RELATO DE
EXPERIÊNCIA
Mapeamento
e análise do fluxo de atendimento ao usuário em uma Unidade de Pronto
Atendimento
Josué Souza Gleriano*, Tatiany Marques de Oliveira**, Liz Vanessa Lupi Gasparini, D.Sc.***, Ana
Claudia Pereira Terças Trettel, D.Sc.****,
Verônica Modolo Teixeira, M.Sc.*****,
Camila Galiano******, Gisele Caroline Richi Fabro*******
*Enfermeiro,
Doutorando em Ciências pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Docente
Assistente da Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus Tangará da Serra,
Mato Grosso, Coordenador do Escritório de Qualidade para Organizações de Saúde
– EsQualOS, **Enfermeira formada pela Universidade do
Estado de Mato Grosso, Campus Tangará da Serra, Mato Grosso, Bolsista do
Escritório de Qualidade para Organizações de Saúde – EsQualOS,
***Administradora, Docente Adjunta do Departamento de Administração da
Universidade do Estado de Mato Grosso, Campus Tangará da Serra, Mato Grosso,
Integrante do Escritório de Qualidade para Organizações de Saúde - EsQualOS,
****Enfermeira, Docente Adjunta da Universidade
do Estado de Mato Grosso, Campus Tangará da Serra, Mato Grosso,
*****Enfermeira, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto,
******Enfermeira da Prefeitura de Sertãozinho/SP,
*******Enfermeira,
Mestranda em Ciências pela Escola de Enfermagem de
Ribeirão Preto
Recebido em 6 de maio
de 2019; aceito em 28 de outubro de 2019.
Correspondência: Josué Souza Gleriano, Universidade do Estado de Mato Grosso,
Departamento de Enfermagem, Rod MT 358, 78300-000 Tangará da Serra MT
Josué Souza Gleriano: josuegleriano@unemat.br
Tatiany Marques de
Oliveira: tatiany_marques@hotmail.com
Liz Vanessa Lupi Gasparini: admlizvanessa@gmail.com
Ana Claudia Pereira
Terças Trettel: ana.claudia@unemat.br
Verônica Modolo Teixeira: veronica_modolo@hotmail.com
Camila Galiano: camilagaliano@gmail.com
Gisele Caroline Richi Fabro: gyfabro@gmail.com
Resumo
Objetivo: Mapear e analisar o
macroprocesso de atendimento em uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA). Métodos: Trata-se de relato de
experiência de integração ensino-serviço realizado em uma UPA localizada na
região sudoeste do estado de Mato Grosso. Compuseram a equipe de trabalho
docentes e discentes do curso de enfermagem e administração, direção,
coordenador da equipe médica e de enfermagem e dois profissionais da
assistência da UPA. A coleta foi dividida em etapas: o mapeamento do fluxo, de
documentos e a característica do tipo de atendimento. Resultados: A descrição dos dados primários e secundários
levantados permitiu compreender que esse fluxo de atendimento participa do
macroprocesso de atendimento ao usuário, composto por 5 processos, que ocorrem
em 11 departamentos. Sua análise possibilitou identificar pontos de melhoria em
todos os cinco processos. No período analisado, percebe-se que 77% da produção
de atendimento são referentes às classificações verde e azul. Conclusão: Conclui-se a necessidade de
aperfeiçoar espaços de gestão da assistência, aumentar o quantitativo de
recursos humanos de enfermagem, além de instituir um diálogo com a atenção
primária à saúde por meio da gestão da clínica capaz de regular corretamente o
usuário no sistema de saúde local.
Palavras-chave: serviço hospitalar de
admissão de pacientes, serviço hospitalar de emergência, triagem, avaliação de
processos, serviços de saúde.
Abstract
Mapping
and analysis of the flow of user service in an Urgent Care Unit
Objective: To map and
analyze the macro-process of service at an Urgent Care Unit (UCU). Methods: This is a teaching-service
integration experience report carried out at an UCU located in the southwest
region of the state of Mato Grosso. The work team comprised professors and
students of the nursing and administration courses, directors, coordinator of
the medical and nursing team and two UCU assistance professionals. The
collection was divided in steps: flow and documents mapping, and type of
service. Results: The description of
the primary and secondary data raised allowed understanding that this service
flow participates in the macro-process of user service, composed by 5
processes, which take place in 11 departments. Its analysis allowed identifying
improvement points in all five processes. In the analyzed period, 77% of the
service production refer to the green and blue classifications. Conclusion: There is need to improve
care management spaces, increase the nursing human resources, and establish a
dialogue with primary health care through clinic management that correctly
regulates the user in the local health system.
Key-words: admitting
department hospital, emergency service hospital, triage, process assessment,
health services.
Resumen
Mapeo y análisis
del flujo de atención al usuario en una Unidad de Servicio
Objetivo: Mapear y analizar el macroproceso
de atención en una Unidad de Pronto Atención (UPA). Métodos: Se trata de relato de
experiencia de integración enseñanza-servicio
realizado en una UPA ubicada
en la región
suroeste del estado de Mato
Grosso. Compusieron el
equipo de trabajo docentes y discentes del curso de enfermería y administración, dirección, coordinador del equipo médico y
de enfermería y de los profesionales de la asistencia de la UPA. La recolección fue dividida en etapas: el mapeo
del flujo, de documentos y la característica del tipo de atención. Resultados:
La descripción de los datos primarios y secundarios levantados permitió comprender que este flujo de atención participa del macroproceso de atención al usuario, compuesto por 05 procesos, que ocurren en 11 departamentos. Su análisis posibilitó identificar puntos de mejora en los cinco procesos.
En el período analizado, se percibe que el 77% de la producción
de atención son referentes
a las clasificaciones verde
y azul. Conclusión:
Se concluye la necesidad de perfeccionar espacios de gestión de la asistencia, aumentar el cuantitativo de recursos
humanos de enfermería, además
de instituir un diálogo con
la atención primaria a la salud a través de la gestión de la
clínica capaz de regular correctamente al usuario en el
sistema de salud ubicación.
Palabras-clave: servicio
hospitalario de admisión de
pacientes, servicio hospitalario
de emergencia, detección evaluación de procesos, servicios de salud.
O Serviço Hospitalar de
Emergência (SHE), ou pronto-socorro, é uma das portas de entrada no sistema de
saúde brasileiro, considerado como uma unidade complexa e que deve possuir
apenas leitos de observação destinados ao atendimento de usuários com ou sem
risco de morte, cujos agravos necessitam de intervenções imediatas nas 24 horas
do dia [1]. A elevada procura por esse tipo de serviço tem dificultado a
resolubilidade na obtenção de resultados positivos em relação ao atendimento
prestado [2] e, para minimizar esse quadro, gestores têm utilizado diversas
estratégias, como a implantação da Unidade de Pronto Atendimento (UPA), a
inserção do sistema de gerência de fluxo de pacientes do SHE para os leitos de
internação, o aumento do número de integrantes da equipe de enfermagem, a
ampliação de leitos da unidade, entre outras [3].
A implantação de uma
UPA propõe atuação de mediadora entre as unidades básicas de saúde e os grandes
hospitais, parte do planejamento da Rede de Atenção às Urgências (RAU), com
objetivo de redirecionar a demanda de usuários e evitar superlotação dos
hospitais. Essas unidades foram instituídas como unidades não hospitalares de
atendimento às urgências por meio da Portaria nº 2048 de 05 de novembro de
2002, mas só se materializaram com o nome UPA 24 horas em dezembro de 2008
[4,5].
O propósito das UPA é a
oferta de atendimento ágil para as urgências, para a assistência e
estabilização do quadro do paciente até que se possa encaminhá-lo aos
hospitais, quando necessário [6]. Porém, o atendimento nas UPA tem se
configurado para além do esperado das queixas de urgência, propriamente ditas,
e sinalizando uma absorção de usuários em situações não urgentes que procuram o
atendimento devido à maior facilidade de consulta médica [7].
O aumento no fluxo de
usuários, proveniente da demanda crescente pela procura dos serviços de
urgência e emergência, configura a necessidade de reorganização do processo de
trabalho nessas unidades, atendendo a diferentes graus de especificidades e
necessidades, conforme as diversas prioridades. Sendo assim, o atendimento deve
ser preconizado em acordo com a situação clínica dos usuários, priorizando
aqueles que, no momento, correm mais risco devido ao agravo à saúde [8].
Na UPA, as questões que
envolvem o exercício da observação do fluxo do atendimento representam um campo
fértil para estudos que visem a melhorias nos SHE. Em relação à organização e
ao controle de fluxo de entrada e saída de pacientes em SHE, uma das
estratégias mais empregadas é utilizar protocolos de classificação do risco que
consideram a queixa do usuário para priorizar a assistência [9].
A utilização de
protocolos de classificação de risco em SHE teve início em meados de 1970, na
Austrália e, em 1990, foi impulsionado pela informatização nos hospitais.
Atualmente, são utilizados como critério para avaliação nas unidades de
emergência [10]. A partir do acolhimento, os usuários são classificados de
acordo com o risco apresentado, sendo realizado por um profissional de saúde,
de nível superior, que possua treinamento específico na utilização de
protocolos pré-estabelecidos para garantir uma classificação de qualidade e com
prioridade para o atendimento [9]. A assistência médica é direcionada em
conformidade com a classificação realizada no setor de acolhimento da unidade
de saúde [11].
O mapeamento do fluxo
de usuários em um SHE torna-se importante na identificação de etapas que
concentram problemas, além de produzir evidências científicas sobre o processo
de trabalho. O mapeamento é uma ferramenta que permite documentar os elementos
que compõem um processo, e sua análise indica possibilidade de melhoria por
identificar atividades não agregadoras de valor. Isso é possível por meio de
uma interpretação correta de técnicas individuais ou em conjunto que devem ser
escolhidas a depender do objeto a ser mapeado, a fim de compreender os
processos atuais e eliminar lacunas e deficiências, e/ou simplificar eventos,
aprimorando-os para que o serviço prestado de fato entregue valor aos clientes
e aprimore as práticas dos profissionais e da gestão [12,13].
Existem diferentes
técnicas para realizar o mapeamento de processos, tais como: fluxogramas, mapa
de processos, mapofluxograma, entre outros, e sua
análise permite a redução de custos no desenvolvimento de produtos e serviços e
nas falhas de integração entre sistemas além da melhoria no desempenho da
organização [14,15].
Inserido nesse
contexto, este estudo é fruto de uma extensão universitária resultante da
interação entre serviço de saúde e ensino com vistas a contribuir para a
melhoria da qualidade e por meio de estratégias para o desenvolvimento do
processo de trabalho na instituição que recebe a extensão. Pontua-se que esse
espaço de integração, além de proporcionar aprendizagem para os discentes,
docentes e profissionais, culmina em possibilidade de efetivação na organização
do processo de trabalho e do relacionamento interdisciplinar [16]. Sendo assim,
buscou identificar, mapear e analisar o fluxo de atendimento em uma Unidade de
Pronto Atendimento no intuito de apresentar possíveis intervenções ao serviço
de saúde.
Trata-se de um relato
de experiência de integração ensino-serviço na condução de um projeto
solicitado pela Direção do Complexo Hospitalar de um município da região
médio-norte mato-grossense a equipe técnica do Escritório de Qualidade para
Organizações de Saúde (EsQualOS),
programa de
extensão da Universidade do Estado de Mato Grosso, reconhecido
pela Organização
Mundial da Saúde e Ministério da Saúde como
inovação na área de educação em
Saúde [17].
Uma das ações de
aproximação do curso de enfermagem da Universidade do Estado de Mato Grosso –
Campus Tangará da Serra da gestão municipal e dos serviços de saúde deu-se por
meio da criação do programa EsQualOS, que obteve, por
acordo nas parcerias a partir da extensão e pesquisas, uma sala de trabalho no
complexo hospitalar, espaço que objetiva apoiar projetos de integração
ensino-serviço, e, para isso, o EsQualOS vincula uma
equipe interprofissional composta por profissionais do serviço, coordenadores
de atenção, docentes e discentes da universidade [19].
O local desse projeto
foi uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) vinculada a um hospital municipal de
média complexidade, integrado ao Sistema Único de Saúde (SUS). A UPA foi
inaugurada no dia 1 de julho de 2016 e atende a uma população estimada de
101.764 habitantes [20], além da população nas cercanias. Essa unidade faz
parte do Complexo Hospitalar, conjunto de serviços agrupados pelo Decreto nº
216, de 30 de junho de 2016 [21].
O Grupo de Trabalho
(GT) desse projeto foi composto por representantes da universidade, docentes e
discentes do curso de enfermagem e de administração e, representantes da UPA,
direção, coordenador da equipe médica e de enfermagem, além de dois
profissionais da assistência convidados por possuírem maior tempo de vínculo
empregatício na unidade que acordaram que o fluxograma seria utilizado como
técnica para coleta dos dados sendo que três etapas completaram a coleta: a
primeira foi o mapeamento do fluxo; a segunda, o levantamento dos documentos
envolvidos no fluxo; e, por fim, um levantamento da característica das
classificações dos atendimentos realizados pela UPA no primeiro semestre de
2017.
O mapeamento do fluxo
foi necessário, pois a unidade não possuía a descrição dessa informação
registrada. Para mapeá-lo, foi aplicado o fluxograma vertical, formulário
indicado para levantar rotinas existentes em um setor de trabalho, por
estabelecer, em seus campos, as informações necessárias e evitar distorções de
documentos escritos e extensos que facilitam a perda de informação [22].
Nessa primeira etapa,
foram realizadas sete visitas à UPA, durante um período de duas horas de
observação, e uma visita de seis horas para observar o fluxo, do início até o
final, no intuito de confirmar os processos e os profissionais envolvidos e
certificar as informações já levantadas nas visitas anteriores. Esse momento
foi realizado pelos docentes e discentes dos cursos, distribuídos sempre em
parceria de um aluno do curso de enfermagem e um de administração sob
supervisão de um docente. Trata-se de uma etapa sugerida [23] para identificar
como as pessoas fazem e organizam o trabalho enquanto realizam o conjunto
diário de suas atividades.
Os dados colhidos foram
classificados em primários, aqueles que estão em posse da equipe de trabalho
coletados com o propósito de atender às necessidades específicas, e em
secundários, aqueles documentais e bibliográficos para serem organizados e
analisados [24].
Os dados adquiridos
compuseram um banco de informações que delinearam as principais atividades do
fluxo do processo de trabalho e da organização da UPA sob a forma do
macroprocesso de atendimento ao usuário e dos processos que o compõem. As
informações registradas compreenderam as ações, decisões, entradas e saídas de
materiais, pacientes e seus atores, na ordem em que são executadas atualmente,
de maneira a identificar a forma como os fluxos de atendimento ocorriam.
Após o levantamento
inicial, apresentou-se à equipe do serviço um quadro descritivo do atendimento
ao usuário por meio da observação não participante do “dia a dia” no setor para
que pudessem analisar e avaliar a informação, além de acrescentar
contribuições. Esse momento foi essencial para o aperfeiçoamento e o
entendimento corretos da real situação do fluxo de atendimento do macroprocesso
de atendimento ao usuário, e principalmente, para validá-lo.
O GT, a partir da
análise dos dados primários e secundários contidos no quadro descritivo do
macroprocesso de atendimento aos usuários, elencou um quadro descritivo com a
identificação de problemas que compõem o macroprocesso estudado, justificados
por referências que abordam as questões da organização do fluxo e capazes de
sinalizar possíveis propostas de melhoria.
No intuito de auxiliar
a gestão do complexo hospitalar, levantou-se o número total mensal de
atendimentos por tipo de classificação, dados do número e tipo de atendimento
realizado na UPA, no período do primeiro semestre de 2017, extraídos do Sistema
de Informação da UPA, disponibilizado pela direção da instituição. Os dados
foram, então, lançados em uma planilha de Excel e apresentados em gráfico com
seus valores absolutos.
Este estudo fez parte
das atividades de parceria do EsQualOS com o complexo
hospitalar, realizado com ciência da Direção Administrativa da Unidade de
Pronto Atendimento e oficializado em documentação do termo de cooperação entre
a universidade e o serviço de saúde. O mapeamento analisado com pontos de
melhorias e sugestões de mudanças justificadas para aprimorar o macroprocesso
de atendimento ao usuário foi apresentado como produto em um relatório à gestão
da UPA e do Complexo Hospitalar.
A área total da UPA
estudada é de 1.202 m². Contém oito leitos de observação, quatro leitos
auxiliares, três leitos de unidade semi-intensiva, um
box de emergência com duas macas e quinze poltronas reclináveis para
administração de medicações e observação. Seu projeto arquitetônico, com
particularidades, adéqua-se a esse tipo de estabelecimento, sendo classificada
para ser habilitada como UPA Porte I. Percebe-se que, no momento de execução
desse projeto, a UPA ainda não havia sido habilitada pelo Ministério da Saúde.
A UPA atende as
diretrizes de funcionamento ininterrupto, 24 horas, e em todos os dias da
semana, incluindo feriados e pontos facultativos, conforme previsto na Portaria
nº 10 de 3 de janeiro de 2017 [9]. A descrição do macroprocesso de atendimento
da UPA está registrado no Quadro 1. A descrição dos dados primários e
secundários levantados permitiu compreender que esse fluxo de atendimento do
macroprocesso de atendimento ao usuário compõe cinco processos: recepção,
acolhimento, consulta médica, observação e entrada de emergência na UPA e
Serviço de Atendimento Médico de Urgência (SAMU). Eles, por sua vez, ocorrem em
11 departamentos: recepção, acolhimento, consultório médico, posto de enfermagem,
sala de coleta de exames, observação nas poltronas e nos leitos, entrada de
emergência, box urgência e semi-intensiva. Essa
estrutura mostra a complexidade desse setor por ser interfuncional,
interdepartamental e interorganizacional.
Quadro 1 - Mapeamento do macroprocesso de atendimento dos usuários realizados na
UPA pesquisada, por departamento, em 2017. (ver anexo em PDF)
Com
base na descrição
do Quadro 1, percebe-se que o modelo de gestão e do cuidado
é vertical,
tradicional, agrupando os profissionais em estruturas departamentais,
que,
mesmo sendo articuladas nas demandas de interação
multiprofissionais, funcionam
de forma isolada. Reforça o desentrosamento entre os tipos de
procedimentos
demandados e executados em cada processo das categorias profissionais,
configurando, nesse contexto, uma fragmentação do
cuidado. Nota-se, ainda, que
na rede de urgência e na estrutura de fluxos assistenciais
há algumas
experiências que apontam fragmentação da
responsabilização da assistência, descontinuidade
do cuidado, inadequação de sistemas de
informações existentes, insuficiente
incorporação de protocolos clínicos elaborados por
meio de bases científicas e
carência na notificação de eventos adversos [25].
Na UPA, há acolhimento
aos pacientes por parte dos recepcionistas, porém não existe uma definição de
funcionário que forneça aporte de informações aos familiares após o início de
atendimento do usuário. Quanto ao atendimento, os casos agudos ou agudizados de
natureza clínica são atendidos na UPA ou transferidos para o hospital
municipal, porém casos cirúrgicos são encaminhados para outro hospital
credenciado pelo SUS, que pode ser no município ou para hospitais regionais do
estado de Mato Grosso, definido por vaga na Central de Regulação de Urgência e
Complexos Reguladores instalados nas regiões de saúde.
É indispensável na
abordagem assistencial de uma UPA prestar o primeiro atendimento resolutivo e
qualificado aos pacientes acometidos por quadros agudos ou agudizados de
natureza clínica e aos casos de natureza cirúrgica e de trauma, estabilização e
investigação diagnóstica e, sua capacidade de articulação com a RAU
oportunizará operacionalização do sistema [9].
Nessa UPA, o
Acolhimento com Classificação de Risco (ACCR) foi implantado em julho de 2016
com funcionamento no período das 07h00 às 11h00 e das 13h00 às 17h00 executado
por um enfermeiro. O ACCR é um requisito da RAU, instituído desde 2011, que
compõe a base para o processo e o fluxo da assistência [26], e tem sido considerado
uma proposta para ressignificar o processo de triagem nos espaços de cuidados
dos serviços de saúde [27], assumido como responsabilidade privativamente do
enfermeiro para realizar escuta qualificada e orientar-se por um fluxograma
que, a partir de critérios de riscos estabelecidos, norteia e classifica as
necessidades de saúde [28].
No contexto
organizacional dos SHE, a definição correta de fluxos para o atendimento tende
a resultar em ações sistematizadas e eficientes, quando adota a diretriz ACCR
[26]. A compreensão acerca do modelo de organização assistencial da UPA precisa
estar clara para cada profissional envolvido na gerência e assistência. Quando
bem estruturado e organizado, o serviço pode diminuir a demanda na emergência
hospitalar, facilitando o encaminhamento para a atenção terciária [29].
Percebe-se que, na UPA
estudada, o modelo de organização assistencial identifica o acolhimento e a
classificação de risco, entretanto não adota protocolos de atendimento em
outros setores e nos procedimentos administrativos. Há, também, limites na
garantia do apoio técnico e logístico para o funcionamento, tanto para a
garantia da continuidade do cuidado por meio da referência e contrarreferência como na integração da Rede de Atenção à
Saúde (RAS), considerando a territorialização.
Foi possível
identificar forte articulação da UPA com o SAMU e com o hospital municipal,
pontos que são favorecidos por estarem na mesma estrutura física, formando o
que denominaram de um Complexo Hospitalar. A expansão do SAMU tem se
concretizado como estratégia estruturante de atendimento à urgência no país,
atendendo a exigências de implantação de UPA com vinculação ao SAMU [30].
Porém, nesse mapeamento, não foi encontrado comunicação de um sistema de informação
com a Atenção Primária à Saúde (APS) e Atenção Domiciliar.
Reconhece-se
que um dos
desafios para a atenção pré-hospitalar às
urgências é a sua integração com a
atenção básica e o serviço hospitalar para
concretizar uma rede organizada de
atendimento com acordos e fluxos capazes de garantir a
recepção, a contrarreferência à rede de atendimento, quando aplicável
[31].
No primeiro semestre de
2017 a documentação do setor de Recursos Humanos registrava que a equipe de
enfermagem da UPA era composta por oito enfermeiros, distribuídos nos turnos de
trabalho, e de 10 técnicos de enfermagem por período. Porém, em função de
atestados médicos e ausência de estudos que assegurassem a Resolução COFEN
543/2017 [32], mostrou-se, durante a elaboração desse fluxo, que a equipe de
enfermagem possuía efetivamente quatro enfermeiros. No período matutino e
vespertino, mantinha-se um enfermeiro exclusivo para ACCR, e o enfermeiro
Responsável Técnico da unidade ficava no período vespertino – esse enfermeiro era
do hospital que integrava o Complexo Hospitalar. Em relação aos técnicos de
enfermagem, eram nove no período matutino, oito no período vespertino e 10
técnicos no período noturno.
Há uma equipe
assistencial multiprofissional, contudo percebeu-se que
o quantitativo de profissionais é baixo em relação à necessidade de
atendimento. Mesmo não partindo da proposta do projeto, a análise quantitativa
de profissionais por serviço, tal afirmação deu-se no mapeamento do fluxo de
assistência, pois foi possível verificar a ausência de funcionários em
determinados períodos de trabalho. Esse achado sinaliza a necessidade de
padronização do atendimento de urgência por meio de protocolos alinhados à
classificação de risco e compatíveis com a realidade do serviço de forma que
sistematize e organize o serviço para a garantia da agilidade, segurança e
integralidade do atendimento [33].
Verificou-se que
acolhimento e classificação de risco têm sido, em vários momentos, substituídos
por uma triagem por técnicos de enfermagem. É imprescindível que a
classificação seja realizada por profissional de saúde de nível superior
treinado para utilizar protocolos pré-estabelecidos, que avalie o grau de
urgência das queixas e capaz de colocar em ordem de prioridade o atendimento.
Entretanto, há, na realidade, em UPA, o não cumprimento dessa exigência, além
de procedimentos de enfermagem e médicos que não seguem protocolos nem rotinas
de controle de atendimentos [34].
No relatório entregue à
Direção do Complexo Hospitalar, apontam-se problemas nos processos de
atendimento. Esses problemas foram elencados com base em referências de
organização da UPA. O Quadro 2, a seguir, sumariza os problemas, suas
justificativas e propostas de melhoria.
Quadro 2 – Problema, justificativa e proposta de melhoria para cada processo do
fluxo de atendimento da UPA, 2017. (ver
anexo em PDF)
Para compreensão do GT
e na tentativa de subsidiar apoio à gestão, verificou-se o elenco da produção
do serviço, no primeiro semestre de 2017, referente ao número de atendimento
por tipo de classificação. Registra-se que, nesse período, totalizaram-se
40.347 atendimentos, que, quando estratificados por ACCR, resultam em 2.261
classificados como vermelho, 344 como laranja, 6.440 em amarelo, 17.255 em verde
e 14.047 como azul. O Gráfico 1 apresenta a quantidade de atendimentos por mês,
estratificados por classificação de risco.
Fonte: Elaborado pelos
autores com base no Sistema de Informação da UPA (2017).
Gráfico 1 - Quantidade de atendimentos realizados por classificação de risco
(AACR) na UPA da cidade de Tangará da Serra/MT, de janeiro a junho de 2017.
No período analisado
pelo Gráfico 1, percebe-se que 77,58% da produção de atendimento são referentes
às classificações verde e azul. Observa-se que, no Brasil, ocorre uma distorção
das finalidades e possibilidades de cuidado na UPA e uma dificuldade de
articulação com a atenção básica [37].
Considerando que o
município possui representativa cobertura de APS [18], torna-se necessário que
a gestão em saúde do município repense a operacionalização do serviço de
atenção na UPA [19]. Uma intervenção para a gestão do fluxo de acesso do
paciente precisará contar com apoio da RAS e da APS como ordenadora do cuidado,
além de visualizar o tempo-resposta ao usuário e as normativas vigentes de
funcionamento dos serviços.
Estudo que investigou
itinerário terapêutico de usuários de uma emergência hospitalar explica que
esses buscam o serviço por identificarem um atendimento de maior resolutividade
[38]. Essa concepção, marcada por um forte domínio de práticas biomédicas, tem
colocado obstáculos na organização do cuidado e precisa ser, no caso do
município onde essa UPA se encontra, por amplo investimento na APS, um
sinalizador do funcionamento do SUS.
A procura por
atendimento rápido, que não se configura como urgência, não é algo específico
apenas dessa UPA, essa realidade é percebida em outras unidades em todo o
Brasil. Por isso, é preciso proporcionar suporte para a APS, com garantia de
recursos humanos suficientes e treinamento efetivo para que o serviço ordene
seus cuidados por meio de uma comunicação efetiva na rede de atenção [39].
Percebe-se que, embora
haja uma tentativa de organização de rede de atenção, há elementos que não
configuram mudança na estrutura de governança da rede de atenção [30]. É
importante também frisar a lógica de produção de serviço que a própria portaria
exige para o funcionamento de uma UPA [9]. A não especificidade para o tipo de
atendimento produz um ciclo vicioso de alcançar resultados que não condizem com
a organização de um sistema pautado em rede de atenção e na lógica do cuidado
prestado no território, com conceitos que fortalecem a coordenação a partir da
APS.
Aufere-se dizer que
esse tipo de exigência, para produzir produção, movimenta uma lógica de mercado
no processo público de produzir saúde. Na UPA, a inversão do seu papel
estrutural de atendimento pode acarretar aumento desnecessário de demandas
assistenciais que gera sobrecarga de trabalho para os profissionais, somado à
escassez de recursos humanos, de modo a implicar prejuízo à agilidade e à
qualidade dos atendimentos. No caso da UPA estudada, o resultado foram, como
observado nos dias de coleta de dados, filas imensas com espera de horas para o
atendimento.
Percebe-se o baixo
critério para o atendimento da UPA, o que requer investimento em pesquisas para
compreender melhor esses pontos levantados. A padronização do atendimento de
enfermagem em urgência, por meio de protocolos, aliados à classificação de
risco, pode subsidiar o desenvolvimento das intervenções de enfermagem, de
forma sistematizada e organizada, garantindo agilidade, segurança e
integralidade do atendimento que refletirá na qualidade da assistência [32].
Por vezes, apesar da existência de protocolos clínicos nas UPAs,
há ausência de supervisão ou avaliação da utilização e/ou aplicabilidade desses
roteiros nos atendimentos [5].
No Brasil, uma das
estratégias atuais utilizadas para organizar os fluxos de atenção à saúde é a
implantação do trabalho em Redes de Atenção à Saúde (RAS), cujo modelo de
atendimento pauta-se na integração entre pontos de atenção que se comunica,
conforme o grau do seu agravo, para o direcionamento do usuário a um serviço ou
unidade de saúde [40].
Na dimensão dos fluxos
lógicos e efetivos de referência e contrarreferência,
percebeu-se nesse estudo que não há uma comunicação entre a UPA e as unidades
básicas desse município, achado levantado nas reuniões com a coordenação médica
e de enfermagem. Há dificuldades de os profissionais elaborarem planos de alta
que efetivem ações com a APS e pontua-se maior facilidade de referências entre
as especialidades que atendem dentro do hospital, como a ortopedia, cardiologia
e nefrologia.
Por isso, a comunicação
efetiva entre APS, UPA, SAMU e hospitais é imprescindível para a eficiência do
serviço. O ACCR não pode seguir a lógica da demanda/hora, pois perderá seu
foco, que é a agilidade e a resolutividade, e as unidades básicas precisam
estabelecer vínculo com o usuário no intuito de agilizar suas demandas [41].
Porém, têm sido
constantes as dificuldades de referência e contrarreferência,
o que consequentemente acarreta ao serviço um acúmulo de usuários, interferindo
na qualidade do atendimento e na satisfação dos profissionais [42].
O mapeamento do fluxo
de atendimento da UPA permitiu identificar cinco processos que compõem o
macroprocesso de atendimento ao usuário que chega por livre demanda em busca de
atendimento ou trazido pelas equipes móveis de urgência. São eles: recepção;
acolhimento; consulta médica, observação e entrada de emergência UPA e Serviço
de Atendimento Médico de Urgência (SAMU), que ocorrem em 11 departamentos –
recepção, acolhimento, consultório médico, posto de enfermagem, sala de coleta
de exames, observação nas poltronas e nos leitos, entrada de emergência, box
urgência e semi-intensiva, demonstrando sua
complexidade por ser interfuncional, interdepartamental e interorganizacional.
Foi possível
identificar falhas existentes no macroprocesso de atendimento, como: a não
realização do ACCR nas 24 horas e no box de urgência derivado do pouco
quantitativo de enfermeiros, a falta de comprometimento médico com o horário de
trabalho, além da falta de sistema de comunicação de referência e contrarreferência.
O estudo partiu de uma
análise do macroprocesso e não se aprofundou no processo de trabalho da equipe
multiprofissional. Assim, recomenda-se posterior análise de como se operam os
processos na prática desse serviço. Nesse sentido, sugerem-se investigações com
enfoque mais amplo, tais como aquelas voltadas ao estudo das relações internas
e externas relacionadas ao fluxo de atendimento e à identificação das
potencialidades e fragilidades do ACCR em SHE.
A falta de padronização
e do desenho do fluxograma de atendimento pode ocasionar falhas e quebras no
processo de trabalho. Do ponto de vista da gestão, percebe-se a complexidade do
macroprocesso analisado por ser interfuncional, interdepartamental e interorganizacional, o que demanda melhor comunicação,
alinhamento e padronização das atividades sob olhar sistêmico para sua
efetividade. Nesse sentido, sugere-se modelar este processo, redesenhando-o
para incorporar as mudanças necessárias nas propostas de solução das lacunas e
para orientar seus atores na sua execução padronizada, e, a partir disso,
definir indicadores de desempenho que permitam efetivar o gerenciamento desse
processo.
Foi possível
identificar na produção do serviço da UPA uma frequência de atendimentos que
não seriam dessa unidade devido à alta cobertura da APS. A partir da análise
desses dados, é necessária uma reflexão que estabeleça maior comunicação com o
sistema de referência e contrarreferência para a APS.
Recomenda-se que novos
estudos sejam realizados na perspectiva de análise do fluxo de acesso dos
pacientes na dimensão da RAS, tendo como princípios norteadores a coordenação
pela APS e a resolubilidade da referência desses fluxos.
Compreende-se que, na
extensão universitária, a integração ensino-serviço se fortalece quando os
profissionais atores do serviço e que possuem, de certa forma, governabilidade
de mudança, participam dos espaços de construção, como no caso deste relato.
Trata-se de reconhecer o campo fértil que a extensão possui enquanto produção
de saberes, rico em compartilhamento, para aproximar teoria e prática.