ARTIGO
ORIGINAL
Polaridades
vivenciadas por enfermeiros no uso das habilidades sociais em um centro de
tratamento de queimados
Juliana Helena Montezeli, D.Sc.*,
Sabrina Aparecida Gomes Pereira**, Elizângela Santana
dos Santos***, Maria do Carmo Fernandez Lourenço Haddad, D.Sc.****,
Cristiano Caveião, D.Sc.*****
*Enfermeira,
Docente no Departamento de Enfermagem da Universidade Estadual de Londrina
(UEL), Londrina PR, **Acadêmica da graduação em enfermagem da Universidade
Estadual de Londrina (UEL), Londrina PR, ***Enfermeira, Residente de Cuidados
Intensivos ao Adulto da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina PR,
****Enfermeira, Docente no Departamento de Enfermagem da Universidade Estadual
de Londrina (UEL), Londrina PR, *****Enfermeiro, Docente do Centro
Universitário Internacional Uninter (UNINTER),
Curitiba PR
Recebido em 6 de julho de 2018; aceito em 26 de novembro de 2018.
Endereço
para correspondência:
Juliana Helena Montezeli, Universidade Estadual de
Londrina (UEL), Rua Jorge Velho, 270, 86.010-600 Londrina PR, E-mail:
jhmontezeli@hotmail.com; Sabrina Aparecida Gomes Pereira:
sasa_pereira@hotmail.com; Elizângela Santana dos
Santos: ss.elizangela@hotmail.com; Maria do Carmo Fernandez Lourenço Haddad:
carmohaddad@gmail.com; Cristiano Caveião: cristiano_caveiao@hotmail.com
Resumo
As habilidades
sociais estão relacionadas ao comportamento do repertório do indivíduo para
lidar com as demandas interpessoais, no caso de enfermeiros que atuam em
unidades de queimados, esta habilidade é de extrema importância para poder
controlar a rotina cotidiana. O estudo teve como objetivo compreender as
polaridades vivenciadas por enfermeiros no uso das habilidades sociais em um
centro de tratamento de queimados. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, tipo
estudo de caso, desenvolvida em um centro de tratamento de queimados do Brasil,
com seis enfermeiros. Utilizou-se entrevista semiestruturada. Os dados foram
transcritos e tratados pela análise de conteúdo. Identificaram-se como
polaridades: Forças motrizes, subdividida nas subcategorias ‘Facilitadores
pessoais’ (flexibilidade, experiência profissional, tempo de atuação na equipe,
criação de vínculos e liderança participativa) e ‘Facilitadores relacionados ao
paciente’ (longo período de internação); Forças deletérias, com as
subcategorias ‘Dificultadores pessoais’ (habilidades
sociais deficitárias do enfermeiro e enfrentamento da dor e da morte) e ‘Dificultadores relacionados ao paciente’ (demanda física
gerada pelas especificidades do cuidado ao queimado e comorbidades
psiquiátricas). Conclui-se que a compreensão das forças motrizes no uso das
habilidades sociais e dos obstáculos deste processo fornece subsídios para
potencializá-las e criar estratégias para superá-los, respectivamente.
Palavras-chave: enfermagem,
unidades de queimados, relações interpessoais, relações enfermeiro-paciente,
serviço hospitalar de enfermagem.
Abstract
Polarities experienced by nurses in the use of social drugs in a burn
treatment center
Social skills are related to the behavior of the repertory of the
individual to deal with the interpersonal demands, in the case of nurses who
work in units of burned, this ability is of extreme importance to be able to
control the daily routine. The study aimed to understand the polarities
experienced by nurses in the use of social skills in a burn treatment center.
This is a qualitative research, a case study, developed in a burn treatment
center in Brazil, with six nurses. A semi-structured interview was used. Data
were transcribed and treated by content analysis. We identified as polarities:
Driving forces, subdivided in the subcategories 'personal facilitators' (flexibility,
professional experience, team time, bonding and participatory leadership) and
'Patient-related facilitator' (long hospitalization); Deteriorating forces,
with the subcategories 'Personal difficulties' (deficient social skills of the
nurse and coping with pain and death) and 'Patient-related difficulties'
(physical demand generated by the specificities of burned care and psychiatric
comorbidities). An understanding of the driving forces for the use of social
skills and the obstacles of this process is provided, providing subsidies to
potentiate them and create strategies to overcome them, respectively.
Key-words: nursing,
burn units, interpersonal relation, nurse-patient relation, hospital nursing
service.
Resumen
Polaridades vividas por los
enfermeros en el uso de las
habilidades sociales en un centro de tratamiento de quemados
Las habilidades sociales están relacionadas con el comportamiento del repertorio del individuo para hacer frente a
las demandas interpersonales,
en el caso de los enfermeros que trabajan en unidades de quemados, esta habilidad es
extremadamente importante para poder controlar la
rutina cotidiana. El estudio procuró
comprender las polaridades
vividas por los enfermeros en el
uso de las habilidades sociales
en un centro de tratamiento de quemados. Se trata de una investigación cualitativa, estudio de caso, desarrollada en un centro de tratamiento de quemados en Brasil, con seis enfermeros. Se utilizó una entrevista semiestructurada.
Los datos fueron
transcritos y tratados por el
análisis de contenido. Se identificaron como polaridades: Fuerzas
motrices, subdivididas en las subcategorías 'Facilitadores personales' (flexibilidad, experiencia profesional, tiempo de actuación en el
equipo, creación de vínculos y liderazgo
participativo) y 'Facilitador relacionado al paciente' (largo período de hospitalización); Fuerzas deletéreas, con las subcategorías 'Dificultadores personales'
(habilidades sociales deficitarias
del enfermero y enfrentamiento del dolor y de la muerte)
y 'Dificultadores relacionados al paciente' (demanda
física generada por las
especificidades del cuidado al quemado
y comorbilidades psiquiátricas). Se concluye que la
comprensión de las fuerzas motrices en el uso de las
habilidades sociales y de los
obstáculos de este proceso proporciona subsidios para potenciarlas y crea estrategias para superarlos, respectivamente.
Palabras-clave: enfermería,
unidades de quemados, relaciones
interpersonales, relaciones enfermero-paciente,
servicio de enfermería en hospital.
Prestar assistência
ao queimado é uma atividade desgastante à enfermagem, tanto pelas atividades
com intensas demandas físicas, como curativos extensos e morosos, quanto pelo
contato frequente com a dor, o sofrimento e as incertezas do paciente e de sua
família. Neste cenário, tal categoria profissional precisa ter a percepção de
que cuidar de queimados e seus familiares é um processo relacional, para o qual
são requeridas competências científicas, técnicas e humanísticas, por se tratar
do encontro entre pessoas, ou seja, uma prática social [1]. Complementando,
afirma-se que os cuidados de enfermagem ao queimado visam, entre outras coisas,
a redução das dores físicas e emocionais, medos e ansiedades [2].
Assim, as relações
interpessoais são de extrema importância nos centros de tratamento a queimados,
pois cabe à enfermagem propiciar calma, esperança e apoio, reduzindo a
ansiedade e minimizando o sofrimento em toda a terapêutica. Para tal, há a
necessidade de comunicação efetiva com o paciente e familiares,
almejando a integralidade do cuidado [3].
Além do cuidado
idiossincrático prestado a tal clientela, destacam-se especificidades da equipe
que ali atua, pois a dinâmica de trabalho pode contribuir para o desgaste dos
profissionais. Muitas vezes, os sentimentos destes indivíduos são antagônicos,
como nos casos de tentativa de autoextermínio, em que a pessoa atentou contra a
própria vida, enquanto o cuidado prestado é para preservar/recuperar a mesma
[4].
Destarte, as relações
interpessoais são importantes para entender as práticas profissionais na
referida ambiência e, para tal, é preciso a constante aproximação entre os
sujeitos no contexto das interações sociais. Todavia, alguns componentes das
relações interpessoais devem ser compreendidos e desenvolvidos para que as
interações sociais sejam profícuas, destacando-se as habilidades sociais.
As habilidades
sociais (HS) são um campo de estudo da psicologia que correspondem às classes
de comportamentos sociais no repertório do indivíduo para lidar de maneira
adequada com as demandas das situações interpessoais e fazem parte dos
componentes de um desempenho social competente na dinâmica das interações.
Essas classes de HS são: automonitoramento,
comunicação, civilidade, assertividade, empatia, de trabalho e de expressão de
sentimento positivo. Porém, ainda que haja tal separação didática, elas
permeiam-se no encontro entre as pessoas [5].
A interação entre o
enfermeiro e o paciente queimado é importante no itinerário terapêutico deste,
pois as lesões e o próprio processo de internação, aliados ao afastamento de
seu círculo de convívio acabam por potencializar sentimentos deletérios à sua
recuperação. Estudo realizado com pacientes internados por queimaduras na
região Nordeste do Brasil identificou que estes expressavam sentimentos de dor,
ansiedade, sofrimento, medo da morte e culpa. Destarte, afirma-se que a
assistência a tais indivíduos deve extrapolar o cuidado físico, estendendo-se
às demais esferas do ser humano [6].
Diante disto, é
possível enfatizar que o cuidado ao queimado deve estar alicerçado em
interações da equipe para com o paciente e sua família, além das competências
técnico-científicas. Entretanto, por se tratar de um local de trabalho repleto
de ambiguidades e conflitos advindos do tipo de clientela, o presente estudo
ancorou-se no seguinte questionamento: como enfermeiros compreendem as
polaridades no uso das habilidades sociais em um centro de tratamento de
queimados? Para elucidar tal indagação, traçou-se como objetivo investigativo:
compreender as polaridades percebidas por enfermeiros no uso das habilidades sociais
na assistência a pacientes queimados.
Material
e métodos
Trata-se de uma
pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso desenvolvida no
centro de tratamento de queimados (CTQ) de um hospital escola público do
Brasil. Foram convidados a participar os enfermeiros estatutários
atuantes há pelo menos um ano no referido setor e excluíram-se os com contrato
temporário de trabalho ou que estivessem de licença ou férias no período de
coleta de dados. Do total de dez enfermeiros que compunham o quadro funcional
desta categoria no CTQ, seis atenderam aos critérios mencionados e compuseram a
amostra.
A coleta de dados
ocorreu de outubro de 2016 a maio de 2017, no ambiente laboral, cada enfermeiro
foi submetido a uma única entrevista de duração mínima de 15 e máxima de 30
minutos, com áudio gravado para posterior transcrição.
Utilizou-se um
instrumento norteador com uma parte inicial de caracterização do participante e
três questões abertas: 1) Em seu cotidiano de trabalho, como você percebe as HS
e os relacionamentos interpessoais para a efetivação da assistência ao paciente
queimado? 2) Quais as facilidades que você encontra no
seu ambiente/instituição de trabalho para o uso das HS. Por quê? 3) Quais as dificuldades que você encontra no seu
ambiente/instituição de trabalho para o uso das HS. Por quê?
Antes do início da
entrevista o enfermeiro foi esclarecido quanto aos objetivos do estudo e também
quanto ao conceito e as classes das HS. Seguiram-se os preceitos éticos
brasileiros descritos na Resolução n° 466/2012, que trata de pesquisas
envolvendo seres humanos. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa, com CAAE 36415314.8.0000.5231 e parecer nº.822.341.
Após a transcrição
das falas, os dados foram tratados pela análise de conteúdo [7], compreendendo
as etapas: a pré-análise, a exploração do material e
o tratamento dos resultados com as inferências e as interpretações. Os
depoimentos apresentados para ilustrar os resultados foram codificados como E1
a E6 (enfermeiro 1 a enfermeiro 6), objetivando manter
o anonimato dos inquiridos.
Os seis entrevistados
eram do sexo feminino, com média de idade de 42 anos, tempo de atuação como
enfermeiro entre 11 e 25 anos e, no CTQ, variando entre um e 10 anos.
A análise de conteúdo
propiciou a identificação de duas polaridades como categorias empíricas: A)
Forças motrizes ao uso das HS no CTQ; B) Forças deletérias ao uso das HS no
CTQ.
Categoria
A: Forças motrizes ao uso das HS no CTQ
Esta categoria
subdivide-se em duas subcategorias: A1) Facilitadores pessoais e A2)
Facilitador relacionado ao paciente.
Subcategoria A1:
Facilitadores pessoais
O Quadro 1 exemplifica os principais pontos salientados pelos
enfermeiros relacionados aos facilitadores pessoais.
Quadro
1 – Facilitadores de ordem pessoal identificados
pelos enfermeiros do CTQ. Londrina/PR, 2017.
Subcategoria A2:
Facilitador relacionado ao paciente queimado
Foi reincidente na
periferia dos discursos dos enfermeiros o fato de que a clientela em questão
demanda longo período de internação, fato que favorece a criação de vínculos e,
por conseguinte, fortalece o uso da HS por tais profissionais. Os excertos a
seguir ilustram tal afirmativa:
O
paciente permanece internado por muito tempo, não é um setor que tem uma
rotatividade muito grande, então facilita bastante (...) você consegue entender
o paciente como todo. (E1)
Cria-se
um vínculo grande com os pacientes, (...) então eles se transformam no nosso
dia a dia, fazendo parte mesmo no trabalho, pois o vínculo é forte. Aqui, este
vínculo nos facilita nas relações. (E4)
Categoria
B: Forças deletérias ao uso das HS
Assim como na
categoria inicial, nesta segunda, há a subdivisão em duas subcategorias: B1) Dificultadores pessoais e B2) Dificultadores
relacionados ao paciente.
Subcategoria B1: Dificultadores pessoais
O Quadro 2 esclarece os achados nesta subcategoria:
Quadro
2 – Dificultadores de ordem pessoal identificados pelos
enfermeiros do CTQ. Londrina/PR, 2017.
Subcategoria B2: Dificultadores relacionados ao paciente
O Quadro 3 sintetiza os achados que compões esta subcategoria.
Quadro
3 – Dificultadores relacionados ao paciente identificados
pelos enfermeiros do CTQ. Londrina/PR, 2017.
Na subcategoria A1, o
fato dos enfermeiros mencionarem que ser flexível contribui no uso das
habilidades sociais e nas relações interpessoais como um todo coaduna com a
literatura correlata, uma vez que estas são situacionais e que requerem
diferentes comportamentos de acordo com a demanda relacional. O enfermeiro é o
profissional responsável por criar espaços que valorizem o diálogo entre os
protagonistas sociais do cuidado e os processos de mudança, manejando conflitos
proficuamente [8].
Dentre as muitas
competências requeridas do enfermeiro, a interpessoal é essencial às situações
conflituosas, e cada uma delas exige um tipo de comportamento deste profissional
[9]. Corroborando, apesar de todas as funções que são atribuídas ao enfermeiro
e dos conflitos presentes no âmbito do cuidado ao queimado, a demanda que o
serviço traz consigo exige liderança galgada na flexibilidade, sendo seu
alicerce para manter o equilíbrio em todas as suas dimensões, inclusive nas
relações interpessoais.
Outro facilitador que
emergiu das falas foi a experiência profissional.
Assim como tal percepção dos participantes, sabe-se que há necessidade de
experiência aliada a conhecimentos específicos para uma adequada atuação do
enfermeiro, já que o avanço cronológico na vida profissional proporciona
vivências relacionais que vão somando ao repertório de HS do indivíduo
possibilidades para promover respostas em situação imprevistas e adversas [10].
Desta forma, pensar
na gerência do cuidado ao paciente queimado sem elucubrar a experiência é um
descuido que, certamente, não se pode ter, dado que ela abrange o olhar nas
suas diferentes dimensões, como segurança, crescimento, capacidade melhorada para enfrentar problemas,
equilíbrio, planejamento e comunicação [8]. Tais questões fortalecem a
percepção de que quanto mais experiente profissionalmente, maiores as chances
das relações interpessoais serem adequadas no ambiente cuidativo.
Entre as falas,
surgiu o tempo de atuação com a equipe e a criação de vínculos como um distinto
facilitador das relações interpessoais. Concordando com a visão dos dialogados,
tem-se que o trabalho em equipe é fortalecido por meio da criação de vínculos
amistosos. Por conseguinte, quanto maior for o tempo de atuação junto a uma
equipe, mais facilidade o enfermeiro terá para lidar com especificidades e
perfis tão diferentes que se encontram nesta [11]. Salienta-se que, para a
criação de vínculos nas relações interpessoais, demanda-se uso de habilidades
sociais criativas, que visam exercitar a vivência grupal, identificando as
questões que enriquecem e empobrecem essas relações, pois a criação de vínculos
significa plantar sementes e colher seus frutos, entre
eles, os cuidados de qualidade ao paciente queimado.
A liderança
participativa também foi um facilitador que aflorou das falas dos
entrevistados, indo ao encontro com o fato de que deve haver parceria e
reciprocidade entre líder e liderados na resolução de problemas cotidianos
[12-13]. No que diz respeito à liderança participativa, como já mencionada,
sendo ela uma via de mão dupla, deve-se superar o modelo ultrapassado de ser um
líder autoritário, almejando métodos para fazer sua equipe comprometer-se e
alcançar resultados positivos no processo de cuidado, sendo este o foco do
gestor.
Quanto à subcategoria
A2, na ótica dos participantes, a internação prolongada proporciona um período
maior para pensar no paciente em todas as suas dimensões, levando em
consideração suas particularidades, sua cultura, seu contexto social, emocional
e espiritual para obter informações, visando o planejamento do cuidado.
As vítimas de
queimadura, quase sempre, permanecem internadas por longo período,
enfatizando-se que aquelas cuja superfície corporal atingida é maior ficam
hospitalizadas, em média, por 41,5 dias [14]. Assim, infere-se que os vínculos
estabelecidos durante sua morosa estadia no hospital fomentam adequado uso das
HS pelo enfermeiro e, consequentemente, melhora o relacionamento pessoal, além
proporcionar uma visão integral do indivíduo.
Ademais, o cuidado de
enfermagem deve se estender além do que é perceptível aos olhos do
profissional, desempenhando amor e atenção para criação de vínculos,
identificando, assim, alterações não só físicas, mas também emocionais,
psíquicas, atendendo suas necessidades, demandas, tornando-se alguém em quem o
paciente possa contar. Desse modo, essa relação ocorrerá com base na confiança
estabelecida entre enfermeiro e paciente [15].
Passando a discorrer
sobre as forças deletérias, o entendimento pelos participantes que o déficit em
algumas HS dificulta na assistência ao queimado remete ao fato que o ser humano
nasce com equipamento biológico de grande potencialidade, contudo, durante toda
a sua vida, ele necessita de aprendizado constante de novas habilidades, uma
vez que o ambiente onde está inserido encontra-se em constante transformação e
grande parte desse ambiente é social [16].
Assim, não há
impeditivo de aprendizado de HS; muitas delas são aprendidas por meio da
observação e pelas consequências que os comportamentos têm no ambiente. Este
aprendizado depende, sobremaneira, do local e da busca por conhecimentos pelo
profissional [17].
Reforça-se,
porquanto, a necessidade da educação permanente na prática profissional do
enfermeiro como potente estratégia para melhoria das suas HS e das suas
relações para com a equipe e clientela, incluindo-se o paciente queimado.
Outro dificultador evidenciado pelos depoentes foi o
enfrentamento das demandas emocionais advindas do cuidado ao queimado. Ao
cuidar do paciente queimado, origina-se, na equipe de enfermagem que o assiste,
uma mistura de sentimentos, dentre eles, compaixão e angústia. Há a sensação de
estarem guarnecidos de dor e sofrimento a si mesmos, visto que a morte é fato
habitualmente presente neste âmbito, mas não são todos os profissionais que
conseguem lidar incessantemente com a finitude humana, assim, acabam sendo
afligidos emocionalmente [17].
Conjectura-se, deste
modo, que podem ser criados mecanismos de autoproteção por parte do enfermeiro,
o qual, se não for bem administrado pelo mesmo pode interferir negativamente no
uso de suas HS. Alguns destes mecanismos, como negação e banalização do
sofrimento da clientela podem contribuir na mecanização do cuidado, afastando
este profissional de uma prática humanizada [18].
É importante, dessa
maneira, valorizar competências que ultrapassem as habilidades meramente
técnicas, com ênfase, entre outras, na comunicação empática e assertiva, pois trata-se de um passo significativo para a qualidade do
produto final no processo de trabalho [19].
No tocante aos dificultadores relacionados ao paciente, emergiu nas falas
a demanda física gerada pelas especificidades do cuidado ao paciente queimado.
Este tipo de paciente, por ter lesões causadas por exposição do corpo
diretamente ou indiretamente a uma fonte de calor, perde a proteção tegumentar
e as limitações geradas pela injúria da queimadura fazem com que os
profissionais que assistem tal indivíduo despenda
importante força física para a atividade cuidativa
diária, podendo esta gerar danos ao longo do tempo laboral. Trata-se, portanto,
de um paciente com limitações corpóreas que culminam na necessidade de auxílio
constante para atividades básicas [20].
O cansaço físico e a
dor advinda de tais atividades podem gerar um processo de desmotivação no
profissional que, por sua vez, pode favorecer uma prática relacional mais
exígua e um comportamento socialmente inabilidoso. Assim,
enfatiza-se a necessidade de prezar pela biomecânica corporal na referida
ambiência.
Os entrevistados
deste estudo mencionaram, ainda, as comorbidades
psiquiátricas como dificultadoras relacionado ao
paciente queimado, sobretudo no tocante aos casos de tentativa de
autoextermínio. As queimaduras advindas de eventos auto
infligidos geralmente causam acometimento de grande percentual de área
queimada, resultando em graves lesões e processos morosos de recuperação [21].
Para os profissionais da saúde, este tipo de comportamento diverge daquele para
o qual foram formados e, indubitavelmente, geram sentimentos ambíguos.
Assim, infere-se que,
nesses casos, bem como em outros relacionados a comorbidades psiquiátricas, são requeridas habilidades sociais
caudalosas por parte de quem cuida, uma vez que é preciso elaborar sentimentos
pessoais de modo que estes não interfiram no processo de cuidar.
Os resultados
demonstraram que as polaridades no uso das habilidades sociais por enfermeiros
de um centro de tratamento de queimados giram em torno de facilitadores e de dificultadores de ordem pessoal do profissional e também de
especificidades relacionadas ao próprio paciente.
Contudo, ressalta-se
que o fato de se tratar de um estudo de caso denota importante limitador à
investigação, sendo recomendado ampliar a busca por evidências em outras
realidades, bem como recomenda-se que o fenômeno possa
ser estudado na perspectiva de outros atores envolvidos no cotidiano de cuidado
de tal ambiência, como técnicos de enfermagem, outras categorias profissionais,
pacientes e familiares.
Assim, as informações
aqui explanadas não determinam cunho finalístico à exploração das habilidades
sociais no cuidado ao paciente queimado, representando apenas “a ponta de um
iceberg” a ser explorado em maior profundidade. Contudo, vislumbra-se que
possam instigar enfermeiros a refletir sobre suas práticas relacionais em seu
cotidiano laboral com a clientela em questão, pois a compreensão das forças
motrizes ao uso das habilidades sociais e dos obstáculos deste processo fornece
subsídios para potencializá-las e criar estratégias para superá-los,
respectivamente.