ARTIGO ORIGINAL

Paralinguagem como recurso comunicacional com o idoso hospitalizado

 

Teresa Cristina Gioia Schimidt, D.Sc.*,Yeda Aparecida de Oliveira Duarte**

 

*Enfermeira da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP), Pesquisadora nas áreas de Comunicação, Gerontologia e Humanização, **Enfermeira, Livre Docente MS5, Professora Associada da Escola de Enfermagem e da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (vinculo subsidiário)

 

Recebido em 7 de abril de 2017; aceito em 3 de agosto de 2017.

Endereço para correspondência: Teresa Cristina Gioia Schimidt, Av. Dr Eneas de Carvalho Aguiar 188, Cerqueira Cesar 05403-000 São Paulo SP, E-mail: teresa.schimidt@gmail.com; Yeda Aparecida de Oliviera Duarte: yedaenf@usp.br

 

Resumo

Objetivo: Verificar a pertinência da aplicação do programa de capacitação em comunicação não verbal em gerontologia e a assimilação mediata frente ao reconhecimento dos recursos paralinguísticos que podem ser usados a favor da comunicação entre o binômino profissional e idoso. Material e métodos: Estudo de campo exploratório desenvolvido com 102 profissionais de saúde que exercem suas funções em três hospitais da administração direta do Estado de São de Paulo e que atendem exclusivamente clientes do Sistema Único de Saúde (SUS). Resultados: As respostas apresentadas sobre o uso da paralinguagem foram corrigidas e classificadas em quatro grupos, a saber: voz; reações provocadas; silêncio, pausas e interrupções; e condição do idoso. O índice de assimilação imediata do conteúdo de paralinguagem foi muito satisfatório e satisfatório em 90,3%. Conclusão: Concluiu-se que a replicação do programa revelou-se pertinente e atualizada ao cenário dos serviços hospitalares, mantendo-se eficiente aos profissionais de saúde.

Palavras-chave: comunicação não verbal, enfermagem geriátrica, idoso, voz.

 

Abstract

Paralanguage as a communicational resource with hospitalized elderly people

Aim: To verify the relevance of the application of the nonverbal communication in gerontology training program and the delayed assimilation in relation to the recognition of the paralinguistic resources that can be used for communication between professionals and elderly people. Methods: Exploratory field study performed with 102 health professionals who worked in three hospitals under the direct administration of the state of São Paulo that exclusively assist clients of the Brazilian National Health System (SUS). Results: The results regarding the use of paralanguage were analyzed and classified into the following four groups: voice; provoked reactions; silence, pauses and interruptions; and condition of the elderly person. The index of immediate assimilation of the paralanguage content was very satisfactory or satisfactory in 90.3% of cases. Conclusion: It was concluded that the replication of the program proved to be relevant and appropriate for the hospital services context, while remaining efficient for the healthcare professionals.

Key-words: Nonverbal communication, geriatric nursing, aged, voice.

 

Resumen

Paralenguaje como recurso de comunicación con el anciano hospitalizado

Objetivo: Verificar la pertinencia de la aplicación del programa de capacitación en comunicación no verbal en gerontología y la asimilación mediata frente al reconocimiento de los recursos paralinguisticos que pueden ser utilizados a favor de la comunicación entre el binomio profesional-anciano. Material y métodos: Estudio de campo, exploratorio desarrollado con 102 profesionales de salud que ejercen sus funciones en tres hospitales bajo administración directa del Estado de São Paulo y que atienden exclusivamente a clientes del Sistema Unico de Salud (SUS). Resultados: Los resultados presentados sobre el uso de paralenguaje fueron corregidos y clasificados en cuatro grupos: voz; reacciones provocadas; silencio, pausas e interrupciones; y condición del anciano. El índice de asimilación imediato del contenido de paralenguaje fue muy satisfactorio el 90,3%. Conclusíon: Se concluye que la replicación del programa se revela pertinente y actualizado para su uso en los servicios hospitalares, manteniendose eficiente para los profesionales de salud. 

Palabras-clave: comunicacíon no verbal, enfermería geriátrica, anciano, voz.

 

Introdução

O processo de envelhecimento é muito mais amplo que a modificação de peso de uma determinada população, dado que altera a vida dos indivíduos, as estruturas familiares e a sociedade, além de ofertar demandas específicas nos setores públicos, dentre eles, a saúde. Tal condição exige a necessidade de implementação de políticas públicas que respeitem e que utilizem de forma eficiente os recursos materiais, financeiros, humanos e sociais disponíveis. Gestores e profissionais encaram com preocupação esta dinâmica, e muitos reconhecem a necessidade de se instrumentalizar para tomar decisões que possam responder adequadamente ao Estado, ao mercado, aos idosos e a suas famílias [1].

A Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa exige, dentre outras atividades, que se estabeleça um trabalho em parceria alicerçado no enfoque do cuidar interdisciplinar. Defende-se a premissa que o cuidado baseado na integralidade considera as peculiaridades dessa clientela e permite a composição de linhas de cuidado consideradas fundamentais na gestão do cuidado gerontológico de qualidade [2].

Gerenciar o cuidado com e nem só ao idoso exige do profissional de saúde conhecimento técnico, assistencial, administrativo, capacidade em técnicas de resolução de problemas, bem como habilidades comunicacionais, que devem ser usadas a favor do cuidado efetivo ao idoso [3].

As competências utilizadas para comunicar são influenciadas por vários fatores, como sentimentos, atitudes, valores, normas sociais e o tipo de ambiente, estando sujeitas a grande vulnerabilidade, correspondente à situação e ao momento específico em que ocorre a interação [3].

O processo comunicacional envolve aptidões interpessoais importantes que permitem ao profissional adaptar a informação que pretende comunicar, estabelecer uma relação de abertura com o idoso, respeitando seu direito à informação, incentivá-lo a tornar-se um cidadão crítico, promover a mudança de atitudes e aumentar seus conhecimentos, aderir ao tratamento, contribuindo deste modo para melhores níveis de conhecimento em saúde [4].

Simultaneamente, o ser humano possui duas dimensões para expressar suas necessidades ao mundo: a linguagem verbal (psicolinguística), referindo-se às palavras ditas ou escritas; e a não verbal (psicobiológica), dentre estas está a paralinguagem [5].

A paralinguagem é fruto da interação de uma série de variáveis não propriamente linguísticas, mas que se referem ao aparelho fonador e envolvem: tom, timbre, intensidade e ritmo da voz, pausas, tipo de vocalização (riso, bocejos, suspiros, gritos) e até secreções vocais (“huum”, “aham”, “né”) [5].

É essencial ressaltar a diversidade linguística existente em uma mesma comunidade e, especialmente, em um mesmo falante que, por aprender que há diferentes maneiras de dizer a mesma coisa, pode optar por como dizê-lo, dependendo de circunstâncias diversas influencia no modo pelo qual se transmite uma determinada informação ou sentimento [5].

Contudo, quando o idoso está doente, muitas vezes, ele se encontra incapaz de expressar adequadamente suas necessidades e desejos, isto porque é comum apresentar alterações sensoriais, cognitivas e linguísticas que afetam o discurso podendo provocar uma diminuição gradativa do contato social, facilitando mudanças no humor e nas emoções [3].

Na maioria das vezes, as emoções são expostas por canais não verbais que são emitidos sinais emocionais inconscientemente, como também são recebidos os mesmos sinais sem consciência de se estar reagindo a eles. Sendo assim, torna-se necessário que os profissionais resgatem de modo consciente a comunicação não verbal emitida por eles próprios e pelos pacientes que cuidam, só assim o sucesso na relação profissional-idoso poderá ser concretizado [5].

Quando o profissional de saúde utiliza os recursos da comunicação, ele pode reconhecer precoce e amplamente as necessidades individuais do idoso e incluí-lo ao planejar, executar e avaliar a assistência a ser prestada, garantindo-lhe uma oportunidade real de exercício de sua autonomia e/ou da manutenção e incremento de sua capacidade funcional e cognitiva, visto estas constituírem seu próprio direito [3]. A problemática, portanto, baseia-se em: “De que modo a paralinguagem pode ser aplicada pelo profissional de saúde a favor da comunicação com o idoso hospitalizado?

O estudo tem como objetivo apresentar os recursos paralinguísticos reconhecidos pelos participantes da capacitação em comunicação não verbal em gerontologia que podem ser usados como coadjuvantes no sucesso da comunicação no binômino profissional-idoso. Justifica-se pelo fato do idoso ser alvo de atenção nos serviços de saúde, visto representar uma clientela relevante e presente cada vez mais nesses espaços e, ainda, por considerar que o profissional de saúde quando participa de capacitações específicas, aproveita a oportunidade de vivenciar novos conceitos e por meio deles modificar sua prática, assim, passa a compreender a amplitude do significado da comunicação e, ainda, assume atitudes profissionais afinadas com os objetivos que favorecem tanto um cuidado efetivo como afetivo ao idoso.

 

Material e métodos

 

Trabalho de campo descritivo e exploratório realizado após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Parecer n. 351.492) em três hospitais de grande e médio porte sob a administração direta do Estado, exclusivamente com atendimento SUS, pertencentes à Rede Regional de Atenção à Saúde no Estado de São Paulo (RRAS 06 - Capital) e que tivessem o idoso como cliente. Foram adotados como critérios de inclusão no estudo técnicos de enfermagem, e ainda, graduandos, pós-graduandos e residentes da saúde (medicina, enfermagem, fisioterapia, fonoaudiologia, serviço social, psicologia, nutrição e terapia ocupacional) desde que estivessem ligados obrigatoriamente à instituição, seja por vínculo empregatício ou escolar; revelassem interesse e disponibilidade para comparecer nos dias agendados da capacitação; assumissem o compromisso de estar presente em todos os três encontros (4 horas cada) e aceitassem participar espontaneamente da pesquisa assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

O programa de capacitação respeitou uma matriz pedagógica [3] que continha as bases teóricas, os recursos e procedimentos pedagógicos. A referida matriz foi elaborada de forma que, no final de cada encontro, o pesquisador pudesse analisar as respostas dos participantes frente ao questionário aplicado e, assim, verificar o grau de assimilação imediata do conteúdo trabalhado.

Dentre os objetivos desta capacitação, foi incluída a identificação dos recursos paralinguísticos que podem ser usados a favor da comunicação no binômino profissional-idoso. Questão esta apresentada aos participantes imediatamente após o término do segundo encontro, momento no qual essa temática foi discutida.

As folhas-respostas foram recolhidas sem qualquer tipo de registro que pudesse identificar os participantes, daí, serem usados somente o número arábico sequencial e a letra correspondente ao hospital (A,B ou C).

O tratamento dos dados foi realizado obedecendo às seguintes etapas: leitura das respostas; correção baseada no referencial teórico específico [5-6]; reconhecimento das similaridades das respostas; criação de agrupamentos; estabelecimento de critérios para determinação do tipo de satisfação (muito satisfatória, satisfatória e insatisfatória) frente à assimilação do item avaliado.

 

Resultados

 

Participaram da capacitação 102 profissionais de saúde separados em três grupos (A=38, B=41 e C=23); entretanto, compareceram ao segundo encontro 92 (90,2%), sendo sua distribuição nos grupos A= 35(92,1%), B=38(92,7%) e C=19(92,6%).

Destes 78,3% (72) eram de nível superior e 21,7% (20) de nível técnico. Em relação ao gênero e à idade, 79,4% (72) eram mulheres com idade média de 43,5 anos, mediana de 42 anos e 20,6% (19) homens com média 39,3 e mediana de 40,6 anos de idade.

Ao analisar os participantes de nível superior destacou-se a participação de 59,7% (43) de enfermagem, 19,4% (14) de psicologia, 11,1% (8) de serviço social, 6,9% (5) de fisioterapia e 2,8% (2) de fonoaudiologia. O nível técnico foi composto exclusivamente por técnicos de enfermagem.

Os resultados em face da maneira reconhecida pelos participantes da capacitação, de utilizar os recursos da paralinguagem, a favor da comunicação com o idoso, foram corrigidos e tratados, classificando as respostas em quatro grupos, a saber: voz; reações provocadas; silêncio, pausas e interrupções e condição do idoso.

O agrupamento “voz” reuniu respostas que citaram a voz e os sinais não linguísticos como fatores a ser percebidos e que devem estar ajustados em conformidade com o contexto e as alterações auditivas e visuais das pessoas na interação, pertinência da entonação, velocidade, timbre, volume da voz e atenção no quanto ela pode revelar tranquilidade, amorosidade e agressividade no discurso, traduzir empatia na relação e autenticidade da mensagem e, ainda, ser um sinal que deve ser observado pelo profissional para ajuda no diagnóstico de depressão/ansiedade (50,5% - 47). Eis os exemplos que ilustram:

 

“É necessário que o profissional tenha consciência de que sua comunicação verbal não pode se limitar ao conteúdo da fala/mensagem, mas, sim, é confirmada e complementada pelo tipo de entonação que se dá”. (25 A)

 

“O tipo de voz profissional releva o quanto ele é autêntico ou não. Ele deve usar um tom de voz na altura adequada ao idoso, usando fala objetiva e clara, numa velocidade que não atrapalhe o entendimento”. (26A)

 

O agrupamento “reações provocadas” foi composto de respostas que englobaram o resultado que o uso da paraliguagem é capaz de provocar como: a sensação de acolhimento, a continuidade da interação, complementa a conversa, expressa afeto, interesse e atenção, aumenta o entendimento de uma prescrição escrita, colabora com o diálogo, favorece o vínculo do profissional-idoso e vice-versa e revela com clareza os sentimentos envolvidos ( 34,4% - 32). Alguns exemplos:

 

“Dependendo, o idoso reage à fala do profissional e pode ser algo de afeto e atenção, com certeza, interfere na segurança e confiança que se tem”. (52B)

“Se eu falar com uma voz segura e firme, eu posso ajudar ele no entendimento da prescrição médica e ainda posso mostrar preocupação por sua situação. É uma forma na qual posso transmitir carinho inclusive”. (85 C).

 

“Silêncios, pausas e interrupções” constitui o agrupamento que englobou as respostas com valor no tempo das respostas às perguntas em uma determinda interação, valor ao silêncio como uma possibilidade de ser substituto do verbal e que traz muitas informações e que requerem interpretações sensíveis, atenção às interrupções quando fala (26,9% -25). Alguns exemplos:

 

“Falar pausadamente, dar espaço de pausa entre as perguntas de maneira que o idoso possa entender a mensagem. É importante também respeitar o silêncio como ainda interpretá-lo, conforme a situação que se está vivenciando”. (73B)

“Entendi que a paralinguagem ajuda o idoso compreender de uma forma melhor a linguagem verbal. Isso ocorre quando se respeita o silêncio. Silêncio é o tempo a ser dado ao idoso para que possa expressar seu entendimento ou apresentar dúvidas entre uma informação e outra”. (75B)

 

O quarto agrupamento, “condições do idoso”, caracterizou-se pelas respostas que enfatizaram a importância de se avaliar o contexto e conteúdo da mensagem e as condições que o idoso possui para compreender as orientações dadas pelos profissionais e, consequentemente, garantir a efetividade da relação em si (16,1% - 15). Eis alguns relatos que ilustram:

 

“Eu presto atenção no grau de escolaridade dele e ai uso termos que ele vai entender melhor”. (100C)

“O envelhecimento traz declínio das capacidades sensoriais, logo preciso ficar atento e observar o ambiente e falar de forma que a interação seja boa, saudável e com vínculo”. (24A)

 

Ressalta-se que a resposta completa do participante podia ser inserida em mais de um agrupamento. Foram considerados como critérios de assimilação imediata muito satisfatória as respostas que tinham em seu conteúdo características expostas que pertenciam a dois ou mais dos agrupamentos propostos (33,3%); satisfatório quando havia características que fossem possíveis ser percebidos em um determinado agrupamento (57,0%); e insatisfatório, no caso das respostas em branco e daquelas que não estavam corretas (9,7%).

 

Discussão

 

Ter habilidade em comunicação perpassa pela capacidade que se tem de ser assertivo nas relações pessoais e profissionais. É essencial que a comunicação seja regada de afeto, expressa por acolhimento adequado, na qual a intencionalidade de estar junto esteja exposta e, ainda, posturas e gestos sejam capazes de gerar empatia. Ser hábil ou competente em comunicar-se ultrapassa a valorização da compreensão da mensagem [3-7]. Ressaltam-se as qualidades importantes do profissional que se comunica bem e que traduz competência, quando este possui, pelo menos, duas características: a primeira, é a reatividade ajustada, isto é, quando tem a capacidade de responder ao outro baseado em um ritmo condizente às peculiaridades do outro, respeitando seu tempo de resposta, sem deixá-lo sozinho ou invadi-lo; a segunda, é assertividade, sendo esta compreendida como a capacidade do profissional agir e tomar decisões pautadas na clareza, objetividade e delicadeza; e terceira, o autoconhecimento, no sentido de desenvolvimento pessoal como um determinante do bem-estar social [7].

A análise de conversação quando usada para verificar a significância da história de vida ou narrativa pessoal tem revelado mudança no planejamento pragmático; daí, a lembrança do passado ser mais frequente nas conversas entre os idosos. As narrativas pessoais ocorrem com maior frequência na fala das pessoas que são mais velhas, trazendo a ideia de que os idosos falam demais e querem contar suas histórias. É importante citar que o passado é utilizado pelo idoso para análise do presente, pois tudo indica que assim ele demonstra seus valores e preserva sua imagem social [8].

A sensação percebida, pelos profissionais ao lidarem com o idoso, de falta de palavras verbalizadas corresponde à ocorrência da anomia, que é o aumento na dificuldade de recuperação ativa do vocábulo, entretanto, devem ser consideradas as influências sociais, culturais, cognitivas e emocionais do mesmo [9], afinal as emoções são transmitidas por meio de expressões faciais, dos gestos corporais e pela própria fala do indivíduo [3-5].

A fala é a representação motora da linguagem, para que ela seja considerada normal, é necessário se ter a integridade e integração da cognição, com os sistemas neuromusculares e musculoesquelético [8].

Para a produção da fala, são requeridos bons mecanismos de: respiração, fonação, articulação, ressonância, boa audição e, evidentemente, de feedback auditivo e proprioceptivo. Ressalta-se que todos estes processos não ocorrem em uma determinada ordem, mas tudo acontece simultaneamente, e um aspecto influencia o outro, sendo todos comandados pelo sistema nervoso central [10].

As estruturas e as funções no mecanismo periférico da fala sofrem modificações com o envelhecimento, porém não há um consenso científico que explique as causas. Nesta função, a deteriorização ocorre sobretudo pela ausência dentária ou prótese com má adaptação, provocando mudanças musculares, consequentemente, dificuldades na articulação da palavra, fazendo com que a fala fique com sibilância e, ainda, provocando acúmulo de saliva nas comissuras labiais [1,11].

Tanta a fala como a voz precisam ser avaliadas de rotina, atenção deve ser dada à respiração (capacidade, controle e coordenação da produção sonora), à intensidade, à qualidade vocal, ao grau de nasalidade, à qualidade da articulação e à prosódia caracterizada pelo ritmo e velocidade da fala [11].

Os sinais paralinguísticos demonstram sentimentos, características da personalidade, atitudes, relacionamento interpessoal e autoconceito. Daí, ficar-se atento ao perceber o uso, por exemplo, de tosse ou grunhido, ou ainda, de pausas em uma interação, pois pode ser que eles representem algo que vai além e requer ser valorizado [5-10]. Interromper o idoso quando ele fala expõe respeito, e isto favorece a criação de um vínculo fundamental para sua recuperação e retrata um bom cuidado [3-7]. Em algumas ocasiões, o idoso não quer falar porque está com medo, vergonha de fazer questionamentos e elucidar suas dúvidas, ou ainda, porque simplesmente percebeu que existe pressa ou não se deseja o contato [7].

Estudo realizado com pacientes que usou observação durante a primeira hora de recuperação anestésica e, posteriormente, entrevista com os pacientes para a compreensão das sensações atribuídas às manifestações observadas detectou que eles apresentavam uma dificuldade de verbalização e, na maioria das vezes, não tiveram suas necessidades percebidas por quem assistia, ela só ocorreu após três ou mais tentativas e a verbalização do paciente [10].

Outro ponto de destaque é que durante a interação entre o binômio idoso-profissional de saúde, seja pelo tipo de sotaque e/ou pela entonação que se dá às palavras, sejam expostas sua raiz, cultura, localidade, regionalidade e escolaridade. O resultado pode provocar o que se denomina preconceito linguístico, fazendo com que possa ocorrer o fator de exclusão social [4,6]. Alguns autores estudam essa situação e tentam compreender como de fato o uso da linguagem vem sendo utilizado para legitimar o domínio de uma classe sobre outras, especialmente, quando se impõe uma variante como padrão que é carregada de ideologias inerentes à classe que a formula [11].

É por meio desse complexo sistema que são expressados valores, posições e o jeito de ser e pensar [11]. O profissional precisa se ater a essa situação e usar isso a favor da interação com o idoso e com a própria equipe que trabalha, afinal a voz expressa uma identidade e é capaz de transmitir os sentimentos mais profundos e revelar quem se é, o que se quer e desvelar a personalidade, mas, se não estiver atento poderá perder algo essencial [3].

Normalmente, pessoas tímidas, introspectivas têm vozes mais baixas e tendem a ser mais agudas, ao passo que pessoas mais agitadas, vozes fortes e, pessoas sérias, vozes mais graves [5,11]. Outro dado interessante é quando o tema da notícia é triste, a voz assume um padrão grave e a velocidade da fala é lentificada; e quando o assunto é alegre, a voz tende a ser agudizada, com a velocidade da fala acelerada e o volume de voz levemente elevado. São estes aspectos vocais que provocam sentimentos de identificação com o que está sendo assistido/ouvido, portanto, os profissionais devem usar isso a favor da interação e revelar solidariedade, atenção, respeito e preocupação com o outro no momento de uma notícia difícil [12,13].

Os profissionais devem estar atentos e dar respostas verbais (“prossiga”, “então”, repetição de uma ou duas palavras ditas) e não verbais (“hum”, “aham”, “ah”), breves destinadas a incentivar o idoso a interagir e sentir-se ouvido. Um breve silêncio também poderá ser sinal de incentivo, uma vez que dá ao idoso a oportunidade de acrescentar informações. Estas interjeições que, à primeira vista, parecem insignificantes, são na prática assistencial de grande auxílio para favorecer a continuidade da comunicação [5-7].

As condições nas quais o idoso se encontra é muito importante de serem observadas na interação, existem situações nas quais as características da idade são exibidas, como é o caso da presbifonia, que é expressa pelo arqueamento de pregas vocais, saliência dos processos vocais das aritenóides e fenda fusiforme e sua consequência é a alteração da tonicidade da voz. Além disso, a fala também sofre influência da adaptação dos lábios e língua, fazendo com seja mais ou menos compreensível [14-15]. A emissão da voz fica mais instável e há um aumento considerável da nasalidade; na mulher, a tendência é de se tornar mais grave e no homem, mais aguda, isto se dá graças aos fatores hormonais [16].

É relevante mencionar que algumas habilidades parecem manter-se intactas até a idade avançada, como o reconhecimento do vocábulo, produçãooral automática, compreensão de sentenças contextualizadas, entretanto, o mesmo não ocorre em relação à compreensão do material linguístico complexo, produção de sintaxe complexa e vocabulário ativo ou de nomeação, estes estão reduzidos [14].

O desenvolvimento e o grau de deterioração vocal da presbifonia são peculiares a cada pessoa e dependentes da saúde física, das condições psicológicas, história de vida, estilo de vida, fatores constitucionais, raciais, hereditários, alimentares, sociais e ambientais [15].

Há problemas ligados ao físico propriamente dito, como é o caso da afasia e/ou disfasia que consiste em um distúrbio de linguagem, na qual, há comprometimento da capacidade de produção e/ou compreensão verbal causado por lesão estrutural adquirida no Sistema Nervoso Central, fazendo com que o indivíduo acabe usando recursos paralinguísticos em maior intensidade [16].

Com a intenção de colaborar com o idoso, os profissionais que cuidam do idoso devem utilizar a leitura orofacial, os aspectos visuais e táteis, como canais sensoriais suplementares, pois estes poderão aumentar o potencial de comunicação com quem tem perda auditiva. Além disso, é imprescindível a inclusão dos mesmos em programas de reabilitação auditiva, estes ajudam os idosos e seus familiares a lidarem de forma positiva frente às dificuldades de comunicação em que estão comumente presentes no cotidiano [17].

Já a presbiopia, é uma alteração caracterizada pela perda da acomodação do cristalino e impede a pessoa de focalizar e observar bem a curta distância, sendo comum as queixas de cefaleia e de incômodo ocular progressivo. Considerando que 70% da relação com o mundo ocorrem por meio da visão, inevitavelmente, este problema afetará a qualidade de vida, acarretando consequências sociais, psicológicas, econômicas ao idoso e à sociedade [18].

As interações que acontecem entre as pessoas, sejam elas, idoso e profissional, são marcadas por intervenções encadeadas, com a troca de saudações ou despedidas, com perguntas e respostas, com trocas de informações, gestualidades e aproximações entre os interlocutores propriamente dito. Outros pontos relevantes que se inserem no contexto da interação e que devem ser valorizados e analisados na conversação são as pausas, interrupções, silêncios e hesitações. Isto porque eles servem como momentos de organização do pensamento e planejamento interno (cognitivo e emocional) do próximo grupo de palavras, estes concedem ao falante tempo para preparo, escolhendo as palavras ou sentenças que serão usadas e reveladas, ou ainda, que darão ou não continuidade à interação [19].

Na contemporaneidade, sons, barulhos, ruídos integram o ambiente como protagonista, e o silêncio acaba por ser um mero figurante. A busca por ouvir tudo e qualquer coisa que não seja o silêncio, pois este pesa aos ouvidos, até porque consome o tempo escasso, decorrente dos inúmeros procedimentos existentes dentro do cenário hospitalar e do reduzido número de pessoal disponível [20].

Contudo, é comum que as pausas e os silêncios apresentados pelo idoso quando prolongados causem na equipe certo desconforto, em especial, àquele que espera uma resposta, mas ao mesmo tempo podem provocar curiosidade e interesse [19-20].

Finalmente, reconhecer o idoso, identificar e satisfazer suas necessidades remetem o profissional de saúde ao seu foco principal que é o de cuidar da pessoa idosa e sua família, cooperando com a experiência do adoecer e das limitações inerentes, que podem ou não estar presentes. A dificuldade de comunicação por parte de idosos faz com que a necessidade de cuidados para com este seja potencializada no ambiente hospitalar, principalmente quando se está em cuidados críticos. A ansiedade, o desconforto e a insegurança normalmente sentidos por idosos nessa condição podem ser potencializados ao máximo para aqueles que possuem a capacidade comunicacional limitada, o que atrapalha a interação com o profissional [21].

Mediante o exposto, pode-se afirmar que o idoso necessita da atenção dos profissionais de saúde, que devem avaliar os aspectos relativos à detecção de transtornos de fala, audição, alterações de memória, bem com a valorizar os silêncios e pausas, reconhecendo que eles constituem uma estratégia para que a prestação da assistência ao idoso seja adequada e satisfatória.

 

Conclusão

 

Os resultados que emergiram desta pesquisa permitem afirmar que os participantes foram hábeis e sensíveis em suas respostas, revelando o quanto o treinamento em comunicação não verbal em gerontologia foi eficiente e importante para eles. Perceberam que os recursos comunicacionais constituem uma ferramenta fundamental a ser aplicada no âmbito pessoal e profissional, pois possibilita um cuidar mais consciente, consistente, verdadeiro e efetivo/afetivo. A descrição satisfatória sobre a utilização da paralinguagem por si só não traz garantias que os profissionais de saúde adaptem seu cotidiano e assim ofereça um cuidado acolhedor e uma comunicação adequada junto ao idoso hospitalizado, mas a capacitação constitui uma tentativa de mobilizar e colaborar na construção de habilidades do cuidar coerente, ético e técnica no âmbito da gerontologia.

A replicação do referido programa revelou-se pertinente e atualizada ao cenário dos serviços hospitalares, mantendo-se eficiente e aplicável aos profissionais de saúde.

Como limite deste estudo ressalta-se o reduzido número de profissionais que constituíram o tamanho amostral, apesar disso, pôde-se observar a convergência dos achados com os da literatura. Defende-se que talvez sejam necessárias estratégias pautadas em outros pressupostos que busquem maior compreensão das interações envolvidas no cenário no qual o idoso encontra-se inserido e, ainda, a necessidade de outras investigações que se proponham ao aprofundamento na temática com metodologias ativas capazes de trazer significado e que estimule o interesse na busca da melhoria dos processos de trabalho no ambiente hospitalar.

A realização de novas pesquisas com outras clientelas, sobre a paralinguagem aqui estudada, poderá implicar no favorecimento da aquisição de resultados mais amplos e com delineamento de outros aspectos além dos já citados nesta pesquisa, contribuindo, assim, para a busca permanente da comunicação efetiva.

 

Referências

 

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