RELATO DE
EXPERIÊNCIA
A tenda
do conto como prática de humanização com mães acompanhantes de crianças
cardiopatas: relato de experiência realizado em um hospital no estado do Pará
Lorena Taynan Vasconcelos Queiroz*
*Graduada
em serviço social pela Universidade da Amazônia UNAMA, pós-graduanda em
Cuidados Paliativos e Terapia de Dor na Pontifícia Católica de Minas Gerais
PUC-MG
Recebido em 12 de
dezembro de 2018; aceito em 26 de junho de 2019.
Correspondência: Lorena Taynan Vasconcelos Queiroz, Av Amazonidas, s/n, Vila Permanente, 68455-664 Tucuruí PA,
E-mail: l.taynan@yahoo.com.br
Resumo
O adoecimento e
internação da criança com cardiopatia geram mudanças em sua vida e necessita de
cuidado e atenção e, na maioria das vezes, esse cuidado é exercido pela mãe
durante a hospitalização, tendo a função de cuidadora principal. Este estudo
teve como objetivo conhecer a realidade social da mãe acompanhante do filho com
cardiopatia, tendo como instrumento de coleta de dados a Tenda do Conto,
conhecida como uma prática integrativa do cuidado em saúde e de intervenção
psicossocial, cujo processo grupal é de narrações de um grupo de sujeitos.
Participaram da pesquisa 5 (cinco) mães acompanhantes de crianças cardiopatas.
Foi realizada uma roda de conversa, na qual se identificou: o medo da morte, a
não aceitação do filho doente, tristeza, culpa, separação conjugal,
vulnerabilidade social, afastamento da família, condição socioeconômica
precária, e que o ambiente hospitalar passa a fazer parte do seu novo
cotidiano.
Palavras-chave: cardiopatias, mães,
Sistema Único de Saúde.
Abstract
The
story tent as a practice of humanization with mothers accompanying children
with heart diseases: experience report carried out in a hospital in the state
of Pará
The
illness and hospitalization of the child with heart disease generate changes in
their life and need care and attention and, usually, this care is performed by
the mother during hospitalization, having the role as primary caregiver. This
study aimed to know the social reality of the accompanying mother of the child
with heart diseases, having as a data collection tool the Story Tent (Tenda do Conto), known as an integrative practice of health care and
psychosocial intervention, whose group process is narratives of a group of
subjects. Five (5) accompanying mothers of children with heart disease
participated in the study. A conversation was held, identifying: fear of death,
non-acceptance of the sick child, sadness, guilt, marital separation, social
vulnerability, family distance, precarious socioeconomic condition, hospital
environment becomes part of their new everyday life.
Key-words: heart
diseases, mothers, Unified Health System.
Resumen
La tienda del cuento como práctica de humanización con madres acompañantes de niños cardiópatas: relato de
experiencia en un hospital en el Estado de Pará
La enfermedad
e internación del niño con cardiopatía
generan cambios en su vida y necesita
de cuidado y atención y, la
mayoría de las veces, ese cuidado es brindado
por la madre durante la hospitalización, teniendo la función como cuidadora
principal. Este estudio tuvo
como objetivo conocer la realidad social de la madre acompañante del hijo con cardiopatía,
teniendo como instrumento de recolección
de datos la Tienda del Cuento
(Tenda do Conto), conocida como una práctica integrativa del cuidado en salud y de intervención
psicosocial, cuyo proceso grupal es de narraciones
de un grupo de sujetos. Participaron de la investigación 5 (cinco) madres acompañantes
de niños cardiópatas. Se realizó una rueda de conversación, en la cual se identificó:
el miedo a la muerte, la
no aceptación del hijo enfermo, tristeza, culpa, separación
conyugal, vulnerabilidad
social, alejamiento de la familia, condición socioeconómica
precaria, el ambiente hospitalario pasa a formar parte
de su nuevo cotidiano.
Palabras-clave: cardiopatías,
madres, Sistema Único de Salud.
A Saúde é um tripé da
Seguridade Social, com programas e projetos implantados, e, como uma política,
deve ser priorizada, já que esses projetos tendem a ser voltados para o cidadão
de uma forma humanizada. De acordo com Reis et
al.
[1], o Sistema Único de Saúde (SUS) é a
expressão mais atualizada do
esforço do nosso país de garantir o acesso universal de
seus cidadãos aos
cuidados em saúde que necessitam para ter uma vida mais longa,
produtiva e
feliz. Embora saibamos que os bons indicadores de saúde dependem
de um conjunto
de políticas econômicas e sociais mais amplas (emprego,
moradia, saneamento,
boa alimentação, educação, segurança
etc.), é inquestionável a importância de
uma política de saúde que, para além da
universalidade, garanta a equidade, a
integralidade e a qualidade do cuidado em saúde prestado aos
seus cidadãos.
Este estudo está
voltado para conhecer a realidade e necessidades sociais da mãe acompanhante do
filho com cardiopatia no período de internação no hospital sendo difícil, pois
provoca inúmeras questões, uma delas é a culpa pelo adoecimento do filho, assim
tomando para si toda a responsabilidade do cuidado no processo de
hospitalização.
O objetivo da pesquisa
no que se refere conhecer a realidade dessas mães e suas necessidades sociais
deram-se com base na metodologia fundamentada chamada de Tenda do Conto. Essa
prática segundo Silva et al. [2] é realizada mensalmente em unidades de saúde
do Rio Grande do Norte e em outros Estados. Começou a ser realizada por Maria
Jacqueline Abrantes Gadelha, autora de
Beirando a Vida, Driblando os problemas:
estratégias de bem viver [3], quando ouviu histórias de vida de usuários dos
serviços de atenção básica a saúde. De acordo com Gadelha [3], a Tenda do Conto
é uma prática não convencional, inventiva, de cuidado a atenção à saúde, na
qual trabalhadores e usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) revelam
possiblidades de produção em saúde. Essa prática vem sendo experimentada por
vivências e junto a participantes na rede humaniza SUS – RHS.
O convite à Tenda do
Conto é objetivo: traga ou leve um objeto que você guarda com carinho e com
afeto, algo que marque sua experiência de vida. O participante se afeta com o
convite; então, começa a mobilizar recursos éticos, estéticos e políticos para
escolher o que irá levar à Tenda do Conto, sabendo que tanto pode levar um objeto
relacionado à experiência do passado ou a uma experiência que está vivendo no
presente [2:16].
A tenda do conto
oferece aos profissionais de saúde oportunidades de estabelecer vínculos e
proporcionar um acolhimento, tem como prioridade a escuta, pois abre caminhos
para novos espaços e reconhecimentos como sujeito de direito e promoção à
saúde, do preceito de equidade e do exercício da cidadania.
Participaram da
pesquisa 5 mães acompanhantes de crianças com cardiopatia que se encontravam
internadas. A primeira fase tratou-se de uma coleta das informações gerais das
mães acompanhantes como (nome, estado civil, nº de filhos, idade, cidade). Na
segunda fase, as participantes receberam um convite em suas enfermarias, com
informações de data e local da Tenda, orientadas a trazerem um objeto afetivo
por meio do qual pudessem contar suas histórias de dor ou de superações
vividas. Para Gadelha [3:51] esses objetos/atores encontram espações de
liberdade de movimento e expressão.
Foi confeccionada uma
colcha de retalhos coloridos, simbolizando uma tenda, as cadeiras estavam em
círculos, cobertas com tecido colorido, e, no centro da roda, a mesa foi posta
contendo os objetos trazidos. A experiência foi relacionada à vida dessas
mulheres, as quais trouxeram fragmentos de suas próprias histórias e relatos de
enfrentamentos diante do adoecimento do filho no ambiente hospitalar.
Figura 1 - Mãe e seu objeto afetivo.
A metodologia aplicada
promoveu o alcance dos objetivos propostos, bem como identificar e desvendar
questões referentes às suas necessidades sociais nesse processo de adoecimento
e internação do filho. O estudo aponta que há um abalo causado pela internação
na vida dessas mães acompanhantes.
Apresentou-se a partir
das narrativas contadas diversos sentimentos e reações como medo, tristeza,
estresse, impotência, solidão, a não aceitação do filho doente, separação
conjugal, o luto antecipatório, vínculos familiares frágeis, a distância dos
outros filhos, baixa autoestima, perda da vaidade e, além disso, o ambiente
hospitalar passa a fazer parte de sua nova rotina.
Foi possível perceber
que a mãe acompanhante se torna sobrecarregada frente ao tratamento do filho,
que o apoio de sua família se faz pouco suficiente, gerando sentimento de
abandono, tendo em conta a maioria das famílias oriundas de municípios
distantes e de situação socioeconômica precária, percebendo-se a
vulnerabilidade social. A experiência apresentada ressalta a primordialidade do acompanhamento da equipe
multiprofissional a essa mãe, oferecendo um atendimento humanizado [2].
Ainda que as políticas
públicas de saúde estejam para garantir um atendimento humanizado, sugerem-se
melhorias nos serviços de saúde como: cuidados maiores na avaliação e
intervenção com a família; melhoria nos relacionamentos entre a equipe multiprofissional
e essas acompanhantes de crianças cardiopatas; promoção de melhorias
estruturais, visando o conforto e a privacidade das mesmas; realização de rodas
de conversas, nas quais essas mães possam ser ouvidas, haja vista que esse
método beneficia tanto o usuário quanto o profissional facilitando vínculos
afetivos, promovendo o conhecimento e realidade da vida, considerando a
subjetividade de cada mãe.
O estudo possibilitou
conhecer a realidade dessa mãe no ambiente hospitalar e seus enfrentamentos na
luta pela cura do filho. Isso ressalta a primordialidade
do acompanhamento da equipe mutiprofissional,
oferecendo um atendimento humanizado. Compreende-se que a prática é um
excelente método de fortalecimento de vínculo entre usuários e equipe de saúde,
possibilitando identificar suas necessidades sociais. Assim, cada narrativa
contribui para uma ressignificação desse processo, e o uso dessa técnica para
fortalecer a atenção em saúde.