REVISÃO

Fatores contextuais da comunicação do diagnóstico de câncer no processo de finitude e morte

 

Raul de Paiva Santos*, Bárbara Caroliny Pereira*, Silvana Maria Coelho Leite Fava, D.Sc.**, Zélia Marilda Rodrigues Resck**, Eliza Maria Rezende Dázio**

 

*Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem (PPGENF) da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG), **Professoras do PPGENF da UNIFAL-MG, Escola de Enfermagem da UNIFAL-MG

 

Recebido em 7 de agosto de 2017; aceito em 6 de dezembro de 2017.

Endereço de correspondência: Raul de Paiva Santos, Rua João Pinheiro, 98, 37130-000 Alfenas MG, E-mail: raulpaivasantos@hotmail.com; Bárbara Caroliny Pereira: barbaracarolinypereira@gmail.com; Silvana Maria Coelho Leite Fava: silvanaleitefava@gmail.com; Zélia Marilda Rodrigues Resck: zmrresck57@gmail.com; Eliza Maria Rezende Dázio: elizadazio@yahoo.com.br.

 

Resumo

Introdução: Este estudo reflete sobre a comunicação de más notícias, visto que o Brasil passa por uma transição demográfica e epidemiológica, com redução da natalidade e mortalidade, envelhecimento populacional e, consequentemente, ocorre uma mudança no perfil de morbimortalidade, com prevalência de patologias crônico-degenerativas; destacando-se o câncer que causa sofrimento biopsicossocial do doente, familiares e equipe de saúde. Objetivo: Refletir e discutir sobre a comunicação do diagnóstico do câncer e do processo de finitude. Métodos: Revisão integrativa de literatura. A busca foi realizada nas bases de dados Pubmed, com os descritores “cancer”, “communication” anddeath”; na Lilacs, usou-se “câncer”, “comunicação” e “morte”; e na BDENF empregou-se a estratégia “câncer”, “comunicação” e “morte”; ademais, a literatura específica do Instituto Nacional do Câncer e da Organização Mundial da Saúde foi utilizada. Resultados: Emergiram duas categorias de discussão: “A comunicação do diagnóstico, tratamento e prognóstico do câncer” e “A comunicação no processo de finitude e morte”. Conclusão: Diante do tratamento do câncer, percebe-se não apenas a importância do profissional médico, mas da equipe multiprofissional de saúde. A assistência em saúde deve basear-se na tríade paciente-equipe multiprofissional-família, com comunicação clara, conforme o contexto biopsicossocial e espiritual dos indivíduos.

Palavras-chave: cuidados paliativos, comunicação, morte, câncer, Enfermagem.

 

Abstract

Contextual factors of the communication of cancer diagnosis in the end of life and death process

Background: This study reflects about the communication of bad news, since Brazil goes through a demographic and epidemiological transition, in which there is a decrease of the birth and mortality rates, with populational aging and change in the morbimortality’s situation, with a higher prevalence of chronic-degenerative pathologies, highlighting the cancer and its recognition as a painful disease, with biopsychosocial suffering of the patient, family members and health staff. Aim: To reflect and discuss about the cancer diagnosis and finitude process communication. Methods: Literature integrative review. The search was performed in the following data bases: Pubmed, with the descriptors "cancer", "communication" and "death"; Lilacs, was used "cancer", "communication" and "death”; "cancer", "communication" and "death" strategy was used in the BDENF; furthermore, the specific literature of the National Cancer Institute and the World Health Organization was used. Results: Two categories of discussion emerged: “Communication of cancer diagnosis, treatment and prognosis” and “Communication in the finitude and death process”. Conclusion: Faced with the treatment of cancer we can see not only the importance of the medical professional role, but of a multi-professional team. Health care should be based on the patient-multi-professional health team-family triad, having a clearer communication, in accordance with the whole biopsychosocial and spiritual context of these individuals.

Key-words: palliative care, communication, death, cancer, Nursing.

 

Resumen

Factores contextuales de la comunicación del diagnóstico de cáncer en el proceso de finitud y muerte

Introducción: Este estudio refleja sobre la comunicación de malas noticias, ya que Brasil pasa por una transición demográfica y epidemiológica, con reducción de la natalidad y mortalidad, envejecimiento poblacional y, consecuentemente, ocurre un cambio en el perfil de morbimortalidad, con prevalencia de patologías crónico-degenerativas; destacándose el cáncer, que causa sufrimiento biopsicosocial del enfermo, familiares y equipo de salud. Objetivo: Reflexionar y discutir sobre la comunicación del diagnóstico del cáncer y del proceso de finitud. Métodos: Revisión integrativa de literatura. La búsqueda fue realizada en las bases de datos Pubmed, con los descriptores "cancer", "communication" y "death"; en la Lilacs, se usó "cáncer", "comunicación" y "muerte"; y en la BDENF se empleó la estrategia "cáncer", "comunicación" y "muerte"; además, la literatura específica del Instituto Nacional del Cáncer y de la Organización Mundial de la Salud fue utilizada. Resultados: Emergieron dos categorías de discusión: "La comunicación del diagnóstico, tratamiento y pronóstico del cáncer" y "La comunicación en el proceso de finitud y muerte". Conclusión: Ante el tratamiento del cáncer, se percibe no sólo la importancia del profesional médico, sino del equipo multiprofesional de salud. La asistencia en salud debe basarse en la tríada paciente-equipo multiprofesional y familia, con comunicación clara, según el contexto biopsicosocial y espiritual de los individuos.

Palabras-clave: cuidados paliativos, comunicación, muerte, cáncer, Enfermería.

 

Introdução

 

O número de idosos no Brasil está em constante aumento, passando de três milhões, em 1960, para sete milhões, em 1975 e 20 milhões em 2008 – um aumento de quase 700% em menos de 50 anos, sendo considerado um “jovem país de cabelos brancos”. A cada ano, 650 mil novos idosos são incorporados à população brasileira, e grande parte possui doenças crônicas e/ou limitações funcionais [1]. Assim, à medida que a expectativa de vida aumenta, tem-se maior frequência de exposição aos fatores de risco e às doenças crônico-degenerativas, dentre elas, o câncer merece particular atenção [1-3].

De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA) [4], câncer é o nome que caracteriza a um conjunto de mais de 100 tipos diferentes de doenças. As estimativas mundiais do Projeto Globocan 2012, da Agência Internacional para Pesquisa em Câncer/ Organização Mundial da Saúde (OMS), assinalou a ocorrência de 14,1 milhões de casos novos de câncer em 2012, com um total de 8,2 milhões de mortes em todo o mundo. Em um futuro próximo, em 2030, a carga global será de mais de 21 milhões de casos novos e, por fim, 13,2 milhões de mortes por câncer. Já no Brasil, a estimativa para o biênio 2016-2017 aponta à ocorrência de aproximadamente 600 mil novos diagnósticos de câncer, destacando ainda mais a magnitude da doença na sociedade brasileira [4,5].

Nesse sentido, dentro do contexto contemporâneo de adoecimento, poucas doenças são tão aversivas quanto o câncer; visto a evolução rápida que resulta na diminuição da sobrevivência, carrega consigo ideias negativas de sofrimento e incapacidade. Ademais, dada a natureza da enfermidade, o seu tratamento algumas vezes pode ser desgastante e doloroso [6].

Os profissionais de saúde devem ter um olhar holístico e não somente biológico da doença, o qual deve ser pautado na individualidade do sujeito, a cada etapa do ciclo vital, diante do processo de enfrentamento da doença [7], levando em consideração todo o contexto biopsicossocial e espiritual do indivíduo. Nessa perspectiva, a responsabilidade do manejo do câncer não deve estar ligada a apenas um profissional, embora quem faça o diagnóstico e direcione o tratamento seja o médico. Por trás de cada procedimento há uma equipe multiprofissional, a qual se articula para fornecer uma assistência integral; de maneira que a comunicação sobre o processo diagnóstico, bem como os procedimentos necessários para o manejo da doença também devem ser considerados entre todos os profissionais de saúde [6,8].

A reflexão a respeito da comunicação no processo diagnóstico de finitude e morte torna-se premente, não só aos profissionais vinculados às áreas de Oncologia e Tanatologia, mas também a todos os integrantes da equipe de saúde nos diferentes níveis de atenção. Não obstante, esse ponto de vista permite uma melhor integração na equipe multiprofissional de saúde, para que seus integrantes possam se articular e planejar uma assistência mais holística, o que proporciona uma melhor qualidade de vida, um bem-estar físico, mental e espiritual, mesmo nos casos em que o prognóstico é desfavorável.

Por fim, perante a premissa, o presente estudo teve como objetivo integrar o conhecimento produzido, pelos profissionais de saúde, sobre a comunicação do diagnóstico do câncer, do processo de finitude e morte.

 

Métodologia

 

Revisão integrativa de literatura, com o método proposto por Whittemore; Knafl [9] a qual sugere as seguintes etapas: 1) Identificação do problema e seleção da hipótese; 2) Estabelecimento de critérios de inclusão/exclusão de estudos; 3) Definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados; 4) Análise das informações; 5) Interpretação dos resultados; e 6) Apresentação da revisão/síntese do conhecimento. Na primeira etapa para nortear a presente revisão, formulou-se a questão: Como ocorre a comunicação do diagnóstico de câncer e no processo de finitude e morte pelos profissionais de saúde? Na segunda etapa, foram delimitados os seguintes critérios de elegibilidade: disponibilidade gratuita na íntegra, estar publicado nos últimos cinco anos e nas línguas portuguesa, inglesa e espanhola. Foram excluídos: teses, livros, editoriais e estudos que não remetiam ao tema.

Como estratégias de busca empregou-se os Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e os Medical Subject Headings (MeSH) e o operador booleano AND. A busca na literatura foi realizada nas Bases de Dados National Library of Medicine (Pubmed), com a estratégia “cancer”, “communication” anddeath”; já na Literatura Latino-Americana em Ciências de Saúde (Lilacs) usou-se “câncer”, “comunicação” e “morte”, e na Base de Dados em Enfermagem (BDENF) empregou-se a estratégia de busca “câncer”, “comunicação” e “morte”; ademais, para melhor embasamento, lançou-se mão da literatura específica do Instituto Nacional do Câncer e da Organização Mundial da Saúde.

 

Resultados e discussão

 

Foram localizados 78 artigos nas bases de dados, Pubmed, Lilacs e BDENF; contudo, após a aplicação dos critérios de elegibilidade, foram selecionados 14 estudos para compor a amostra final da presente revisão integrativa. Ainda, para melhor embasar a discussão, outras fontes de literatura complementar foram usadas. A caracterização dos estudos analisados quanto ao título, autoria e ano de publicação, objetivos e principais resultados encontram-se disponível no Quadro 1 abaixo.

 

Quadro 1 - Caracterização dos estudos incluídos na revisão. Alfenas, 2017. (n=14). (ver PDF em anexo)

 

Visando possibilitar maior compreensão e discussão, optou-se por discutir a comunicação do diagnóstico de câncer e a comunicação na finitude e morte em duas categorias temáticas: A comunicação do diagnóstico e tratamento do câncer; A comunicação de notícias ruins e a comunicação na finitude e morte; as quais estão explanadas a seguir.

 

A comunicação do diagnóstico e tratamento do câncer

 

O câncer é uma doença que tem crescido nos últimos anos e acometido várias pessoas. Com isso, a comunicação torna-se fator ideal ao se lidar com determinada doença que abala tanto o psicossocial do paciente quanto do familiar envolvido. Deste modo, pensar em cuidados paliativos envolve agregar também a família como suporte fundamental na unidade de cuidado, e prestar assistência à mesma durante todo acompanhamento do paciente, até seu óbito e posteriormente ao seu luto [10]. Tal comunicação deve ser uma habilidade desenvolvida desde o currículo dos diversos cursos da área da saúde, desde o início dos estudos, no momento em que o conhecimento clínico é introduzido [11], configurando-se como uma tecnologia leve da assistência em saúde.

Em um estudo realizado com enfermeiros, os mesmos classificaram a comunicação como uma das competências mais importantes em sua prática cotidiana. Nesse sentido, as habilidades de comunicação do profissional enfermeiro tornam-se essenciais na assistência aos pacientes; haja vista que tal profissional se encontra diretamente no cuidado e passam maior parte do tempo com pacientes e familiares ao longo da trajetória da doença [12].

Nesse sentido, comunicar uma notícia ruim, torna-se algo difícil, apesar de muitas vezes ser corriqueiro aos profissionais de saúde. Isto porque muitos médicos e outros profissionais da saúde, com intuito de manter a esperança de uma pessoa gravemente doente, escondem seu diagnóstico e prognóstico, ou adiam ou delegam essa comunicação a outros profissionais [13]. E essas notícias difíceis podem incluir vários aspectos, como ameaça à vida e ao bem-estar, mas de uma forma geral seria qualquer tipo de informação que acarrete em uma alteração negativa na vida dos envolvidos [14]. Nesse contexto, uma das possíveis vias para a melhora do envolvimento dos enfermeiros nos cuidados no processo de finitude e morte, envolve capacitá-los em relação à comunicação com os pacientes, seus familiares [12] e com a equipe multiprofissional de saúde.

Para os pacientes, os elementos mais importantes antes de se iniciar o tratamento, se traduz em uma linguagem compreensível e de fácil entendimento, disponibilidade do médico em discutir sua doença e explicar todos os fatores e, além disso, a confiança que o médico vai lhe passar [15]. No Brasil, foi desenvolvido um protocolo de comunicação de notícias ruins, denominado P-A-C-I-E-N-T-E o qual abarca etapas a serem seguidas no momento do diagnóstico e de más notícias. “P” seria preparar, ou seja, os profissionais de saúde devem estar preparados antes de transmitir más notícias apropriadamente, levando em consideração a veracidade das informações, o ambiente, garantindo que não ocorram interrupções e mantendo a privacidade e o conforto. “A” abarca avaliar o quanto o paciente sabe e quanto deseja saber, caso o indivíduo não queira receber informações negativas, esse pode indicar alguém de confiança para receber a notícia ruim. Por sua vez, o “C” significa um “convite à verdade”, no qual o paciente é informado da existência de más notícias, nesse momento o paciente pode mudar de ideia e decidir se quer ou não ser informado; assim, essa atitude pode indicar se o indivíduo precisa de mais tempo para trabalhar aquilo que lhe foi dito. Já o “I” envolve informar no sentido de o que se compartilha com o paciente, quanto à velocidade, qualidade, quantidade desejada de informações, para que o paciente possa tomar decisões em relação à sua vida ou informar consentimento sobre o seu tratamento. O “E” expõe que o paciente necessita de tempo para entender e reagir às más notícias, referindo-se às “emoções”. O “N” é a afirmativa “não abandone o paciente”, denotando que o profissional nunca deve abandonar o seu paciente, independentemente do prognóstico. Por fim, “T” e “E” são o tratamento e as estratégias, incluindo também o cuidado interdisciplinar [11].

O modelo comunicacional que pressupõe a comunicação dialógica é a substância do trabalho em saúde, na qual cada encontro entre profissional de saúde e paciente, seja uma conversa que considere a singularidade e a individualidade desses pacientes [16], ou seja, que perpasse o tratamento do câncer, avaliando-o então de forma holística. Destarte, a necessidade de melhorar a comunicação entre profissionais de saúde, paciente e familiar se fazem de suma importância para o processo de tratamento. Diante de reflexões teóricas sobre a comunicação, vê-se a importância de respeito mútuo, confiança, colaboração, e relações mais equânimes para se ter um atendimento resolutivo, com compreensão e concordância de ambas as partes envolvidas [16].

O Modelo Biomédico se baseia propriamente no conhecimento técnico-científico, apenas na figura do doente, que leva em consideração somente relatos subjetivos da enfermidade, em que existe apenas uma relação assimétrica entre médico e paciente [16]. Essa transfiguração de centrar o cuidado apenas na doença torna o mesmo superficial, pois não se trata apenas da doença, mas do profissional ter uma visão holística sobre o paciente e tudo que o circunda. Nesse sentido, o paciente deve ser participativo de seu processo de tratamento-cura, o profissional da saúde precisa empoderá-lo em relação aos métodos de tratamento e a todas as decisões a serem tomadas a respeito de sua doença. Percebe-se que muitas vezes dependendo do julgamento do profissional e de suas tomadas de decisões, as informações são omitidas dos pacientes.

Não obstante, diante do tratamento do câncer percebe-se não só a importância do profissional médico, mas de uma equipe multiprofissional, que necessita estar com a saúde mental mantida e aprimorada, para que se consiga desenvolver o trabalho com sucesso. A partir do momento que os profissionais de saúde trabalharem consigo mesmos antes de cuidar do paciente, isso refletirá na qualidade do cuidado prestado não só ao paciente, mas a sua família [10].

Durante todo o tratamento desse paciente a comunicação é imprescindível a todos os profissionais de saúde com respectivos pacientes e familiares. O diálogo está relacionado ao vínculo e a corresponsabilidade. Isso possibilita uma construção de autonomia, reconhecendo que tanto o profissional quanto o paciente necessitam ter espaço e voz nos processos de decisão. O vínculo pode tornar a responsabilidade mútua, a partir do momento que favoreça uma aproximação ao valor que o adoecimento e as práticas em saúde têm para os sujeitos [16].

 

A comunicação de notícias ruins e a comunicação na finitude e morte

 

Tratar a terminalidade e a morte é um desafio enfrentado pela maioria dos profissionais da saúde, quando se refere a comunicação. A promoção de relações estreitas se faz necessária tanto para o paciente terminal, quanto para os familiares [17], que vão precisar enfrentar e aprender a conviver com a morte do ente querido. Desse modo, o temor pela morte está presente no indivíduo com câncer durante toda a trajetória da doença [18].

Mesmo se tratando de um processo natural, é uma abordagem difícil de aceitar, pois a morte já gera comportamentos de negação, como é descrita como algo indesejado, isso dificulta incluí-la como parte da vida [19]. Assim, usualmente as conversas em relação à terminalidade ocorrem no âmbito de Instituições de Saúde ou hospitais. Nesse sentido, os profissionais de saúde tornam-se participantes ativos ou líderes na facilitação da comunicação com a família sobre o processo de terminalidade [20] e de morte. Ademais, nas sociedades ocidentais, há uma evitação ou medo de falar abertamente sobre a morte, o que causa mais malefícios do que benefícios aos pacientes e aos enlutados [20].

A comunicação neste aspecto, vai incluir qualquer interação realizada durante as conversas finais, sendo ela verbal ou não-verbal, esse tipo de conversa pode ser uma ou várias conversas, realizadas pelos profissionais de saúde, amigos, familiares e outras pessoas próximas. Estudo afirma que essas conversas finais são uma forma de promover grande impacto para a viagem do fim da vida [21]. Isso seria uma forma de possibilitar a família uma melhor aceitação, como forma de permissão para seguir em frente, permitindo também ao paciente e familiar a sensação de fechamento e conclusão de uma relação construída.

Conversas sobre o fim da vida podem agir como amortecedores contra o isolamento emocional. Evitar de falar sobre terminalidade e morte pode ser uma forma de escape utilizada pelos profissionais de saúde, pacientes e familiares, ao invés disso utilizam expressões eufemísticas, que são mais suaves, mas esse tipo de linguagem pode indicar algum tipo de medo social [20]. Nesse sentido, discussões entre a família, o paciente e a equipe sobre o processo de finitude, têm sido empregadas para alinhar melhor as preferências de cuidado do paciente e para diminuir assistências indesejadas [22].

Pesquisa com estudantes de enfermagem aponta que estes se sentem despreparados para cuidar de pacientes no fim da vida, e revelam que lidar com a morte e o morrer, de certa forma, gera muita ansiedade [23]. Corroborando a temática da morte, consta-se deficiência de conteúdos sobre morte nos currículos, assim como livros que abordem o assunto. Percebe-se que as universidades vivem a negação da morte e ainda transmitem isso aos alunos. Por mais que o assunto seja desagradável, faz-se necessário que tal seja abordado desde a graduação, com uma elaboração adequada do que é a morte [19].

O preparo para lidar com a morte é essencial, mas vale ressaltar que, durante o processo de finitude, esse paciente precisa ser cuidado. Esse ato de cuidar é o que promove o bem-estar do ser fragilizado [24]. Portanto, na preparação e formação dos acadêmicos de enfermagem, faz-se premente que estes recebam informações e conteúdos sobre os cuidados paliativos, para que sejam aptos a prestar um atendimento com qualidade, e assim decidirem posteriormente ou não em especializar-se na área que se encontra em ascensão nos dias de hoje [25]. Por sua vez, o enfermeiro é o profissional da saúde que passa mais tempo com o paciente, dentro dos cuidados paliativos, principalmente com pacientes oncológicos, seu principal objetivo é a promoção do cuidar humanizado [24].

A humanização e ética no serviço desses profissionais precisam sempre ser preservadas. O fato de se tratar do processo da finitude não significa que o profissional da saúde não precisa se preocupar com a aparência, conforto e estado geral do paciente. Pelo contrário, estudo indica que ele é responsável por prestar uma assistência pautada no respeito, na humanização e no acolhimento desse paciente [24]. Destarte, um cuidado com qualidade, humanização e com ética deve ser oferecido ao paciente, em todo processo da vida, desde o nascimento até o processo de finitude e morte.

Por fim, apesar de o diagnóstico médico ser competência de tal profissão, reveste-se de grande premência a inclusão dos demais profissionais de saúde capacitados [18], na comunicação com o paciente e com a família, seja ela em relação ao diagnóstico, ao prognóstico, aos tratamentos e suas viabilidades, assim como no processo de finitude e morte.

 

Conclusão

 

Verifica-se que a comunicação do diagnóstico e tratamento do câncer e sua contextualização no processo de finitude e morte ainda se caracterizam como tabus em nossa prática assistencial, com inúmeras dificuldades aos profissionais da saúde. Assim, manter uma relação interpessoal com pacientes e familiares e uma comunicação efetiva é um processo complexo, que demanda capacitação, desde os primeiros períodos dos cursos da área de saúde brasileiros, além do respeito e da cooperação entre a tríade paciente-profissional de saúde-família.

Diante do tratamento do câncer percebe-se não só a importância do profissional médico, mas de uma equipe multiprofissional, que necessita estar com a saúde mental mantida e aprimorada, para que consiga desenvolver o trabalho com sucesso. A assistência em saúde deve basear-se na tríade paciente- equipe multiprofissional de saúde- família, tendo uma comunicação clara, conforme todo o contexto biopsicossocial e espiritual dos indivíduos, tendo sempre em mente que o paciente tem o direito de decidir como, onde, quando, o quanto deseja saber sobre seu estado de saúde e seu prognóstico e isso deve ser respeitado acima de tudo, prezando pelo princípio da autonomia do paciente.

Ademais, percebe-se que para assistir com qualidade, os profissionais de saúde devem estar preparados em relação ao processo saúde-doença, à comunicação como tecnologia leve, à comunicação terapêutica, visando um cuidado integralizado, individualizado e, sobretudo, humanizado no processo de finitude e morte.

 

Referências

 

  1. Veras R. Envelhecimento populacional contemporâneo: demandas, desafios e inovações. Rev Saúde Pública 2009;43(3):548-54.
  2. Duarte RC, Nogueira-Costa R, Viana LS. Tratamento do paciente geriátrico portador de câncer. In: Freitas EV, Py L, Cançado FAX, Doll J, Gorzoni ML, eds. Tratado de Geriatria e Gerontologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011. p.117-23.
  3. Basílio DV, Mattos IE. Câncer em mulheres idosas das regiões Sul e Sudeste do Brasil: evolução da mortalidade no período 1980-2005. Rev Bras Epidemiol 2008;11(2):204-14.
  4. Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva. Coordenação de Prevenção e Vigilância. Estimativa 2010: Incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2009. 98p. PDF.
  5. Instituto Nacional do Câncer José Alencar Gomes da Silva. Coordenação de Prevenção e Vigilância. Estimativa 2016: Incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2015. 126p. PDF.
  6. Pedraza HMP, Collazos HAG. La comunicación del diagnóstico de cáncer como práctica saludable para pacientes y profesionales de la salud. Rev Cuid 2015;6(1):964-9.
  7. Belhiani HPP, Matos LRP, Camargos F. O paciente frente ao diagnóstico de câncer e a atuação dos profissionais de enfermagem: uma Revisão Integrativa de Literatura. Rev Enferm Cent Oeste Min 2014;3(4):1374-81.
  8. Lerner K, Vaz P. “Minha história de superação”: sofrimento, testemunho e práticas terapêuticas em narrativas de câncer. Interface (Botucatu) 2017;21(61):153-63.
  9. Whittemore R, Knafl K. The integrative review: update methodology. J Adv Nurs 2005;52(5):546-53.
  10. Silveira MH, Ciampone MHT, Gutierrez BAO. Percepção da equipe multiprofissional sobre cuidados paliativos. Rev Bras Geriatr Gerontol 2014;17(1):7-16.
  11. Pereira CR, Calônego MAM, Lemonica L, Barros GAM. The P-A-C-I-E-N-T-E Protocol: an instrument for breaking bad news adapted to the Brazilian medical reality. Rev Assoc Med Bras 2017;63(1):43-9.
  12. Coyle N, Manna R, Shen MJ, Banerjee SC, Penn S, Pehrson C et al. Discussing death, dying, and end-of-life goals of care: a communication skills training module for oncology nurses. Clin J Oncol Nurs 2015;19(6):697-702.
  13. Silva RBL. Comunicando notícias difíceis na unidade de terapia intensiva. Arq Catarin Med 2015;44(1):82-92.
  14. Cabeça LPF, Sousa FGM. Dimensões qualificadoras para a comunicação de notícias difíceis na unidade de terapia intensiva neonatal. J Res: Fundam Care Online 2017; 9(1):37-50.
  15. Munhoz BA, Paiva HS, Abdalla BM, Zaremba G, Rodrigues AM, Carretti MR et al. From one side to the other: what is essential? Perception of oncology patients and their caregivers in the beginning of oncology treatment and in palliative care. Einstein 2014;12(4):485-91.
  16. Miranda ACA, Feliciano KVO, Sampaio MA. A comunicação médico-paciente na percepção de mulheres com nódulo mamário e indicação de biópsia. Rev Bras Saúde Matern Infant 2014;14(3):251-60.
  17. Keeley MP, Generous MA. Final conversations: overview and practical implications for patients, families, and healthcare workers. Behav Sci 2017;7(2):E17.
  18. Neves FB, Noguez PT, Guimarães SRL, Muniz RM, Pinto BK. Contradictory decisions: reasons that lead the family caregiver to omit cancer diagnosis. J Nurs UFPE on line 2017;11(2):591-600.
  19. Duarte AC, Almeida DV, Popim RC. A morte no cotidiano da graduação: um olhar do aluno de medicina. Interface (Botucatu) 2015;19(55):1207-19.
  20. Omilion-Hodges LM, Swords NM. Communication matters: exploring the intersection of family and practitioner end of life communication. Behav Sci 2017;7(1):E15.
  21. Keeley MP, Generous MA, Baldwin P. Exploring children’s final conversations with dying family members. J Fam Commun 2014;14:208-29.
  22. Reinke LF, Feemster LC, Gunnink JME, Tartaglione EV, Udris E, Curtis JR et al. Heart and Lung 2017;46:30-4.
  23. Gillan PC, Riet PJ, Jeong S. End of life care education, past and present: a review of literature. Nurse Educ Today 2014;34(3):331-42.
  24. Fernandes MA, Evangelista CB, Platel ICS, Agra G, Lopes MS, Rodrigues FA. Percepção dos enfermeiros sobre o significado dos cuidados paliativos em pacientes com câncer terminal. Ciênc Saúde Coletiva 2013;18(9):2589-96.
  25. Coelho AF, Silva MCLG, Santos RMP, Bueno AAB, Fassarella CS. A importância do conhecimento do cuidado paliativo pelos docentes durante o curso de graduação em enfermagem. Revista Rede de Cuidados em Saúde 2014;8(3):1-14.