ARTIGO
ORIGINAL
Autocuidado
em hanseníase: comportamento de usuários atendidos na rede de atenção primária
à saúde
Paula Soares Carvalho*,
Karen Krystine Gonçalves de Brito, D.Sc.**, Emanuelle Malzac Freire
de Santana***, Siméia Macêdo de Lima****, Smalyanna Sgren da Costa Andrade,
D.Sc.*****, Matheus de Medeiros Nóbrega******, Maria Júlia Guimarães Oliveira Soares, D.Sc.*******
*Mestranda
em Enfermagem pela Universidade Federal da Paraíba, João
Pessoa/PB,
**Enfermeira do ambulatório de feridas da Secretaria Municipal
de Saúde de
Bayeux, Paraíba, ***Doutoranda em Enfermagem pela Universidade
Federal da
Paraíba, Docente do curso de Fisioterapia das Faculdades Nova
Esperança, João
Pessoa, Paraíba,****Graduação em Enfermagem pela
Universidade Federal da
Paraíba, João Pessoa/PB, *****Docente do curso de
Enfermagem das Faculdades
Nova Esperança, João Pessoa PB, ******Mestrando pelo
programa de Pos-graduação em Enfermagem da Universidade
Federal da Paraíba, *******Docente do Programa de
Pós-Graduação em Enfermagem
da Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa/PB
Recebido em 10 de
setembro de 2018; aceito em 22 de abril de 2019.
Correspondência: Emanuelle Malzac Freire de Santana, Av. Julieta Marinho Marsciano, 109/204, 58035-000 João Pessoa PB, E-mail:
manumalzac@gmail.com; Paula Soares Carvalho: paaula-soares@live.com; Karen Krystine Gonçalves de Brito: karen_enf@yahoo.com.br;
Emanuelle Malzac Freire de Santana:
manumalzac@gmail.com; Siméia Macêdo de Lima:
simeiamacedo@windowslive.com; Smalyanna Sgren da Costa Andrade: nana_sgren@hotmail.com; Matheus de Madeiros Nóbrega: matheusnobrega0@gmail.com; Maria Júlia
Guimarães Oliveira Soares: mmjulieg@gmail.com
Resumo
Introdução: A hanseníase é uma
doença negligenciada e incapacitante de relevância para a saúde pública
brasileira. O autocuidado se configura como estratégia de prevenção contra suas
incapacidades físicas. Objetivo: Investigar as competências dos indivíduos com
hanseníase atendidos na atenção primária à saúde, direcionado a ações de
autocuidado através da escala Appraisal of Self-care Agency.
Métodos: Pesquisa quantitativa
realizada nas unidades de saúde da família em João Pessoa/PB, com 22
participantes de janeiro a março de 2017. Utilizou-se na coleta de dados um
instrumento sociodemográfico e a escala Appraisal of Self-care Agency.
Os dados foram analisados por técnicas de estatística descritiva e inferencial
através dos testes U de Mann-Whitney e Kruskal
Wallis. Resultados: Perfil
caracterizado por maioria de mulheres, com média de 52 anos, tipo multibacilar, grau de incapacidade não especificado, com
média de 92 pontos na escala ASA. Conclusão:
Observou-se em uma taxa majoritária dos entrevistados a competência para o
autocuidado.
Palavras-chave: hanseníase, atenção
primária à saúde, autocuidado, Enfermagem.
Abstract
Self-handled
in leprosy: behavior of users attended in the primary health care network
Introduction:
Leprosy is a neglected and disabling disease of relevance to Brazilian Public
Health. Self-care is configured as a prevention strategy against the physical
disabilities. Objective: To
investigate the skills of individuals with leprosy treated in primary health
care, directed to self-care actions through the Appraisal of Self-care Agency
Scale. Methods: Quantitative research
carried out at the family health units in João Pessoa, Paraíba,
Brazil, with 22 participants from January to March 2017. A sociodemographic
instrument and the Appraisal of Self-care Agency scale were used in the data
collection. Data were analyzed by descriptive and inferential statistics using
the Mann-Whitney and Kruskal Wallis U tests. Results: Profile characterized by majority of women, with a mean of
52 years old, multibacillary type, degree of disability not specified, with a
mean of 92 points on the ASA scale. Conclusion:
Most of respondents had the competence to self-care.
Key-words: leprosy,
primary health care, selfcare, Nursing.
Resumen
Autocuidado en la lepra: comportamiento de usuarios atendidos en la red de atención
primaria a la salud
Introducción: La lepra es una enfermedad
negligente e incapacitante de relevancia para la salud pública brasileña. El autocuidado se configura como estrategia de prevención contra
sus incapacidades físicas. Objetivo:
Investigar las competencias
de los individuos con hanseniasis atendidos en la atención
primaria a la salud,
dirigido a acciones de autocuidado a través de la escala de evaluación de la autoestima. Métodos:
Investigación cuantitativa
realizada en las unidades
de salud de la familia en João Pessoa, Paraíba,
Brasil, con 22 participantes de enero
a marzo de 2017. Se utilizó
en la recolección
de datos un instrumento
sociodemográfico y la escala Appraisal of Self-care Agency. Los datos fueron analizados por técnicas de
estadística descriptiva e inferencial a través de las pruebas U de Mann-Whitney y Kruskal Wallis. Resultados:
Perfil caracterizado por mayoría de mujeres, con media
de 52 años, tipo multibacilar,
grado de incapacidad no especificado, con promedio de 92 puntos en la
escala ASA. Conclusión:
Se observó en la mayoría de los
entrevistados la competencia
para el autocuidado.
Palabras-clave: lepra, atención primaria de salud,
autocuidado, Enfermería.
A hanseníase é uma
doença crônica, infectocontagiosa, negligenciada e que apresenta distribuição
mundial, colocando o Brasil como o segundo país mais endêmico. Apesar de
curável, pode causar aos indivíduos incapacidades físicas e consequências
biopsicossociais devido ao acometimento dermatoneurológico
ocasionado pelo Mycobacterium leprae, configurando-se
como problema de saúde pública [1,2].
O diagnóstico e
tratamento tardios trazem consigo grandes consequências como as incapacidades
físicas e deformidades, convidando o indivíduo acometido a vivenciar de maneira
particular o estigma e preconceito da doença. As incapacidades podem acarretar
restrições na realização de atividades diárias, limitações da vida social e
prejuízos psicológicos [3].
No ano de 2017 foram
registrados globalmente 210.671 novos casos de hanseníase. Desde a última
década, o Brasil vem apresentando uma tendência de diminuição dos casos novos,
entretanto, essa realidade tem se transformado, obtendo-se um aumento de
números de casos entre o ano de 2017 e 2018, perfazendo 27.884 casos nesse último
ano [1]. Desses, a região nordeste apresenta-se com maior endemicidade,
sendo responsável por aproximadamente 11.420 casos novos [4].
Integrante da região
Nordeste, o estado da Paraíba tem se mostrado ativo no combate a hanseníase,
tendo registrado no ano de 2018, 510 casos novos, e sua capital, João Pessoa,
233 casos novos, alcançando no ano de 2016 a meta de possuir menos de 1
caso/10.000 habitantes [4].
Cerca de 25% das
pessoas com hanseníase manifestam alguma incapacidade. No Brasil, aproximadamente
23,3% dos casos registrados anualmente apresentam graus de incapacidade física
(GIF) I e II, fazendo-se importante a realização do acompanhamento destes por
parte dos profissionais de saúde [5]. Acredita-se que não exista outra doença
que produza tantas incapacidades físicas, emocionais e sociais como a
hanseníase [6].
No âmbito da prevenção
e controle de incapacidades, o autocuidado se estabelece como uma das
principais estratégias. O mesmo pode ser definido como a realização de atividades
cotidianas que atuam em prol da manutenção de sua vida, saúde e bem-estar,
podendo ser influenciado por habilidades, limitações, condições culturais,
sociais e econômicas que interferem de modo direto na saúde de quem o realiza
[7]. As demandas de autocuidado estão diretamente relacionadas aos olhos, face,
membros superiores e inferiores, considerando-se que são os principais sítios
de acometimentos cutâneo e neural [8].
Na perspectiva de
relacionar às funções humanas essenciais para a manutenção da saúde e do
bem-estar dos indivíduos, Dorothea Elizabeth Orem, propôs que os indivíduos,
quando capazes, devem cuidar de si mesmos. Em face do surgimento da
impossibilidade de realizar estas atividades básicas, torna-se necessário a
intervenção do cuidado através de um terceiro, tornando assim o ser que não
exerce a prática, dependente de outrem [9].
Em se tratando da
hanseníase, as práticas de cuidado para consigo faz parte da abordagem de
manutenção do tratamento, a partir do momento em que o enfermeiro juntamente
com o paciente é capaz de identificar as condições e atividades necessárias
para desenvolvê-las de forma positiva [9].
A adesão ao autocuidado
depende de diversos fatores, posto que se trata de medidas cotidianas que devem
ser efetuadas por toda vida. Acredita-se que o indivíduo acometido pela
hanseníase além de ser afetado fisicamente pela doença, lida com o conflito
diário do paradigma que é cuidar-se e relacionar-se com as diversas ações de
cuidar de si mesmo [10].
Neste contexto, a
Estratégia Saúde da Família possui relevante importância no cumprimento do
papel da promoção, prevenção e controle de agravos na saúde pública, devendo a
hanseníase ser tratada de forma prioritária através da poliquimioterapia(PQT)
disponível no Sistema Único de Saúde. Além
disso, ações de educação em
saúde e avaliação das capacidades dos utentes
são atividades válidas e
essenciais para instrução e realização do
autocuidado [11].
Em face ao exposto, é
fundamental avaliar as competências dos utentes ao tratamento para viabilizar a
promoção de estratégias e ações educativas direcionadas e, portanto, mais
efetivas. Nesta perspectiva, o objetivo deste estudo é investigar as
competências dos pacientes com hanseníase, atendidos na atenção primária à
saúde, direcionado a ações de autocuidado.
Trata-se de estudo
quantitativo, que foi desenvolvido com pacientes acometidos pela hanseníase e
atendidos nas Unidades de Saúde da Família (USF) da rede de atenção primária a
saúde, localizadas no município de João Pessoa, Paraíba, Brasil.
A
atenção básica deve
ser responsável pela resolução de aproximadamente
80% de todos os problemas de
saúde da população, desempenhando papel importante
nas políticas direcionadas à
prevenção de agravos e à promoção da
saúde [12]. No município de João Pessoa,
as USF estão distribuídas em cinco distritos
sanitários, a saber:
A população do estudo
foi constituída por indivíduos acometidos pela hanseníase que atendessem aos
seguintes critérios de inclusão: idade maior a 18 anos; em tratamento a partir
da 2ª dose de PQT, e em um dos cenários da pesquisa; e apresentar capacidade
cognitiva preservada (autorreferida ou percebida pela
pesquisadora). Foram utilizados como critérios de exclusão: casos novos da
doença, tendo em vista que estes podem apresentar alguma das fases do luto e
não aceitação da sua condição de saúde; pacientes em tratamento apenas de
reação hansênicas e em alta por
cura/abandono/transferência.
Assim, após realizada
busca ativa em todos os distritos sanitários do município, foram constatados 44
indivíduos cadastrados em tratamento para doenças. Desses, 03 eram menores de
idade, 03 haviam descontinuado o tratamento por abandono, 01 já havia
comparecido ao serviço para receber a última dose supervisionada e, por isso,
não retornaria, 03 não aceitaram participar da pesquisa.
Dos 34 pacientes
selecionados, 12 não foram contactados pela
inviabilidade de acesso pelo contexto socioespacial em que habitavam, sendo
estas áreas de difícil acesso, violência urbana e vulnerabilidade à
pesquisadora. Assim, foram entrevistados e compuseram a amostra 22 indivíduos.
A coleta de dados foi
realizada entre os meses de janeiro a março de 2017, através de dois
instrumentos estruturados. O primeiro contendo dados sociodemográficos (sexo,
idade, nível de escolaridade, estado civil, renda familiar média, religião), e
clínico-epidemiológicos (dose do tratamento, classificação operacional, status
de baciloscopia, forma clínica, grau de incapacidade física no diagnóstico,
comprometimento neural, presença de doenças associadas, ocorrência de reações hansênicas, presença de úlceras palmares e plantares e
neurite).
O segundo instrumento
utilizado foi a escala Appraisal of Self-care Agency – ASA (Avaliação
da competência para o autocuidado) com o intuito de mensurar a capacidade do
indivíduo para engajar-se em intervenções essenciais ao seu cuidado. A escala
foi desenvolvida por Isenberg, Evers
e Philipsen em 1987, baseado na Teoria de Enfermagem
de Dorothea Orem, sendo seu conteúdo validado pela mesma e outras 8 doutoras,
com especialidade no conceito que diz respeito ao autocuidado. A escala é
exposta em dois formatos, ASA-A_Autoavaliação e ASA-A_Avaliação por outros, sendo a primeira adaptada e
validada para cultura brasileira e denominada Escala para avaliar a capacidade
de autocuidado [13].
A ASA-A é composta por
24 itens com atribuições de valores que variam entre 1 e 5, associada com uma
escala Likert na seguinte disposição: 1 (discordo
totalmente), 2 (discordo), 3 (nem concordo nem discordo), 4 (concordo) e 5
(concordo totalmente). As respostas têm valor mínimo de 24 pontos e máximo de
120, sendo a pontuação máxima relacionada à melhor capacidade [13].
Os dados obtidos foram
analisados através de técnicas de estatística descritiva e inferencial. Foram
tabulados e codificados no Microsoft Office Excel 2016 para posterior análise
no software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS)
versão 21.0 utilizando os testes U de Mann-Whitney e Kruskal
Wallis.
O projeto foi aprovado no Comitê de Ética e
Pesquisa (CEP) do Centro de Ciências em Saúde da Universidade Federal da
Paraíba, sob o protocolo n°1.824.702 e de acordo com o Certificado de
Apresentação para Apreciação Ética de número 59488616.2.0000.5188. Ressalta-se
que foram obedecidas todas as observâncias éticas contempladas na Resolução n°
466/12 do Conselho Nacional de Saúde.
Os dados compilados
apontam predominância dos entrevistados com idade variando entre 21 e 84 anos
com média de 52 anos, sexo feminino (54,5%), estado civil (54,5%), religião
católica (63,6%). Quanto à escolaridade e renda, 40,9% referiram possuir o
ensino médio completo e 63,6% renda menor ou igual a um salário mínimo.
Clinicamente
sobressaíram-se os casos multibacilares (81,8%),
baciloscopia positiva (50%), forma clínica dimorfa
(40,9%). Aproximadamente 40% dos indivíduos tiveram classificação do GIF
desconhecida/não registrada em seus prontuários, e em sua maioria não
apresentaram comprometimento neural em face (68,2%), membros superiores (59,1%)
e membros inferiores (50%). Quanto às reações hansênica,
72,7% relataram a ausência de episódio e 77,3% não referiram neurite.
Para os resultados da
escala, a Tabela I apresenta a sua distribuição de acordo com as categorias. O
valor mínimo obtido foi de 68 pontos (categoria regular) e o máximo de 114
pontos (ótima), com média de 92 pontos (DP ± 13,37) (categoria muito boa).
Tabela I – Distribuição quantitativa das categorias de pontuação da Escala Appraisal of self-Care Agency, de acordo com
frequência e percentual. João Pessoa, PB, 2017. (N=22)
Fonte: Dados da
pesquisa, 2017.
As tabelas II e III
exibem a associação entre a classificação da escala ASA-A e as variáveis
sociodemográficas e clínico-epidemiológicas, sendo observada relevante
associação apenas entre a variável acometimento da face e classificação
operacional com p-valor ≤ 0,05.
Tabela II
– Distribuição quantitativa cruzada,
relacionando as características sociodemográficas e categorias de pontuação da
escala ASA-A. João Pessoa/ PB, 2017. (N=22).
*Os dados não
obtidos/ignorados não foram contabilizados para o p-valor; **Teste de Mann
Whitney; *** Teste de Kruskal Wallis. Fonte: Dados da
pesquisa, 2017.
Tabela
III – Distribuição quantitativa cruzada,
relacionando as características clínicas e categorias de pontuação da escala
ASA-A. João Pessoa/PB, 2017(N=22).
Fonte: Dados da
pesquisa, 2017; *Os dados não obtidos/ignorados não foram contabilizados para o
p-valor; #P-valor significativo estatisticamente; **Teste de Mann Whitney; ***
Teste de Kruskal Wallis.
Os resultados apontam
amostra majoritariamente do sexo feminino, com ensino médio incompleto e renda
menor ou igual a um salário mínimo. Quanto à classificação na Escala ASA-A
72,7% apresentaram capacidade para se autocuidar
entre boa (31,8%) e muito boa (40,9%). Quanto às associações das
características sociodemográficas e clínicas com as classificações, apenas o
acometimento facial e classificação operacional, tiveram valores
estatisticamente significativos (p ≤ 0,05).
A hanseníase continua
sendo considerada um dos grandes problemas de saúde pública do Brasil, que
apesar de ser uma enfermidade curável e tratável, sua alta prevalência se dá
por consequência de uma evolução lenta, silenciosa, com rápida facilidade de
proliferação de focos de infecções, atingindo alto comprometimento de
incapacidades física no acometido. Quanto mais tardio o diagnóstico, maior a
chance de acarretar grandes complicações e sequelas, comprometendo a qualidade
de vida daqueles que possui a doença [14].
Partindo-se desse
pressuposto, acredita-se que a realização de ações de autocuidado seja de
fundamental importância para minimizar ou prevenir consequências, como
incapacidades para atividades laborais do cotidiano e deformidades físicas, e
auxiliar o indivíduo no reconhecimento de sua dor, de suas angústias,
esperanças e perspectivas [10].
Nesse
contexto
preponderante os achados desta amostra são de grande
relevância, pois apontam a
presença de relações atitudinais favoráveis
a capacidade de autocuidado dos
indivíduos. Quando isso é propiciado pela
atenção primária à saúde, há
ainda
melhores prognósticos, uma vez que neste nível de
atenção devem ser
intensificadas ações relacionadas à
prevenção de agravos e a promoção à
saúde
[15], contribuindo para uma melhor qualidade de vida dos
indivíduos.
Visando a prevenção de
incapacidades por meio da prática do autocuidado, infere-se a importância de
implementação de estratégias que busquem avaliar a capacidade que o indivíduo
tem de realizar o cuidado do seu próprio corpo. O autocuidado configura-se como
ferramenta principal para a prevenção e controle dos agravos. Os profissionais
de saúde atuam junto ao cliente para proporcionar medidas educativas que
incentivam a adesão e realização do autocuidado continuamente. Nesse contexto,
a avaliação da capacidade para tais atividades faz com que o profissional possa
traçar métodos educativos para auxiliar o paciente dentro das limitações e
individualidades de cada ser [16].
Consubstancia-se,
portanto a inovação deste estudo ao buscar esclarecer arestas tão pouco
evidenciadas na literatura, muito embora a capacidade de autocuidado esteja
intrinsecamente relacionada com a adesão ou não do indivíduo a prática. A
afirmativa se confirma ao observar a associação estatisticamente significativa
entre a capacidade para autocuidado (avaliada pela escala ASA-A) e as
características clínicas da amostra.
Quanto à associação da
ASA-A com o acometimento facial pode-se hipotetizar
que por ser um local de grande visibilidade e graves formas de deformidades (logoftalmo, triquíase, perda de
cílios, entre outros), os participantes apresentam a tendência e a capacidade
de prover ações de autocuidado com essa área especificamente.
É válido enaltecer a
necessidade de avaliar de forma cautelosa e criteriosa este sítio corporal.
Quando alojadas, as incapacidades poderão evoluir para deformidades trazendo consigo
as dificuldades de realização de atividades diárias, perda de identidade
restringindo ainda mais o convívio social [16].
Outro estudo enfatiza
ainda que as alterações na estrutura e função corporais acarretadas pela
hanseníase levam os pacientes a apresentarem mudanças na percepção da própria
imagem corporal e se tratando principalmente da face, há relatos responsáveis
por mudanças de concepção da própria identidade daqueles indivíduos [10].
Outro dado a ser
destacado neste estudo concerne à associação significativa entre a escala ASA-A
e a classificação operacional para hanseníase. Evidencia-se que os indivíduos
com maior carga bacilar estão mais propensos a se autocuidar
ao passo que foram classificados com maior grau de capacidade conforme escala
avaliativa.
O acometimento pelas
formas multibacilares da doença, aumenta em nove
vezes a chance de desenvolver algum grau de incapacidade física. Tendo isso
como referência, acredita-se que há nesse caso uma consciência de risco que
justifique esse valor significativo pelos entrevistados [17].
Estudo aponta que a
maior frequência da forma clínica existente da hanseníase são as multibacilares, e é neste grupo que ocorre a maioria das
deformidades e incapacidades visíveis na hanseníase, sendo considerada a mais
grave complicação da doença. Esse fato contribui para que esses indivíduos
tenham a compreensão do risco em que estão expostos, fazendo com que os utentes
aflorem a necessidade das realizações das ações de autocuidado, através dessa
consciência de risco [18].
Ainda nesse contexto, a
percepção que o indivíduo tem sobre seu próprio corpo é uma maneira de poder
auxilia-lo a reconhecer sua dor, angustias, esperanças e perspectivas e, desse
modo, poder acrescentar novos conceitos na prática educativa em autocuidado
[10].
A capacitação da
realização do autocuidado nem sempre está interligada com a prática da mesma.
Muitas vezes o sujeito possui competência para praticar o cuidado consigo mesmo
em prol da sua própria saúde, mas pouco se é explorado sobre esse domínio, ou
seja, o indivíduo que tem boa capacidade para o autocuidado não necessariamente
o pratica, porém, conhecer sobre sua capacidade é uma vertente que pode ser
explorada para a adesão desse utente.
Nesse sentido, o estudo
limita-se apenas à avaliação da capacidade, não considerando as práticas e suas
realizações em si, visto que os participantes podem apresentar boas ou ótimas
competências, mas não concretizam a execução do autocuidado. Portanto, é
necessário que outros estudos analisem tais práticas, suas frequências e
qualidades.
Além disso, ressalta-se
inviabilidade de acesso a alguns indivíduos em virtude de dificuldades
estruturais, violência urbana e vulnerabilidade à pesquisadora. Neste contexto,
faz-se necessário a realização de novos estudos com a utilização da escala
ASA-A para ampliação do debate e fortalecimento da importância da adesão ao
autocuidado.
O fato de o indivíduo
ser acometido pela hanseníase remete a uma avalanche de consequências negativas
em relação a sua vida física, psíquica e sociocultural, provinda,
principalmente, pelas incapacidades e deformidades físicas que acarretam junto
a si o estigma, discriminação, preconceito, exclusões e desestruturação da
imagem corporal, que podem ser evitadas pela aderência ao autocuidado.
Diante dos dados
expostos, pode-se observar uma taxa majoritária dos entrevistados apresentando
competência para se autocuidar. A mensuração dessa
capacidade é importante para compreender a efetividade da realização do
autocuidado e através deste poder construir uma melhor assistência integral ao
paciente, respeitando sua individualidade.
Concernente aos demais
achados neste estudo, pode-se perceber a interligação entre o sítio corporal
facial, assim como a forma clínica predominante multibacilar,
como fatores predispostos que se aproximam à adesão da prática do autocuidado.
Neste sentido, é
necessária a realização de treinamentos/capacitações dos profissionais de saúde
de forma continuada para subsidiar o tratamento e a prevenção de incapacidades
através do autocuidado, levando em consideração as particularidades, limitações
e aspectos culturais, assim como o potencial de cada indivíduo para exercer o
autocuidado.