ARTIGO ORIGINAL
Mortalidade materna em Pernambuco: delineando o perfil
epidemiológico (2009-2013)
Luciana
Alves Lima de Melo Frutuoso*, Cândida Correia Pereira Barros**, Érika Maria
Alves da Silva***, Gabriela Cunha Schechtman Sette****, Ana Paula Esmeraldo Lima, D.Sc.*****
*Enfermeira, Secretaria Estadual de Saúde de
Pernambuco, Recife/PE, **Enfermeira, Mestrado Profissional em Avaliação em
Saúde, Secretaria Estadual de Saúde de Pernambuco, Recife/PE, ***Enfermeira,
Iniciação Científica no Núcleo de Telessaúde da UFPE,
Universidade Federal de Pernambuco, Recife/PE, ****Enfermeira, Pós-doutora pelo Centre for Health Service Studies na Universidade de Kent, Reino Unido, Professor
Adjunto do Departamento de Enfermagem da Universidade Federal de Pernambuco,
Recife/PE, *****Enfermeira, Professor Adjunto do Departamento de Enfermagem da
Universidade Federal de Pernambuco, Recife/PE
Recebido
em 16 de outubro de 2018; aceito em 4 de junho de 2019.
Correspondência: Ana Paula Esmeraldo
Lima, Universidade Federal de Pernambuco, Av. Prof. Moraes Rego, s/n -
Departamento de Enfermagem, Bloco A do Hospital das Clínicas– Cidade
Universitária, 50670-420 Recife PE
Ana
Paula Esmeraldo Lima: anapaulaesmeraldo@gmail.com
Luciana
Alves Lima de Melo Frutuoso: llimafrutuoso@hotmail.com
Cândida
Correia Pereira Barros: candidapereira2011@gmail.com
Érika
Maria Alves da Silva: contatoerikaalves@outlook.com
Gabriela
Cunha Schechtman Sette:
gabrielacssette@gmail.com
Resumo
Introdução: A mortalidade materna
é um grave problema de saúde pública e reflete a qualidade da assistência à
saúde das mulheres, sendo suas estatísticas uma importante ferramenta de gestão
de políticas públicas voltadas para esse público. Objetivo: Delinear o perfil
epidemiológico da mortalidade materna, assim como a variação da razão de
mortalidade materna no estado de Pernambuco, no período de 2009 a 2013. Métodos: Trata-se de estudo documental,
que utilizou dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade e do Sistema de
Informação de Nascidos Vivos, disponíveis na Secretaria de Saúde do Estado de
Pernambuco. Resultados: Foram
analisados 433 óbitos, com uma razão de mortalidade materna de 61,5 mortes por
cem mil nascidos vivos. 64,4% desses óbitos ocorreram na faixa etária de 20 a
35 anos, 63,5% eram pardas e 56,8% solteiras. Hipertensão, hemorragia, aborto e
infecção puerperal foram responsáveis por 2/3 das mortes. Conclusão: A razão de mortalidade materna encontrava-se acima da
média nacional, e as principais causas de óbitos foram consideradas evitáveis,
apontando para a necessidade de qualificar a atenção obstétrica no estado.
Palavras-chave: mortalidade materna,
saúde da mulher, causas de morte, estatísticas vitais, epidemiologia.
Abstract
Maternal
mortality in Pernambuco: delineating the epidemiological profile (2009-2013)
Introduction:
Maternal mortality is a serious public health problem and reflects the quality
of women's health care, and their statistics are an important tool for the
management of public policies aimed at this public. Objective: To delineate the epidemiological profile of maternal
mortality, as well as the variation of the maternal mortality ratio in the
state of Pernambuco, from 2009 to 2013. Methods:
This is a documentary study that used data from the Mortality Information
System and of the Live Birth Information System, available at the Health
Department of the State of Pernambuco. Results: 433 deaths were analyzed, with
a Maternal Mortality Ratio of 61.5 deaths per 100,000 live births. 64.4% of
these deaths occurred in the age group of 20 to 35 years, 63.5% were brown and
56.8% were single. Hypertension, hemorrhage, abortion and puerperal infection
were responsible for 2/3 of the deaths. Conclusion:
The maternal mortality ratio was above the national average, and the main
causes of death were considered avoidable, pointing to the need to qualify
obstetric care in the state.
Key-words:
maternal mortality, women's health, cause of death, vital statistics,
epidemiology.
Resumen
Mortalidad
materna en Pernambuco: descripción
del perfil epidemiológico (2009-2013)
Introducción:
La mortalidad materna es un
grave problema de salud pública y refleja
la calidad de la atención médica de las mujeres, y sus estadísticas son una herramienta importante de
gestión de políticas públicas para este público. Objetivo: Delinear el
perfil epidemiológico de la mortalidad
materna, así como la variación de la tasa de mortalidad materna en el estado de Pernambuco, de
2009 a 2013. Material y métodos: Este es un estudio documental que utilizó datos del Sistema de Información de Mortalidad y
Sistema de información sobre nacimientos
vivos, disponible en el Departamento de Salud del Estado de Pernambuco. Resultados: Se analizaron 433 muertes, con un
índice de mortalidad materna de 61.5 muertes por 100,000 nacimientos
vivos. El 64.4% de estas muertes ocurrieron
en el grupo de edad de 20-35 años, el 63.5% eran marrones
y el 56.8% solteros. La hipertensión, la hemorragia, el aborto espontáneo y la infección puerperal representaron 2/3 de las muertes. Conclusión: La tasa de mortalidad materna fue superior
al promedio nacional, y las
principales causas de muerte
se consideraron prevenibles,
lo que indica la necesidad de calificar la atención obstétrica en el estado.
Palabras-clave:
mortalidad materna, salud
de la mujer, causas de muerte, estadísticas vitales, epidemiología.
A
mortalidade materna (MM) representa um indicador social de grande magnitude no
Brasil e no mundo, sendo considerado um reflexo da condição socioeconômica e da
qualidade dos serviços de saúde de um país [1]. Apesar do progresso
considerável no último milênio na redução dos óbitos maternos, os índices ainda
se mantêm em níveis preocupantes, apresentando uma estimativa global de 280 mil
óbitos por ano [2], mantendo a MM como um grande problema de saúde pública
mundial [3].
Mesmo
com um decréscimo de 17,11% entre os anos de 2015 e 2016, o número de mortes
maternas declaradas no Brasil chegou a 1.484 em 2016. Mais de 30% desses casos
ocorreram na região Nordeste do país, e 63 mortes por causas obstétricas foram
declaradas em Pernambuco, sendo a maioria evitável por melhoria das condições
socioeconômicas e de acesso a serviços de saúde com boa qualidade [4].
A
redução da MM tem sido uma prioridade da agenda da saúde global, e continuará
em pauta no âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que
buscam eliminar a mortalidade materna evitável entre os anos de 2016 e 2030.
Entre as metas dos ODS, encontra-se a redução de pelo menos dois terços da
razão de mortalidade materna (RMM) global. Na realidade brasileira, a meta para
2030 é reduzir a MM para cerca de 20 mortes para cada 100 mil nascidos vivos
[5].
Assim,
o conhecimento da magnitude da mortalidade materna, tal como a caracterização
dos fatores sociodemográficos envolvidos neste processo e a descrição das
principais causas básicas de óbitos maternos, tem sua importância justificada
pela contribuição na avaliação, planejamento e aprimoramento de estratégias
voltadas para a prevenção e controle mais eficazes da MM. O objetivo deste
estudo foi delinear o perfil epidemiológico da mortalidade materna, assim como
a variação da RMM no estado de Pernambuco, no período de 2009 a 2013.
Trata-se
de um estudo documental, transversal, de natureza quantitativa, para o qual se
utilizou como fonte de dados o Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM) e
o Sistema de Informação de Nascidos Vivos (SINASC), disponíveis na Secretária
de Saúde do estado de Pernambuco (SES-PE).
A
população total do estado de Pernambuco, definida no último censo realizado pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é de 8.796.448 pessoas.
Dessas, 4 milhões e meio são mulheres, sendo 54,8% mulheres em idade fértil (de
10 a 49 anos de idade) [6].
A
coleta de dados ocorreu no período de março a maio de 2017, na SES-PE. Foram
incluídos na amostra óbitos de mulheres em idade fértil (10 a 49 anos) devido a
causas maternas diretas ou indiretas, nos anos de 2009 a 2013, ocorridos até 42
dias após o término da gestação, e que foram revisados pelo Comitê de Estudos
de Morte Materna de Pernambuco. O ano de 2013 foi considerado como o ano limite
para a coleta de dados devido à completude das informações. Foram excluídos os
óbitos devido a causas externas (acidentais/incidentais) e as mortes maternas
ocorridas em Pernambuco de mulheres residentes em outros estados.
Foram
estudados 433 óbitos maternos, que foram classificados e avaliados dentro das
variáveis: sociodemográficas (faixa etária, raça/cor, estado civil e
escolaridade); obstétricas (tipo de causa obstétrica direta ou indireta); e
grupo de causas básicas segundo a 10ª Revisão da Classificação Internacional de
Doenças (CID-10).
Para
fins de análise, foram consideradas as definições propostas pela CID-10 [7-8]. Mortalidade materna: morte de uma mulher
durante a gestação ou dentro de um período de 42 dias após o término da
gestação, independente da duração ou da localização da gravidez, devido a
qualquer causa relacionada com ou agravada pela gravidez ou por medidas em
relação a ela, porém não em consequência a causas acidentais ou incidentais; Causas obstétricas diretas: aquelas
resultantes de complicações obstétricas na gravidez, parto ou puerpério devido
a intervenções, omissões, tratamento incorreto ou a uma cadeia de eventos
resultantes de quaisquer das causas acima mencionadas; Causas obstétricas indiretas: aquelas resultantes de doenças
existentes antes da gravidez ou de doenças que se desenvolveram durante a
gravidez não por causas obstétricas diretas, mas que foram agravadas pelos
efeitos fisiológicos da gravidez; Razão
de mortalidade materna: número de óbitos maternos, por 100 mil nascidos
vivos, de mães residentes em determinado espaço geográfico, no ano considerado.
O
processamento e análise dos dados foram realizados utilizando-se o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS,
versão 21.0), procedendo-se à análise descritiva dos mesmos.
Atendendo
à Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, o estudo foi aprovado pelo
Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Maurício de Nassau (Parecer
no1.499.405).
Entre
os anos de 2009 e 2013 foram verificados 433 óbitos por motivo de causas
obstétricas, em mulheres de 10 a 49 anos residentes em Pernambuco, sendo 2009 o
ano com maior número de mortes maternas (N=92). Utilizando o número de nascidos
vivos (NV) no estado, neste mesmo intervalo, obteve-se uma RMM média de
61,5/100 mil NV. A menor RMM (53,7/100 mil NV) foi encontrada no ano de 2012,
ao passo que a maior (64,8/100 mil NV), foi verificada no ano de 2009 (Tabela
I).
Tabela I - Óbitos maternos, nascidos vivos e razão de mortalidade materna segundo
o ano de ocorrência, 2009-2013. Pernambuco, 2017.
*RMM
= Razão de Mortalidade Materna por 100.000 nascidos vivos.
No
que diz respeito às características sociodemográficas, observa-se que a maioria
(64,4%) dos óbitos identificados foi mulheres na faixa etária entre 20 e 35
anos, de cor/raça parda (63,5%) e solteiras (56,8%). No que tange à
escolaridade, aproximadamente metade das mulheres possuíam menos de sete anos
de estudo, salientando-se que 5,5% não possuíam nenhuma escolaridade (Tabela
II).
Tabela II - Características sociodemográficas dos óbitos maternos, 2009-2013.
Pernambuco, 2017.
No
que se refere aos tipos de mortes maternas, as causas obstétricas diretas foram
superiores às causas obstétricas indiretas, com 62,6% (n = 271). Ao analisar os
grupos de causa obstétrica direta, foi constatado que a hipertensão se
destacou, correspondendo a 31,4% (n = 85) dos óbitos, seguida de hemorragia,
aborto, infecção puerperal e embolia. As doenças do aparelho circulatório
figuraram como as principais causas obstétricas indiretas (Tabela III).
Tabela III - Óbitos maternos segundo tipo de causa obstétrica e causas obstétricas
diretas e indiretas, 2009-2013. Pernambuco, 2017.
O
cálculo da RMM em Pernambuco revelou que não houve alterações no período
estudado, mantendo-se uma estabilidade. Contudo, ainda permaneceu acima da média
nacional e de países como Uruguai (14/100 mil NV) e Porto Rico (20/100 mil NV),
ficando muito acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que
considera plausível até 20/100.000 nascidos vivos [1,9,10].
Até
o ano de 2013, os índices mundiais de MM foram reduzidos em 45%. Porém, apesar
do esforço governamental e institucional empregado, milhares de mulheres ainda
morrem diariamente devido a causas obstétricas [11,12]. No Brasil, em 2009,
houve um salto no número de óbitos maternos totalizando 1.872 mortes [4],
corroborando dados deste estudo, no qual 2009 foi o ano com o maior número de
óbitos em Pernambuco, no período avaliado.
Quando
realizada uma comparação com as regiões do país em períodos semelhantes, os
resultados encontrados em Pernambuco sugerem uma proximidade com todo Nordeste,
que obteve RMM de 73,19/100.00 NV. A região Sul apresentou números inferiores
ao estado de Pernambuco, com uma RMM de 55,41 [11]. As diferenças
socioeconômicas entre as regiões do Brasil podem justificar parte das
diferenças na RMM, já que o Nordeste tem a maior população em vulnerabilidade
por rendimento econômico e carências sociais [9].
Em
2012, fica evidente uma diminuição da RMM no estado em estudo em relação aos
outros anos, que possivelmente poderia ser atribuído às subnotificações e subregistros que impossibilitam o real monitoramento da
mortalidade materna. Porém, em 2013, os números voltam a aumentar
consideravelmente. Este fato levanta questionamentos sobre a qualidade da assistência
e a efetividade das políticas de saúde no estado, permanecendo em situação
preocupante.
A
amostra estudada revelou que houve maior prevalência dos óbitos em mulheres
jovens de 20 a 35 anos. Situação igualmente encontrada na maior parte do Brasil,
que apresenta 41,8% dos casos nesta mesma faixa etária. Em Santa Catarina,
verificou-se divergência comparativa, pois a prevalência dos óbitos ocorreu em
mulheres com idade entre 30 a 39 anos [11]. Esse elevado número de óbitos na
faixa etária em destaque sugere uma deficiência importante na atenção à saúde,
uma vez que essa idade oferece menor risco de mortalidade materna, quando
comparado às mulheres que estão acima de 35 anos [12].
Uma
das justificativas a ser considerada para a elevada frequência da raça/cor
parda são as características populacionais do estado, em que mais da metade das
mulheres autodeclaram-se de raça/ cor parda, segundo os dados do IBGE [6].
Semelhantemente, Fortaleza apresentou o mesmo resultado no que se refere a essa
variável [6,13]. Outros estudos associam as variáveis raciais aos fatores
intervenientes para mortalidade materna, porém, em contrapartida a este estudo,
a associação à cor negra é mais prevalente [14].
Mães
solteiras e com menos de oito anos de estudo apresentaram maior taxa de
mortalidade em Pernambuco. Em virtude do precário acesso à informação acerca
dos métodos contraceptivos e conhecimentos sobre práticas saudáveis e direitos
garantidos em lei, a baixa escolaridade apresenta-se como fator de risco
importante para a mortalidade materna [15]. A situação conjugal instável também
interfere nos resultados obstétricos, visto que o apoio durante o ciclo
gestacional do parceiro proporciona maior segurança para a mulher [16].
Ainda
que muitas mudanças tenham ocorrido no Brasil desde o surgimento do Programa de
Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM), a garantia
dos direitos e o acesso à saúde das mulheres que se encontram em situação de
vulnerabilidade social têm sido difíceis. Como estratégia para a
qualificação da atenção, foi criada a “Rede Cegonha”, uma política voltada ao
enfrentamento da mortalidade materna e infantil que atua na proteção integral
do ciclo gravídico-puerperal, incluindo as estratégias da Política Nacional de
Humanização [17].
Em
consonância com as estatísticas nacionais, as mortes por causas obstétricas
diretas prevaleceram sobre as indiretas em Pernambuco [4]. Hipertensão,
hemorragia, aborto e infecção puerperal responderam por quase dois terços das
mortes maternas, seguindo também o padrão brasileiro. Esse quadro vem se
mantendo há décadas, ratificando a baixa qualidade da atenção obstétrica
oferecida, assumindo que essas causas são passíveis de prevenção, consideradas
evitáveis e/ou controláveis se as mulheres tivessem acesso a serviços de saúde,
equipamentos e materiais adequados, com profissionais de saúde qualificados
[4,18].
É
possível que as taxas de aborto estejam subestimadas, devido à questão da
ilegalidade, o que pode, por outro lado, superestimar as taxas de hemorragia e
infecção, quando estas são consequentes às complicações do aborto inseguro, o
qual é definido pela OMS como a interrupção da gravidez realizada por pessoas
não capacitadas e/ou em locais insalubres e sem segurança para o atendimento de
eventuais complicações [19].
Estima-se
que dos 55,7 milhões de abortos que ocorreram anualmente em todo o mundo, entre
2010 e 2014, 45% foram inseguros. A proporção de abortos inseguros foi
significativamente maior em países com leis de aborto altamente restritivas do
que naquelas com leis menos restritivas. Em contrapartida, os estudos apontam
que a existência de leis restritivas não diminui a incidência de abortos
[20,21].
A
penalização do aborto aumenta os riscos de morte materna, sobretudo para as
mulheres em condições socioeconômicas desfavoráveis, que precisam recorrer ao
aborto inseguro. Por medo das consequências legais, as mulheres temem procurar
o serviço de saúde ou o fazem tardiamente, acentuando os riscos e gravidade do
quadro, e contribuindo para a subnotificação nos registros oficiais. A
mortalidade por aborto, portanto, enquadra-se como uma iniquidade em saúde, que
poderia ser evitada através da educação sexual, uso de métodos contraceptivos
eficazes, provisão de abortos legais, seguros e cuidados oportunos para
complicações [19].
A
importância da infecção puerperal nos óbitos maternos, por sua vez, pode ainda
estar relacionada com a elevada quantidade de partos cesáreos realizados no
Brasil. A incidência dessa alteração é consideravelmente menor em partos
normais e apesar dos esforços, essa condição de excessividade
de procedimentos cirúrgicos no parto é um dos pontos que dificultam a redução
da mortalidade materna no país [22]. O Brasil apresenta a maior taxa de cesárea
do mundo, sendo 57% de todos os nascidos vivos e quase 90% entre as mulheres
que recebem cuidados de saúde privados durante o parto, em 2013, questionando
se muitas delas são por razões não médicas [23].
Dentre
as causas indiretas dos óbitos maternos, as doenças do aparelho circulatório
corresponderam a quase um terço dos casos. As mortes obstétricas indiretas
normalmente acometem mulheres em idade mais avançada e aquelas portadoras de
doenças crônicas, exigindo uma captação precoce, bem como uma assistência
especializada e qualificada, a fim de que os riscos sejam minimizados [12]. A
maior parte dessas patologias é de caráter prevenível ou controlável, se houver
profissionais capacitados a oferecer orientações precisas e de qualidade à
mulher e capazes de identificar sinais de alerta.
A
má qualidade dos registros foi minimizada pela inclusão na amostra somente dos
óbitos revisados pelo Comitê de Estudos de Morte Materna de Pernambuco, que, no
período da coleta de dados, constituíam todos os casos registrados até o ano de
2013.
A
variação da razão de mortalidade materna no período estudado não sofreu
modificações, mantendo-se estável no estado de Pernambuco, porém acima da média
nacional. As elevadas taxas de mortalidade materna revelam a qualidade da
assistência prestada à mulher durante o ciclo gravídico-puerperal, assim como o
traçado epidemiológico revelou a influência da vulnerabilidade social nesses
números, atingindo principalmente mulheres solteiras e com menos de oito anos de
estudo.
O
fato da maior incidência de óbitos maternos ocorrerem
por causas obstétricas diretas permite a reflexão da necessidade de uma
reformulação política, estrutural e de qualificação profissional no sistema de
saúde. Por serem consideradas causas evitáveis em sua maioria, reforça ainda
mais a ideia de fragilidade assistencial aos diferentes aspectos envolvidos na
gestação, desde a concepção até o puerpério.
Apesar
do grande caminho percorrido para a redução da mortalidade materna, ainda há
muitos obstáculos a serem vencidos. Uma boa assistência à saúde necessita de
uma atenção integral, permeando todos os âmbitos da vida da mulher. Por fim,
recomenda-se uma avaliação profunda sobre a efetividade das políticas públicas
e programas já implantados, capaz de conhecer a realidade, identificar
possíveis falhas e, assim, propor soluções a fim de obter resultados mais
satisfatórios.