ARTIGO
ORIGINAL
Acessibilidade
para pessoas com deficiência na atenção básica de saúde em Três Rios, Centro
Sul Fluminense
Renata Pedreira da
Cruz, M.Sc.*, Rafael André
da Silva, M.Sc.*, Juarez de Souza Pereira **, Vanessa
Vianna Cruz***, Luciana Krauss Rezende**, Ricardo da
Silva Monteiro****, Wiliam César Alves Machado*****
*Enfermeiro,
UNIRIO, **Fisioterapeuta, Professor na Faculdade Vértice de Três Rios
(UNIVÉRTIX), ***Enfermeira, Mestranda no Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem PPGENF – UNIRIO, ****Arquiteto, Professor na Faculdade Vértice de
Três Rios (UNIVÉRTIX), *****Enfermeiro, Professor na Universidade Federal do Estado
do Rio de Janeiro (UNIRIO), Faculdade Vértice de Três Rios (UNIVÉRTIX)
Recebido em 20 de
dezembro de 2018; aceito em 13 de fevereiro de 2019.
Endereço
para correspondência:
Wiliam César Alves Machado, wilmachado@uol.com.br; Renata Pedreira da Cruz:
renatapcrj@gmail.com; Rafael André da Silva: rafael1853@hotmail.com; Juarez
de Souza Pereira : juarez.fisio@gmail.com; Vanessa Vianna Cruz:
vanessavianna2005@yahoo.com.br; Luciana Krauss
Rezende: lukrare@uol.com.br; Ricardo da Silva Monteiro: ricardo@rodriguesmonteiro.com.br
Resumo
Objetivo: Analisar as
condições de acessibilidade para as pessoas com deficiência nas unidades de
atenção básica de saúde do município de Três Rios, Rio de Janeiro, Brasil. Métodos: Estudo exploratório, com
abordagem quantitativa, realizado com estudantes de Pós-Graduação, no primeiro
semestre de 2016, utilizando um questionário autoaplicável em 29
estabelecimentos de saúde: 28 unidades básicas de saúde e um complexo regulador.
Os resultados foram analisados a luz da estatística descritiva, e discutidos
com base no preconizado pelos parâmetros antropométricos oficiais vigentes, no
Brasil. Resultados: 51,7% da amostra
(15 unidades) não apresentavam condições mínimas de acessibilidade para pessoas
com deficiência, enquanto outras 14 dispunham de algumas condições básicas. Em 6 delas os usuários alcançavam a recepção, em apenas 2
existia vão de portas para acesso de cadeirantes; 4 com acesso à sala de
atendimentos ao público, aos consultórios, aos banheiros masculino e feminino;
apenas 9 delas ofereciam condições transitáveis nos entornos. Acessibilidade
para surdos e cegos, também inexpressíveis. Conclusão:
Conclui-se que as unidades básicas de saúde estudadas não estão preparadas para
acolher com dignidade cidadãos e cidadãs com deficiência ou mobilidade
reduzida, o que demonstra flagrante descumprimento da legislação vigente e
descaso dos gestores públicos para com as necessidades de cuidados e saúde para
essas pessoas.
Palavras-chave: acesso aos serviços
de saúde, atenção básica de saúde, estruturas de acesso, pessoas com
deficiência.
Abstract
Accessibility to disabled persons in primary health care units in Três Rios, Rio de Janeiro, Brazil
Objective: To analyze
the accessibility conditions for disabled person in the basic health care units
of the municipality of Três Rios, Rio de Janeiro,
Brazil. Methods: Exploratory study
with quantitative approach, carried out with master graduate students, in the
first half of 2016, using a self-administered questionnaire in 29 health
facilities: 28 basic health units and a regulatory complex. The results were
analyzed in the light of the descriptive statistics, and discussed based on the
one recommended by the official anthropometric parameters in force in Brazil. Results: 51.7% of the sample (15 units)
did not present minimum accessibility conditions for disabled person, while
another 14 had some basic conditions. In 6 of them users reached the reception,
in only 2 there was a doorway for wheelchair users; 4 with access to the
reception room to the public, to the offices, to the men's and women's
bathrooms; only 9 of them offered passable conditions in the surroundings.
Accessibility for deaf and blind, were also
inexpressible. Conclusion: The basic
health units studied are not prepared to welcome for disabled citizens or with
reduced mobility, which demonstrates flagrant noncompliance with current
legislation and public managers' disregard for the health and care needs of
these people.
Key-words: health
services accessibility, primary health care, architectural accessibility, disabled person.
Resumen
Accesibilidad para personas con discapacidad en la atención básica de salud en Três Rios, Río de Janeiro,
Brasil
Objetivo: Analizar
las condiciones de accesibilidad
para las personas con discapacidad en las unidades de atención básica
de salud del
municipio de Três Rios, Río
de Janeiro, Brasil. Métodos: Estudio exploratorio, con abordaje cuantitativo,
realizado con estudiantes
de posgraduación en salud, en el
primer semestre de 2016, utilizando un cuestionario autoaplicable en 29 establecimientos de salud: 28 unidades básicas de salud
y un complejo regulador. Los
resultados fueron analizados
a la luz de la estadística descriptiva, y
discutidos con base en el preconizado por los parámetros antropométricos oficiales
vigentes, en Brasil. Resultados: 51,7% de la muestra (15 unidades) no presentaban
condiciones mínimas de accesibilidad para las personas con discapacidad, mientras que otras 14 tenían algunas condiciones básicas. En 6 de ellas los
usuarios alcanzaban la recepción, en
apenas 2 existía van de puertas
para acceso de usuarios de sillas de ruedas; 4 con acceso a la
sala de atención al público, a los
consultorios, a los baños masculino y femenino; sólo 9 de ellas ofrecían condiciones transitable en los entornos. Accesibilidad para sordos y ciegos, también inexpresables. Conclusión: Se concluye que las unidades básicas de salud estudiadas no están preparadas
para acoger con dignidad las personas con discapacidad o movilidad reducida, lo que demuestra flagrante incumplimiento de la
legislación vigente y descuido de los
gestores públicos para con las
necesidades de atención y salud para esas personas.
Palabras-clave: accesibilidad
a los servicios de salud, atención primaria de salud, estructuras de acceso, personas con discapacidad.
A população de
pessoas com deficiência é composta de um grupo heterogêneo, pois reúne
indivíduos com deficiência física, auditiva, visual e intelectual e, desse
modo, há a necessidade de garantir a esse público acesso as ações e serviços de
saúde considerando suas características e diferentes necessidades [1].
Segundo o Censo do
IBGE de 2010, entre mais de 190 milhões de habitantes, 23,9% da população do
Brasil apresenta um tipo de deficiência, com maior ocorrência da deficiência
visual, afetando 18,6% da população do país, seguida da deficiência motora
(7%), deficiência auditiva (5%) e da deficiência mental ou intelectual (1,40%)
[2].
A oferta de ambientes
com acessibilidade é uma exigência constitucional, tem como objetivo permitir
ganhos de autonomia e de mobilidade a uma porção maior de pessoas, incluindo
aquelas que tenham dificuldades de locomoção [3]. No caso deste estudo, para que
pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, os usuários dos serviços
disponíveis nas unidades básicas de saúde possam deles usufruir com mais
segurança, confiança e comodidade.
A associação do
aspecto sócio-organizacional com o geográfico da acessibilidade
gera barreiras físicas, arquitetônicas e de comunicação que impedem que pessoas
com deficiência exerçam seus direitos de acesso ao tratamento em igualdade de
condições, quando comparado às pessoas sem deficiência [4]. O enfrentamento
cotidiano dessas barreiras põe em risco a saúde e o processo de reabilitação
das primeiras, afetando negativamente a necessidade de cuidado de longo prazo
dessas pessoas [3].
A Associação
Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) em 2015 revisou e atualizou a Norma
Brasileira (NBR) 9050/2015 [5], que regulamenta e define os critérios e
parâmetros sobre acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e
equipamentos urbanos. Define acessibilidade como possibilidade e condição de
alcance, percepção e entendimento para a utilização com segurança e autonomia
em edificações, espaços, mobiliários e a equipamentos urbanos. Estabelece as
normas gerais de construções, adaptações e adequações para que todas as pessoas
tenham acesso facilitado em qualquer local público no país. Importante para
este estudo são seus parâmetros, que incluem rota externa e interna acessível,
sinalização visual e tátil, mobiliários, banheiros e estacionamento dentro dos
padrões de acessibilidade, entre outros.
Da mesma forma
relevante para este estudo, os elementos do Decreto nº 6.949 [6], de 25 de
agosto de 2009, que promulga a Convenção Internacional sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, e norteia questões
referentes aos direitos de pessoas com deficiência, estabelece normas gerais e
critérios básicos para a promoção da acessibilidade destas pessoas, garantindo
que elas tenham acesso igualitário a todos os direitos concedidos por lei.
A legislação
brasileira garante a todos os cidadãos, incluindo as pessoas com deficiências,
o direito ao acesso à educação, à saúde, ao lazer e ao trabalho. Ademais, o
conceito de cidadania envolve o termo acessibilidade, no qual os indivíduos têm
direitos assegurados por lei que devem ser respeitados, entretanto muitos
destes direitos esbarram em barreiras arquitetônicas, de comunicação, além de
barreiras sociais [7].
Com a organização dos
serviços de saúde do Sistema Único de Saúde em redes de atenção, as Unidades
Básicas de Saúde (UBS) são a porta de entrada preferencial do sistema para
todos os usuários, inclusive os deficientes, terem acesso às redes de atenção.
As condições de acessibilidade nas UBS, como em todos os espaços arquitetônicos
e urbanísticos, citados em lei, devem envolver condições de acesso para pessoas
com deficiência física, visual e auditiva, de modo a atender igualitariamente
todos os cidadãos [8].
Diante do exposto e
do fato da escassez de estudos sobre acessibilidade principalmente em UBS, este
relato de experiência tem o objetivo de analisar as condições de acessibilidade
para as pessoas com deficiência nas unidades de atenção básica de saúde do
Município de Três Rios, região Centro Sul do Estado do Rio de Janeiro.
Trata-se de estudo
exploratório, com abordagem quantitativa, realizado no primeiro semestre de
2016. O cenário deste estudo compreendeu as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e o
Complexo Regulador do Município de Três Rios, Rio de Janeiro, Brasil. A amostra
foi composta por 28 UBS que desenvolvem a Estratégia de Saúde da Família para
atender munícipios de Três Rios e o seu Complexo Regulador, somando 29 unidades
de saúde.
O Complexo Regulador
foi escolhido por ser o espaço onde as pessoas buscam informações gerais acerca
do Sistema de Saúde no Município, devendo o mesmo ser tão acessível quanto as
UBS.
Os dados foram
coletados no primeiro semestre de 2016, em visitas às unidades, devidamente
acompanhadas de seus gestores. Com ajuda desses, foi preenchido instrumento,
contendo questões referentes à identificação da unidade de saúde e aspectos
referentes à acessibilidade para usuário com mobilidade reduzida ou pessoa com
deficiência, baseado nos parâmetros da NBR 9050/2015 [5].
As questões avaliaram
o acesso à recepção nas unidades, o acesso às instalações internas de
atendimento e consultórios, a acessibilidade aos banheiros femininos e
masculinos, a largura dos vãos das portas, rotas acessíveis interna e externa,
sinalizações, entre outras questões que podem otimizar
ou limitar acesso dos usuários com deficiência ou mobilidade reduzida. Esses
dados foram transcritos para o banco de dados como adequados ou não aos
parâmetros da NBR 9050/2015 [5].
Ainda no questionário
buscou-se identificar se algum servidor da unidade domina a Língua de Sinais
Brasileira (Libras), se existe sinalização tátil no piso/parede/quadros em
Braile, para orientação espacial de cegos.
Dados foram
submetidos ao software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences version 21) para análise
estatística descritiva simples. Com os resultados obtidos foi possível discutir
com parâmetros antropométricos da ABNT, discutidos a partir dos resultados de
estudos que abordam a temática, disponíveis nas bases de dados da área de
conhecimento.
A experiência
constitui contribuição para ampliar a aproximação e melhor compreensão da
temática – acessibilidade de pessoas com algum tipo de deficiência – aos
serviços de saúde da Atenção Básica, para estudantes de Graduação e
Pós-Graduação, gestores públicos, docentes e pesquisadores que se dedicam ao
estudo de fenômenos relacionados.
Da mesma forma,
procura elucidar explicações para que tamanhas disparidades excludentes ainda persistam nos diversos ambientes de cuidado à saúde, a
despeito da legislação vigente no Brasil.
Consoante com a
Resolução 466/20129 do CNS, foi extraído de estudo submetido ao Comitê de Ética
da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, via Plataforma Brasil, e
aprovado com o parecer de nº 1.241.940 em 23/09/2015, CAAE
45409015.4.0000.5285.
Foram analisados 28
UBS e o Complexo Regulador do município de Três Rios – RJ, totalizando 29
unidades de saúde, onde se priorizou avaliar a acessibilidade das unidades em
relação aos parâmetros sobre acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços
e equipamentos urbanos que foram definidos e regulamentados através da NBR
9050/2015 [5]. Os aspectos destacados foram o acesso à recepção, a sala de
atendimento, aos consultórios, aos banheiros femininos e masculinos, medidas
das larguras das portas, sobre a possibilidade de comunicação através da Libras, das condições das rotas interna e externa e sobre
a existência de placas sinalizadoras em Braile.
As barreiras
arquitetônicas ou de comunicação comprometem negativamente o direito de acesso
das pessoas com mobilidade reduzida ou algum tipo de deficiência, neste estudo,
o direito de acesso aos serviços básicos de saúde, infringindo princípios
constitucionais do Brasil, como pode ser observado na tabela I.
Tabela
I - Condições fundamentais de acessibilidade por
tipo de deficiência. Unidades Básicas de Saúde. Três Rios/RJ, 2016.
A seguir a Tabela II
apresenta a frequência encontrada sobre as condições de acessibilidade nas 29
unidades de saúde analisadas e o respectivo percentual de acessibilidade.
Tabela
II -
Condições de acessibilidade encontradas
nas Unidades Básicas de Saúde do Município de Três Rios/RJ, 2016.
A tabela III
apresenta a relação entre o número de unidades com a frequência de critérios e
o tipo de condição de acessibilidade presente nos estabelecimentos avaliados.
Tabela
III
– Unidades de Saúde e itens de
acessibilidade que dispõem. Três Rios/ RJ, 2016.
I (Acesso à recepção),
II (Acesso a sala de atendimento), III (Acesso aos consultórios), IV (Acesso ao
banheiro feminino), V (Acesso ao banheiro masculino), VI (Largura adequadas das
portas), VII (Condição do entorno), VIII (Sinalizadores/ placa em Braile) e IX
(Comunicação em Libras).
Observou-se que a
maioria das unidades (51,7%) não dispunha de nenhum item de acessibilidade
exigido pela NBR 9050 de 2015 [5]. Das 29 unidades de saúde, nove apresentavam
apenas um item de acesso disponível em suas unidades, quatro delas dispunham de
um funcionário que dominava a Língua de Sinais Brasileira (Libras), quatro
unidades apresentavam condições de entorno favoráveis de forma que os usuários,
inclusive os com deficiência, podiam acessar com independência.
Uma unidade
apresentava acessibilidade satisfatória na recepção e apenas duas unidades
(6,9%) cumpriam oito itens exigidos na norma vigente e outras duas (6,9%)
disponibilizavam em suas unidades seis itens importantes para facilitar o
acesso das pessoas com deficiência ao serviço de Atenção Básica de Saúde no
município.
Dos nove itens
questionados, 25 unidades (86,2%) apresentavam menos que 25% de cumprimento às
exigências de condições de acessibilidade de acordo com as normas da NBR
9050/2015 [5] e apenas quatro unidades apresentavam mais que 67% adequação as
condições de acessibilidade.
Devido às
peculiaridades da própria deficiência somadas as comorbidades,
os indivíduos com deficiência necessitam utilizar os serviços de saúde e a
acessibilidade a esses serviços e sua satisfação estão diretamente associadas
aos obstáculos que podem inviabilizar o seu acesso [10].
Nenhuma das UBS desta
pesquisa cumpre com todos os critérios e parâmetros sobre acessibilidade a
edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos que foram determinados
pela NBR 9050/2015 [5]. A maioria (51,7%) das unidades não apresentou nenhuma
das condições de acessibilidade em suas edificações e 48,3% apresentou poucas
condições de acesso para as pessoas com deficiência.
A dificuldade de
acesso às UBS nos demonstra o conflito existente entre a legislação que
assegura acessibilidade das pessoas com deficiência a Saúde e os pressupostos
da NBR 9050/2015 [5], além de confrontar com as diretrizes de humanização, que
priorizam o respeito e o atendimento humanizado, de forma acolhedora e
resolutiva [11].
É importante destacar
que baixas condições de acessibilidade também têm sido encontradas em outros
níveis de atenção. Em uma pesquisa realizada em hospitais no município de João
Pessoa, na Paraíba, foi constatado que nessas instituições de saúde havia a
existência de barreiras arquitetônicas implicando no acesso aos serviços de
saúde [12].
O fato é que a NBR
9050 [5] está em vigor desde 2015, assegurando que todos os espaços,
edificações, equipamentos urbanos devem ser acessíveis de maneira que estes
possam ser alcançados, acionados, utilizados e vivenciados por qualquer pessoa,
inclusive aquelas com mobilidade reduzida. Essa Norma chama atenção para que o
termo acessível implique tanto em acessibilidade física como de comunicação, o
que envolve acessibilidade para os deficientes físicos ou pessoas com mobilidade reduzida e deficientes visuais e auditivos. Essa
norma determina ainda que as condições de acesso e circulação interna nas
unidades também precisam estar de acordo para garantir que as pessoas possam
desenvolver suas atividades com normalidade e independência.
A falta de
acessibilidade não é uma particularidade nas unidades de saúde, elas podem ser
observadas na sociedade de uma forma geral, o que reflete numa grave omissão do
Estado em garantir e cumprir com o que se encontra legalizado. Esse fato vai ao
encontro a achados em um estudo realizado através de Oficinas Vivenciais do
projeto “Vivenciando a Deficiência: (des) educando
para incluir”, realizada junto a 638 alunos matriculados na disciplina
Psicologia da Educação, na Universidade Federal de Uberlândia (MG),
evidenciando que mesmo após reformas estruturais, as instalações das IES não
atendem aos requisitos para a acessibilidade das pessoas com deficiência
exigidos, tanto aspectos urbanísticos, como arquitetônicos e de
informação e comunicação (sinalização, sistemas de consulta e empréstimos,
tecnologia de apoio para usuários portadores de deficiências, sistemas para
acesso remoto etc.) precisam ser adaptados [13].
Considerando a
equiparação de oportunidades, todos os seres humanos devem ter igualdade de
oportunidades em participar de todas as atividades da vida e usufruir de bens e
serviços, se faz necessário que as vias e espaços públicos sejam transformados
em ambientes acessíveis para garantir este direito às pessoas com deficiência
ou aquelas com mobilidade reduzida [14].
Um dos critérios de
acessibilidade analisado no presente estudo foi avaliar as condições do
entorno. Esse critério se aproxima do termo rota acessível presente na NBR
9050/2015 [5] que trata como trajeto contínuo, desobstruído e sinalizado,
conectando ambientes externos (estacionamentos, calçadas rebaixadas, faixas de
travessia de pedestres, rampas, etc.) ou internos (corredores, pisos, rampas,
escadas, elevadores etc.).
As condições do
entorno das unidades são importantes para garantir o pleno funcionamento do serviço,
todas as entradas devem ser acessíveis bem como as rotas de interligação às
principais funções do edifício. As áreas de circulação externa devem ser
utilizadas de forma autônoma e seguras por todas as pessoas, inclusive as com
deficiência.
No entanto, quando se
observa o resultado a respeito das condições do entorno nas unidades de saúde
pesquisadas, objeto deste estudo, apenas 32% delas é acessível considerando
esse critério como condição indispensável para que as pessoas com deficiência
possam ter acesso às UBS e consequentemente aos serviços que elas
disponibilizam. Em contrapartida, foi realizado estudo, em 2011, com 100
famílias cadastradas no Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB),
moradores da área de abrangência da Unidade de Saúde Américo Bertão, Jardim Eldorado, município de Cordeirópolis, SP,
Brasil [15], com objetivo de identificar os fatores associados ao acesso a
serviços básicos de saúde partindo do pressuposto de que fatores atrelados a
diferentes dimensões do indivíduo e dos serviços de saúde se relacionam na sua
construção. Os resultados mostram que os fatores associados ao acesso dos
moradores ao serviço no qual estão adstritos são: a naturalidade; o uso da
unidade de saúde na época; o local de residência; e a classificação do
atendimento da unidade. Contudo, em se tratando da garantia de calçadas que
garantissem o deslocamento seguro de deficientes visuais, cadeirantes, idosos e
outras pessoas com mobilidade reduzida, no presente estudo,
dados revelaram que foram consideradas como inexistentes em 66,7% das
UBS.
Os resultados obtidos
sobre os critérios de acessibilidade no ambiente interno deste estudo
apresentaram que o acesso à sala de atendimento, aos consultórios e aos
banheiros (femininos e masculinos) apenas 13,79% das unidades garantem acessibilidade nesses espaços e 20,69% tem recepção
acessível. Dificuldades no acesso a serviços de saúde também foram observadas
em outro estudo, no qual se observou que não havia rampas, inexistência de
elevadores e de sinalização para as pessoas com deficiência. Além de lugares de
espera insuficientes e salas com presença de obstáculos físicos impedindo o
acesso dessas pessoas, e ainda ausência ou inadequação de sanitários destinados
às pessoas com deficiência [10].
Apenas 6,9% das UBS
atendem às exigências de larguras das portas. De acordo com a NBR 9050/2015
[5], as portas devem ter no mínimo vão livre de 0,80 m e altura de 2,10 m e
devem permitir a aproximação de cadeira de rodas. As informações essenciais aos
espaços internos e externos das edificações devem ser sinalizadas de forma
visual, tátil, gestual e sonora [5].
O resultado obtido
neste estudo também nos apontou que apenas 17,24% das UBS dispõem de
profissionais capazes de se comunicarem em Libras, e apenas 6,9% cumpre com a
existência de placas de Braile. Um estudo realizado sobre deficiência como
restrição de participação social e os desafios para avaliação a partir da Lei
Brasileira de Inclusão [16], em diversos setores da sociedade, constatou em sua
maioria ausência de informações em braile, sonoras ou visuais. Observa-se,
assim, que não somente unidades de saúde descumprem as normas sobre
acessibilidade e permitem que barreiras de comunicação impeçam que pessoas com
deficiência visual ou auditiva possam desenvolver com autonomia e independência
suas atividades [3].
A pesquisa demonstrou
que instalações das UBS não estão adequadas para atender ao Decreto 6.949/2009
[6], bem como a NBR 9050/2015 [5]. Resultados semelhantes foram encontrados no
estudo que verificou a acessibilidade nas UBS em um município do estado da
Bahia, que identificou que aproximadamente dois terços dos prédios não eram
adequados às necessidades dos usuários [17]. Esses autores afirmaram que muitas
unidades eram instaladas em edificações improvisadas disponíveis nas comunidades
e não específicas para atenderem as necessidades dos profissionais e as dos
usuários [17]. Tal fato não difere do que foi encontrado no presente estudo.
Na realidade, parte
dos imóveis são construções antigas disponíveis nas comunidades, alugadas pelo
poder público municipal e adaptadas para instalar as unidades de saúde, o que
pode explicar, em parte, as inadequações arquitetônicas encontradas em seu
interior. Porém, o Decreto nº 6.949/2009 [6] considera que o Poder Público
buscará garantir dotação orçamentária para ampliar o número de acessos nas
edificações de uso público a serem construídas, ampliadas ou reformadas, e que
as edificações de uso público e de uso coletivo referidas, já
existentes, têm, respectivamente, prazo de trinta e quarenta e oito
meses, a contar da data de publicação do Decreto, para garantir a
acessibilidade de que trata este Decreto. Deste modo, observamos que tais UBS
já deveriam estar adaptadas e acessíveis para pessoas com deficiência.
Tal fato também é
confirmado por estudo sobre acessibilidade de pessoas com deficiência ou
restrição permanente de mobilidade ao SUS [18], revelando que maior parte das
Unidades Básicas de Saúde está instalada em casas improvisadas, um tipo de
construção que não atende às necessidades dos usuários; e outro estudo também
aponta que os prédios das UBS não eram adequados para o acesso de idosos e
pessoas com deficiência física [19].
O Ministério da Saúde
tem buscado estratégias para mudar essa realidade através de portarias como a
de Nº 339 de 2013, que redefine o componente ampliação
do Programa de Requalificação de Unidades Básicas de Saúde. Esse programa tem o
objetivo de fortalecer a atenção básica através da estruturação de suas
unidades, mediante a transferência de recursos financeiros direto da esfera
federal para os municípios. Visa também transformar as UBS em estabelecimentos
acolhedores melhorando o acesso, facilitando a prática das equipes de saúde e
buscando uma melhor qualidade do atendimento [20]. No entanto, ele não tem sido
capaz de mudar a realidade encontrada pela dificuldade do município cumprir com
algumas exigências. Pois, tanto para ampliar, reformar, assim como para
construir com esses recursos os imóveis devem ser próprios dos municípios ou
cedidos por outro ente federado.
Considerando, ainda,
que as pessoas com deficiência devam fazer uso deste espaço em igualdade de
condições aos demais usuários, é importante que mudanças ocorram na forma da
sociedade se organizar para que se possa tratar a deficiência com mais justiça
e igualdade [17].
Cabe destacar a
inexistência de fiscalização efetiva que exija do poder público e do setor
privado o cumprimento do Decreto 6.949/2009 e das normas contidas na NBR
9050/2015 para que as pessoas com deficiência possam ter garantidos seus
direitos de acessibilidade sem o impedimento de barreiras arquitetônicas e de
comunicação e exigir que tal legislação seja cumprida.
A partir do exposto,
podemos constatar que as pessoas com deficiência não dispõem de condições
plenas de acessibilidade adequada nas UBS contempladas no presente estudo.
Sendo assim, é
necessário que haja uma sensibilização da sociedade civil como um todo, assim
como das autoridades, para que desta forma sejam cumpridas as legislações que
tratam da acessibilidade na atenção básica e demais espaços públicos e
privados, em conformidade com o princípio de universalidade de acesso do SUS.
O fato de o poder
público municipal não garantir direito de que pessoas com deficiência tenham
acesso pleno aos serviços de saúde, particularmente, os da Atenção Básica,
demonstra como ainda vigora preconceito para com este segmento da sociedade.
Ficou evidenciada distância oceânica entre as peças legais em vigor no Brasil e
a realidade discriminatória predominante em nossas cidades, estampadas na
injustificável falta de acessibilidade em 51% das UBS investigadas. Tanto
quanto inadmissível a constatação de que as portas dos banheiros masculinos e
femininos impedem entrada de cadeirantes, além de surdos e cegos indisporem de
condições básicas de comunicação e orientação espacial.
Mais pesquisas se
fazem necessárias, para que novas evidências possam apresentar o panorama da
acessibilidade das pessoas com deficiência em outras localidades, além de serem
incentivadas a realização de encontros, fóruns e eventos para expor e propor
soluções para esta situação, pois o comprometimento do deslocamento das pessoas
com deficiência afeta, sobretudo, a qualidade de vida desses indivíduos.
É necessário que
sejam implementados mecanismos efetivos e sistemáticos
de fiscalização do cumprimento da legislação vigente, para que pessoas com
deficiência não sofram discriminação e constrangimentos que, segundo a
Convenção das Nações Unidas sobre Direitos da Pessoa com Deficiência, constitui
crime, a ser punido na forma da Lei. Ademais, compete aos Conselhos Municipais
de Direitos da Pessoa com Deficiência a função deliberativa de fiscalizar o
cumprimento da Lei, tanto quanto do acionar o Ministério Público para resolver
casos recorrentes.
Este estudo não
esgota a análise e discussão da temática acessibilidade para pessoas com
deficiência nos serviços de saúde, em particular, aqueles prestados pelas
equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF), atuantes na Atenção Básica, até
porque as UBS, como entrada do sistema de saúde no âmbito do
SUS, devem encaminhar esses usuários para atendimentos na Rede de
Cuidados da Pessoa com Deficiência. Cabendo aos enfermeiros avaliar as
condições de acesso de todos os clientes da população-alvo da UBS em que atuam,
garantindo assistência domiciliar às pessoas com deficiência, mais
especificamente as concernentes às habilidades para o autocuidado e atividades
cotidianas, considerando se tratar de público potencialmente candidato aos
cuidados de longo prazo.