ARTIGO
ORIGINAL
A
percepção de cuidadoras sobre os cuidados com a criança soropositiva ao HIV
Samuel Lima Ferreira*, Isabelle
Vasconcelos de Sousa**, Marcos Vinícius Costa Fernandes, M.Sc.***,
Arinete Véras Fontes
Esteves, D.Sc.****, Ellen Pessoa Rocha, M.Sc.*****
*Acadêmico
de Enfermagem na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), **Acadêmica de Enfermagem
na Universidade Federal do Amazonas (UFAM), ***Enfermeiro, Programa de
Pós-Graduação em Enfermagem, Universidade do Estado do Pará (UEPA) em
associação com a Universidade Federal do Amazonas (UFAM), Manaus (AM), Brasil,
****Enfermeira, professora, Programa de Pós-Graduação em Enfermagem,
Universidade do Estado do Pará (UEPA) em associação com a Universidade Federal
do Amazonas (UFAM), *****Enfermeira, Universidade Federal do Amazonas
Recebido em 2 de abril de 2018; aceito em
14 de junho de 2019.
Correspondência:
Samuel Lima Ferreira, Graduação em Enfermagem, Escola de Enfermagem de Manaus
(EEM), Rua Teresina, 495, Adrianópolis, 69057-070 Manaus AM, E-mail:
samuelllima97@gmail.com; Isabelle Vasconcelos de Sousa: isavasconcelosds@gmail.com; Marcos
Vinicius Costa Fernandes: mvcf_2012@hotmail.com; Arinete
Véras Fontes Esteves: arineteveras@bol.com.br; Ellen
Pessoa Rocha: ellenrocha.hugv@gmail.com.
Resumo
Introdução: A soropositividade implica em desafios para seus portadores,
principalmente na infância, pois repercute negativamente na construção
interpessoal e no desenvolvimento biopsicossocial da criança. O ser
cuidador/orientador atua como auxiliar na transição entre a infância e
adolescência, de modo a buscar novas formas para melhorar a qualidade na
assistência desses menores soropositivos. Objetivos:
Compreender a percepção do cuidador quanto à rotina de cuidados com a criança
soropositiva e a aceitação quanto a construção de uma tecnologia educacional
para este contexto, bem como conhecer a rotina e as dificuldades enfrentadas
pelas cuidadoras durante a assistência. Métodos:
Estudo descritivo exploratório com abordagem qualitativa, realizado na
Associação de Apoio à Criança com HIV (AACH) localizada em Manaus. Os dados
foram coletados por meio de entrevista semiestruturada com 8 cuidadoras da
instituição e foram analisados conforme a técnica de análise qualitativa de
dados. Resultados: Os resultados
mostram aspectos importantes a serem considerados durante a realização dos
cuidados a criança soropositiva, dentre os quais o medo de infectar-se, a
dificuldade de revelar o diagnóstico e a carência de novas metodologias para o
cuidar mostram-se como as principais peculiaridades durante o assistir ao menor
soropositivo. Conclusão: Nota-se,
assim, a necessidade de implementação de tecnologias educativas pautadas para a
educação das cuidadoras e crianças com HIV.
Palavras-chave:
sorodiagnóstico da AIDS, criança, cuidados, educação em saúde.
Abstract
The
perception of caregivers on care of HIV seropositive child
Introduction: Seropositivity is a challenge for patients,
especially in childhood, because it negatively affects the interpersonal
construction and the biopsychosocial child development. The caregiver/counselor
acts as a support in the transition between childhood and adolescence, to seek
new ways to improve the care quality of these seropositive children. Objectives: To understand the perception
of the caregiver regarding the routine of care with seropositive child and the
acceptance regarding the construction of an educational technology in this
context, as well as to know the routine and the difficulties faced by
caregivers during the care. Methods:
Exploratory descriptive study with qualitative approach, conducted at the
Association for Supporting Children with HIV (ASCH) located in Manaus. The data
were collected through a semi-structured interview with 8 caregivers from the
institution and analyzed according to the technique of qualitative data
analysis. Results: The results show
important aspects to be considered during the care of the seropositive child,
among them the fear of becoming infected, the difficulty of revealing the
diagnosis and the new methodologies deficiency to take care of are shown as the
main peculiarities during the support of the seropositive minor. Conclusion: It is noted therefore, the
need to implement educational technologies based on the children with HIV and caregivers education.
Key-words:
AIDS serodiagnosis, child, care, health education.
Resumen
La percepción de
cuidadoras sobre los cuidados con
el niño seropositivo
al VIH
Introducción: La seropositividad implica en desafíos para sus portadores, principalmente en la infancia,
pues repercute negativamente en
la construcción interpersonal y en el desenvolvimiento biopsicosocial de los niños, el cuidador/ orientador actúa cómo auxiliar en la transición
entre la infancia y la adolescencia, de modo a buscar
nuevas formas para mejorar la cualidad en
la sistencia de eses menores seropositivos.
Objetivo: Comprender la percepción del cuidador en cuanto a la
rutina de cuidados con el niño seropositivo y la aceptación en
cuanto a la construcción de una tecnología
educativa para este contexto, así como conocer la rutina y las dificultades enfrentadas por las cuidadoras durante la asistencia. Métodos: Estudio descriptivo exploratorio con abordaje cualitativo,
realizado en la Asociación de Apoyo al Niño con VIH (AACH) ubicada en Manaus. los datos fueran
colectados por medio de
entrevistas semiestructurada con
8 cuidadoras de la institución
y fueran analizados
conforme la técnica de análisis
cualitativa de datos.
Resultados: los resultados muestran
aspectos importantes que deben considerarse
durante la realización de los cuidados al niño seropositivo, entre los cuales el miedo
de infectarse, la dificultad de revelar el
diagnóstico, y la carencia
de nuevas metodologías para
el cuidar se muestran cómo las principales
peculiaridades durante la asistencia
al menor seropositivo. Conclusión:
Se observa así, la necesidad de implementación de tecnologías educativas pautadas para la
educación de las cuidadoras
y niños con VIH.
Palabras-clave: Serodiagnóstico
del SIDA, niño, cuidados, educación en salud.
A
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), sempre foi vista pela sociedade,
como um transgressor de normas sociais, sendo uma doença com estigma e
preconceitos, de doenças oriundas da promiscuidade com estereótipos de grupos
de riscos e morte iminente. Os usuários de drogas, homossexuais, prostitutas e
garotos de programa eram vistos como grupos vulneráveis à contaminação do HIV.
No entanto se observa uma mudança no panorama da realidade acerca desta doença,
porém ainda continua incorporada no pensamento errôneo da sociedade [1].
A
mudança
no perfil vem se justificando a partir dos indicadores
epidemiológicos que
apontam o aumento da exposição heterossexual, sendo a
mulher mais vulnerável a
contaminação pelo vírus HIV. Tal
condição impõe alto risco de
contaminação
vertical, em caso de gravidez na ausência de um pré-natal
eficaz. A ocorrência
destes fatos infere prejuízos na estrutura familiar [2].
A
partir deste momento surge o conflito das peculiaridades do crescimento e
desenvolvimento da criança com a doença e a ansiedade da incerteza da espera do
diagnóstico, gerando abalos emocionais no ambiente familiar. Vários temores e
sentimentos conflitantes são apresentados pelas famílias após a confirmação do
diagnóstico definitivo e durante o conviver com o portador do vírus do HIV, afetando
sua estrutura psicológica, religiosa, biológica e familiar [3].
Sendo
a infância um marco no crescimento e desenvolvimento da criança, por conta das
transformações biopsicossociais e o HIV um fator extrínseco negativo a este
processo, que passa a viver no ser mais íntimo da criança, os profissionais de
saúde devem favorecer ao cuidador através da educação em saúde sua inserção no
tratamento e nos cuidados prestados a estas crianças, pois estes são
responsáveis pelo atendimento à criança em todas as suas necessidades e
peculiaridades [4].
Visando
uma assistência de enfermagem com melhor qualidade, o enfermeiro pode inserir
as metodologias ativas na educação em saúde a fim de facilitar a assimilação do
conhecimento e o trabalho de cuidar permitindo sua utilização como um motivador
na realização de tarefas do cotidiano, interferindo diretamente na
inter-relação do saber-fazer e aprender a aprender, utilizando as tecnologias
educacionais como manuais, simulações, cartilhas, álbum seriado e vídeos
educativos, para facilitar e aprimorar o ensino-aprendizagem do portador do
vírus do HIV e o empoderamento no tratamento [5].
Tratou-se
de um estudo descritivo-exploratório de abordagem qualitativa, o referido
método busca compreender a casuística do modo como os sujeitos a vivenciam, bem
como identificar os fatos em sua essência. Essa estratégia metodológica é
comumente empregada por profissionais de enfermagem, uma vez que descreve os
fenômenos em suas dimensões e variações no contexto em que se realiza o estudo.
Optou-se
por realizar a coleta de dados em uma Instituição Não Governamental (ONG)
denominada Associação de Apoio à Criança com HIV (AACH), a mesma está
localizada na cidade de Manaus/AM, que dispõem de serviços de assistência
integrativa de cuidados a crianças diagnosticadas com HIV, bem como crianças
que se encontram expostas a referida condição de saúde.
Para
selecionar as participantes do estudo, optou-se como critério de inclusão que a
cuidadora tivesse contrato empregatício de pelo menos 6 meses com a referida
instituição, sendo assim, 8 cuidadoras foram convidadas a participar da
pesquisa e explicados os benefícios e malefícios da pesquisa e todos os pontos
do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) respeitando a Lei nº
466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), que trata sobre as pesquisas
envolvendo seres humanos. Por outro lado, os critérios de exclusão consistiram
em não incluir neste estudo as cuidadoras que, no período da coleta de dados,
estavam afastadas por internação hospitalar, atestado médico ou férias.
Ao
aceitarem participar da pesquisa assinando o TCLE, realizou-se uma entrevista
semiestruturada com cada uma das cuidadoras, aplicando-se um questionário com
perguntas abertas e fechadas no intuído de construir o diagnóstico situacional
do público alvo. Esse questionário passou por modificações para que as
perguntas ficassem coesas com o objetivo da pesquisa. As entrevistas eram
realizadas durante as trocas de turnos e intervalos das cuidadoras, por isso
essas entrevistas que eram audiogravadas para se
obter maior autenticidade e descrição dos dados tinham o tempo médio de 25
minutos.
Após a
coleta dos dados, todas as entrevistas foram transcritas na íntegra e separadas
conforme a estratégia metodológica de análise de temática de Minayo [6] que afirma: “a análise temática consiste em
descobrir os núcleos de sentido que compõem uma comunicação cuja presença ou
frequência signifiquem alguma coisa para o objetivo analítico visado”. Em
primeiro momento foi realizada a Leitura Flutuante para que se tivesse um
contato direto e intenso com o material de campo, em seguida as falas foram
separadas e comparadas de maneira a determinar as palavras-chave e frases que
mais se destacavam nas falas das cuidadoras e quanto à relevância para o
objetivo do estudo, e assim chegou-se nas Unidades Categóricas que se
apresentam nos resultados. A análise estatística não foi necessária, visto que
se pretendeu trabalhar mais com os significados do que investir em inferências
estatísticas. O presente estudo obteve aprovação no Comitê de Ética e Pesquisa
da Universidade Federal do Amazonas com CAAE: Nº 54697816.0.0000.5020.
Da
análise das entrevistas, emergiram três unidades categóricas: tecnologia
educativa: o que sabe não sabe, aprender para usar; cuidar de criança
soropositiva: mitos e medos; o ser cuidador/orientador: amor incondicional;
rotina e cuidados: principais dificuldades dos cuidadores. Para manter a
integridade das participantes do estudo, optou-se por identificá-las apenas
como “cuidadora”, seguindo a ordem das entrevistas.
Tecnologia
educativa: o que sabe/não sabe, aprender para usar
Ao
serem entrevistadas, houve desconhecimento por parte das cuidadoras, quanto à
temática abordada de forma a se basearem pelas palavras “tecnologia
educacional” e falarem da sua construção a partir desse entendimento. No
entanto, interessaram-se em conhecer sobre as tecnologias educacionais para que
pudessem opinar melhor sobre a sua construção. Após conhecerem o papel básico
das tecnologias valorizaram o interesse de implementá-las na intenção de
promover melhoria aos cuidados prestados. A seguir observa-se nas falas das
cuidadoras o conhecimento, tangente às tecnologias educativas:
“Seria
muito bom, pois é preciso porque é bom a gente sempre ler ou alguém falar do
HIV pra gente, tipo, relembrar e reciclar sobre os cuidados e sobre o HIV
[...]”. Cuidadora 4
“Tecnologia educacional? Educação pelo
computador e essas coisas?” Cuidadora 6
“Acho que é um meio de comunicação através da
internet”. Cuidadora 5
“Eu
nunca tinha ouvido falar não, agora que eu conheço essa palavra [...] teria
muito interesse em aprender sobre tecnologia educacional”. Cuidadora 1
“É um
benefício interessante pra elas, um tipo de educação através da tecnologia”. Cuidadora
8
“Desconheço
um pouco, eu acho que é bom a gente saber muito mais para cuidar dessas
crianças”. Cuidadora 7
Como
destacado pelas cuidadoras, a incorporação de novos saberes retrata a
relevância de sempre estar atualizado e aberto a novos conhecimentos e
metodologias de cuidar/ensinar, em especial para prestar cuidados direcionados
às necessidades e peculiaridades ao tema em questão e ao público alvo. Quando
indagadas quanto à construção de Tecnologias educacionais para melhorar a
assistência das crianças soropositivas, as cuidadoras demonstraram entusiasmo
pelo material a ser produzido.
Cuidar
de crianças soropositivas: mitos e medos
O
assistir a criança requer um conhecimento integral de seu crescimento e
desenvolvimento para uma assistência de qualidade. A assistência à criança
soropositiva vai além do cuidado com o corpo, cuidar de crianças soropositivas
requer um preparo biopsicossocial sobre o pequeno ser, bem como a doença com
estigma social favorece a exclusão de seus portadores. O conceito deturpado do
HIV/Aids na sociedade corrobora o desconforto dos cuidadores de criança
soropositivas quando o tema é mencionado. Neste contexto, a referida temática
foi abordada pelas cuidadoras quando falaram sobre o cuidar da criança com o
HIV/Aids.
“[...]
tenho medo de transmissão [...] o bumbum da criança é cheio de feridinhas e pode transmitir a doença, não sei bem”.
Cuidadora 6
“[...]
eu tenho um pouco de medo, elas são muito agressivas e não querem tomar os
remédios, mas conversamos muito com eles porque sabemos que é a doença [...]”
Cuidadora 1
Observa-se
que existe sensação de insegurança no momento de executar a tarefa, as
cuidadoras possuem suas dúvidas quanto a transmissibilidade da doença, quanto
as características comportamentais das crianças que incluem a agressividade
verbal e corporal (como chutes, mordidas). As cuidadoras relatam que é difícil
lidar com uma criança que possui um vínculo familiar frágil, pois estas
crianças evidenciam o medo de serem discriminados também por outras pessoas.
Como problemática observa-se a interpretação errônea das cuidadoras, uma vez
que relacionam o comportamento da criança proveniente das características da
doença.
O ser
cuidador/orientador de criança soropositiva: amor incondicional
Trabalhar
com criança soropositiva requer se desnudar dos preconceitos para atender suas
necessidades, sejam elas cotidianas ou psicológicas. Neste âmbito o ser
cuidador destaca a importância de alguns aspectos para lidar com essas crianças
em diferentes situações, como se pode observar a seguir nas falas das
cuidadoras.
“Acho
que em primeiro lugar pra trabalhar com criança soropositiva, você tem que ter
amor ao que você faz, porque sem isso você não faz nada; paciência porque eles
requerem muita paciência”. Cuidadora 3
“Conversar,
dialogar, tem que ter diálogo com uma conversa você algumas vezes consegue
reverter o problema, a discórdia [...]”. Cuidadora 7
Observa-se nas falas das cuidadoras que essas crianças apresentam uma
barreira para aceitar novas rotinas em suas vidas, em decorrência das
restrições impostas a elas; assim, este panorama requer do cuidador um
exercício constante de seu bom senso buscando compreender a necessidade afetiva
dessas crianças. Com isso, observa-se que quem cuida também precisa de apoio
psicológico, pois existe uma grande sobrecarga sobre ela, que é submetida
diariamente a um agregado de emoções e ainda assim desempenha a função de
cuidador, orientador e educador dessas crianças.
Rotina
e cuidados: principais dificuldades dos cuidadores
A
rotina dos cuidadores de soropositivos mostra-se como um desafio constante para
esses, pois quase sempre se deparam com dificuldades para aplicar o cuidado
necessário para a criança.
“Ah, o
banho [...] alguns não querem tomar banho”. Cuidadora 1
“Eles
não querem comer a alimentação que é estipulada pela nutricionista, eles querem
comer besteiras”. Cuidadora 3
“Acho
que o pior de tudo que a gente passa é pra dar a medicação, é por conta de elas
serem grandes e algumas ruins e isso faz eles recusarem [...] e quando eles
perguntam pra que serve”. Cuidadora 4
Evidenciou-se
que os cuidadores sentem certa dificuldade para realizar tarefas diárias para
esses menores como administrar as medicações que muitas vezes causam mal-estar
nas crianças; além de todo o envolto acerca da doença, algumas dificuldades
enfrentadas pelos cuidadores também se relacionam com a faixa etária das
crianças.
Frente
aos resultados apresentados percebe-se que a caracterização do medo de prestar
assistência a criança soropositiva é uma das maiores
dificuldades enfrentadas pelas cuidadoras e isso surge por conta do
desconhecimento de aspectos inerentes ao HIV como: a patogenicidade, o
diagnóstico da doença e a ausência de cura; esse não saber ou não ter acesso a
informação faz com que os cuidadores acabem discriminando essas crianças de
forma despercebida.
Da
mesma forma, no estudo realizado em Fortaleza/CE [7], em um hospital de
referência para tratamento a portadores de HIV/Aids, após identificar as
interações sociais com crianças soropositivas, relata que a incerteza de
contagio faz com que a assistência seja problematizada pelos cuidadores, pois a
exacerbação do medo gera insegurança na realização dos cuidados diários com
soropositivos. Com isso, ao transparecer essa insegurança ao prestar a
assistência, essas cuidadoras acabam por estigmatizar as crianças; e essas por
já sofrerem discriminação, dentro do próprio círculo familiar, se isolam ainda
mais e criam barreiras com o receio de enfrentar o preconceito que muitas vezes
se faz presente em casa.
Ao
mesmo tempo, o medo como mecanismo de defesa por parte das crianças, faz com
que estas apresentem peculiaridades de comportamento de modo a dificultar ainda
mais a assistência, no entanto o cuidador por ser o elo entre a criança e o
meio social auxiliando-as a transpor essa faixa de transição, entre a infância
e adolescência deve construir ferramentas de apoio para o processo de educação,
promoção da saúde e prevenção de agravos desses menores institucionalizados,
para que esse sentimento de impotência e raiva seja superado. Esse medo das
crianças também é observado num estudo feito no Hospital Infantil de Minas
Gerais, no qual os pequenos demonstram incerteza pela vida e pelo futuro [8].
O
estudo de Favero et
al. [9], desenvolvido em um Serviço de Assistência
Especializada (SAE) em HIV/AIDS, com crianças com HIV,
demonstrou a necessidade de ter o cuidador para ajudar na interação social das
crianças. Corroborando os dados deste estudo, no qual o cuidador tem o papel de
atender as necessidades de saúde e de interação social dessas crianças,
auxiliando-os na fase de transição da infância para a adolescência, orientando
e aconselhando, principalmente por conta dos temores e angustias que se
apresentam ao conviver com o HIV/Aids, para oferecer uma melhor qualidade de
vida para esses enfermos, além disso o cuidador deve sempre aprimorar as suas
habilidades para que essas contribuam com a educação em saúde.
Ao
desvelar as dificuldades enfrentadas pelas cuidadoras no cotidiano, observou-se
que gerenciar a adesão ao tratamento das crianças é uma tarefa delicada para
elas, pois existe o comportamento de não-aceitação ao medicamento devido aos
efeitos adversos e tamanho das pílulas a serem ingeridas pelas crianças. Da
mesma forma, no estudo realizado por Braga [10], na cidade do Piauí, observa-se
que as dificuldades que se apresentam no cotidiano, principalmente em relação
aos medicamentos, devem ser trabalhadas individualmente por cada cuidador, ou o
próprio receber instruções para lidar com determinadas situações, visando
sempre o bem-estar das crianças.
Para
dar a assistência à criança, alguns aspectos são necessários como paciência e
interpretação das expressões faciais e corporais, pois elas são carentes de
afeto. Igualmente observado na pesquisa desenvolvida em serviços especializados
em DST/AIDS no município de Porto Alegre, no qual revela que o cuidado familiar
no mundo da criança soropositiva deve apresentar um ambiente harmonioso e uma
relação saudável, pois se torna um aspecto facilitador para que as crianças
possam expressar seus sentimentos livremente e, dessa forma, a assistência se
faz mais eficaz por atender as reais necessidades que as crianças apresentam
[11].
Neste
contexto, o amor envolvido na atividade do cuidar, advindo do convívio e da
aproximação entre profissional e paciente, reflete na vida do cuidador que
passa a se preocupar mais com a criança cujo organismo torna-se suscetível a
patologias oportunistas e as hospitalizações. O estigma social sofrido pelas
crianças em cuidados diários também gera uma sobrecarga mental e física no
cuidador que desempenha várias funções além do cuidar.
Por
conta disso, observa-se que a vida social de algumas cuidadoras se torna
solitária devido a dedicação exclusiva as crianças soropositivas, e por estes
profissionais sofrerem do estigma social de cuidar de pacientes com HIV. Nesta
situação, faz-se necessário que essas cuidadoras recebam apoio psicológico para
que essa sobrecarga não venha a interferir nos cuidados a serem prestados [12].
Dessa
forma, a tarefa das cuidadoras em falar sobre o HIV com as crianças mostra-se
bastante delicada, visto que existe um limiar de aceitação difícil por parte
dos pacientes em viver e conviver com a doença. Na visão das cuidadoras é
importante que eles aprendam sobre a doença desde cedo, mas segundo elas a
implicação negativa que isso pode ter na infância faz com que o diagnóstico
acerca da patologia seja revelado apenas em certa parte da adolescência.
No
contexto das dificuldades por parte dos profissionais, o estudo de Zanon
realizado em Ambulatório de Doenças Infecciosas Pediátricas do Hospital
Universitário de Santa Maria [13] afirma que a principal dificuldade seria em
revelar o diagnóstico a criança/adolescente, pois esses não sabem como abordar
sobre a patologia com os menores; e ressalta que falar o diagnóstico deve ser
um processo lento e planejado juntamente com outros profissionais e com os
familiares, sendo assim são necessários ferramentas e métodos que ajudem o
cuidador nessa tarefa delicada que enfrenta diariamente seja ela explicar a
patologia para os pais ou quando indagados pelas crianças com certas perguntas
acerca das restrições.
Neste
âmbito, o apoio ao cuidador pode vir através da utilização de ferramentas que
facilitem a assistência a ser prestada, de forma que promova a educação e o
cuidado, ao mesmo tempo em que melhora a qualidade de vida desses enfermos. A
tecnologia educacional como ferramenta, além de possibilitar novas formas de
cuidado ao paciente, permite que os cuidadores aprendam e promovam a educação
do autocuidado [14].
Neste
estudo, percebeu-se que as cuidadoras desconhecem o emprego da tecnologia de
educação como ferramenta para adquirir conhecimento, e fica explicito que a
utilização desse instrumento ainda é pouco difundida na assistência à criança
soropositiva. No entanto, as cuidadoras da instituição demonstraram interesse
em aprender mais sobre as tecnologias educacionais, pois segundo elas qualquer
ferramenta que as ajude é sempre necessária para cuidar dessas crianças. Esse
fato implicou na questão da percepção da construção, pois elas sabiam pouco ou
quase nada sobre as tecnologias educacionais.
Considerando
esse contexto, Fernandes et al. [15] ressalta que a utilização da tecnologia
para cuidar de crianças soropositivas é carente, e que essa ausência de
inovação no cuidado pode comprometer o desenvolvimento e crescimento infantil,
sendo necessários mais estudos voltados para esse contexto, para que possam
empoderar os profissionais que assistem a criança com HIV, de forma coerente e
segura dos procedimentos a serem executados na assistência.
Outros
estudos realizados sobre construção, validação de tecnologias e que falam sobre
a utilização de cartilha como ferramenta para abordar o HIV são um marco
importante para adquirir o conhecimento de forma eficaz e científica para o
público alvo, pois permite que as dúvidas em relação à doença, os sinais e
sintomas, e a transmissão seja esclarecida, de modo a facilitar a assistência à
criança com HIV por parte dos demais profissionais [16,17].
Não
houve erros metodológicos e as limitações encontradas no decorrer da pesquisa
se deram em torno do conhecimento das cuidadoras acerca das tecnologias
educacionais; a produção de artigos nacionais que abordassem sobre a temática
das tecnologias para cuidadoras de crianças soropositivas. Essas limitações só
embasam mais a importância de estudos futuros sobre a construção e validação de
tecnologias como ferramenta de apoio para esse público alvo.
Os
objetivos propostos foram alcançados de maneira a apresentar a rotina das
cuidadoras de crianças soropositivas, as dificuldades e a sua percepção quanto
a construção de tecnologias educacionais voltadas para ajudar na rotina de
cuidados com menores soropositivos. O
estudo vem a contribuir para o meio científico de forma que enfatiza a produção
de novas tecnologias educacionais para cuidadores de soropositivos, além de
trazer dados relevantes sobre as dificuldades que esses passam durante o
cotidiano de cuidados. Os dados coletados neste estudo servirão como base para
construção de uma tecnologia educacional para as cuidadoras da instituição, de
modo a trabalhar as suas dificuldades.