ARTIGO
ORIGINAL
Distribuição
espacial e temporal da incidência da hanseníase em menores de 15 anos em Manaus
Marcos Vinícius Costa
Fernandes*, Arinte Véras
Fontes Esteves**, Cláudia Benetida dos Santos***,
Daniel Barros de Castro****
*Universidade
do Estado do Pará e Universidade Federal do Amazonas, Programa de Pós-graduação
em Enfermagem, **Universidade do Estado do Pará e Universidade Federal do
Amazonas, Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Manaus/AM, ***Universidade
de São Paulo, Programa Nacional de Cooperação Acadêmica, Escola de Enfermagem
de Ribeirão Preto, São Paulo/SP, ****Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de
Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro/RJ
Recebido em 25 de julho
de 2018; aceito em 12 de dezembro de 2018.
Endereço
de correspondência:
Marcos Vinícius Costa Fernandes, Rua Teresina, 495, Adrianópolis, Manaus AM,
E-mail: mvcf_2012@hotmail.com; Arinte Véras Fontes Esteves: arineteveras@ig.com.br; Cláudia Benetida dos Santos: cbsantos@eerp.usp.br; Daniel Barros de
Castro: danielbarrosbio@gmail.com
Resumo
Introdução: A hanseníase é uma
doença milenar, permanecendo no século XXI como um grande desafio à saúde
pública mundial. Objetivo: Analisar a
distribuição espacial e temporal da incidência de hanseníase em menores de 15
anos no município de Manaus, no período de 2009 a 2015. Métodos: Estudo epidemiológico de caráter descritivo do tipo
ecológico, com unidade de análise dos bairros. Os dados foram obtidos no
Sistema de Informação de Agravos de Notificações. As unidades de análises foram
classificadas de acordo com o grau de endemicidade.
Foram calculadas as taxas de incidência para cada ano; em seguida, para
analisar a distribuição espacial e temporal foram construídos mapas temáticos,
com o software QGIS. Resultados: No
período de 2009 a 2015 foram notificados 173 casos novos de hanseníase em
menores de 15 anos em Manaus. Os indicadores apresentaram um gradiente, na
distribuição por zonas, apontando cinco áreas onde se concentram bairros com
taxas de detecção classificados entre média e elevada incidência, que são os
bairros das regiões Norte, Sul, Leste, Centro-sul. Conclusão: O conhecimento detalhado do município de Manaus,
observando o processo saúde-doença da hanseníase em menores de 15 anos,
descreveu a magnitude e distribuição desse problema de saúde pública.
Palavras-chave: criança, hanseníase,
epidemiologia.
Abstract
Spatial
and temporal distribution of incidence of leprosy in children under 15 years of
age in Manaus
Introduction:
Leprosy is a millennial disease, remaining in the 21st century as a major
challenge to global public health. Objective:
To analyze spatial and temporal distribution of the incidence rates of leprosy
in children under 15 years in Manaus, from 2009 to 2015. Methods: This is an epidemiological study of a descriptive approach
and ecological type, with analysis of the neighborhoods. Data were obtained
from the Notifiable Diseases Information System. The units of analysis were
classified according to the degree of endemicity. The incidence rates were
calculated for each year; then to analyze the spatial and temporal distribution
were constructed thematic maps, with the QGIS software. Results: In the period from 2009 to 2015, 173 new cases of leprosy
were reported in children less than 15 years in Manaus. The indicators
presented a gradient, in the distribution by zones, pointing out five areas
where districts with detection rates are concentrated and classified as medium
and high incidence, which are the districts of the North, South, East,
Center-South regions. Conclusion: The
detailed knowledge of the municipality of Manaus, observing the health-disease
process of leprosy in children under 15, described the magnitude and
distribution of this public health problem.
Key-words: child, leprosy,
epidemiology.
Resumen
Distribución espacial
y temporal de la incidencia de la lepra
en menores de 15 años en
Manaus
Introducción: La hanseniasis
es una enfermedad milenaria, permaneciendo en el siglo XXI como un gran desafío a la salud pública mundial.
Objetivo: Analizar la distribución
espacial y temporal de la incidencia
de hanseniasis en menores
de 15 años en el municipio
de Manaus, en el período de 2009 a
2015. Métodos: Estudio
epidemiológico de carácter descriptivo del tipo ecológico, con unidad de análisis los barrios. Los datos fueron obtenidos
de las bases de datos del Sistema de Información de Agravamientos de Notificaciones. Las unidades de análisis se clasificaron de acuerdo con el grado de endemicidad. Se calcularon las tasas de incidencia
para cada año; a continuación,
para analizar la distribución espacial y temporal se construyeron
mapas temáticos, con el
software QGIS. Resultados: En el período de 2009 a 2015 se notificaron 173 casos nuevos de
lepra en menores de 15 años
en Manaus. Se ha producido una caída del número de
casos nuevos del año 2009 a 2015, sin embargo el recorrido temporal de la enfermedad presenta una oscilación
entre el declive y el
aumento de los casos de 2009 a 2013. Resultados: Los
indicadores presentaron un
gradiente, en la distribución por zonas, apuntando
cinco áreas donde se concentran barrios
con tasas de detección clasificados entre media y alta incidencia, que son los barrios
de las regiones Norte, Sur, Este, Centro-sur. Conclusión: El conocimiento detallado del municipio de Manaus,
observando el proceso salud-enfermedad de la lepra en menores de 15 años, describió la magnitud
y distribución de ese
problema de salud pública.
Palabras-clave: niño,
lepra, epidemiología.
A hanseníase é uma doença
milenar, permanecendo no século XXI como um grande desafio à saúde pública
mundial [1]. Dados referenciados de 2016 publicados pela Organização Mundial de
Saúde (OMS) mostram que 145 países apresentaram registro de 214.783 novos casos
de hanseníase. No Brasil foi evidenciado em 2016 um coeficiente de detecção
geral de 12,23 por 100 mil hab. e o coeficiente de detecção em menores de 15
anos de 3,63 por 100 mil hab. Com todo avanço em 2016, o Brasil não atingiu a
meta estabelecida aos países membros da OMS, visto que apresentam mais de um
caso para cada 100.000 habitantes em menores de 15 anos, sendo assim
considerado um país endêmico [2,3].
No Amazonas, a situação
de hanseníase é preocupante, com 186 casos, destes 144 novas
infecções, 23 recidivas, 14 reingressos e 07 transferências. Na detecção
de novos casos, 12 foram em menores de 15 anos. A detecção na população
pediátrica sinaliza uma deficiência no controle e vigilância da doença pelos
gestores de saúde, pois uma criança com hanseníase significa que alguém do
convívio dela também tem a doença e não está realizando o tratamento [4].
Um estudo realizado em
Manaus para analisar a distribuição espacial dos casos novos de hanseníase em
menores de 15 anos e as condições de vida no período de 1998 a 2004 enfatizou
que a utilização da análise espacial pôde auxiliar na compreensão da
distribuição da doença no município, contribuindo para elucidação da sua
relação com questões socioeconômicas e crescimento urbano, confirmando a
gravidade do nível de endemia da hanseníase e sinalizando as áreas prioritárias
para a intervenção de políticas públicas de saúde [5].
Ainda no que se refere
à distribuição espacial de hanseníase em Manaus, um estudo entre os anos de
1998 a 2009, com o objetivo de conhecer o perfil do custo das doenças
fortemente atribuíveis a fatores ambientais na cidade de Manaus, observou o
padrão de distribuição espacial do número de casos novos diagnosticados na
população geral e sua relação com o padrão de expansão urbana em Manaus após a
instalação da Zona Franca (1967), que trouxe novas áreas de ocupação regular e
irregulares [6].
No presente artigo,
busca-se analisar a distribuição espacial dos casos novos de hanseníase em
menores de 15 anos.
Este artigo buscou
realizar um estudo descritivo do tipo ecológico misto, cuja unidade de análise foi
os bairros de Manaus. O município está localizado na
região Norte do Brasil, situado a
03º06’07’’ S de latitude e
60º01’30’’ W de
longitude, possui área territorial de 11.401,092 km2. Em 2010 sua
população era de 1.802.014 habitantes e com uma densidade demográfica de 158,06
habitantes/km2 [7].
A população de estudo
constituiu-se dos menores de 15 anos residentes em Manaus, diagnosticados com hanseníase
no período de 2009 a 2015, notificados no Sistema Nacional de Agravos de
Notificação (SINAN).
Foram excluídos os
registros duplicados e aqueles em que os campos “idade”, “bairro de
residência”, “modo de entrada” e “tipo de alta” estavam em branco ou preenchido
com "ignorado", além daqueles cujos registros descritos como erro de
diagnóstico. Foram consideradas duplicações aqueles registros cujo campo data
de nascimento, nome do paciente e nome da mãe era igual.
Os dados sobre a população
dos bairros foram obtidos a partir do censo realizado em 2000 e 2010 pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e as populações do
período intercensitário foram obtidas pelo método de interpolação linear.
A taxa de incidência de
hanseníase em menores de 15 anos em cada bairro foi calculada dividindo o total
de casos novos em menores de 15 anos de idade residentes em determinado bairro
e diagnosticados em cada ano estudado, pelo total da população de zero a 14
anos de idade, no mesmo local e período, multiplicado por 100 mil habitantes.
Após o cálculo da taxa
de incidência realizou-se uma análise descritiva por meio de distribuições de
frequências, valores médios, medianos e desvio padrão das taxas de incidência.
O programa estatístico utilizado foi o Statistical Package for Social Sciences
(SPSS, 1999), versão 19. 0 (NFS-e 3076, licença no 10101111255).
Os bairros de Manaus
foram classificados segundo o grau de endemicidade,
conforme preconizado pelo Ministério da Saúde (MS), como: (i) hiperendêmico: ≥ 10,00 por 100 mil hab.; (ii) muito alto: 5,00 a 9,99 por 100 mil hab.; (iii) alto: 2,50 a 4,99 por 100 mil hab.; (iv) médio: 0,50 a 2,49 por 100 mil hab.; (v) baixo: < 0,50
por 100 mil hab. [6]. Foram construídos de mapas temáticos sequenciais por meio
do software QGIS versão 2.18.16.
Este estudo foi
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Amazonas
(UFAM), com número do Parecer: 1.860.181 [8].
Foram notificados 2.207
novos casos de hanseníase na população geral no período de 2009 a 2015. Desse
total, 173 (9%) casos ocorreram em menores de 15 anos e depreende-se que 91
notificações (53%) eram de indivíduos do sexo masculino, havendo predomínio
sobre o sexo feminino (47%).
Tabela I - Casos novos de hanseníase em adultos segundo o sexo em Manaus no
período de 2009 a 2015.
Fonte: Sistema Nacional
de Agravos de Notificação – SINAN.
Conforme a Tabela II,
verificou-se que o coeficiente de incidência neste grupo etário oscilou, ao
longo dos anos entre 2009-2015, de 6,3 casos/100 mil hab. classificado como
muito alto e 3,8 casos/100 mil hab. que é considerado alto nível endêmico, de
acordo com Ministério da Saúde (MS). Neste mesmo período o coeficiente de incidência
anual médio em menores de 15 anos foi de 4,7 casos/100 mil hab. classificado
como alto nível endêmico.
Tabela II - Casos novos de hanseníase em crianças e coeficientes de incidência por
100 mil habitantes em Manaus no período de 2009 a 2015.
Fonte: Sistema Nacional
de Agravos de Notificação – SINAN; População: IBGE – Censos Demográficos e
Contagem Populacional (2010).
Verificou-se uma
distribuição heterogênea quando analisada a evolução da taxa de incidência de
hanseníase no período estudado, havendo uma variação entre a redução e aumento
no período estudado. Evidencia-se ainda que os bairros de Manaus mantiveram um
padrão heterogênico em suas taxas de incidência em relação a novos casos de
hanseníase. Foi observado um aglomerado de bairros com elevada incidência de
hanseníase nas regiões Norte, Sul, Leste e Centro-sul, e em poucos bairros da
região Oeste do município de Manaus (Figura 1).
A análise da
distribuição do número de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos aponta
que o número de casos novos se apresentou com oscilação nos padrões temporais.
Observou-se que houve queda do número de casos novos do ano de 2009 a 2015,
entretanto o percurso temporal da doença apresenta uma oscilação entre o
declínio e aumento dos casos da hanseníase na cidade de Manaus no período de
2009 a 2013.
Fonte: Sistema Nacional
de Agravos de Notificação – SINAN; IBGE – Censos Demográficos e Contagem
Populacional (2010).
Figura 1 - Distribuição espacial da taxa de incidência de hanseníase em menores de
15 anos nos bairros de Manaus (mapas sequenciais).
Através do presente
estudo pode-se identificar a predominância dos casos de hanseníase em
indivíduos do sexo masculino. Este perfil epidemiológico da hanseníase
corrobora demais estudos feitos na Amazônia e em outros Estados do Brasil, os
quais afirmam a prevalência da doença no sexo masculino em relação ao feminino
no período de 2009 a 2015 [9-11].
Relacionada a fatores
com a identidade masculina, o maior contato interpessoal no trabalho, menor
preocupação com seu bem-estar físico e a falta de acesso aos serviços médicos
torna esse grupo mais propicio a doenças infeciosas e outros agravos. O que
sugere a hipótese que as condições de vida mais ativa do homem e o descaso com
a saúde os torna mais expostos à doença [12,13].
Com relação à
hanseníase em menores de 15 anos em Manaus, que houve transmissão ativa nesta
faixa etária, no período de 2009 a 2015, é valido ressaltar que a presença de
casos na população pediátrica é um indicador da gravidade do nível endêmico da
hanseníase e reflete a exposição precoce de menores ao bacilo, uma vez que este
agravo não é considerado uma doença prevalente na infância [5].
Sabe-se que onde há
adultos com a doença sem tratamento seja vizinho ou familiar contribuem para o
destaque epidemiológico em menores de 15 anos, devido à exposição precoce ao
bacilo. Sendo assim, a infecção em menores de 15 anos é mais frequente quando
existem casos na família e em áreas de incidência elevada da doença, tornado
assim a vigilância de casos neste grupo como princípio fundamental para a
erradicação da hanseníase [14].
Essa afirmativa foi
demonstrada por estudos realizados nos Estados do Mato Grosso e Minas Gerais
que revelaram a exposição precoce de crianças ao bacilo, em decorrência do
contato íntimo e prolongado com os familiares bacilíferos
não tratados somado ao agravante da defesa imunológica deficitária na infância.
Sinalizando ainda que a prevalência de casos em crianças pode ser um indicador
de um sistema de saúde ineficiente no controle e tratamento de casos na
população adulta e a busca de casos insatisfatória em menores de 15 anos,
permanecendo assim focos de transmissão ativos da hanseníase [14,15].
Destaca-se, na
literatura, um caso raro de diagnóstico clínico de hanseníase multibacilar, sendo a forma mais grave da doença, em uma
criança de três anos de idade corroborando a exposição precoce da criança ao
bacilo. Esta forma da doença favorece a apresentação de incapacidade física e é
menos frequente em crianças devido ao seu longo período de incubação. Em
síntese, a detecção e tratamento precoce da hanseníase na população geral
quebra sua cadeia de transmissão e previne a incidência de casos novos na
infância. Além disto, a presença de casos nesta população jovem é um indicativo
da deficiência nos serviços de saúde quanto à detecção precoce da doença [16].
Em Manaus, o
coeficiente de detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos
variou no período estudado de muito alto e alto nível endêmico, mostrando uma
tendência de redução. O declínio da taxa da hanseníase ao longo dos anos pode
estar relacionado à implantação de estratégias governamentais com o intuito de
promover saúde e prevenir doenças e agravos. Umas das estratégias foi o
Programa Saúde na Escola (PSE) com o objetivo de promover a atenção integral à
saúde da criança, adolescente e adultos, por meio da educação em saúde,
fortalecendo, assim, os espaços de participação com discentes, docentes e
profissionais de saúde para a construção da educação em saúde [17].
O PSE prevê, por meio
da parceria entre o MS e Ministério da Educação (ME), conscientizar o autoexame
e realizar a busca ativa de casos entre escolares de forma articulada com o
Plano integrado de ações estratégicas de eliminação de doenças negligenciadas e
relacionadas à pobreza, otimizando, assim, o compromisso nacional de redução da
carga da hanseníase nos grupos populacionais mais vulneráveis situados em áreas
geográficas de maior risco [17-19].
Apesar
dos esforços do
governo, em relação à criação de
políticas públicas buscando a promoção da
saúde e prevenção de doenças, Manaus
apresenta um coeficiente de incidência acima
da média proposta pelo MS. Os resultados encontrados na pesquisa
corroboram
outro estudo realizado no Brasil, que enfatiza que a hanseníase
em menores de
15 anos ainda é um alerta para os gestores de saúde e a
participação da atenção
primária baseada na Estratégia da Saúde da
Família desenvolvendo atividades de
educação em saúde representa uma forma eficaz na
prevenção de doenças endêmicas
[20,21].
Em
Manaus os
profissionais de saúde responsáveis pela
promoção da saúde e prevenção de
agravos se encontram nos seus quatro Distritos de Saúde (DISA):
Distrito Sul,
Distrito Norte, Distrito Oeste, Distrito Leste. Neste contexto a
atenção
primaria à saúde deve atuar nos territórios de sua
abrangência, proporcionando
atenção integral a população. É
válido ressaltar que as condições de trabalho
das equipes de Saúde da Família são determinantes
para o seu processo de
trabalho. Sendo assim, a falta de materiais de insumo e infraestrutura
inadequada das Unidades Básicas de Saúde pode colaborar
com a fragilidade no
serviço de saúde em áreas que muitas vezes
são marcadas pelas condições de
vulnerabilidade socioeconômicas [21].
Outros estudos no país
apresentaram alta endemicidade da doença, em Salvador
a distribuição da magnitude das taxas anuais de casos em menores de 15 anos
apresentou-se em endemicidade muito alta (5,4
casos/100 mil hab.), além de detectar casos em menores de 4 anos (10,3%) sendo
mais um fato importante para a evidência da transmissão ativa da doença, este
fato de contágio reflete a inoperância das políticas públicas de saúde.
Conforme já mostrado na literatura, é válido ressaltar que a meta da Estratégia
Global para Hanseníase 2016-2020 é de reduzir a zero o número de crianças
diagnosticadas com hanseníase [1,22].
Contudo, a Estratégia
Global para Hanseníase 2016-2020 ressalta a luta mundial contra a hanseníase,
aperfeiçoando e aprimorando as ações conjuntas globais e locais para o
diagnóstico e tratamento precoce da doença, redução da incapacidade física e
melhorias das condições de vida da população. Embora o Brasil já tenha
estabelecido fortalecimento para vigilância, atenção e controle da hanseníase
por meio do Programa Nacional de Controle da Hanseníase (PNCH), que desenvolve
ações de educação permanente visando melhorar a qualidade da prática
assistencial nos diferentes níveis de atenção, além de fortalecer a vigilância
epidemiológica desta patologia, o país não conseguiu estabilizar os indicadores
epidemiológicos da doença [2,22].
O detalhamento dos
bairros de Manaus como unidades de análise permitiu a identificação das áreas
de maior endemicidade da doença, o que pode vir a
contribuir para o planejamento de ações de controle da hanseníase no município.
A taxa de incidência em menores de 15 anos mostra uma elevada exposição à
doença nesta faixa etária, particularmente nos bairros das regiões Norte, Sul e
Leste.
Tal resultado corrobora
estudo realizado em Manaus no ano de 2009, que em sua análise espacial mostrou
a hanseníase heterogênea, atingindo intensamente as regiões Norte, Sul e Leste,
sua taxa de detecção variou de hiperendêmico e muito
alto nos setores de estudo. Em 2011, outra pesquisa apontou alta taxa de
incidência de hanseníase nessas mesmas regiões, relacionado à distribuição
espacial de casos da doença com o padrão de expansão urbana de Manaus na década
de 1990, nas zonas Sul e Oeste e partir de 2000 na Leste e Norte da cidade
[21].
A mudança do padrão de
expansão urbana em Manaus ocorreu entre o final do século XIX e o começo do
século XX, quando a capital se tornou o principal centro financeiro da Região
Norte, o que proporcionou a expansão urbana e demográfica da cidade, trazendo
novas áreas de ocupação. As zonas Sul, Centro-sul, Oeste e Centro-oeste eram as
áreas onde se encontravam os maiores espaços urbanos. Com a implantação da Zona
Franca de Manaus, em 1967, houve um êxodo rural, das populações oriundas do
interior do estado e de cidade vizinhas em busca de melhores condições de vida,
este fato contribuiu para o surgimento de ocupações irregulares e regulares,
influenciando a expansão das zonas Leste e Norte [23].
Diante da crítica
situação de ocupação irregular em decorrência do aumento populacional e da
expansão da cidade, principalmente a partir da criação da Zona Franca de Manaus,
pode-se observar o agravamento da saúde pública e a exclusão social na região,
como consequência do êxodo rural e a migração de famílias que buscavam uma nova
oportunidade de vida, favorecendo ocupações em locais insalubres e com
precárias condições de vida por aqueles que não conseguiram se inserir no
mercado de trabalho, e se depararam com o desemprego e baixa fonte de renda
[24].
A caracterização da
expansão urbana e demográfica desordenada em Manaus pode explicar a repercussão
da dinâmica de problemas de saúde pública nessas zonas administrativas e ser o
ponto chave para justificar a distribuição demográfica da hanseníase na cidade.
Na zona Sul, sendo umas das zonas mais antiga da cidade, as características
sociodemográficas influenciaram no aumento da densidade populacional, além de
apresentar os bairros com maior número de população, com construções de
moradias precárias, o contato íntimo e prolongado é maior no ambiente
domiciliar, o que favorece a transmissão do bacilo [5].
Os impactos ambientais
negativos significativos nas zonas Norte e Leste ocorreram devido ao intenso
processo de ocupação destas, tendo destaque a zona Leste que apresentou uma
forma de ocupação irregular em encostas, nascente de igarapé, barrancos e
próximos a rede elétrica de alta tensão, chamadas de invasões. Essas expansões
influenciam não só nas condições socioeconômicas e ambientais, mas também na
propagação de doenças negligenciadas, pois sua ocorrência pode estar ligada a
exposição de pessoas às condições precárias de vida [23,24].
A limitação deste
estudo reside, sobretudo, por se tratar de um estudo com dado secundário
estando sujeito a subnotificação e má classificação dos casos no banco de dados
do SINAN, cujos limites imprecisos poderão ser na identificação do endereço de
residência do paciente. Porém a suavização produziu um mapa mais claro da
hanseníase em Manaus e os resultados obtidos com o alisamento espacial foram
tratados com cautela para não mascarar grandes diferenças entre as regiões vizinhas.
O estudo indica a
necessidade do fortalecimento da vigilância em saúde em menores de 15 anos no
município de Manaus, como ponto crucial para o controle e erradicação da
hanseníase nesta população. Conjuntamente o mapeamento da taxa de incidência de
hanseníase nos bairros do município foi uma ferramenta válida para a observação
das áreas de elevada endemicidade. Esses dados se
mostraram preocupantes uma vez que evidenciou a gravidade da situação
epidemiológica da hanseníase em Manaus.
O controle da
hanseníase em menores de 15 anos em Manaus tem obtido alguns avanços,
entretanto seus índices continuam acima da meta proposta pela OMS. A meta a ser
seguida está concentrada em zerar os casos novos de hanseníase em menores de 15
anos, o que reflete a importância de maiores esforços dos gestores de saúde do
município e do estado para assegurar o acesso à saúde e as medidas de promoção
da saúde e prevenção de doenças. Dentro deste contexto, este dado se torna
relevante para estabelecer bases para uma ampla discussão no avanço e busca
ativa de casos em escolares, a fim de detectar os focos de transmissão ativos
em domicilio e iniciar o tratamento, uma vez que a criança é um indicador do
nível de transmissão e tem relevância epidemiológica.
Este trabalho foi
conduzido como parte do Programa Nacional de Cooperação Acadêmica (Procad) / Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (Capes) e com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado
do Amazonas (Fapeam).