REVISÃO
A
assistência de enfermagem prestada às gestantes privadas de liberdade
Ana Paula Frota da
Rocha*, Samantha Souza Farias**, Leidiane Oliveira
Lozano***, Beatriz Gonçalves de Oliveira****
*Enfermeira
pós-graduada em Saúde Pública com Ênfase em Saúde Familiar, Instituto
Educacional Líder, Manaus/AM, **Enfermeira do Hospital e Pronto Socorro 28 de
agosto Manaus/AM, pós-graduada em Urgência e Emergência, Ginecologia e
Obstetrícia, ***Enfermeira do Hospital de Manaquiri/AM, pós-graduada em Centro
Cirúrgico e CME, ****Enfermeira pós-graduada em UTI
Recebido 22 de
fevereiro de 2019; aceito 15 de março de 2019
Endereço
para correspondência:
Leidiane Oliveira Lozano, Rua 24, 995 Parque 10 de
Novembro 69055-420. Manaus AM, E-mail: leide.jg@gmail.com; Ana Paula Frota da
Rocha: frota.anapaula95@gmail.com; Samantha Souza Farias:
costa.samantha.farias@hotmail.com; Beatriz Gonçalves de Oliveira: beatrizoliveiraximenes@gmail.com
Resumo
Objetivo: Avaliar a
efetividade da assistência de enfermagem prestada à gestante em situação de
cárcere. Metodologia: Trata-se de uma
revisão integrativa de literatura, de abordagem qualitativa, com propósito de
análise dos dados fornecidos a respeito da assistência de enfermagem prestada à
gestante privada de liberdade, com pesquisas de artigos sob
linha temporal dos anos de 2008 a 2018. Resultados: As análises demonstram fragilidade das ações de
enfermagem ofertadas à população gestante reclusa, vistos algumas dificuldades encontradas
específicas do ambiente prisional, segundo os estudos, relatados pelos próprios
profissionais e por internas custodiadas, que se encaixam no perfil da
pesquisa. Conclusão: O profissional
de enfermagem encontra diversos impedimentos acerca da aplicação da assistência
à população privada de liberdade, vistos os procedimentos
padrões adotados no ambiente carcerário, que por vezes, vão de encontro às
atividades de promoção de saúde.
Palavras-chave: gestante,
enfermagem, prisão, maternidade.
Abstract
Nursing care provided to pregnant women deprived of their liberty
Objective: To evaluate the effectiveness of nursing care provided to
pregnant women in prison. Methodology: This is an integrative review of the
literature, from 2008 to 2018,with a qualitative
approach, with the purpose of analyzing the data provided about the nursing
care provided to the pregnant woman deprived of liberty. Results: The review
demonstrate the fragility of the nursing actions offered to the pregnant
population, considering some difficulties found in the prison environment,
according to the studies reported by the professionals themselves and by
custodial inmates, which fit the research profile. Conclusion: The nurse
experiences several difficulties for the assistance to the population deprived
of liberty, considering the standard procedures adopted in the prison environment,
which sometimes go against health promotion activities.
Key-words: pregnant,
nursing, prison, maternity.
Resumen
Cuidado de enfermería
a las mujeres gestantes
privadas de libertad
Objetivo: Evaluar
la efectividad
del cuidado de enfermería a
la mujer gestante en prisión. Metodología: Se trata de una revisión integrativa de la literatura, de abordaje cualitativo, entre los años de 2008 y 2018, con el propósito de analizar los datos suministrados
respecto al cuidado de enfermería
a la mujer embarazada privada de libertad. Resultados: Los análisis
demuestran fragilidad de las acciones de enfermería brindadas a la población de mujeres gestantes reclusa, ante algunas
dificultades encontradas específicas del ambiente carcelario, según los estudios
relatados por los propios profesionales y por internas custodiadas, que se encajan en el
perfil de la investigación.
Conclusión:
El profesional de enfermería
encuentra diversos impedimentos para brindar la asistencia
en salud a la población privada de libertad, una vez que los procedimientos estándares
adoptados en el ambiente carcelario a veces van contra las actividades de promoción en salud.
Palabras-clave: gestante, enfermera, prisión, maternidad.
Profissionais da
atenção básica, responsáveis por atender a gestantes devem realizar ações de
atenção integral e de promoção da saúde, prevenção de agravos e escuta
qualificada em todas as ações, oferecendo atendimento humanizado e viabilizando
o estabelecimento do vínculo. A consulta de enfermagem é realizada
privativamente pelo enfermeiro, e tem como objetivo propiciar condições para a
promoção da saúde da gestante e a melhoria na sua qualidade de vida, mediante
uma abordagem contextualizada e participativa [1].
Toda gestante em
regime prisional é amparada de acordo com a Lei de Execução Penal (LEP) nº
7.210 e nº 11.942, que assegura a essas mulheres o acompanhamento médico no
pré-natal, parto e pós-parto, garantindo assistência de forma integral à saúde
da mãe e do bebê, sendo garantidas também condições mínimas estruturais, como
dormitórios exclusivos para as gestantes e parturientes, e berçários para que
auxilie as mães nos cuidados ao recém-nascido até os 6
meses de idade [2].
Em 2003 o Ministério
da Saúde, em ação integrada com o Ministério da Justiça, institui pela Portaria
Interministerial n.1777, o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário
(PNSSP), dentre suas ações esse plano assegura que a mulher tem direito ao
pré-natal, assim que descoberta a gestação, essa deve ser transferida para uma
unidade prisional que possua equipe médica e estrutura física para
acompanhamento em todo o período gravídico, e o parto deve ocorrer em unidade
hospitalar do sistema penitenciário ou da rede de saúde pública [3].
Porém, a oferta do
serviço de assistência à saúde no sistema penitenciário brasileiro é pequena,
em razão da necessidade da população carcerária que o utiliza, visto que este
público aumentou consideravelmente nos últimos anos, principalmente o publico
feminino, além das condições insalubres, especialmente estruturais, de saúde e
segurança que inibem a boa qualidade do atendimento a ser prestado [2,4].
Nesse sentido,
contesta-se qual a efetividade da assistência prestada a essa população.
Certifica-se, por exemplo, que, apesar dos esforços para abolição do uso de
algemas, durante o parto e pós-parto, ainda é possível diagnosticar seu uso em
alguns casos, prática tida como meio de segurança pelo regime prisional, a fim
de evitar possíveis fugas, por outro lado, torna tênue a assistência de
enfermagem ofertada à mulher, especialmente em tais períodos de fragilidade
[5].
A maior parte das
penitenciarias não fornece condições adequadas às necessidades femininas,
especialmente das em estado gravídico, há grande negligência nos cuidados com a
saúde reprodutiva e sexual. As mulheres em condição de cárcere tem
vulnerabilidade aumentada, em razão das limitações de acesso aos serviços
legais, de saúde e social, além das condições carcerárias degradantes, situação
essa que é estendida aos seus filhos, havendo, então, a persistente violação
dos direitos humanos [6].
Sob a ótica das detentas, que utilizam os serviços de saúde oferecidos
pelas unidades prisionais, as que realizam acompanhamento gestacional de
pré-natal, pós-parto e puerpério na unidade, enfatizam a dificuldade de
locomoção para qualquer tipo de consulta necessária nesta fase, o que as mesmas
atribuem à ausência no acolhimento [7].
Dessa forma,
constata-se a importância do profissional de enfermagem na dedicação a
prestação de cuidados a essa população, muito embora, tenha-se que enfrentar as
dificuldades já instaladas no sistema carcerário, e as advindas das
singularidades de cada caso. A preparação desses profissionais para o
enfrentamento de tais adversidades, é crucial na promoção da boa assistência à
saúde, posto que o acolhimento dessas mulheres são
vitais para minimizar os agravos à saúde destas, em qualquer período de sua
vida [2].
Contudo, o estudo
objetiva avaliar a efetividade da assistência de enfermagem prestada à gestante
em situação de cárcere, elencar as principais dificuldades enfrentadas pelos
profissionais em sua atuação e das mulheres na condição de reclusão em período
gravídico, contextualizando as especificidades que trazem a vivencia no sistema
prisional, através da análise do conteúdo revisado e relato de depoentes
descritas nos artigos.
Trata-se de uma
revisão integrativa de literatura, de abordagem qualitativa, com propósito de
análise dos dados fornecidos pelos artigos, a respeito da assistência de
enfermagem prestada à gestante privada de liberdade, por meio da ótica do profissional
de atuação no ambiente prisional, bem como na visão das mulheres expostas a
esses cuidados, através do conteúdo colhido nos artigos revisados.
A Revisão Integrativa
configura-se, portanto, como um tipo de revisão da literatura que reúne achados
de estudos desenvolvidos mediante diferentes metodologias, permitindo aos
revisores sintetizar resultados sem ferir a filiação epistemológica dos estudos
empíricos incluídos. Para que esse processo concretize-se de maneira lógica,
isenta de desatinos epistemológicos, a revisão integrativa requer que os
revisores procedam à análise e à síntese dos dados primários de forma
sistemática e rigorosa [8].
A abordagem
qualitativa é a ciência que trabalha com o universo dos significados, crenças,
representações, atitudes, opiniões, produtos das interpretações que os humanos
fazem a respeito de como vivem, sentem e pensam. Que busca a compreensão do
problema da maneira que os sujeitos a vivenciaram possibilitando, assim, a
identificação dos fatos em real essência [9].
Para consumação da
pesquisa, em ato de revisão bibliográfica, foram utilizados artigos, na linha
temporal de 2008 a 2018, contendo abordagens sobre a temática em questão e
adotados os seguintes descritores: cárcere, maternidade, prisão, pré-natal,
assistência de enfermagem, saúde da mulher, direitos reprodutivos,
penitenciária, grupos vulneráveis, sexualidade, vulnerabilidade, presa e filho,
gravidez.
Para critérios de
exclusão foram utilizados artigos que continham o conteúdo de afinidade com a
temática, compreendidos na linha temporal de 2013 a 2017, com textos completos
e em língua portuguesa. Foram excluídos os periódicos fora do seguimento
temporal descrito, os que se compunham por língua estrangeira e que não
englobavam a temática almejada.
Segundo análise dos
artigos revisados, a maior parte dos profissionais que se encontram no
exercício da profissão de enfermagem no sistema prisional declara não ter tido
preparo antecedente à prática da função no referido ambiente, o que dificulta o
contato inicial com a população em cárcere, assim como o discernimento da
melhor e/ou ideal forma de lidar com esse público e suas peculiaridades [10].
Dentre os principais
indicadores da baixa qualidade do atendimento, principalmente o pré-natal das
mulheres reclusas, destaca-se a má relação terapêutica e a falha na troca de
informações entre os profissionais de saúde da unidade prisional,
posteriormente há ao atraso das consultas, procedimentos e orientações não
realizadas, que pode se dar por conta da ausência de educação continuada aos
profissionais, a fim de capacitá-los para atuação no meio em questão, além da
devida atenção à prática das condutas acolhedoras previstas ao pré-natal
[3,11].
Por outro lado, há o
contraste entre saúde e segurança, circunstancia causadora de grande estresse
aos profissionais, que são por vezes impedidos de exercer a assistência em sua
integralidade, o que expropria sua responsabilidade descrita na Lei Federal n°
7.498, de 25 de junho de 1.986, em seu art. 11, que é atribuído ao enfermeiro
privativamente a responsabilidade por todo o serviço de enfermagem e a direção
do órgão de enfermagem. Com isso, a enfermagem tem pequeno espaço neste
ambiente tão hierárquico, que mantém posse total da vida de seus custodiados,
que ressalta a segurança sobre todas as outras prioridades [11,13].
As pessoas são fruto
do meio, e seria uma incoerência imaginarmos uma unidade prisional onde as
sensações e sentimentos se mantêm sempre a flor da pele. O medo e ansiedade
andam juntos, caminham lado a lado. Isso explica muitas questões relacionadas a
possíveis falhas na assistência, como na comunicação durante o cuidado, contudo
as condutas profissionais estão pautadas na ética e na responsabilidade com o
próximo, mas não estão dissociadas dos sentimentos desse profissional [14].
Além disso, mostra-se
relevante o aumento de investimento voltado à saúde das presidiárias, tanto
devido aos maiores riscos no espaço prisional, como pela carência de ações
preventivas necessárias de forma incessante e intensa, levando em conta a
também rotatividade e demanda da comunidade presidiária. Nesse contexto, o
papel do enfermeiro é de extrema relevância, visto que é um dos principais
profissionais atuantes na prevenção do surgimento de agravos à saúde [11,13].
Pensar também em uma
reestruturação do sistema prisional e das políticas sociais da própria
sociedade, para que a dignidade humana seja respeitada entre essas mulheres,
com isso, o aspecto segurança também deve englobá-las, provendo formas de
prevenção de doenças, por exemplo, que nesta condição são mais frequentes,
tendo maiores agravantes que na sociedade comum [14,15].
De certo, o estudo
proporciona adição no conteúdo que trata deste assunto no campo da enfermagem,
tão diferenciado e ainda pouco conhecido, além, reforça a necessidade da
preparação destes profissionais desde o meio acadêmico, com propósito de compor
especialistas também na enfermagem atuante em ambiente de prisional, abrangendo
o ser humano em todas as suas possíveis condições, com expertise.
Espera-se
que esta
produção privilegie a assistência às
mães em condição de cárcere, a fim de
promover saúde à população, seja ela qual
for, abrangendo o ser humano como um
todo, fortalecendo as bases do bom acolhimento, realizando
enfrentamento das
barreiras opositoras dos cuidados, com intuito de prover saúde
integral,
considerando o universo carcerário como necessitado de cuidados
reais e
exitosos, tanto quanto qualquer outro.
O estudo possibilitou
abrangência no conhecimento sobre a qualidade e efetividade dos cuidados da
equipe de enfermagem prestados às mulheres em estado gravídico do sistema
penal, logo, identificando a necessidade da equipe para a população em questão,
sua realidade e principalmente os muitos impedimentos na realização da função,
devido a múltiplos fatores específicos do ambiente, especialmente a linha tênue
entre saúde e segurança.
Tais impedimentos foram referidos na
maioria dos estudos, pela equipe, e não poucas vezes, pelas internas, que
enfatizam a necessidade de um melhor e mais eficaz acolhimento, muitas vezes
embargado por procedimentos padrões, hierárquicos, adotados pelo Sistema, que,
por vezes debilitam o suporte necessário a ser provido neste período da mulher,
certamente, não propositalmente, pois, há, contudo, a necessidade de prezar
pela segurança prevista para o recinto.
Ao focarmos
exclusivamente na população feminina e gestante, em âmbito penal, houve algumas
limitações, pois, a pesquisa foi baseada em revisão de literaturas, ainda
escassas com relação à temática, o que impossibilitou variabilidade referencial
e de objeto específico, demonstrando necessidade de novos estudos a respeito do
conteúdo supracitado, vistas a relevância do mesmo para sociedade,
especialmente aos envolvidos no campo de atuação da saúde.
Isso fortalece o fato
de que os ensinos a esse respeito necessitam de maior relevância, viabilidade e
aplicabilidade, levando em consideração as ações demandadas a uma boa
assistência de saúde, que requerem embasamentos teóricos, para que, então, haja
aplicação exitosa das práticas a serem desenvolvidas. Levar o conhecimento ao
profissional atuante, a fim de favorecer melhor desempenho de sua profissão,
visando também à importância a ser dada ao período gravídico, que trás em suma,
a carência de cuidado ao binômio mãe-filho.
Compreende-se que a
saúde no sistema penal carece de investimentos, aprimoramentos, estudos e de
olhar humano, empenho ao desenvolver políticas capazes de fornecer cuidados
operativos, ações de prevenção mais intensas, levando em conta a
vulnerabilidade das apenadas, a indispensabilidade do cuidado com a mãe, que
consequentemente, irá refletir no desenvolvimento dos recém-nascidos, que podem
permanecer, amparados por lei, na guarda de suas mães por pelo menos 6 meses durante o cárcere da mesma, demandando também da
atenção de toda uma equipe, que deve estar preparada para o amparo ao binômio
mãe-filho.