações desenvolvidas durante a assistência pré-natal à realização da triagem
pré-natal em toda gestante acompanhada pela rede SUS. Logo, o Ministério da
Saúde [17] orienta a realização do rastreamento das principais infecções que
podem acometer a gestação, dentre as quais se encontra o HTLV.
É necessário que os
profissionais de saúde possuam conhecimento científico suficiente para o
trabalho junto à temática HTLV a fim de embasar sua prática assistencial [13].
Há necessidade de formulação de políticas públicas que permitam maior
visibilidade ao HTLV na busca pelo preenchimento das principais lacunas na
formação dos profissionais de saúde para atuarem frente a este público [18].
A respeito das
principais fontes de informação sobre o vírus utilizadas
pelas participantes, foram citadas:
Através
de materiais médicos, manuais do MS, em manuais de gestação, artigo científico,
às vezes entrevistas de médicos né, em programas no site, então busca mesmo é
variar. (E3)
Internet
é dado que eu busco pra obter mais conhecimento. (E5)
O
Centro de Testagem e Aconselhamento, que é o CTA do município, que é a
coordenação de DST/Aids. (E2)
Em se tratando de
materiais referentes ao HTLV, a produção disponível na literatura é incipiente,
o que gera dificuldades na aquisição de informações sobre o vírus. Para além
das fontes literárias, o Centro de Aaconselhamento e
Testagem (CTA) do município é também utilizado como fonte de informação pelas
enfermeiras. Vale destacar que deve ser garantida a referência e contra
referência entre este serviço e as USF, no intuito de garantir que o indivíduo
uma vez encaminhado mantenha seu acompanhamento na unidade de origem.
Nesse sentido,
mostra-se de grande importância o papel desempenhado pelo CTA, que devido as
suas características e funções pré-estabelecidas, se configura num espaço onde
estas profissionais adquirem suporte, tanto informativo, quanto de
encaminhamento de casos.
O que
se sabe sobre o HTLV
Em relação ao que as
enfermeiras sabem a respeito do ‘que é HTLV’, as narrativas evidenciam que as
participantes o classificam como um vírus linfotrópico
de células T, traduzindo que existe algum conhecimento, mesmo que incipiente em
relação ao vírus.
É
um vírus linfotrópico humano do linfócito T, e assim
pouco a gente, na verdade, trabalha com esse tipo de vírus. (E2)
[...]
tem dois tipos o HTLV 1 e o HTLV 2; ele é um vírus que
tem tropismo por células T, linfócitos T. (E3)
[...]
é um vírus linfotrópico que ele atua normalmente nas
células T que são as que ele procura atingir, são conhecidos dois tipos o HTLV 1 e o HTLV 2. (E11)
O primeiro relato
evidência que o HTLV é pouco trabalhado na rotina da USF. No entanto algumas
situações pontuais fazem com que essas profissionais desenvolvam ações
relacionadas ao vírus, nessa ótica pode-se mencionar a sorologia para o HTLV na
triagem pré-natal.
Outro aspecto
levantado nas falas anteriores foi o reconhecimento de dois subtipos de HTLV, o
subtipo 1 e 2. Foram identificados na década de 1980
os dois tipos de HTLV, sendo o primeiro retrovírus humano, o vírus possui
tropismo por células T e tem transmissão intracelular [19].
Ao se tratar do modo
de transmissão do HTLV, os relatos evidenciam as principais vias de transmissão
do vírus:
O
HTLV é um vírus, uma doença sexualmente transmissível. (E9)
[...] que também é transmitido pela relação sexual,
(desprevenida) ou... desprotegida, pode ter também a
transmissão vertical mãe/bebe através da amamentação que tem que ser suspendida
na detecção do HTLV na mãe. (E7)
Eu sei que é um vírus é... muita
gente confunde com o HIV mas é um vírus que é transmitido sexualmente, por
objetos, seringas. (E10)
A principal via de
transmissão vertical do HTLV é a amamentação, devendo ser considerada a duração
prolongada da amamentação e a quantidade de anticorpos anti-HTLV
maternos. Mas a transmissão transplacentária e a
contaminação pelo canal de parto também ocorrem, ainda que seja rara [2].
Em
estudo realizado
no estado do Pará, Brasil, encontrou-se um significativo
número de gestantes
infectadas com o vírus; esse fato chama a atenção
para a importância da
identificação/triagem de todas as gestantes durante o
pré-natal e do
desenvolvimento de ações para a prevenção
da transmissão vertical como a
orientação para a não amamentação e
disponibilização de fórmula infantil para
alimentar a criança, ações estas que foram implementadas
com as participantes do estudo [20].
Por ser uma decisão
complexa, que envolve fatores emocionais da mulher, é fundamental o preparo
antecipado da gestante e parturiente ajudando-a a tornarem-se protagonistas do
processo; o diagnóstico precoce durante o pré-natal visa garantir condutas
adequadas na prevenção da transmissão vertical do vírus [18].
Apesar da ocorrência
de outras vias de transmissão vertical, a transmissão através do leite materno
ainda é a via sabidamente mais eficaz [7], pois se mostra mais efetiva devido à
quantidade de células infectadas presentes no leite materno, em comparação a
quantidade presente no sangue periférico.
Devido ao risco de
transmissão pela amamentação, o Ministério da Saúde orienta evitar o
aleitamento materno, buscando garantir a nutrição do lactente através de
aleitamento artificial [21]. Porém ainda não se criou uma política específica
para essas mulheres, que garanta o acesso gratuito ao leite artificial para
seus filhos, dificultando assim o enfrentamento da doença [7].
O HTLV é classificado
como uma doença sexualmente transmissível, e consequentemente apresenta formas
de transmissão semelhante às de outras doenças deste grupo, dentre elas o HIV.
O Ministério da Saúde [21] afirma que os dois tipos de vírus possuem os mesmos
mecanismos de transmissão, os quais podem ocorrer tanto por via vertical como
horizontal.
Apesar da semelhança
nas formas de transmissão, o HTLV não deve ser lembrado simplesmente
comparando-se ao HIV, uma vez que ambas as patologias possuem particularidades
que as diferenciam uma da outra. Assim é necessária uma diferenciação entre
estas, especialmente em seus graus de morbidade e letalidade [22,23].
Comparando-se a infecção pelo HIV, a infecção pelo HTLV apresenta menor infectividade e período de incubação mais prolongado [21].
O HTLV comumente é
confundido com o HIV, possivelmente por sua semelhança semântica ou na
tentativa de aproximá-lo a um vírus que é mais conhecido mundialmente. Em
conformidade com este achado, alguns profissionais da área da saúde na
tentativa de tornar mais rápida à compreensão sobre o HTLV acabam se valendo de
expressões como “vírus parentes”, ou ainda “o HTLV é primo do HIV” [23].
Essa realidade não
difere dos resultados obtidos neste estudo, no qual a grande maioria das
enfermeiras se reporta a estas expressões na tentativa de definir HTLV. Dessa
maneira, informações correlacionando o HTLV ao HIV são também passadas ao
indivíduo diante do resultado de soropositividade
para o vírus.
O
HTLV é um vírus né, da mesma família do HIV, que é um vírus humano. (E7)
Eu
sei que o HTLV é uma doença retroviral da família do vírus que é o subtipo que
algumas pessoas conhecem da família do HIV. (E6)
[...]
é da família do HIV, mas até a gente pra orientar esse paciente quando dá reagente eles ficam assim ai meu deus é HIV ou não é?
Então assim o que eu sei é que ele é um retrovírus. (E1)
Considerando que
informações científicas sobre o vírus são reduzidas e geralmente de difícil
acesso, a insegurança e o medo são sentimentos destacados nas falas das
enfermeiras no momento de oferecer esclarecimentos sobre a infecção a um
soropositivo.
O aconselhamento
configura-se como um momento que se destina no estabelecimento de um diálogo
com o usuário para fornecer-lhe informações sobre a doença e realizar a escuta
ativa, buscando sempre o esclarecimento de cada dúvida. Transmitir informações
incompletas e não dominadas pelo emissor gera dificuldades no entendimento
individual da doença [15].
Diante da não
qualificação de todos os profissionais de saúde, uma das medidas inicialmente
realizada, diante de um diagnóstico da infecção pelo HTLV, é o encaminhamento
desse paciente para o aconselhamento clínico especializado em serviço de
referência, para que estes possam ser esclarecidos sobre as diferenças entre
esse agente e outros retrovírus como o HIV [24]. Desse modo, prolonga-se o
tempo, após o diagnóstico, para uma explicação mais concreta sobre a infecção,
seus sinais e sintomas e as doenças que dele pode originar.
Apesar da gravidade
das doenças associadas ao HTLV, sua notificação não é feita no Brasil. Por
conseguinte, não há dados nacionais disponíveis sobre a sua ocorrência,
impossibilitando o desenvolvimento de recomendações de saúde pública para
médicos e outros profissionais de saúde [25].
As narrativas
destacam a falta de tratamento para esse vírus. Desta maneira a forma de
prevenção mais eficaz se configura em medidas preventivas, vejamos:
[...]
não tem vacina preventiva pra nenhum dos tipos. (E3)
[...]
e não tem tratamento específico para HTLV, além da prevenção que é o melhor
remédio. (E7)
O Ministério da Saúde
não recomenda qualquer intervenção terapêutica rotineira, uma vez que a maioria
dos infectados são assintomáticos; orienta que, para as pessoas que já
apresentam alguma sintomatologia clínica, o tratamento deve ser de acordo com o
grau de acometimento, utilizando as opções terapêuticas específicas para o tipo
de complicação apresentada [21].
Quanto aos métodos
disponíveis para o diagnóstico da infecção pelo HTLV, apenas nove enfermeiras
identificaram o método de triagem ELISA. Quanto ao método de diferenciação dos
subtipos virais, somente três entrevistadas citaram o Western Blot.
Apesar de essas
profissionais solicitarem a sorologia na rotina de pré-natal, a maioria
desconhece informações relativas ao teste e interpretação dos resultados no que
diz respeito ao diagnóstico da infecção pelo HTLV.
Para o diagnóstico
laboratorial do HTLV no Brasil há predominância dos testes de imunoensaio, sendo o principal utilizado para triagem o ELISA, estes fazem o rastreio para ambos os vírus (HTLV 1
e 2); para confirmação da infecção os principais são Western blot, imunofluorescência indireta
(IFA) e radioimunoprecipitação (RIPA), estes também
fazem a diferenciação dos subtipos em HTLV 1 ou 2 [14].
O conhecimento
constitui-se uma ferramenta essencial no âmbito da saúde, dentre outra coisas,
é o alicerce para o entendimento da sintomatologia da doença, bem como dos
meios necessários para sua prevenção e combate.
Apesar de o HTLV ser
o primeiro retrovírus humano identificado, o mesmo é pouco abordado nos cursos
da área de saúde, além de ser baixa a produção científica sobre esse vírus. Tal
fato acaba gerando dificuldades na aquisição de conhecimentos por parte dos
profissionais de saúde.
O estudo permitiu
verificar que o conhecimento das enfermeiras em relação ao HTLV ainda é
incipiente, sendo o medo e a insegurança os sentimentos destacados pelas
mesmas.
Sugere-se a inclusão
de conteúdos sobre o HTLV nos cursos de graduação em enfermagem; o
desenvolvimento de políticas públicas para as pessoas acometidas pelo vírus; a
realização de cursos de qualificação sobre o tema; além do desenvolvimento de
outros estudos, com vistas a levantar as reais carências dos profissionais, em
se tratando da abordagem sobre o HTLV.