ARTIGO ORIGINAL

Altura do fundo uterino no diagnóstico do crescimento fetal

 

Ivelise Fhrideraid Alves Furtado da Costa*, Arthur Gabriel Alves Furtado de Carvalho Noya**, Hildegard Naara Alves Furtado da Costa***, Fernanda Dayenne Alves Furtado da Costa****

 

*Doutoranda em Enfermagem pela Universidade de Pernambuco, Bolsista do Programa de Fornecimento Acadêmico da Universidade de Pernambuco,**Discente de Medicina pela Universidade de Pernambuco, ***Médica pela Faculdade de Ciências Médicas de Campina Grande, Médica da Estratégia Saúde da Família do Município de Cuité, ****Mestranda em Ciências Naturais e Biotecnologia pela Universidade Federal de Campina Grande, Técnica em Laboratório da Universidade Federal de Campina Grande

 

Recebido em 17 de janeiro de 2017; aceito em 31 de maio de 2017.

Endereço para correspondência: Ivelise Fhrideraid Alves Furtado da Costa, Rua Sinhazinha de Oliveira, 10, Palmeira, 58401-105 Campina Grande PB, E-mail: ivelisefurtado@gmail.com; Arthur Gabriel Alves Furtado de Carvalho Noya: arthurnoya17@gmail.com; Hildegard Naara Alves Furtado da Costa: hildegardfurtado@gmail.com; Fernanda Dayenne Alves Furtado da Costa: fernanda.dayenne@gmail.com

 

Resumo

Objetivos: Avaliar os fatores envolvidos na determinação da altura de fundo uterino (AFU) enquanto estimador do crescimento fetal. Métodos: Estudo de coorte prospectivo, com 302 mulheres, de gestação única, idade ≥ 18 anos e idade gestacional máxima de 16 semanas no início do seguimento. A classificação do índice de massa corporal inicial seguiu os critérios de Atalah; o ganho ponderal, as recomendações do Institute of Medicine; e o peso fetal, curva de crescimento fetal brasileira. Resultados: A coorte apresentou intervalo interpartal, número de gestação e índice de tabagismo superiores aos recomendados (p < 0,01). O estado nutricional inicial foi prevalentemente adequado e o ganho de peso excessivo, no segundo e terceiro trimestres, alcançou aproximadamente 45% (p < 0,01). Observou-se a partir da 28ª semana associação entre a AFU com o estado nutricional inicial, o ganho ponderal materno total, o peso fetal, o volume do líquido amniótico na 36ª semana (p < 0,01) e a renda familiar per capita (p < 0,03). Conclusão: O estado nutricional da gestante, dentre outros fatores, pode dificultar o rastreamento do crescimento fetal inadequado baseado nas curvas atuais de AFU, sugerindo a necessidade de nova curva uma vez que os valores obtidos foram superiores aos das curvas adotadas.

Palavras-chave: diagnóstico pré-natal, desenvolvimento fetal, ganho de peso.

 

Abstract

Symphysis fundal height in fetal growth diagnosis

Objectives: To evaluate the factors involved in determining uterine fundus height (UFH) as a fetal growth factor. Methods: Prospective cohort study with 302 women of single gestation, ≥ 18 years old and maximum gestational age of 16 weeks at the beginning of the follow-up. The classification of the initial body mass index was according to Atalah’s criteria; the weight gain, the recommendations of the Institute of Medicine, fetal weight, Brazilian fetal growth curve. Results: The cohort had an interpartal interval, gestation number and smoking index higher than recommended (p < 0.01). The initial nutritional status was adequate and the excess weight gain in the second and third quarters reached approximately 45% (p < 0.01). It was observed up to week 28 association between UFH and initial nutritional status, total maternal weight gain, fetal weight, amniotic fluid volume at week 36 (p < 0.01) and per capita family income (p < 0.03). Conclusion: The nutritional status of pregnant women, among other factors, may make it difficult to track inadequate fetal growth based on the current AFU curves, suggesting the need for a new curve since the values obtained were higher than the adopted curves.

Key-words: prenatal diagnoses, fetal development, gain weight.

 

Resumen

Altura del fondo uterino en el diagnostico del crecimiento fetal

Objetivos: Evaluar los factores involucrados en la determinación de la altura del fondo uterino (AFU) como estimador del crecimiento fetal. Métodos: Estudio de corte prospectivo, con 302 mujeres, de gestación única, edad igual o mayor que 18 años y edad máxima del embarazo de 16 semanas al inicio del seguimiento. La clasificación del índice de masa corporal se realizó según los criterios de Atalah; la ganancia ponderal, las recomendaciones del Instituto of Medicine; y el peso fetal, la curva brasileña del crecimiento fetal. Resultados: La cohorte presentó intervalo interpartal, número de gestaciones e índice tabáquico superior a los recomendados (p < 0,01). El estado nutricional inicial fue predominantemente adecuado y el aumento de peso excesivo en el segundo y el tercer trimestres alcanzó cerca del 45 % (p < 0.01). Fue observado desde la 28ª semana asociación entre la AFU y el estado nutricional inicial, la ganancia ponderal materna, el peso fetal, el volumen de líquido amniótico en la 36ª semana (p < 0,01) y la renta familiar per cápita < 0,03). Conclusión: El estado nutricional de la embarazada, entre otros factores, pueden dificultar el rastreo del crecimiento fetal basado en las curvas actuales del AFU, que sugiere necesidad de nueva curva una vez que los valores obtenidos fueron mayores que las curvas adoptadas.

Palabras-clave: diagnóstico prenatal, desarrollo fetal, aumento de peso.

 

Introdução

 

O desenvolvimento humano tem seu início a partir da fertilização e é seguido pelos períodos embrionário e fetal, quando ocorre intenso crescimento e ganho de peso do feto [1]. Este processo é suscetível a diversos fatores, tais como: desenvolvimento placentário, hábitos e estilo de vida, fatores demográficos e socioeconômicos, cuidados pré-natais, fatores nutricionais, obstétricos, genéticos e constitucionais, doenças maternas e, por fim, fatores inerentes ao feto [2]. O crescimento fetal inadequado, seja no sentido da macrossomia ou da restrição do crescimento intrauterino (RCIU), poderá trazer repercussões para a saúde do indivíduo em qualquer das demais etapas do ciclo vital [3-11].

A instalação precoce da restrição do crescimento fetal (RCF) está associada à taquipnéia transitória, asfixia, hipoglicemia, infecção no período neonatal [3], e a alta morbimortalidade; podendo implicar em alterações do desenvolvimento físico, neuropsicomotor e intelectual [4]. A RCF em longo prazo aumenta o risco de hipertensão arterial, triglicerídeos séricos elevados, alterações endócrinas, sensibilidade ou resistência à insulina, obesidade central, acidentes cérebro vasculares e subfertilidade [5].

Da mesma forma, a macrossomia também pode resultar em complicações para os recém-nascidos (RNs), dentre elas destacam-se o elevado risco para distócia de ombros, lesão de plexo braquial e esqueléticas, síndrome de aspiração do mecônio, desproporção cefalopélvica, índice de Apgar inferior no 1º e 5º minutos, alterações respiratórias neonatais, asfixia perinatal, hipoglicemia, neomortalidade e, assim como no caso de RCIU, maior ocorrência de internações em Unidades de Tratamento Intensivo Neonatal. Na vida adulta, associa-se com maior risco para obesidade [6], diabetes mellitus tipo II [7], diabetes gestacional [8], câncer de próstata [9] e câncer de mama [10]. As complicações maternas associadas à macrossomia correspondem ao trabalho de parto prolongado, parto cesáreo, hemorragia pós-parto, infecção, lacerações de partes moles de terceiro e quarto graus, eventos tromboembólicos e acidentes anestésicos [11].

O procedimento clínico mais utilizado para a avaliação do crescimento fetal corresponde à mensuração da altura de fundo uterino (AFU). Apesar da existência de procedimentos ultrassonográficos, a AFU é recomendada pelo American College of Obstetricians and Gynecologists (ACOG), pelo Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG). A sua utilização referenciada em uma curva de crescimento fetal adequada proporciona a detecção do crescimento fetal e dos seus desvios [12], além de indicar possíveis complicações durante a gravidez e erros na estimativa da idade gestacional [13].

A mensuração da AFU vem sendo utilizada extensivamente nos serviços brasileiros de atenção básica à saúde [14], visando à prevenção de agravos, sendo utilizada como parâmetro a curva de altura uterina do Centro Latino Americano de Perinatologia (CLAP). A curva do CLAP foi estabelecida a partir de valores obtidos de uma amostra de 47 uruguaias, onde a AFU foi relacionada à idade gestacional [15]. Diante das diferenças existentes entre as populações a serem comparadas, foram realizados estudos de avaliação da eficácia desta curva. Verificou-se que a curva do CLAP não foi efetiva na detecção de RCF e teve baixa especificidade na detecção de crescimento fetal excessivo [16,17]. Portanto, embora amplamente utilizada, a curva não se mostra a mais adequada para avaliar o padrão de crescimento gestacional da população brasileira, sendo também limitada para a detecção de anormalidades do crescimento fetal.

Não obstante as divergências metodológicas e amostrais, estudos recentes têm obtido valores significativamente superiores aos da curva do CLAP entre a 20ª e a 39ª semanas gestacionais [16,17]. Portanto, é imprescindível a realização de um estudo com uma amostra representativa da população brasileira, em que a avaliação da idade gestacional seja confiável, a técnica da medida da AFU seja padronizada, e que os fatores que possam interferir na mensuração da altura uterina sejam investigados. Dentre estes fatores destacam-se a situação fetal, o volume de líquido amniótico e o acúmulo de tecido celular subcutâneo materno [16]. Assim, este estudo se propõe a avaliar fatores maternos e fetais que possam interferir na determinação da AFU em uma população de gestantes do nordeste brasileiro.

 

Material e métodos

 

Estudo de coorte prospectivo com gestantes atendidas por 28 equipes da Estratégia Saúde da Família (PSF) de unidades urbanas do município de Campina Grande-PB. A coleta dos dados foi realizada entre março de 2005 e maio de 2007, no Instituto de Saúde Elpídio de Almeida (ISEA), localizado no município de Campina Grande/PB.

A amostra incluiu 302 gestantes, sem restrição quanto ao estado nutricional inicial. O cálculo do tamanho da amostra baseou-se no pressuposto de que os valores da AFU seguem uma distribuição normal e utilizou como referência estudo realizado na Paraíba, por Freire e colaboradores [17], que efetuou 1.206 medidas em 227 gestantes. Na presente pesquisa foram realizadas 1.190 medidas em 238 gestantes, correspondendo, em média a cinco medidas por gestante.

Os critérios de inclusão foram: idade materna igual ou superior a 18 anos e idade gestacional máxima de 16 semanas. Foram excluídas mulheres com gestação múltipla, portadoras de doenças crônicas, como diabetes mellitus, hipertensão, cardiopatias, e malformações fetais maiores.

Para se avaliar o efeito dos diferentes fatores sobre as medidas da AFU foram coletadas informações sobre as seguintes variáveis: tabagismo, estado nutricional inicial, ganho de peso gestacional trimestral e total, peso fetal, volume do líquido amniótico, peso ao nascer, além de dados obstétricos (número de gestações, intervalo interpartal, mudança de companheiro, número de consultas pré-natal), socioeconômicos e demográficos (trabalho, renda familiar per capita, idade materna, escolaridade).

A altura das gestantes foi aferida na primeira entrevista, com antropômetro móvel, com acuidade de um centímetro (Seca®), sendo utilizadas técnicas padronizadas por Jelliffe [18]. Para a tomada do peso fez-se uso de balança antropométrica portátil digital (Tanita®), com acuidade de 100 gramas, sendo realizada uma tomada inicial na primeira entrevista e as demais a cada quatro semanas, até a 36ª semana gestacional. A padronização e o controle de qualidade das medidas antropométricas foram executados mediante técnica de Habitch [19].

A partir do peso e altura calculou-se o Índice de Massa Corporal (IMC), que foi utilizado para a classificação do estado nutricional inicial, de acordo com a idade gestacional [20], sendo as gestantes classificadas como eutróficas, desnutridas, com sobrepeso ou obesidade. Computou-se o ganho ponderal no segundo e terceiro trimestres, sendo o primeiro determinado através da diferença entre os pesos da 28ª e 16ª semana, e o segundo, entre a 36ª e 28ª semana. Foi considerado ganho ponderal total a soma do ganho de peso no segundo e terceiro trimestres. O ganho ponderal foi classificado em insuficiente, adequado e excessivo de acordo com os critérios do Institute of Medicine [21].

O peso fetal foi determinado através de ultrassonografia, a cada quatro semanas, a partir da 16ª, sendo utilizada como referência a equação de Hadlock [22]. Utilizou-se aparelho Schimadzu (SSD-2200), com sonda convexa de 3,75 mHz. Os fetos foram então classificados em pequeno (percentil < 10), adequado (percentil 10 e 90) e grande para a idade gestacional (percentil > 90) de acordo com curva de crescimento fetal brasileira [23].

Tanto a avaliação do peso fetal como a medida da AFU foram realizadas, em todas as gestantes do estudo, a partir da 16ª e 20ª semana de gestação, respectivamente, e repetidas a cada quatro semanas até a 36ª semana de gestação. Ambos os procedimentos foram realizados por um único pesquisador, especialista em medicina fetal.

Para a medida da AFU, utilizou-se fita métrica inelástica, graduada em centímetros. As gestantes foram orientadas para o esvaziamento vesical completo, a menos de trinta minutos antes do exame, confirmada a ausência de resíduo através de ultrassonografia [24]. As medidas foram aferidas segundo a técnica descrita por Belizán [24].

Foi realizado um pré-teste dos instrumentos de coleta de dados e treinamento da equipe de antropometria no Laboratório de Avaliação Nutricional em Populações (LANPOP), do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

Durante a coleta de dados, aplicou-se um questionário para a obtenção das informações relativas às condições socioeconômicas, história gestacional e demais variáveis de interesse supracitadas. Ao final da gestação, as parturientes foram visitadas na maternidade para a coleta de dados complementares referentes às mesmas e aos recém-nascidos.

Os dados foram duplamente digitados no Epi Info 6,02 [25] e a análise estatística foi realizada através da análise de variância para verificar a associação da altura de fundo uterino com as demais variáveis do estudo. Foram construídos modelos de regressão linear múltipla, considerando-se o nível de significância de 5%.

O estudo obedeceu a resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde [26], bem como a Resolução complementar nº 303, que dispõe sobre procriação humana [27], tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual da Paraíba sob o protocolo nº 1129.0.133.000-05 e as gestantes só participaram do estudo após assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.

 

Resultados

 

Dentre as gestantes assistidas, 60% possuíam baixa escolaridade (< 8 anos) 70,2% estavam desempregadas e 89,7% tinham baixo poder aquisitivo (renda per capita de R$ 75,00 a R$ 300,00).

A idade de 74,5% das gestantes foi superior a 20 anos (205), condizendo o que caracteriza uma população de baixo risco perinatal, e 87,2% gestantes submeteram-se a mais de seis consultas pré-natais (87,2%). Por outro lado, 86,7% gestantes apresentaram intervalo interpartal de dois ou mais de cinco anos (65,7% eram multigestas e 9,4% tabagistas).

A população do estudo apresentou estado nutricional inicial em sua maioria adequado (48,9%), entretanto o percentual de gestantes com ganho de peso excessivo no segundo e no terceiro trimestres alcançou cerca de 45% nos dois trimestres.

Neste estudo observou-se que a média da AFU se mostrou estatisticamente significativa (p < 0,05) na detecção da alteração do peso fetal somente a partir da 28ª semana de gestação (p < 0,01).

Esta pesquisa indicou que o estado nutricional avaliado no início da gestação influenciou os valores da altura de fundo uterino ao longo da gestação (Tabela I).

 

Tabela I - Categorias de estado nutricional, média e desvio padrão da AFU a cada quatro semanas gestacionais.

 

 

Em relação ao ganho ponderal no segundo e no terceiro trimestres, observou-se associação estatisticamente significante entre as categorias de ganho ponderal e a AFU (p < 0, 01). O mesmo raciocínio em relação ao estado nutricional inicial pode ser utilizado quando se fala em ganho ponderal materno.

O índice de líquido amniótico na 36ª semana teve uma relação direta com a altura de fundo uterino (p < 0,01).

Os valores correspondentes à altura de fundo uterino na 36ª semana e as categorias de peso ao nascer: baixo peso, peso insuficiente, peso normal e macrossomia apresentaram associação estatisticamente significativa (p < 0,0000). A AFU média variou entre 31 cm nos RNs com baixo peso e 37 cm nos macrossômicos.

No que se refere ao ajustamento das variáveis estudadas através de análise de regressão, o modelo apresentado na Tabela II inclui apenas as variáveis que permaneceram estatisticamente associadas à altura de fundo uterina: o estado inicial no início da gestação, o ganho ponderal materno total, o peso fetal, o volume do líquido amniótico na 36ª semana e a renda familiar per capita.

 

Tabela IIResultado do modelo de regressão linear para fatores que influenciam na AFU. Campina Grande/PB, 2006 e 2007.

 

 

Uma análise comparativa entre nossos resultados e os dos estudos do CLAP [16] e de Freire [17] indicou que os valores da média da AFU obtidos no primeiro apresentavam-se significativamente superiores (p < 0, 001) (Tabela III e Figura 1).

 

Tabela III – Análise comparativa da média da altura de fundo uterino a cada quatro semanas entre o presente estudo, a curva de Freire et al. e a curva de Fescina et al.

 

 

 

Figura 1 - Comparação da média da AFU a cada quatro semanas entre o presente estudo, a curva de Freire et al. e a curva de Fescina et al.

 

 

Discussão

 

A amostra caracterizou-se socioeconomicamente típica de uma população atendida pelo serviço público de saúde, ou seja, uma população de baixa renda. Embora o estudo tenha excluído gestações de alto risco, o número de multigestas, o intervalo interpartal e o tabagismo prevalente indicaram risco para complicações gestacionais e fetais [28]. Entretanto, a faixa etária e o número de consultas pré-natais sugerem baixo risco perinatal.

Em estudo de revisão bibliográfica [29] foi observado que a idade materna superior a 30 anos e o tabagismo são fatores de risco arrolados na recorrência de baixo peso ao nascer. Já a idade materna, variando nos extremos de menos 20 ou mais de 35 anos, a baixa escolaridade e o menor nível socioeconômico são fatores de risco para a recorrência de restrição de crescimento intrauterino.

Outro estudo, que investigou os fatores associados à macrossomia [11], afirma que as gestantes multíparas, com índice de massa corporal elevada e ganho ponderal excessivo, durante a gestação, apresentam maior risco para a formação de fetos macrossômicos.

Nesta pesquisa, indicou-se que o estado nutricional avaliado no início da gestação influenciava os valores da altura de fundo uterino ao longo da gestação. Este fato pode ser justificado pela associação entre o estado nutricional inicial e o crescimento fetal, além de uma influência no aumento ou redução da AFU devido a um excesso ou escassez de tecido adiposo. Em estudo de revisão, que avaliou o ambiente intrauterino como fator de risco para a síndrome metabólica [14], concluiu-se que o estado nutricional materno atuava de forma direta sobre o crescimento fetal, principalmente no último semestre.

Observou-se que a medida da AFU se torna relevante a partir do momento em que o ganho de peso fetal é substancial, pois na fase inicial da gestação a sensibilidade deste método não é boa, devido ao pequeno peso fetal neste período, no qual os desvios de crescimento provocariam pouca interferência na altura uterina. A associação do método clínico com o padrão de crescimento fetal a partir da 28ª semana corrobora o fato de que o crescimento fetal e o ganho de peso são mais acentuados nas últimas semanas de gestação, período em que o método se mostrou mais sensível.

Gestantes componentes do “Estudo Brasileiro de Diabetes Gestacional” [15] tiveram como média de IMC pré-gestacional 23,7 kg/m2, o que indica pré-obesidade das gestantes selecionadas, este fato coloca sob suspeita de crescimento fetal excessivo 42 a 57% da população. Tal fato também se evidenciou nesta pesquisa, repercutindo inclusive no peso ao nascer com um percentual de macrossomia de 9%, bem acima da média nacional que gira em torno de 5%.

Com a retenção de peso, as gestantes podem comprometer sua saúde, uma vez que o peso excessivo está associado a várias doenças crônicas.

O índice de líquido amniótico na 36ª semana apresentou relação direta com a altura de fundo uterino, corroborando os estudos que defendem sua consideração na avaliação do crescimento fetal através da AFU [16,17].

Os resultados aqui encontrados, superiores aos valores que compõe a curva adotada pelo Ministério da Saúde [16] e a curva de Freire [17], sugerem que há uma repercussão do estado nutricional inicial e do ganho ponderal materno sobre a AFU, este achado vai ao encontro do obtido em estudo de validação da curva de Freire [30].

 

Conclusão

 

Os resultados deste estudo indicam que a altura de fundo uterino se associa ao estado nutricional materno no início da gestação, ao ganho ponderal materno total, ao volume do líquido amniótico na 36ª semana e a renda familiar per capita e, ainda, que há interferência destes fatores na altura uterina, reduzindo a sensibilidade deste método na monitorização do crescimento fetal.

Por se tratar de método de fácil realização, acessível e barato para monitoramento do crescimento fetal, faz-se necessário a continuidade de pesquisas, de preferência multicêntricas, com a finalidade de se construir uma curva que reproduza as características das gestantes brasileiras. Ressalta-se ainda a necessidade de considerar o estado nutricional inicial e o ganho ponderal durante a gestação como fatores que podem influenciar na sensibilidade deste método.

 

Agradecimentos

 

        Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pelo auxílio financeiro; ao Núcleo de Estudos e Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Estadual da Paraíba pela contribuição na coleta de dados.

 

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