ARTIGO
ORIGINAL
Caracterização
das quedas sofridas por pacientes internados em um hospital de grande porte
Tereza Laís Menegucci Zutin, D.Sc.*, Angélica de Araújo dos Reis**, Jéssica Cristina Cavallari**, Flávia Vilas Boas Ortiz Carli,
M.Sc.***, Luiz Fernando Fregatto****,
Jean Carlo da Costa Rezende**
*Profa.
Cursos de Enfermagem e Medicina da Universidade de Marilia, Marilia/SP,
**Enfermeiros, Marialia/SP, ***Profa. Cursos de
Enfermagem e Medicina da Universidade de Marilia, Marilia/SP, ****Prof.
Especialista do Curso de Enfermagem da Universidade de Marilia/SP
Recebido em 14 de junho
de 2018; aceito em 12 de fevereiro de 2019.
Correspondência: Flávia Vilas Boas
Ortiz Carli, Curso de Enfermagem e Medicina,
Universidade de Marilia, Av. Higino Muzi Filho, 1001 Mirante
17525-902 Marília SP, E-mail: flaviavvilasboas@gmail.com; Tereza Laís Menegucci Zutin:
laís_zutin@hotmail.com; Angélica de Araújo dos Reis: angel_adr@hotmail.com;
Jéssica Cristina Cavallari: jehcavallari@hotmail.com;
Luiz Fernando Fregatto: lffregatto@hotmail.com; Jean
Carlo da Costa Rezende: jeancarlo.rezende@hotmail.com
Resumo
Introdução: Podemos dizer que uma
assistência é de qualidade quando realizada de maneira correta, com os cuidados
adequados para a pessoa certa e objetivando alcançar o melhor resultado
possível. Esses são os princípios que fundamentam a qualidade da assistência e
que direcionam a prática de enfermeiros que se preocupam em prestar uma
assistência ética e respeitosa, baseada nas necessidades do paciente e da
família. Porém, eventos adversos ocorrem em qualquer local onde se prestam
cuidados de saúde, como exemplo a queda de paciente em uma unidade de
internação hospitalar, o que traz um grande risco a sua condição física e,
algumas vezes, provoca um agravamento em seu estado de saúde. Objetivo: Analisar a ocorrência e as
características de episódios de quedas em pacientes hospitalizados. Métodos: Trata-se de um estudo
descritivo, retrospectivo e de caráter quantitativo, realizado em um Hospital
de grande porte onde a coleta de dados ocorreu por meio de instrumento
padronizado pela instituição. Resultados:
Identificamos um predomínio de quedas em pacientes do gênero masculino, que
estavam deambulando, desacompanhados e sem uso de restrição mecânica, tendo
como principais consequências às fraturas, incluindo traumatismo crâneo
encefálico. Conclusão: A pesquisa
realizada revelou alguns fatores de risco para quedas, que podem servir para
prevenir essa ocorrência e suas complicações em pacientes hospitalizados.
Palavras-chave: acidentes,
segurança do paciente, cuidados integrais de saúde.
Abstract
Characterization
of falls of hospitalized patients in a large hospital
Introduction:
We can say that a care is of quality when performed in the correct way, with
the appropriate care for the right person and aiming to achieve the best
possible result. Those are the principles that underlie the quality of care
that direct the practice of nurses who are concerned to provide an ethical and
respectful care, based on patients and their family needs. However, adverse
events occur anywhere where providing health care, for example the fall of
patient in a hospitalization unit, which is risk to their physical condition
and sometimes worsen his state of health. Objective:
To analyze the occurrence and characteristics of episodes of falls in
hospitalized patients. Methods: This
is a descriptive and retrospective study with quantitative character, performed
in a large hospital where the collection of data occurred by means of an
instrument standardized by the institution. Results:
We identified a predominance of falls in male patients, who were wandering,
unaccompanied and without the use of mechanical restriction, having as main
consequences fractures, including traumatic brain injury. Conclusion: The study revealed some risk factors for falls, which
may serve as for prevention of this occurrence and their complications in
hospitalized patients.
Key-words: accidents,
patient safety, comprehensive health care.
Resumen
Caracterización de las
quedas sufridas por pacientes internados en un hospital de grande porte
Introducción: Podemos decir que
una asistencia es de calidad
cuando se realiza de manera
correcta, con los cuidados adecuados para la persona adecuada y con el objetivo de alcanzar el mejor
resultado posible. Estos son los principios
que fundamentan la calidad de la asistencia
y que dirigen la práctica de enfermeros que se preocupan en prestar una asistencia ética y respetuosa, basada en las
necesidades del paciente y
de la familia. Sin embargo, eventos adversos ocurren
en cualquier lugar donde se
prestan atención de salud, como ejemplo la caída de paciente en una unidad de internación hospitalaria, lo que trae un gran
riesgo a su condición física y, algunas veces, provoca un agravamiento en su estado de salud. Objetivo: Analizar
la ocurrencia y las características de episodios
de caídas en pacientes hospitalizados. Métodos: Se trata de un
estudio descriptivo,
retrospectivo y de carácter cuantitativo, realizado en un Hospital de gran porte donde la recolección de datos ocurrió por medio de un instrumento estandarizado por la institución. Resultados: Identificamos un predominio de caídas en pacientes del género
masculino, que estaban deambulando, desatendidos y sin uso de restricción mecánica, teniendo como principales consecuencias a las fracturas, incluyendo traumatismo cráneo
encefálico. Conclusión:
La investigación realizada reveló
algunos factores de riesgo para caídas, que pueden
servir para prevenir esa ocurrencia
y sus complicaciones en
pacientes hospitalizados.
Palabras-clave: accidentes
por caída, seguridad del
paciente, calidad del
cuidado.
Segundo o dicionário
Michaelis [1], cuidar significa: zelar pelo bem-estar ou pela saúde. Levando em
conta a sua definição, entende-se o porquê do cuidado
estar diretamente ligado à enfermagem. O ensino de enfermagem busca capacitar o
profissional à prestação de cuidado de saúde ao ser humano/paciente/cliente,
uma característica de envolvimento, se colocar no lugar do próximo, de fazer
pelo outro o que gostaria que fosse feito para si, enriquecendo a relação
interpessoal e, por consequência, propiciando o desenvolvimento mútuo, dos
seres cuidados e dos cuidadores, a realização e aperfeiçoamento de procedimentos
que promovam a saúde, previnam doenças e recuperem lesões; na impossibilidade
de cura ou recuperação, favoreça uma morte digna e com o menor sofrimento
possível. A esse profissional está assegurado um embasamento científico e o
desenvolvimento de habilidades técnicas para atender às necessidades do outro,
inerentes ao exercício da profissão. “O cuidado profissional oferecido está
alicerçado na aprendizagem obtida na escola e no exercício da profissão [2].”
Por esse motivo, o
cuidado com o paciente, incluindo sua segurança no decorrer da internação
hospitalar, é um compromisso ético que deve ser assumido pelos profissionais de
enfermagem desde a sua formação [3].
Para o Ministério da
Saúde (MS) a qualidade na execução dos serviços é elemento diferenciador no
processo de atendimento das expectativas de clientes dos serviços de saúde. Com
essa perspectiva, o MS publicou, juntamente com a Organização Pan-Americana de
Saúde, os padrões mínimos de assistência de Enfermagem para a prevenção,
promoção e recuperação da saúde, com o objetivo de orientar a qualidade e o
controle das ações em saúde, e a partir da instituição do Programa Nacional de
Segurança do Paciente (PNSP), por meio da Portaria MS/GM nº 529, de 1° de abril
de 2013, o tema segurança do paciente tem gerado amplas discussões, com o
objetivo de contribuir para a melhoria do cuidado e promover maior segurança
dos pacientes atendidos nos estabelecimentos de saúde [4].
A expressão “Segurança
do Paciente”, hoje é amplamente utilizada, mas poucas vezes, definida com
clareza. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a segurança do paciente
é a redução do risco de danos desnecessários associados à assistência em saúde
até um mínimo aceitável [5].
Com isso as
instituições hospitalares estão cada vez mais preocupadas em garantir um
atendimento de qualidade a seus clientes. Nesse âmbito, a segurança do
paciente, por meio do gerenciamento de riscos, tem recebido destaque com a
implementação de medidas de prevenção à exposição aos riscos, bem como aos
danos ao cliente decorrentes da assistência à saúde. Segundo Fassini [6], o enfermeiro permanece a maior parte do tempo
na unidade de internação e em contato com o cliente, portanto, ele é um dos
principais profissionais engajados no gerenciamento de riscos.
A maior parte dos
pacientes está sujeito a sofrer quedas durante sua estadia em uma unidade
hospitalar. Avelar [7] define a queda como a situação na qual o paciente, não
intencionalmente, vai ao chão ou a algum plano mais baixo em relação à sua
posição inicial.
Estudo realizado com
objetivo de caracterizar a prevalência dos diagnósticos de enfermagem segundo a
Taxonomia II da NANDA de pacientes internados em UTI em um hospital privado verificou
33 diagnósticos de enfermagem, dos quais, risco de infecção, risco de aspiração
e risco de quedas foram encontrados em todos os pacientes internados nas
unidades [8].
Uma pesquisa recente,
publicada por graduandos do curso de Enfermagem da Universidade Grande Rio,
mostra que queda é a terceira ocorrência mais sofrida por pacientes internados
dentro de uma Unidade de Terapia Intensiva de um hospital privado, sendo
superado apenas pelo risco de infecção e risco de aspiração [9].
A prevenção de quedas é
considerada como um dos focos de trabalho para a segurança do paciente, listado
e revisado recentemente pelo National Quality Forum (NQF),
organização norte-americana que visa à melhoria da qualidade na área da saúde
[9].
Nesse contexto, a
prevenção de quedas requer o conhecimento dos fatores de risco que propiciam
esse evento, pois são multifatoriais e complexos, que podem trazer danos e
prejuízos diversos a um paciente, desde o aumento do tempo de permanência em
uma instituição hospitalar, necessidade de intervenções diagnósticas e
terapêuticas, alto custo do tratamento e até consequências trágicas, como a
morte [10].
Essas consequências são
conhecidas como eventos iatrogênicos. Iatrogênia é
uma palavra de origem grega e significa o resultado indesejável da ação
prejudicial não intencional dos profissionais de saúde, relacionado à
observação, monitorização ou intervenção terapêutica [3]. Tradicionalmente,
situações dessa natureza assumem uma conotação negativa, pois são relacionadas,
com frequência, a imperícia, imprudência ou negligência [11].
A aplicação do processo
de enfermagem tem como finalidade ajudar e priorizar os cuidados com os
pacientes internados, fazendo-os manter o foco para o estado de saúde e
qualidade de vida dos mesmos, além de proporcionar que os enfermeiros
raciocinem a fim de obter confiança e habilidade nas rotinas hospitalares,
pensando criticamente [9].
Uma importante medida
de prevenção a ser adotada em âmbito hospitalar é a implementação de um
programa interdisciplinar, no qual os enfermeiros em conjunto com os demais
profissionais adotem atribuições específicas voltadas à identificação de
intervenções preventivas [8].
Eventos adversos são
ocorrências indesejáveis, porém preveníveis, de natureza danosa ou prejudicial
que comprometem a segurança do paciente que se encontra sob os cuidados dos
profissionais de saúde [11].
O termo "evento
adverso" tem sido aplicado para situações que podem servir de alerta para
os profissionais da saúde a respeito da possível ocorrência de agravos
preveníveis. Essas ocorrências, muitas vezes, podem estar associadas à má
qualidade de intervenções de caráter preventivo ou terapêutico, por parte dos
colaboradores do serviço de saúde.
Através dessa e outras
ferramentas, é preciso despertar a consciência e o comprometimento dos
profissionais para melhorar a segurança na assistência prestada, além de apoiar
o desenvolvimento de práticas focadas na segurança do paciente. Nesse contexto,
este estudo objetivou contribuir para uma maior compreensão do evento queda e
verificar a ocorrência do evento nesse ambiente visando a sua prevenção.
Objetivo
Analisar a ocorrência e
as características de episódios de quedas em pacientes hospitalizados.
Trata-se de um estudo
descritivo, retrospectivo e de caráter quantitativo. O campo de estudo foi
composto de unidades de internação cirúrgica, clínica médica, obstétrica e
unidade de terapia intensiva (UTI) de um hospital de grande porte no interior
do estado de São Paulo, o cenário foi eleito devido à disponibilidade do local.
A coleta de dados foi realizada após autorização da diretoria e do coordenador
de enfermagem da instituição hospitalar e aprovação do projeto pelo comitê de
Ética em Pesquisa, recebendo o número do parecer 1.522.545. Foi utilizado
instrumento padronizado pela instituição, denominado “Ficha de Notificação de
Eventos Adversos”, o qual deverá ser preenchido pelo enfermeiro, identificando
assim a ocorrência da queda e sua caracterização. A população foi constituída
de todos os pacientes internados, que sofreram queda durante a internação, no
período de junho de 2015 a junho de 2017. Como critério de inclusão foi
estabelecido a existência da notificação da queda, associada ao preenchimento
do instrumento de caracterização das mesmas. O critério de exclusão foi o não
preenchimento completo dos dados de identificação da queda no instrumento. O
programa estatístico utilizado foi o SPSS, v 21 [12].
Diferentes fatores
estão ligados à queda de pacientes institucionalizados, que podem ser
intrínsecos, isto é, caracterizam-se por alterações inerentes à condição
fisiológica do indivíduo, como as condições patológicas apresentadas por eles; ou
podem advir de fatores extrínsecos, que estão associados com os riscos
oferecidos pelo ambiente [6].
Os dados coletados
foram analisados e apresentados em tabelas e figuras seguindo as normas
preconizadas para uma pesquisa descritiva e nos mostra a caracterização dos
pacientes participantes da pesquisa.
Tabela I - Distribuição das ocorrências, de acordo com sexo dos pacientes.
N = número.
Em nosso estudo, houve
predominância de queda no gênero masculino, semelhante a estudo publicado por
Nascimento [13] no qual o maior número de quedas (56,3%) foi sofrido pelo sexo
masculino, resultado esse que pode estar associado a fatores culturais, já que
os homens em nosso meio apresentam resistência em solicitar e/ou aceitarem
auxílio para executar determinadas tarefas da vida diária, como levantar da
cama [14].
Tabela II - Reincidência de quedas.
N = número.
Observando a tabela II,
identificamos que o predomínio de ocorrências registradas foi de uma queda por
paciente. Outros estudos apresentam resultado semelhante, indicando que a maior
parte da amostra estudada sofreu apenas uma queda durante o período de
internação [10].
A baixa taxa de
reincidência sugere medidas preventivas mais efetivas após a ocorrência da
mesma. A queda do paciente hospitalizado pode ser prevenida por meio da
implantação de protocolos com medidas preventivas quando há a identificação do
paciente com risco de queda, garantindo segurança e qualidade no atendimento
prestado [6].
Segundo Teixeira [15],
um aspecto importante identificado em seu estudo foi a ausência de protocolo de
prevenção de quedas na instituição, o que contribui para a reincidência de
quedas.
Tabela
III - Ocorrência de queda, segundo condições do
paciente.
N = número.
Observamos na tabela
III que o predomínio de ocorrências de queda foi maior em pacientes
desacompanhados e sem restrição mecânica, 46% apresentavam-se confusos. Estudo
nos mostra que a frequência absoluta dos pacientes que caíram é igual, tanto
para os orientados quanto para os pacientes desorientados [16].
Meneguin [17], em seu estudo,
mostrou que 64,2% dos pacientes encontravam-se desacompanhados no momento da
queda, valor aproximado ao encontrado nesta pesquisa.
Ao analisarmos os
resultados, podemos dizer que o paciente desacompanhado foi um importante fator
de risco para queda no presente estudo.
Tabela IV - Posicionamento do paciente no momento da queda.
N = número.
Quanto aos fatores que
predispõem as quedas (Tabela IV), o presente estudo verificou que a queda da
própria altura, durante a deambulação, foi o fator de maior ocorrência,
representando 46% dos casos. Peixoto [18] identificou que 75,86% dos pacientes
foram vítimas de queda da própria altura durante a deambulação.
Estudo aponta que
muitos pacientes apresentam perda funcional quando hospitalizados por doença
aguda e ainda que “a restrição ao leito traz grande perda de massa óssea e
muscular e pode levar à perda da capacidade de deambulação, além de aumentar o
risco de quedas e fraturas” [19].
Quedas em outros locais
que não do leito são contabilizadas em estudos na literatura mundial e seus
dados demonstram ser importantes para o conhecimento das causas que provocaram
as mesmas [13].
Estudos confirmam que o
uso da cadeira nos quartos é responsável por 18% das quedas, número semelhante
ao encontrado em nossa pesquisa, pois alguns pacientes levantam-se da cadeira
sem auxílio, o que pode contribuir para a ocorrência de quedas, devido à perda
da sustentação e estabilidade da marcha [16].
TCE = Traumatismo Crâneo
Encefálico
Figura 1 - Consequências ocasionadas pela queda.
Analisando os dados da
figura 1, identificamos que 40% dos pacientes não sofreram nenhuma consequência
física, porém ocorreram consequências graves, como o Traumatismo Crâneo
Encefálico (TCE) 7%. Os resultados obtidos se assemelham com o estudo de Fassini [6], no qual a maior parte dos pacientes não sofreu
nenhum agravo a sua condição física e 20% apresentaram algum tipo de lesão após
a ocorrência da queda.
Tabela V - Distribuição de quedas por plantão.
N = número.
Através da tabela V,
identificamos que o plantão diurno obteve o maior número de ocorrências, 54%
dos pacientes sofreram queda durante o dia.
No estudo apresentado
por Meneguin [17], os eventos predominaram no período
noturno, com 55,2% quedas. Embora o achado neste estudo defira de outras, nas
quais o turno da noite foi o que apresentou maior ocorrência de quedas, devemos
ressaltar que durante o dia os pacientes estão expostos a riscos, pois
normalmente executam um maior número de atividades [20,21].
Pode-se concluir que a
ocorrência de quedas em pacientes hospitalizados é elevada, estando associada a
pacientes do gênero masculino, desacompanhados, no período diurno, sem uso de
restrição mecânica, tendo como consequências lesões, e o Traumatismo Crâneo
Encefálico (TCE) foi a consequência mais grave.
Observamos através dos
registros dos eventos adversos, a identificação de alguns fatores de risco para
quedas demonstrando a necessidade de se propor intervenções preventiva, promovendo
com eficácia a segurança do paciente.