ARTIGO ORIGINAL

Eficácia da aplicação do banho de clorexidina na prevenção de infecção da corrente sanguínea relacionada ao uso de cateter vascular central em pacientes de unidade de terapia intensiva de um hospital brasileiro

 

Suziane do Socorro dos Santos, M.Sc.*, Thiago Emanuel de Queiroz Batista**, Irna Carla do Rosário Souza Carneiro, D.Sc.***, Tereza Cristina de Oliveira Corvelo, D.Sc.****

 

*Professora da Universidade da Amazônia (Unama), **Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará, ***Professora da Universidade Estadual do Pará (UEPA) e da Universidade Federal do Pará (UFPA), ****Professora titular da Universidade Federal do Para (UFPA)

 

Recebido em 10 de outubro de 2018; aceito em 2 de julho de 2019.

Correspondência: Thiago Emanuel de Queiroz Batista, Passagem Cabedelo, 4/806 Ed. Meridiano 6612-320 Belém PR

 

Thiago Emanuel de Queiroz Batista: thiago.qbatista@gmail.com

Suziane do Socorro dos Santos: susocorrosantos@gmail.com

Irna Carla do Rosário Souza Carneiro: irnajula@uol.com.br

Tereza Cristina de Oliveira Corvelo: tereza@ufpa.br

 

Resumo

O banho de clorexidina tem sido estudado na prevenção de infecção primária da corrente sanguínea relacionada ao cateter vascular central (IPCS-CVC), como medida para controlar esta infecção. O objetivo da pesquisa foi avaliar a eficácia do uso de clorexidina na higienização do corpo para reduzir a incidência de IPCS-CVC em UTIs. Trata-se de um estudo de coorte retrospectiva, na UTI, em pacientes que fizeram uso de cateter vascular central, no período entre julho e dezembro de 2014. Neste estudo, a densidade das taxas de IPCS-CVC não diferiu entre o grupo de pacientes submetidos à intervenção com banhos de clorexidina e o grupo controle, cujos valores estimados foram de 3,04 e 5,74 IPCS-CVC por 1000 CVC/dia, respectivamente, podendo ser atribuído a uma considerável proporção de bacilos Gram negativos na etiologia das IPCS-CVC, diferenças na concentração de clorexidina aplicada no banho dos pacientes e a maior gravidade dos pacientes do grupo da intervenção. O pequeno tamanho amostral e o tempo curto de intervenção influenciaram no poder do teste estatístico. Acredita-se que outros estudos, utilizando maior tamanho amostral e tempo de intervenção, devem ser realizados para buscar melhor entender a eficácia do banho de clorexidina na prevenção de IPCS-CVC em cenários de terapia intensiva.

Palavras-chave: clorexidina, higiene da pele, infecções relacionadas a cateter.

 

Abstract

Effectiveness of chlorhexidine bathing to prevent catheter-associated bloodstream infections among patients in medical intensive care unit of a Brazilian hospital

The chlorhexidine bath has been studied in the prevention of primary infection of the bloodstream related to the central vascular catheter (BSI-CVC) as a measure to control this infection. The objective was to evaluate the effectiveness of the use of chlorhexidine in the hygiene of the body to reduce the incidence of BSI-CVC in ICUs. This is a retrospective cohort study in the ICU, between July and December 2014. In this study, the density of the BSI-CVC rates did not differ between the patients group with chlorhexidine baths and the control group, whose estimated values were 3.04 and 5.74 BSI-CVC per 1000 CVC/day, respectively, and can be attributed to a considerable proportion of Gram negative bacilli in the etiology of BSI-CVC, differences in the concentration of chlorhexidine applied in the bath of the patients and the greater severity of the patients of the intervention group. The small sample size and short intervention time influenced the power of the statistical test. It is believed that other studies using a larger sample size and intervention time should be performed to better understand the effectiveness of the chlorhexidine bath in the prevention of BSI-CVC in intensive care settings.

Key-words: chlorhexidine, skin care, catheter-related infections.

 

Resumen

Eficacia del baño de clorhexidina en la prevención de infección de la corriente sanguínea relacionada al uso de catéter venoso central en pacientes de unidad de cuidados intensivos de un hospital brasileño

El baño de clorhexidina ha sido estudiado en la prevención de infección de la corriente sanguínea relacionada al catéter venoso central (ICSRC). El objetivo fue evaluar la eficacia del uso de clorhexidina en la higienización del cuerpo para reducir la incidencia de ICSRC en UCI. Se trata de un estudio de cohorte retrospectiva, en la UCI, entre julio y diciembre de 2014. En este estudio, la densidad de las tasas de ICSRC no difería entre el grupo de pacientes que fueron sometidos a la intervención con baños de clorhexidina y el grupo control, cuyos valores estimados fueron de 3,04 y 5,74 ICSRC por 1000 CVC / día, respectivamente, pudiendo ser atribuido a una considerable proporción de bacilos Gram negativos en la etiología de las ICSRC, diferencias en la concentración de clorhexidina aplicada en el baño de los pacientes y la mayor gravedad de los pacientes del grupo de intervención. El pequeño tamaño muestral y el tiempo corto de intervención influenciaron en el poder del test estadístico. Se cree que otros estudios utilizando mayor tamaño de muestras y tiempo de intervención deben ser realizados para buscar mejor entender la eficacia del baño de clorhexidina en la prevención de ICSRC.

Palabras-clave: clorhexidina, cuidados de la piel, infecciones relacionadas con catéteres.

 

Introdução

 

As infecções relacionadas à assistência em saúde (IRAS) são adquiridas durante a prestação dos cuidados de saúde. São os eventos adversos associados a assistência em saúde mais frequentes e apresentam uma alta morbidade e mortalidade repercutindo diretamente na segurança do paciente e consequentemente na qualidade dos serviços [1]. E considerando que a maioria das infecções é relacionada a dispositivos invasivos, estes são os alvos prioritários das medidas de prevenção e controle por serem considerados fatores de riscos passíveis de intervenção [2].

O uso do cateter venoso central (CVC) é apontado como um dos principais fatores relacionados às IRAS [3]. Ele ocasiona uma das mais graves complicações que é a infecção primária da corrente sanguínea relacionada a cateter venoso central (IPCS-CVC) [4].

De acordo com alguns estudos desenvolvidos, há uma comprovação de que o gluconato de clorexidina (CHG) pode ser eficaz para a redução da IPCS-CVC, uma vez que este tem uma ampla atividade antimicrobiana e um efeito residual prolongado [5]. A recomendação seria utilizar na limpeza diária da pele do paciente como uma estratégia de controle de infecção adjuvante, que reduz a densidade de potenciais patógenos diminuindo a infecção [6].

Segundo Climo et al. [8] e Bleasdale et al. [8], a clínica diária de banho com CHG tende a diminuir a incidência de IPCS-CVC e a transmissão de microrganismo multirresistentes [7,8].

No estudo de Munoz-Price et al. [9], observou-se que após a implementação de banhos de CHG, houve uma redução imediata das taxas de IPCS-CVC. No final da intervenção, ocorreu uma redução global de 99% na taxa dessas infecções e o percentual de infecção polimicrobiana diminuiu de 25% para 3% durante o período de intervenção [9].

O estudo buscou identificar se o banho com CHG poderia ser mais uma medida para conter as IPCS-CVC. Logo, buscamos avaliar a eficácia do uso de CHG na higienização do corpo para reduzir os índices de IPCS-CVC.

 

Material e métodos

 

Trata-se de um estudo observacional do tipo caso-controle aninhado em uma coorte retrospectiva, a partir de uma intervenção executada a priori através do Setor de Controle de Infecção Hospitalar de um estabelecimento privado de saúde na cidade de Belém/PA, no cenário de UTI, em pacientes que fizeram uso de cateter venoso central, entre os meses de julho a dezembro de 2014.

A amostra estimada deste estudo envolveu um número fixo de 57 pacientes que foram internados na UTI e que tiveram um cateter venoso central inserido no período da intervenção acima referido, nos quais se utilizaram os banhos com CHG e 119 pacientes nas mesmas condições, mas que não passaram pelo processo de banho com CHG. A pesquisa foi realizada em um hospital da rede privada do município de Belém/PA.

Os critérios de inclusão corresponderam à clientela atendida pelo estabelecimento, conforme estudo de intervenção já mencionada, onde todo o paciente que possuiu um CVC inserido na UTI foi selecionado, passando a realizar o procedimento do banho com CHG 24 horas após a inserção. Neste caso, foram incluídos os sujeitos que preencheram um dos seguintes critérios associados ao uso de cateter venoso central como: neoplasia, insuficiência renal crônica (IRC), sepse e outras patologias se relacionadas ao uso de CVC.

Não foi permitida a participação no estudo, dos sujeitos que apresentaram pelo menos um dos seguintes critérios de exclusão: Já tinham sido admitidos na UTI com CVC; já apresentavam CVC antes de iniciado o estudo; pacientes com histórico de alergia ou manifestação de reação cutânea após o primeiro banho com CHG.

Durante o período do acompanhamento foram realizados banhos diários com CHG degermante a 2% nos pacientes selecionados para o estudo. Os que não foram incluídos realizaram banhos normais com água e sabão, e foram acompanhados para posterior comparação com o grupo de estudo. A execução do banho consistiu em realizar a higienização com o produto na área próxima ao cateter venoso central, dando ênfase aos cuidados com este dispositivo.

Os banhos dos pacientes selecionados foram mantidos até a retirada do CVC na UTI ou alta do paciente da unidade. Todos os membros da equipe de enfermagem foram treinados e supervisionados pelo setor do SCIH para realizarem o banho com CHG. O banho ocorreu com CHG degermante a 2% (almotolias de 100 ml individualizadas), utilizando também água, sabão e compressa.

As informações referentes a cada um dos pacientes envolvidos na pesquisa foram obtidas via prontuário eletrônico com registros de variáveis como idade, sexo, atendimento, uso de dispositivos invasivos, tempo de permanência do cateter, presença de hemodiálise, procedimentos cirúrgicos, recebimento de antibiótico, APACHE II (Acute Physiology and Chronic Health Evalution), condições imunossupressoras, tempo de permanência hospitalar e mortalidade intraunidade.

Os dados foram condensados em uma planilha do Excel onde foi identificada a data de adesão do paciente ao projeto, quantos dias ele permaneceu no estudo, data de inserção do cateter e hemocultura positiva, microrganismos isolados, evolução clínica e desfecho. Foi estimada a densidade de infecção hospitalar para a população em estudo.

Este protocolo de pesquisa foi cadastrado na Plataforma Brasil da CONEP (CNS/MS) foi submetido à apreciação, julgamento e aprovação através do CEP do ICS/UFPA conforme rege a Resolução Nº466/2012, sob os aspectos éticos envolvendo a pesquisa com seres humanos, sendo aprovado com número CAAE: 44261315.6.0000.0018.

Os dados, processados em banco de dados criado pelo software Statistical Package for Social Sciences (SPSS) for Windows versão 20.0 (nível de significância do estudo de 5%).

Na análise bivariada, verificou-se a associação entre cada uma das variáveis independentes e com as variáveis dependentes de Infecção Primária da Corrente Sanguínea (IPCS) e uso da clorexidina para a higienização. Nesta situação, foi realizada análise pelo teste qui-quadrado (c2). Em algumas variáveis foi utilizado o teste Exato de Fisher e Teste G.

Para determinar se houve diferença nos resultados preliminares, foi calculada a diferença de incidência (por 1.000 dispositivos-dia) entre os dois grupos. Todas as variáveis pesquisadas foram dicotomizadas. Na análise multivariada, utilizou-se a análise de regressão logística para a análise das variáveis independentes associadas ao desfecho do Estudo (IPCS), calculando a razão de chances (odds ratio - OR), controladas por possíveis fatores de confusão (OR ajustada). Definiu-se o nível de significância de 0,20 para a inserção de cada variável no modelo de predição para higienização com clorexidina, sendo utilizado o nível de 0,05 para a sua remoção para o melhor ajustamento no referido modelo. Na sequência, definiu-se um modelo com as variáveis que melhor determinaram a ocorrência da IPCS. Nestas análises foi aplicado o programa STATA 12.0, adotando-se o nível de significância de 5%.

 

Resultados

 

Foram estudados 176 pacientes, divididos em dois grupos englobando os casos e os controles, correspondendo a 57 e 119, respectivamente, totalizando 5.603 paciente/dias. No período estudado ocorreram 26 episódios de IPCS-CVC com densidade de 3,04 (6 casos / 1974 CVC-Dias * 1000) no grupo intervenção, e 5,74 (20 casos / 3486 CVC-Dias * 1000) no controle.

A IPCS-CVC esteve presente em 17,0% (24/142) dos casos de óbitos, dos quais 13,95% (6/43) no grupo de casos e 25% (18/72) no grupo de controles. A permanência média dos cateteres venosos centrais foi de 28 dias nos casos e 23 dias nos controles. A média do APACHE nos casos foi de 26 e no controle de 27.

A frequência de pacientes que desenvolveram infecções em outros sítios, além de IPCS-CVC, atingiu 80,76%. Entretanto, nenhuma diferença significativa foi observada entre a distribuição do grupo de casos (83,3%) e de controles (80,76%) (Tabela I).

No grupo de casos, 33,3% (2/6) dos microrganismos identificados em hemoculturas foram MDR, enquanto que, nos controles, os MDR corresponderam a 20% (4/20), não demonstrando diferença estatisticamente significante entre ambos os grupos (Tabela II).

Em relação ao perfil epidemiológico destes pacientes, os episódios de IPCS-CVC foram mais presentes em pacientes com idade acima de 60 anos em ambos os grupos. No entanto, não houve diferença estatística significativa entre eles. Em relação aos episódios de IPCS-CVC e a presença ou ausência de neoplasias também não foram observadas diferenças significativas entre os grupos (Tabela III).

Quando se comparou o grupo intervenção (higienização com clorexidina) com o controle (higienização sem clorexidina), foram observadas diferenças significativas, quanto a frequência do diagnóstico de sepse e presença de APACHE II maior que 25 no grupo de casos, e utilização da sonda vesical de demora no grupo controle (Tabela IV e Tabela V).

 

Tabela I - Frequência de indivíduos que desenvolveram Infecção Relacionada à Assistência à Saúde (IRAS) segundo topografia da infecção, Belém/PA, 2014-2015.

 

*p = probabilidade do teste G.; PNM = Pneumoniae; IPCS = Infecção Primária da Correntes Sanguínea; ITU = Infecção do Trato Urinário.

 

Tabela II - Distribuição dos indivíduos que foram submetidos à higienização com ou sem clorexidina, Belém/PA, 2014-2015.

 

*p = probabilidade do teste Exato de Fisher.

 

Tabela III - Doença de base de indivíduos que foram submetidos à higienização com ou sem Clorexidina, Belém/PA, 2014-2015.

 

P = probabilidade do teste G.

 

Tabela IV - Distribuição de indivíduos que foram submetidos à higienização com ou sem clorexidina segundo variáveis de caracterização, Belém/PA, 2014-2015

 

p: probabilidade do teste estatístico; *Teste do qui-quadrado; #Teste Exato de Fisher.

 

Tabela V - Modelo de regressão logística de associação de variáveis que realizaram o banho com clorexidina, Belém/PA, 2014-2015.

 

OR bruta* = razão de chances (OR) com variáveis não ajustadas - análise bivariada. IC95% = Intervalo de confiança de 95%; OR ajustada** = OR com variáveis ajustadas entre si - análise múltipla; p: probabilidade do teste qui-quadrado.

 

Discussão

 

Os achados desta investigação demonstraram que o banho diário com CHG não teve influência na aquisição de IPCS-CVC, diferindo de outros trabalhos que também aplicaram similar intervenção de higienização com CHG [10-12].

Alguns autores sugeriram que tais banhos podem não ser necessários, determinando diminuição de custos e uma exposição desnecessária ao produto, evitando, portanto, consequências negativas na evolução clínica [13]. Portanto, esforços para reduzir a incidência dessas infecções deveriam se concentrar apenas em intervenções onde a eficácia e o efeito benéfico da substância tenham sido comprovados.

Assim, com este estudo observou-se que os resultados da avaliação do banho diário com CHG não determina uma redução significativa na incidência de IPCS-CVC. Mas, acredita-se que não se pode desconsiderar a limitação do estudo, cujos achados da análise estatística não significativa pode ser consequência direta do pequeno tamanho amostral. Em virtude de que o grupo submetido a intervenção correspondeu a 57 pacientes, destes 10,5% (6/57) desenvolveram IPCS, enquanto que no grupo controle esta estimativa correspondeu a 16,8% dos pacientes (20/119).

A análise do perfil clínico-epidemiológico dos pacientes evidenciou que eles ficavam mais de 15 dias em uso de cateter considerado de uso temporário, não ocorrendo diferença entre os grupos quanto ao tempo de cateter, onde a média de CVC-dia foi de 28 no grupo intervenção e 23 no grupo controle. A recomendação quanto ao seu tempo de utilização é de cerca de 10-14 dias [14].

Como a clorexidina atua principalmente em microrganismos Gram positivos, o esperado era que no grupo de intervenção ocorresse uma redução neste perfil. No entanto, o observado foi uma frequência igual de microrganismos Gram positivos nos dois grupos, apresentando uma diferença não significativa no perfil microbiológico dos agentes causadores de IPCS-CVC.

Foi identificado também que além da IPCS-CVC estes pacientes apresentaram outras infecções como pneumonia e infecção do trato urinário, o que leva a compreender que o CHG não apresentou influência nos demais focos infecciosos.

Nos pacientes analisados foi utilizado um elevado número de sondas vesicais, fato importante porque podemos relacioná-lo com a gravidade dos pacientes, pois estes estariam em risco maior para infecção, aliado ao fato de que pacientes em uso de cateter vesical possuem mais um mecanismo para entrada de bactérias, que é o próprio cateter.

Outro achado quanto ao perfil desses pacientes diz respeito ao predomínio de pacientes idosos, uma vez que a infecção adquirida em ambiente hospitalar assume grande importância nesse grupo devido à alta taxa de letalidade.

O diagnóstico de sepse no momento da admissão foi mais frequente no grupo intervenção, gerando uma diferença significativa com o grupo controle. Neste caso, pacientes com esse diagnóstico estão mais propensos a aquisição de novas infecções, o que pode dificultar a mensuração da eficácia dos banhos.

A elevada proporção de pacientes que apresentaram doença de base grave à admissão reforça a ideia da complexidade diagnóstica e terapêutica que foi requerida por esta população, pois estes buscam um suporte com cuidados intensivos o que gera muitas intervenções invasivas, o que favorece o aparecimento das IRAS [15].

Quanto ao APACHE, a média nos dois grupos estudados foi de 27 pontos, um valor considerado elevado. Segundo Feijó et al. [17], pacientes admitidos com APACHE II maior que 25 pontos evoluem para o óbito em mais de 50% [16].

Em face de tais resultados, esta análise clínica-epidemiológica demonstrou que eles já possuíam um perfil de risco, devido as suas comorbidades e imunodepressão. Neste caso, já eram pacientes com alto risco para infecção. Então, considerando tais fatores de risco, nenhuma diferença significativa foi detectada em relação à ocorrência de IPCS-CVC entre o grupo de casos e controles.

Neste aspecto, se faz necessário uma avaliação criteriosa de cada paciente que será selecionado para receber o banho com CHG, considerando o grave estado de saúde, para que assim a ação deste produto possa ser significativamente avaliada na evolução desses pacientes.

Comparando o perfil dos pacientes deste estudo com a literatura revisada [12,14,18], foram identificadas que nas demais pesquisas não foram trabalhadas todas as variáveis utilizadas no estudo, os demais autores caracterizam esses pacientes como uma grande diversidade clínica.

Entre os estudos revisados na literatura [11,12,15] que apresentaram eficácia no banho, a metodologia consistiu em utilizar durante o banho panos impregnados com CHG a 2%, onde cada pano tinha o equivalente a 500 mg de clorexidina, e cada paciente utilizou 6 panos de CHG, distribuídos na higienização de diferentes áreas do corpo todo em cada banho. Em geral, no Brasil, as instituições hospitalares utilizam as almotolias de 100 ml a 2% do produto que foram aplicadas somente em áreas adjacentes e no local de inserção do cateter.

Sendo assim, este estudo foi desenvolvido com as variações acima descritas em consonância com a realidade brasileira, embora mantendo sempre um valor equivalente de 2% na concentração de clorexidina, pois, de acordo com Southern, o efeito do CHG varia em função de sua concentração, de modo que em altas concentrações oferece efeito bactericida, enquanto em baixas concentrações tem efeito bacteriostático [18]. Logo, a eficácia do produto depende de uma concentração adequada e parece não estar ligada com a forma como foi aplicado nos pacientes.

Em termos gerais, ainda se constatam resultados conflitantes entre os diversos estudos, indicando que estudos adicionais devem ser realizados para validar estes procedimentos antes de incorporá-los na prática de rotina nas UTIs, especialmente, levando em consideração custos adicionais do seu uso e a possibilidade de desenvolvimento de resistência a clorexidina.

Neste sentido, é importante mencionar a relevância de estudos regionais e nacionais que devem ser traçados na busca de melhor atender o perfil dos nossos pacientes em UTI, e ainda com a garantia de dispor dos recursos materiais, que permitam viabilizar a reprodutibilidade de métodos consistentes capazes de avaliar de maneira segura e eficiente este tipo de intervenção.

 

Conclusão

 

A densidade das taxas de IPCS-CVC não diferiu entre o grupo de pacientes submetidos à intervenção com banhos de CHG e o grupo controle, cujos valores estimados foram de 3,04 e 5,74 IPCS-CVC, respectivamente, por 1000 CVC/Dia. O que pode ser atribuído a uma considerável proporção de bacilos Gram negativos na etiologia das IPCS-CVC, diferenças na concentração do CHG, aplicação no banho dos pacientes e a maior gravidade dos pacientes do grupo da intervenção.

Em termos gerais, a comparação da eficácia terapêutica quanto à aplicação ou não do banho com clorexidina não diferiu em relação à aquisição da IPCS. Indubitavelmente o pequeno tamanho amostral e o tempo de intervenção limitado afetaram o poder do teste estatístico.

Acredita-se que outros estudos regionais e nacionais, utilizando maior tamanho amostral e tempo de intervenção, devem ser realizados para buscar melhor entender a eficácia do banho de CHG na prevenção de IPCS-CVC em cenários de terapia intensiva.

 

Referências

 

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