ARTIGO
ORIGINAL
Conhecimento
e acesso de mulheres à prevenção do câncer de colo uterino
Maria Aparecida da
Cruz Oliveira*, Elionara Teixeira Boa Sorte
Fernandes, M.Sc.**,
Magno Conceição das Merces, M.Sc.***,
Talitha Sonally Soares Fernandes****, Antônio
Marcos Tosoli Gomes D.Sc.*****
*Enfermeira
graduada pela Universidade do Estado da Bahia, Campus XII, Guanambi, Bahia,
**Enfermeira, Professora Assistente do Departamento de Saúde, Universidade
Estadual de Feira de Santana, Bahia, ***Biólogo e Enfermeiro, Professor do
Departamento de Ciências da Vida, Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Campus
I, Salvador, ****Enfermeira, Professora Auxiliar do Departamento de Educação,
Universidade do Estado da Bahia, Campus XII, Guanambi, Bahia, *****Enfermeiro,
Professor Titular do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica e do Programa
de Pós-graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro
Recebido em 12 de
outubro de 2018; aceito em 5 de dezembro de 2018.
Endereço
para correspondência:
Magno Conceição das Merces,
Rua Silveira Martins, 2555, Cabula 41150-000 Salvador BA, E-mail: magnomerces@hotmail.com; Maria
Aparecida da Cruz Oliveira: cida.igaporan@hotmail.com;
Elionara Teixeira Boa Sorte Fernandes: naratbsorte@gmail.com;
Talitha Sonally Soares Fernandes: talithasonally@yahoo.com.br;
Antônio Marcos Tosoli Gomes: mtosoli@gmail.com
Resumo
Introdução: O câncer do colo do
útero constitui-se um importante problema de saúde pública que requer uma
atenção especial das instituições de saúde, gestores, profissionais da saúde e
população em geral. Objetivos: Apreender
o conhecimento de mulheres em idade fértil quanto à prevenção ao câncer do colo
uterino e descrever seu acesso às ações preventivas na atenção básica. Métodos: Estudo descritivo, com
abordagem qualitativa, realizado em uma Unidade Básica de Saúde em Guanambi/BA.
Para a coleta de dados foram utilizados um formulário e um roteiro de
entrevista semiestruturada. Para análise utilizou-se a técnica de análise de
conteúdo de Bardin. Resultados: Apesar de possuírem acesso às ações de saúde
relacionadas à neoplasia em questão, ainda há um conhecimento restrito sobre os
fatores de risco e sua prevenção. Isso contribui para a vulnerabilidade a esta
neoplasia. Conclusão: Faz-se
necessário uma avaliação das estratégias de educação em saúde utilizadas,
priorizando aquelas que considerem os aspectos socioculturais das mulheres e
que as reconheçam como participantes ativas do processo educativo.
Palavras-chave: neoplasias do colo
do útero, conhecimento, acesso aos serviços de saúde, prevenção de doenças,
enfermagem.
Abstract
Knowledge and women's access to cervical cancer prevention
Introduction: Cervical cancer is an important public health problem that requires
special attention to health institutions, managers, health professionals and
the general population. Objectives:
To apprehend the knowledge of women of childbearing age about the prevention of
cervical cancer and describe their access to preventive actions in primary
care. Methods: A descriptive study
with a qualitative approach, carried out in a Basic Health Unit in Guanambi/BA. For data collection were used a form and
semi-structured interviews. For analysis we used the Bardin
content analysis technique. Results:
Despite having access to health actions related to the cancer in question,
there is still a lack of knowledge about risk factors and prevention. This
contributes to the vulnerability of this neoplasm. Conclusion: It is necessary
an assessment of health education strategies used by prioritizing those that
consider sociocultural aspects of women and recognize them as active
participants in the educational process.
Key-words: uterine
cervical neoplasms, knowledge, health services accessibility, disease
prevention, nursing.
Resumen
Conocimiento y acceso de las mujeres
a la prevención
del cáncer de cuello uterino
Introducción: El cáncer
cervical (CC) es un
importante problema de salud pública que requiere especial atención a las instituciones de salud, gerentes, profesionales de
la salud y la población en
general. Objetivos: Aprender el conocimiento
de las mujeres en edad fértil sobre prevención del cáncer del cuello
uterino y describir su acceso a las acciones
preventivas en la atención primaria. Métodos:
Estudio descriptivo con un enfoque cualitativo, realizado en una Unidad Básica de Salud en Guanambi/BA. Para la
recolección de datos se utilizaron un formulario
y entrevistas semiestructuradas. Para el análisis
se utilizó la técnica de análisis de contenido de Bardin. Resultados:
A pesar de tener acceso a las acciones de salud relacionadas con el cáncer
en cuestión, todavía hay una falta de conocimiento sobre los factores de riesgo y prevención. Esto contribuye a la
vulnerabilidad de esta neoplasia. Conclusión: Es
necesario una evaluación de
las estrategias de educación para la salud utilizadas, priorizando las
que consideren los aspectos
socioculturales de las mujeres y que las reconozcan como participantes activas
en el proceso
educativo.
Palabras-clave: neoplasias del cuello
uterino, conocimiento, acceso
a los servicios de salud, prevención de enfermedades, enfermería.
O câncer do colo do
útero (CCU) constitui-se um importante problema de saúde pública que requer uma
atenção especial das instituições de saúde, gestores, profissionais da saúde e
população em geral. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (INCA), o CCU
ocupa a quarta posição de causa de morte de mulheres por câncer no Brasil e
corresponde ao terceiro tumor mais frequente na população feminina [1].
Também chamado de
câncer cervical, ele está associado à infecção persistente do Papilomavírus Humano (HPV). Esse vírus é transmitido
durante as relações sexuais, através do contato com os
fluidos corporais e mucosas e, na maioria das vezes, não apresenta
nenhuma sintomatologia e patogenicidade. Contudo, em alguns casos, pode causar
alterações celulares no colo uterino que poderão evoluir para o câncer [1,2].
Sua prevenção
consiste em afastar os fatores de risco como a obesidade, sedentarismo,
tabagismo, multiplicidade de parceiros, atividade sexual precoce, relação
sexual desprotegida, dentre outros, e a realização periódica do exame
preventivo, também conhecido como Papanicolau [3].
A não realização do
exame preventivo, bem como a exposição aos diversos fatores de risco tornam
diversas mulheres vulneráveis ao CCU. O termo vulnerabilidade é empregado para
designar susceptibilidades das pessoas a problemas e danos de saúde. Pode ser caracterizado ainda pela intensidade do dano, a magnitude de uma
ameaça, ou qualquer outro tipo de evento adverso [4].
As mulheres em idade
fértil (15 a 49 anos), por exemplo, podem e devem realizar o exame, pois estudo
realizado na região sul do Brasil demonstra que grande parte das mulheres
acometidas pelo CCU está nesta faixa etária. Este mesmo estudo aponta que a
doença pode trazer transtornos a uma possível gravidez, por afetar o estado
emocional da gestante e devido às restrições do tratamento [5].
A
Estratégia de Saúde
da Família (ESF) exerce um trabalho fundamental no controle ao
CCU,
desenvolvendo ações de promoção,
prevenção e proteção da saúde das
mulheres.
Nas Unidades de Saúde da Família (USF), as mulheres podem
participar de
atividades educativas, assim como agendar e realizar o exame
preventivo, além
de obter orientações ao receber o resultado.
Como base nessas
constatações, questiona-se: Qual o conhecimento de mulheres em idade fértil
sobre a prevenção do CCU? Como se dá o acesso dessas mulheres aos serviços
preventivos? Tal inquietação remete à necessidade do enfermeiro, na condição de
integrante das equipes de saúde da família, compreender seu importante trabalho
nesse processo, através do planejamento e execução de estratégias de educação
em saúde, orientando as mulheres sobre a prevenção e os fatores de risco
associados ao CCU; realização de coleta do material para o exame citopatológico; da busca ativa das mulheres faltosas no
serviço e no acesso às orientações diversas sobre a patologia.
Observa-se ainda uma
lacuna no conhecimento acerca do conhecimento de mulheres em idade fértil sobre
prevenção ao CCU e acesso aos serviços de prevenção, revestindo-se este estudo
em uma importante contribuição sobre o tema no cenário científico.
Neste sentido, este
estudo buscou apreender o conhecimento de mulheres em idade fértil quanto à
prevenção ao CCU e descrever o acesso das mesmas às ações preventivas na
atenção básica.
Assim, acredita-se
que o acesso às ações educativas e preventivas é um elemento indispensável na
prevenção do CCU, uma vez que os estudos apontam que o conhecimento da doença
está diretamente relacionado à maior adesão às condutas de prevenção.
Trata-se de uma
pesquisa descritiva, de abordagem qualitativa, realizada em uma Unidade Básica
de Saúde (UBS) do município de Guanambi/BA. As colaboradoras da pesquisa foram
26 mulheres que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: ter de 15 a 49
anos (idade fértil) e serem adstritas na UBS escolhida. As mulheres que
concordaram em participar receberam as informações sobre a pesquisa e assinaram
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
O número de
participantes foi definido com base no critério de saturação dos dados, que
interrompe a captação de novos componentes quando for constatado que as
informações obtidas por novos participantes não altera o material coletado [6].
As colaboradoras
foram entrevistadas individualmente na UBS, antes da realização do exame
preventivo. As informações fornecidas foram confidenciais, de modo que as falas
não permitiram reconhecer as envolvidas, que foram identificadas com a letra E,
seguida do número de ordem da entrevista.
Os dados foram
coletados no período de outubro a novembro de 2015. Para tal, utilizou-se um
roteiro de entrevista semiestruturada, que contemplava dados sociodemográficos, para a caracterização das participantes,
e questões específicas relativas ao tema em questão. As entrevistas foram
gravadas com auxílio de um gravador de voz e, além disso, a pesquisadora
registrava todas as impressões obtidas em um diário de campo.
Para sistematizar e
analisar os dados obtidos nas entrevistas utilizou-se a técnica de Análise de
Conteúdo Temática de Bardin [7]. Essas foram
minunciosamente transcritas e lidas exaustivamente, seguindo então o plano de
análise, em três fases: a pré-análise, a exploração
do material, o tratamento dos resultados e a interpretação.
A pesquisa faz parte
de um projeto maior, intitulado “Vulnerabilidade de mulheres aos cânceres de
colo uterino e de mama”, o qual seguiu todos os preceitos éticos e legais da
Resolução nº 466/2012 e recebeu parecer favorável do Comitê de Ética em
Pesquisa (CEP) da UNEB sob o CAAE nº 47525915.9.0000.0057.
As características sociodemográficas das 26 mulheres que participaram do
estudo incluíram: idade entre 19 e 47 anos; sendo 20 casadas ou em relação
estável com seu companheiro, 05 solteiras e 01 viúva. Em relação à
escolaridade, 06 não completaram o ensino fundamental, 07 concluíram o ensino
fundamental, 09 concluíram o ensino médio, 02 cursavam o ensino superior e 02
concluíram o ensino superior. No que se refere à ocupação, 12 das entrevistadas
exerciam uma atividade remunerada, 04 eram autônomas, 04 donas de casa, 02
aposentadas, 01 possuía apenas o benefício Bolsa Família e 03 estavam
desempregadas. A renda familiar variou de 01 a 03 salários mínimos. No quesito
raça/cor, 05 mulheres se declararam brancas, 03 amarelas, 17 pardas, 01
indígena e nenhuma preta. E em relação à religião que professam,
14 declararam-se católicas e 12 evangélicas.
As condições sociodemográficas influenciam o acometimento pelo CCU na
medida em que mulheres de baixa escolaridade e nível socioeconômico são as que
menos têm acesso às ações de rastreamento e acabam não realizando o exame
preventivo [8,9].
O Relatório Anual das
Desigualdades Raciais no Brasil evidenciou que, no ano de 2008 a taxa de não
realização do exame preventivo entre as mulheres brancas foi de 13,2%, enquanto
que entre as mulheres pretas e pardas foi de 18,1%. Para as mulheres brancas
com ensino fundamental completo, a taxa de não realização do exame preventivo
para câncer de colo de útero foi de 17,7%, ao passo que para as pretas e pardas
foi de 21,5%. Com isso, é possível observar uma assimetria de cor ou raça no
que concerne à prevenção dessa neoplasia de colo uterino [10].
Os conteúdos dos
depoimentos contemplaram duas categorias temáticas referentes ao conhecimento
de mulheres sobre a prevenção do CCU e o acesso aos serviços preventivos:
“Câncer do colo uterino: doença temida que deve
ser
prevenida” e “Acesso às ações de
prevenção: avaliação positiva e algumas
dificuldades”. Sua discussão fundamentou-se em autores que
abordam a temática.
Câncer
do colo uterino: doença temida que deve ser prevenida
As mulheres
associaram o câncer a uma doença temida, e que causa a morte caso não se
previna. Isso pode ser percebido tanto nas falas das entrevistadas, como também
através das expressões faciais e da maneira como elas falam ao serem
questionadas sobre qual o seu conhecimento acerca do CCU.
[...]
a gente tem que prevenir para que não aconteça esse mal terrível com a gente
(E02)
[...]
sei que a gente morre rapidinho e que se não cuidar a mulher morre. (E21)
Apesar de
inicialmente dizerem não saber nada sobre o CCU ou a prevenção da doença, as
mulheres destacaram a importância da prevenção precoce através da realização
periódica do exame preventivo, como demonstrado nas falas abaixo.
Vou
fazer o preventivo hoje. O que eu sei é que é muito importante, pois quanto
mais cedo detectar o problema, mais chance de você viver. E se passar, não tem
jeito. (E14)
Eu
não sei. Até hoje ninguém nunca me falou nada. Eu acho que é o preventivo né?
(E25)
Nem
sei o que eu sei sobre o câncer do útero. Eu faço exame. Faço o preventivo de
ano em ano (E08).
De três mulheres que
afirmaram não saber nada sobre o CCU, duas delas alegaram nunca ter realizado o
exame.
Algumas mulheres
(cinco) citaram o preservativo masculino como forma de prevenção do CCU, mesmo
esta não sendo uma prática constante nas suas relações sexuais:
Ué!
Através de quê? De camisinha. (E12)
Usar
preservativo [...] fazer os exames. (E04)
Tem
que estar usando preservativo. (E23)
Eu
não sei como se previne, pelo uso do preservativo, sei lá. (E22)
De
vez em quando uso preservativo, quando estou sem remédio. Injeção
também já usei muito. (E17)
Uma entrevistada
afirmou ainda que usa o preservativo, mesmo contra a vontade do parceiro.
Eu
tenho meu marido e mesmo assim eu uso preservativo, contra a vontade dele, tem
que estar se cuidando. (E07)
Acesso
às ações de prevenção: avaliação positiva e algumas dificuldades
As mulheres
entrevistadas fazem uma avaliação positiva do atendimento na prevenção ao CCU,
o que é confirmado pelas falas abaixo:
O
atendimento sempre é ótimo por todos aqui no nosso PSF. Toda quinta-feira tem
essa prevenção. (E26)
Você
pode vir no postinho marcar [...] todo mundo consegue fazer esses exames. Eu
creio que era bem mais difícil, mas hoje facilitou. (E20)
Apesar de avaliarem o
atendimento como positivo, algumas entrevistadas deste estudo mencionarem
algumas dificuldades como o enfrentamento de grandes filas e a morosidade do
atendimento e do interstício entre a marcação e a realização do exame.
Às
vezes a gente marca um exame e demora um pouco. Eu estava até questionando com
a menina ali agora, porque hoje tudo é esperar, é fila, é muita gente. E você
chega, e você tem que trabalhar ainda, e demora muito pra atender. (E20)
Pra
você conseguir um exame desses é muito demorado. E às vezes quando você tá com
uma doença dessas, ela não espera. Você tem que ter um atendimento adequado. Às
vezes você coloca um exame desses no posto de saúde e leva seis a um ano pra
sair. (E15)
Quando questionadas
sobre as informações recebidas no serviço de saúde a respeito do CCU, as
entrevistadas afirmaram que sempre receberam orientações dos profissionais de
saúde quando realizavam o exame.
Fui
bem orientada. Ela me orientou direitinho. Me explicou.
(E10)
Aqui
eu não tenho o que reclamar. Sempre é bom. Recebo orientações, tudo direitinho.
Se tiver alguma coisa ela fala, é muito bom, eu não
tenho o que reclamar não. (E09)
Geralmente essas
orientações são dadas no momento das consultas para a coleta do material para
exame e também no momento da entrega do resultado como demonstra a fala abaixo.
Eles
orientam tudo direitinho, na hora de realizar e na hora de entregar também.
(E04)
Não obstante a
afirmação que sempre recebem orientações sobre o câncer do colo do útero por
profissionais de saúde, o tipo de orientação não fica explicitado nas falas,
com exceção da orientação de repetir o exame anualmente, a qual foi recorrente
durante as entrevistas.
Quando
recebe o resultado a mulher é orientada a fazer com um ano depois, novamente.
(E26)
Quando
a gente recebe o resultado, ela orienta a gente pra estar anualmente fazendo.
(E02)
As palestras também
aparecem nas falas das entrevistadas como momentos nos quais elas possuem
acesso às informações sobre o CCU.
Sempre
tem palestra aqui, que elas falam sobre o câncer do colo do útero. Elas fazem a
palestra no posto falando. É muito bom. Elas conversam com a gente e explica.
(E01)
É
bom, tem os exames certos, tem orientação, tem palestra. A gente vem direto pra assistir a palestra. (E21)
De
vez em quando tem as palestras também, que falam sobre isso. (E17)
Embora algumas
patologias e/ou problemas de saúde sejam inevitáveis, existem tantas outras que
são evitáveis quando conhecemos suas características, sinais e sintomas,
manifestações clínicas, formas de prevenção e tratamento.
Apesar das campanhas
realizadas pelo Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais e Municipais de
Saúde, dentre outros órgãos das esferas públicas e privadas, ainda há um
caminho muito longo a trilhar no campo da educação em saúde, especialmente na
saúde da mulher, o que ficou evidente nas falas das mulheres entrevistadas.
O temor em relação ao
câncer é comum entre as mulheres devido ao sofrimento que a patologia causa, aos estigmas da sociedade quando uma pessoa é
acometida pela mesma e também devido à possibilidade de perda de um órgão que
tem um valor simbólico e repleto de representações para a mulher, por este
estar intrinsecamente associado à maternidade e à feminilidade [11].
Estudo realizado com
o objetivo de perceber as representações sociais das mulheres com relação à
doença demonstrou que a mesma é atribuída a uma ferida de difícil tratamento e
que se não for tratada pode evoluir para uma forma mais grave e levar à morte
[13].
Durante as
entrevistas, as mulheres se mostraram receosas em falar sobre a doença, talvez
pelo fato das neoplasias, em geral, serem consideradas pela maioria das pessoas
uma patologia de difícil tratamento e grande morbimortalidade, portanto, infere-se que este excesso de temor acaba prejudicando a
compreensão das informações veiculadas pelos meios de comunicação, salas de
esperas, campanhas, consultas, dentre outros espaços.
Um estudo que
objetivou avaliar a percepção de mulheres frente ao diagnóstico e tratamento do
CCU apontou que quando a mulher não conhece a doença e suas consequências, ela
protela a realização do exame preventivo, aumentando, desta forma, a sua vulnerabilidade
à patologia [12]. Destaca-se assim a importância das ações de educação em saúde
no campo da saúde da mulher, especialmente, no que se refere à prevenção do
CCU.
Outro estudo
realizado com mulheres em um hospital universitário, no interior de São Paulo,
demonstrou que grande parte das mulheres diagnosticadas com a patologia não
realizava periodicamente o exame. Algumas afirmaram que não o faziam por medo e
vergonha, por não estarem sentindo nenhum sintoma e por falta de tempo [11].
Outra ação importante
para prevenção ao CCU é o uso de preservativos durante a relação sexual,
contudo, segundo o INCA, seu uso não é suficiente para proteger o indivíduo do
contágio pelo HPV, causador do CCU. Os preservativos protegem apenas
parcialmente, uma vez que o contágio também pode ocorrer através do contato com
a pele da vulva, região perineal, perianal e bolsa escrotal [1].
Além disso, o medo da
gravidez indesejada parece ser maior que o de contrair uma doença, pois fica
evidente que o preservativo é utilizado apenas como método contraceptivo, visto
que o seu uso acontece apenas na ausência de outros métodos anticoncepcionais.
Estudo realizado em
Recife, com um grupo de adolescentes, demonstrou que dos oito adolescentes que
já tinham iniciado a vida sexual, três utilizavam o preservativo em suas
relações apenas para evitar a gravidez, enquanto outros três utilizavam para
prevenir IST [14]. Entre as idosas, também há a ideia equivocada da dispensação
do uso do preservativo, dentre outros fatores, devido à chegada da menopausa
nas mulheres e a impossibilidade de gravidez [15-17].
Grande parte dos
estudos confirma que a prática sexual desprotegida é bastante comum nas
relações estáveis devido à confiança que os parceiros depositam no outro. Com
isso, muitas mulheres são infectadas nessas relações, em nome dos juramentos de
fidelidade e de amor eterno feitos pelos parceiros
[18].
Geralmente, as
alegações são de que o preservativo diminui a sensibilidade e,
consequentemente, a sensação de prazer proporcionada pelo ato sexual. Nesse
contexto, algumas mulheres são coagidas a não utilizar o preservativo, ficando,
desta forma, vulneráveis à infecção pelo HPV e outras IST [19].
Embora a maioria das
mulheres demonstre conhecer que o CCU é uma doença que se detectada
precocemente as chances de sobrevivência são aumentadas, há ainda um equívoco
sobre as suas formas de prevenção. Um destes equívocos é acreditar que apenas a
frequência da realização do exame citopatológico é
suficiente para prevenir a doença, enquanto existem vários fatores de risco
para o seu desenvolvimento, os quais estão atrelados ao estilo de vida que a
mulher possui [3].
Desta forma, as
mulheres têm consciência de que o exame citopatológico
deve ser realizado periodicamente, porém, faz-se necessário a compreensão de
que o exame em questão é apenas uma forma de rastreamento da doença e que é
preciso dar uma ênfase maior aos fatores de risco para doença, a fim de se
alcançar uma prevenção mais efetiva.
Estudo que objetivou
avaliar os aspectos da qualidade dos serviços oferecidos pela rede básica de
saúde do município de Tubarão, Santa Catarina, na perspectiva das usuárias,
apontou que das 16 entrevistadas, 15 manifestaram satisfação com o atendimento
[20]. Outro estudo, realizado no estado da Paraíba, demonstra que 64% das
participantes da pesquisa estão satisfeitas com a realização do exame, ou seja,
com o procedimento em si, porém demonstram insatisfação com as orientações
recebidas, as quais, segundo elas, não são suficientes para a compreensão da
doença [21].
Por problemas
estruturais e de gestão, o Sistema Único de Saúde (SUS) enfrenta dificuldades
recorrentes nos serviços de saúde nos diversos municípios brasileiros.
Dificuldades semelhantes às apontadas pelas participantes desta pesquisa foram
também relatadas em estudo realizado no município de Paracatu, Minas Gerais, em
que 11% das participantes alegaram demora em conseguir marcar e realizar o
exame [22]. Outro estudo realizado em Uberaba também constatou que 20% das
entrevistadas encontravam dificuldade na marcação do exame, devido à
insuficiência de vagas no serviço oferecido [23].
Apesar de as
entrevistadas afirmarem a qualidade do atendimento, o conhecimento de algumas
sobre a patologia não se mostrou amplo, o que pode ser justificado por um
serviço deficiente no que se refere à informação de maneira completa, pois se
destaca, apenas, a periodicidade de realização do exame.
A
consulta de
enfermagem constitui-se um importante espaço de
educação em saúde e pode ser
utilizada como um indispensável momento de compartilhamento do
saber sobre
práticas de prevenção, promoção e
proteção da saúde, contribuindo, desta forma,
para facilitar o acesso da população às
informações sobre essa tríade.
Estudo realizado com
enfermeiros das Unidades de Saúde da Família do município de Juazeiro do Norte,
Ceará, com o objetivo de investigar as práticas dos mesmos acerca da educação
em saúde para a prevenção de CCU evidenciou a utilização de atividades
coletivas, como palestras, salas de espera e rodas de conversa, para facilitar
o acesso das mulheres às informações sobre a prevenção do CCU, assim como sobre
os aspectos gerais da doença [24].
Apesar da utilização
de diferentes estratégias de educação em saúde, geralmente, os métodos
utilizados são baseados no tradicionalismo, através da transmissão do
conhecimento, no qual o profissional de saúde assume a posição de detentor do
saber e as usuárias de meras expectadoras. Paulo Freire, educador brasileiro,
denomina esse fenômeno de educação bancária, no qual aquele que transmite a
informação é comparado ao depositante e os sujeitos que a recebem de maneira
passiva se assemelham à conta bancária [25].
Ademais, acredita-se
que a utilização de linguagem técnica e inapropriada que não faz parte do
cotidiano das mulheres afeta significativamente a compreensão das informações
recebidas.
Neste sentido,
profissionais de saúde precisam reconhecer as usuárias como participantes do
processo educativo e utilizar métodos baseados no compartilhamento das
informações, estabelecendo uma relação horizontal com as mesmas e evitando a utilização demasiada de vocabulário técnico e rebuscado em suas
abordagens.
Este estudo
evidenciou que apesar da adesão de muitas mulheres à realização do exame
preventivo e mesmo possuindo acesso aos serviços e às ações de prevenção e
promoção da saúde, ainda há um conhecimento restrito sobre o CCU e suas formas
de prevenção, o que contribui para a vulnerabilidade das mulheres à neoplasia.
É preciso que as
mulheres reconheçam os fatores de risco associados ao desenvolvimento do CCU e
a vulnerabilidade a que estão expostas. Isto é possível a partir do estabelecimento
de estratégias efetivas de promoção e prevenção da saúde. Neste sentido, faz-se
necessário a avaliação constante das estratégias de educação em saúde
utilizadas por profissionais, especificamente por enfermeiros, com vistas à
utilização de abordagens nas quais as usuárias se sintam participantes ativas
do processo educativo, instigando, desta forma, o seu envolvimento com a
atividade desenvolvida, o que contribuirá significativamente para a compreensão
das informações compartilhadas.
Este estudo
apresentou uma limitação quanto ao momento de abordagem das participantes da
pesquisa, pois a ansiedade e o receio de ser convocada para a consulta no
momento da entrevista interferiu no conteúdo das respostas. Contudo, este
estudo poderá contribuir para a reflexão sobre o modelo de educação em saúde
vigente e para dar subsídios a outros estudos que por ventura vierem a surgir
sobre o assunto em questão.