ARTIGO ORIGINAL
Paciente grave com
sepse: concepções e atitudes de enfermeiros intensivistas
José
Melquiades Ramalho Neto, M.Sc.*,
Aran Rolim Mendes de Almeida**, Luípa
Michele Silva, D.Sc.***, Renata Andréa Pietro Pereira
Viana, D.Sc.****, Maria Miriam Lima da Nóbrega, D.Sc.*****
*Doutorando em
Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal
da Paraíba (UFPB), Enfermeiro Assistencial na UTI Adulto do Hospital
Universitário Lauro Wanderley (UFPB), **Enfermeiro Especialista na Modalidade
Residência Multiprofissional em Saúde Hospitalar com Ênfase na Atenção ao Paciente
Crítico (UFPB), Enfermeiro Assistencial na UTI Adulto do Hospital Memorial São
Francisco, ***Professora Adjunto do Curso de Graduação em Enfermagem da
Universidade Federal de Goiás (UFG), ****Diretora do Núcleo de Terapia
Intensiva do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo,
*****Professora Titular do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva,
Docente do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da
Paraíba, Diretora do Centro para Pesquisa e Desenvolvimento da CIPE do Programa
de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal da Paraíba (UFPB),
Pesquisadora CNPq
Recebido
em 1 de fevereiro de 2019; aceito em 16 de abril de 2019.
Correspondência: José Melquiades Ramalho Neto, Rua Lauro Torres, 174/1101 Tambauzinho, 58042-030 João Pessoa PB
José Melquiades Ramalho Neto: melquiadesramalho@gmail.com
Aran Rolim Mendes de Almeida: aranalmeida74@gmail.com
Luípa Michele Silva: luipams@ufg.com.br
Renata Andréa Pietro
Pereira Viana: rpietrov@gmail.com
Maria Miriam Lima da Nóbrega:
miriam@ccs.ufpb.br
Resumo
Introdução: A sepse é definida
pela presença de disfunção orgânica ameaçadora à vida decorrente de uma
resposta imune desregulada do organismo à infecção, podendo progredir para
choque séptico diante de acentuadas anormalidades circulatórias, celulares e
metabólicas. Objetivo: Conhecer a
atuação de enfermeiros intensivistas de uma Unidade de Terapia Intensiva Geral
no tocante aos cuidados com o paciente séptico. Métodos: Estudo exploratório com abordagem qualitativa, realizado
com 12 enfermeiros de um hospital escola do município de João Pessoa/PB,
Brasil, no período de outubro a novembro de 2015. Para a apreensão do material
empírico, utilizou-se um formulário estruturado, sendo o material tratado por
meio da técnica de análise de conteúdo temática categorial. Resultados: Da análise qualitativa
emergiram duas categorias: compreensão sobre a sepse e cuidados intensivos ao
paciente com sepse. Os depoimentos dos enfermeiros intensivistas revelaram
adequado conhecimento sobre a sepse, com ações embasadas na Campanha
Sobrevivendo à Sepse e na própria experiência clínica. Conclusão: Os cuidados intensivos deixaram transparecer, de modo
enfático, que o reconhecimento precoce dos diferentes espectros clínicos da
sepse por enfermeiros torna-se relevante tanto para o diagnóstico quanto para
as definições rápidas dos planos terapêuticos e estratégias de monitorização
dos pacientes.
Palavras-chave: sepse, cuidados de
enfermagem, unidades de terapia intensiva, assistência centrada no paciente.
Abstract
Severe patient
with sepsis: conceptions and attitudes of critical
care nurses
Introduction: Sepsis
is defined by the presence
of life-threatening organic dysfunction due to a dysregulated
immune response of the organism to
infection and may progress to
septic shock in the face of marked
circulatory, cellular and metabolic abnormalities.
Objective: To know the
performance of critical care nurses of a General Intensive Care Unit in the care of
the septic patient. Methods: An exploratory
study with a qualitative approach, carried out
with 12 nurses from a school hospital in the city of João Pessoa/PB, Brazil, from October
to November 2015. A structured form was used to
capture the empirical
material, and the material was treated by
Theme/Category-Based Content Analysis. Results: Two categories emerged from the
qualitative analysis: understanding about sepsis and intensive
care for patients with sepsis. The declarations of critical care nurses revealed adequate knowledge about sepsis, with actions
based on the Surviving Sepsis
Campaign and clinical experience. Conclusion: Intensive care has emphatically shown that early
recognition of the different clinical
spectra of sepsis by nurses becomes relevant both for diagnosis and for the rapid
definition of therapeutic plans and patient monitoring
strategies.
Key-words: sepsis,
nursing care, intensive care units, patient-centered care.
Resumen
Paciente grave con sepsis: concepciones y actitudes de enfermeros
intensivistas
Introducción: La sepsis es definida por la
presencia de disfunción orgánica
amenazadora a la vida
derivada de una respuesta inmune
desregulada del organismo a la
infección, pudiendo progresar hacia shock séptico ante acentuadas anormalidades circulatorias, celulares y metabólicas. Objetivo: Conocer
la actuación de enfermeros intensivistas de una Unidad
de Terapia Intensiva General en cuanto
a los cuidados con el paciente séptico. Métodos: Estudio
exploratorio con abordaje cualitativo, realizado con 12 enfermeros de un hospital escuela del municipio de João Pessoa/PB,
Brasil, en el período de octubre a noviembre de 2015. Para
la captura del material
empírico, se utilizó un formulario estructurado, siendo el material tratado
mediante la técnica de análisis
de contenido temático categorial. Resultados: Del análisis
cualitativo emergieron dos categorías: comprensión sobre la sepsis y cuidados
intensivos al paciente con sepsis.
Los testimonios de los enfermeros intensivistas revelaron
adecuado conocimiento sobre
la sepsis, con acciones basadas
en la Campaña
Sobreviviendo a la Sepsis y en la
propia experiencia clínica. Conclusión: Los cuidados
intensivos dejaron de manifiesto,
de modo enfático, que el reconocimiento
precoz de los diferentes
espectros clínicos de la sepsis
por enfermeros se vuelve relevante
tanto para el diagnóstico y para las
definiciones rápidas de los
planes terapéuticos y estrategias
de seguimiento de los
pacientes.
Palabras-clave: sepsis, atención
de enfermería, unidades de terapia intensiva, atención dirigida al paciente.
A sepse constitui importante problema de saúde
pública por representar uma das maiores causas de hospitalização e mortalidade
nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI) de todo o mundo, não obstante o avanço
da ciência contemporânea para o suporte artificial das funções orgânicas do
paciente grave, da existência de modernos recursos diagnósticos, do emprego de
antimicrobianos de largo espectro, da monitorização hemodinâmica à beira do
leito, dentre outras abordagens terapêuticas [1-3].
Infecções de origem comunitária ou relacionadas
à assistência à saúde podem suscitar um quadro clínico de sepse, porém no
ambiente de cuidados intensivos os pacientes apresentam maior predisposição
para desenvolvê-la devido à presença de doenças crônicas subjacentes; ao tempo
de internação prolongado e debilitante na UTI; à maior prevalência de
resistência bacteriana; à necessidade imperiosa de procedimentos invasivos e
intervenções outras que, de alguma forma, quebram as barreiras naturais do
organismo [4].
Nesse ínterim, atualmente a sepse é definida
pela presença de disfunção orgânica ameaçadora à vida decorrente de uma
resposta imune desregulada do organismo à infecção, podendo progredir para
choque séptico diante de acentuadas anormalidades circulatórias, celulares e
metabólicas que refletem uma inadequada utilização de oxigênio pelas células,
capazes de aumentar substancialmente a mortalidade [5-6].
Por se manifestar em distintos espectros de
gravidade com o decorrer do tempo, o enfermeiro intensivista é instigado a
planejar, coordenar e implementar ações que promovam uma avaliação mais
criteriosa à beira do leito no sentido de rastrear a presença de infecção e
possível sepse pelo reconhecimento precoce de disfunções orgânicas (clínica ou
laboratorial) ou, ainda, embasar tal desconfiança a partir de discussões
clínicas com a equipe multiprofissional de plantão a fim de propiciar um
tratamento ágil e adequado decorrente de uma prática clínica especialmente
embasada nas diretrizes internacionais da Campanha Sobrevivendo à Sepse (CSS).
Diante da elevada morbimortalidade e dos
exorbitantes dispêndios gerados para sistemas de saúde, as diretrizes da CSS
vem sendo desenvolvidas como um movimento mundial que busca padronizar o
tratamento dos pacientes à beira do leito com base nas mais sólidas evidências
científicas, consistindo no agrupamento de intervenções que, quando aplicadas
em conjunto, apresentam maior eficácia do que em separado [7].
No cenário brasileiro, estudos epidemiológicos
sobre pacientes sépticos evidenciaram importante incremento na incidência anual
da doença com progressivo aumento da mortalidade segundo seus estágios
evolutivos (sepse e choque séptico), além de refletirem altos custos com a
hospitalização e considerável impacto econômico para o sistema de saúde [8-11].
No intuito de contribuir para a reflexão acerca
da importância de um cuidado intensivo individualizado e sistemático aos
pacientes graves com sepse, capaz de efetivamente reduzir a mortalidade na UTI,
este estudo estruturou-se com o objetivo de conhecer a atuação de enfermeiros
intensivistas de uma Unidade de Terapia Intensiva Geral no tocante aos cuidados
com o paciente séptico.
Trata-se de um estudo exploratório com
abordagem qualitativa, desenvolvido na UTI Geral de um hospital escola do
município de João Pessoa/PB, Brasil. A escolha do local decorreu do fato da UTI
ser referência no estado, possuir constantes projetos para o aprimoramento
teórico-prático de estudantes e profissionais residentes dos cursos da área de
saúde, contar com uma educação continuada na área da Enfermagem, assim como se
constituir em amplo campo de pesquisa científica nas diversas áreas de formação
profissional.
Participaram do estudo 12 enfermeiros intensivistas
que compunham o quadro de profissionais da unidade em turnos de seis ou doze
horas assistenciais à beira do leito, obedecendo ao critério de inclusão: atuar
na área de cuidados intensivos por tempo igual ou superior a seis meses.
A coleta de dados aconteceu por meio de
entrevista entre os meses de outubro e novembro de 2015 no próprio local de
trabalho do enfermeiro, com dia e horário por ele pré-determinados, após
assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A apreensão do
material empírico ocorreu em local reservado, utilizando-se um formulário
contendo questões subjetivas que foram embasadas nas diretrizes da Campanha
Sobrevivendo à Sepse [11-12] e na prática profissional de enfermagem com
pacientes graves acometidos por sepse. Na segunda parte, foram investigadas
variáveis como sexo, idade, nível de educação e tempo de experiência
profissional (em anos).
Os dados referentes ao objetivo proposto foram
analisados e tratados por meio da técnica de análise de conteúdo temática
categorial, utilizada em pesquisas de campo da saúde por abranger um conjunto
de técnicas que favorecem o tratamento dos significados dos discursos [14].
Para tanto, o procedimento obedeceu às seguintes etapas: pré-análise,
que compreendeu a leitura flutuante dos formulários respondidos, os quais
constituíram o corpus; após o preparo
do material houve a aplicação da técnica de análise de conteúdo e,
posteriormente, a seleção das unidades de análise. Foram consideradas como
unidades de contexto o parágrafo, e como unidades de registro a frase. Para
realizar o recorte, a classificação e a categorização, optou-se pelo processo
categorial indutivo, isto é, as categorias foram definidas a posteriori.
Uma vez constituído o banco de dados e aplicada
a técnica selecionada, houve o tratamento dos dados; a validação dos dados
obtidos; as inferências e a interpretação dos resultados, com base na
literatura pertinente e no bundle da Campanha Sobrevivendo à Sepse [5,7,12].
Vale ressaltar que o projeto foi submetido ao
Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley, da
Universidade Federal da Paraíba, mediante CAAE n° 46215615.5.0000.5183,
recebendo parecer favorável. Foram respeitados os princípios éticos para
pesquisas envolvendo seres humanos [13].
A seguir, apresentam-se os participantes do
estudo e as categorias geradas a partir da análise dos dados.
No tocante aos doze enfermeiros participantes
do estudo, a idade variou entre 32 e 60 anos (média 41,9 ± 8,4), com predomínio
do gênero feminino (92%). Ademais, foi evidenciado dentre os enfermeiros um
significativo grau de maturidade assistencial na área de cuidados intensivos,
tendo em vista que os mesmos apresentaram tempo médio de assistência direta a
pacientes graves de 13,0 ± 9,7 anos, embora somente três deles (25%) tivessem
cursado uma pós-graduação strictu sensu.
Ao analisar os depoimentos dos enfermeiros,
emergiram duas categorias: 1ª Categoria - Compreensão sobre a sepse, e suas
respectivas subcategorias: entendimento do conceito e manifestações clínicas;
2ª Categoria - Cuidados intensivos ao paciente com sepse, com as subcategorias:
abordagem inicial e vigilância do paciente séptico. As unidades de análise, que
correspondem às frases coletadas, estão explicitadas a seguir no Quadro 1.
Quadro 1 - Representação sinóptica das categorias e subcategorias segundo as
unidades de análise. João Pessoa/PB, Brasil, 2016.
Conforme evidenciado nos resultados, os
enfermeiros tranquilamente entendem a sepse como uma condição clínica grave
desencadeada por uma resposta imune desregulada diante de um quadro infeccioso,
embora a maioria deles tenha afirmado não ter sido abordada tal temática em
momento algum da sua formação profissional.
Atualmente, a definição ampla de sepse oriunda
da nova conferência de consenso (Sepsis-3) ressalta, ainda, em seu conceito a
presença de disfunção orgânica potencialmente fatal com base na variação de
dois ou mais pontos no escore Sequential Organ Failure Assessment (SOFA),
não sendo os critérios relacionados à síndrome da resposta inflamatória
sistêmica (SRIS), mas necessários para a definição da doença, e tampouco o
termo “grave” para a sua nomenclatura pelo fato da sepse já traduzir uma
condição grave que demanda atenção imediata e senso de prioridade pelos
profissionais de saúde, sendo hoje utilizados os termos: infecção, sepse e
choque séptico [5].
A identificação de pacientes infectados e com
potencial quadro séptico na UTI sempre representou um desafio para os
profissionais devido a SRIS induzir sensibilidade exacerbada frente ao vasto
aparato tecnológico utilizado para a monitorização das suas funções
fisiológicas, além dela estar igualmente presente em outras situações clínicas.
Diante disso, rastrear infecção e possível sepse compreende um desafio no
tocante ao reconhecimento precoce de disfunções orgânicas por meio da variação
do escore SOFA ou, ainda, segundo critérios clínicos preconizados pelo
Instituto Latino Americano de Sepse (ILAS) e que estão alinhados com a Campanha
Sobrevivendo à Sepse, como: hipotensão arterial; oligúria ou elevação da
creatinina; índice de oxigenação reduzido ou baixa saturação de oxigênio pela
oximetria de pulso; plaquetopenia; hiperlactatemia;
alteração do nível de consciência; aumento significativo de bilirrubinas
[5,6,15].
Por outro lado, a triagem de sepse em pacientes
com suspeita de infecção no pronto-socorro ou em enfermarias [15-19] deve se
basear em ferramentas sensíveis, de acordo com a disponibilidade de recursos de
cada instituição, buscando sempre o equilíbrio entre sensibilidade (critérios
de SRIS, quick-SOFA
ou algum sistema próprio de triagem institucional) e especificidade (disfunção
orgânica clínica ou laboratorial).
Nesse processo fisiopatológico, a infecção
bacteriana, viral, fúngica ou parasitária pode afetar a relação entre a oferta
e o consumo de oxigênio, considerada um dos principais mecanismos de disfunção
na sepse [20] e que não se limita unicamente ao local inicial da infecção. Além
disso, a evolução dessa síndrome varia de acordo com o tempo de diagnóstico e a
debilidade do estado de saúde do paciente que pode desenvolver disfunções
orgânicas nos diferentes sistemas corporais, como o cardiovascular,
respiratório, neurológico, renal, digestivo, endócrino e hematológico, sendo de
extrema importância o papel do enfermeiro na identificação precoce.
No tocante à prática profissional dos
enfermeiros do estudo em reconhecer manifestações clínicas de sepse, percebe-se
que é possível, ao longo do tempo, construir valores pessoais, profissionais
e/ou institucionais por meio de ferramentas que contribuam para essa evolução e
o entendimento de importantes conceitos acerca da doença [2,21-24], tornando-os
capazes de efetivamente rastrear a presença de uma infecção e possível sepse a
partir de um cotidiano assistencial na UTI lapidado pelos conhecimentos
empírico, estético, pessoal e ético.
Assim, o entendimento desses conceitos
reveste-se de grande importância não somente pelo objetivo diagnóstico de sepse
ou choque séptico, mas também para que definições rápidas de planos
terapêuticos e estratégias de monitorização sejam capazes de prontamente
integrar habilidades técnicas pessoais, segundo a tecnologia existente em cada
UTI, e as fundamentar em um conhecimento científico especialmente norteado
pelas recomendações da Campanha Sobrevivendo à Sepse [7,12], potencializando
sobremaneira a habilidade de liderança do enfermeiro intensivista para treinar,
orientar e coordenar a equipe de enfermagem [25], além de estar influenciando
positivamente toda a equipe multiprofissional de cuidados intensivos ao se
antecipar de modo proativo às necessidades humanas desses pacientes com sepse.
Os cuidados intensivos ao paciente séptico,
reportados na 2ª categoria, além de serem condizentes com o bundle da Campanha Sobrevivendo à
Sepse, representam o esforço profissional de número significativo dos
enfermeiros na busca de cursos de pós-graduação latu sensu na área de cuidados
intensivos, bem como na imersão desse conhecimento específico por meio de
congressos, pesquisas eletrônicas pessoais ou informativos.
É pertinente destacar que as atitudes dos
enfermeiros evidenciaram a imediata instituição de intervenções baseadas em
dois pilares cruciais: o tratamento e a ressuscitação volêmica precoces,
compreendidas na literatura corrente [9,26] como a medição do nível de lactato
sérico; a coleta de culturas microbiológicas sem atraso substancial na
administração dos antimicrobianos, com coleta de duas amostras de hemocultura
e, quando apropriado, de outros sítios pertinentes; e o início da terapia
antimicrobiana empírica de amplo espectro dentro da primeira hora do
diagnóstico, atentando-se para potenciais alterações do paciente decorrentes de
disfunções orgânicas já instaladas, as quais possam interferir na
farmacocinética (PK) e, como consequência, afetar sua farmacodinâmica (PD).
No tocante aos potenciais distúrbios
hemodinâmicos envolvendo os sistemas macro e microvascular, ressalta-se a
necessidade da rápida ressuscitação volêmica com frequente (re)avaliação
pelo enfermeiro do status
hemodinâmico do paciente não mais guiada pelas metas terapêuticas de Rivers et al. [27], mas por meio do exame
clínico minucioso que estime variáveis fisiológicas efetivamente disponíveis no
contexto em que aconteça o cuidado: frequência cardíaca, pressão arterial,
saturação arterial de oxigênio, frequência respiratória, temperatura corporal,
débito urinário, além de outras variáveis advindas de métodos invasivos ou
minimamente invasivos de monitorização, como a variação da pressão de pulso
[7].
Entretanto, independentemente do método para
avaliação da fluido-responsividade do paciente, o enfermeiro tem que primar
pela instalação de adequado acesso venoso e estar atento aos sinais clínicos de
hipotensão refratária ou hipoperfusão tecidual para agregar valor às medidas
terapêuticas médicas complementares, como a administração de vasopressor para
manter um alvo de pressão arterial, remensuração dos
níveis de lactato para nova avaliação do status
perfusional ou, ainda, instalação de inotrópico na
evidência clínica de hipoperfusão persistente ou disfunção miocárdica.
Nas UTIs brasileiras,
de acordo com o aparato tecnológico, a avaliação da equipe de plantão e a
definição médica por monitorização invasiva da pressão arterial, o enfermeiro
intensivista pode realizar a punção arterial (preferencialmente a radial) para
a instalação de um cateter e monitorização contínua [28], atentando-se não
somente para o valor bruto desta variável fisiológica, mas também para os cuidados
de enfermagem que garantam a fidedignidade desta monitorização, por meio da
adequada montagem e calibração do sistema; reconhecimento dos padrões de curva
para que se perceba precocemente, à beira do leito, alterações secundárias a
interferências técnicas ou a eventos fisiopatológicos importantes do paciente
séptico.
Assim, no que diz respeito ao paciente com
sepse, o número de necessidades humanas afetadas ou parcialmente atendidas é
muito grande, evidenciando-se diversos fenômenos de enfermagem e peculiares
conceitos diagnósticos de débito cardíaco prejudicado, perfusão tissular
ineficaz, troca de gases prejudicada, ventilação espontânea prejudicada, choque
séptico, hipertermia, risco de infecção, risco de choque, risco de aspiração,
risco de glicemia instável, entre outros [29-31].
Importante também na sepse é uma abordagem
multidisciplinar centrada em práticas baseadas em evidências para promover um
cuidado eficaz, eficiente e com alto impacto na mortalidade, muitas vezes sendo
necessária uma concentração de esforços para promover uma detecção e tratamento
precoces, transpondo-se barreiras que podem estar relacionadas a histórias
clínicas inadequadas do paciente antes da sua internação hospitalar;
transferências mal conduzidas até os serviços de emergência; atrasos na chegada
desses pacientes graves na UTI; falhas nas interações intersetoriais entre
pronto-socorro, enfermarias, centro cirúrgico, UTI, laboratório, agência
transfusional e/ou farmácia [32,33].
A partir da análise dos depoimentos, percebe-se
que os enfermeiros intensivistas detêm um conhecimento relevante a respeito da
temática mediante as ações por eles ressaltadas no cenário assistencial da sua
UTI, as quais deixam transparecer a ideia da importância de estarem evoluindo
sempre em habilidades interpessoais e cognitivas embasadas na Campanha
Sobrevivendo à Sepse e na própria experiência clínica.
Dessa forma, o reconhecimento precoce dos
diferentes espectros clínicos da sepse por enfermeiros torna-se relevante tanto
para o diagnóstico quanto para as definições rápidas dos planos terapêuticos e
estratégias de monitorização dos pacientes. Entende-se que a redução da
mortalidade e do dispêndio para os sistemas de saúde dependem desse
reconhecimento precoce por meio de estratégias peculiares aplicadas no ambiente
pré-hospitalar, departamento de emergência, unidades de internação ou UTI,
identificando pacientes com infecção sem disfunção; sepse ou choque séptico.
Este estudo apresenta algumas limitações no
sentido de trazer uma amostra pequena, refletindo concepções e práticas de
enfermeiros intensivistas de uma única instituição, embora o objetivo tenha
sido devidamente alcançado. Por esse motivo, ressalta-se a importância do
presente estudo ser replicado com uma amostra maior, envolvendo outras UTIs de diferentes regiões do país para que se possa
vislumbrar um panorama de como o conhecimento prévio desses profissionais pode
estar conduzindo a prática do cuidado intensivo a pacientes com sepse.