Enferm Bras 2021;22(3):334-52

doi: 10.33233/eb.v20i3.4520

ARTIGO ORIGINAL

Perfil de mulheres no período gestacional atendidas em Estratégias de Saúde da Família

 

Nathália Gianini Nery, M.Sc.*, Eliza Mara das Chagas Paiva**, Sérgio Valverde Marques dos Santos, D.Sc.***, Patrícia Mônica Ribeiro*, Eliana Peres Rocha Carvalho Leite*, Fábio de Souza Terra, D.Sc.*

 

*Unifal, MG, **Mestranda em Enfermagem, Unifal, MG, ***UEMG-MG

 

Recebido em 17 de dezembro de 2020; Aceito em 22 de julho de 2021.

 

Correspondência: Nathália Gianini Nery, Rua Petra Gago Munhoz, 191, Jardim Boa Esperança, 37135-124 Alfenas MG

 

Nathália Gianini Nery: nathaliagianininery@gmail.com

Eliza Mara das Chagas Paiva: elizamdcp@gmail.com

Sérgio Valverde Marques dos Santos: sergiovalverdemarques@hotmail.com

Patrícia Mônica Ribeiro: patrícia.ribeiro@unifal-mg.edu.br

Eliana Peres Rocha Carvalho Leite: eprcl@yahoo.com.br

Fábio de Souza Terra: fabio.terra@unifal-mg.edu.br

 

Resumo

Introdução: A gestação é um momento de mudanças na vida da mulher e é necessário um pré-natal qualificado, visando prevenir intercorrências. Objetivo: Conhecer o perfil sociodemográfico, hábitos de vida, doença crônica e dados da gestação das mulheres no período gestacional atendidas em Estratégias de Saúde da Família. Métodos: Estudo transversal e descritivo, com abordagem quantitativa, desenvolvido em 2019/2020 com 201 gestantes de um Município do Sul de Minas Gerais. Após aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa, foi realizada a coleta de dados com aplicação de questionário com 26 questões. Foi utilizada análise descritiva das variáveis, por meio de frequência absoluta, relativa, medidas de tendência central e dispersão. Resultados: A maioria se encontrava na faixa etária de até 25 anos, casadas ou com companheiros(as), católicas, renda familiar mensal de 1.001 a 2.000 reais, não fumava e nem consumia bebida alcoólica e não possuía doença crônica. Também não planejaram a gravidez, realizaram pré-natal de risco habitual, não estavam no primeiro parto e tinham idade gestacional entre 14 e 27 semanas. Conclusão: É importante o conhecimento do perfil das gestantes atendidas em serviços de saúde a fim de sensibilizar quanto ao contexto social, visando prestar uma assistência integral e humanizada.

Palavras-chave: gestação; pré-natal; saúde da mulher; Enfermagem.

 

Abstract

Profile of pregnant women assisted in Family Health Strategy

Introduction: Pregnancy is a time of changes in the woman's life and a qualified prenatal care is necessary, to prevent complications. Objective: To know the sociodemographic profile, life habits, chronic illness, and pregnancy data of women in the gestational period assisted in Family Health Strategies. Methods: Cross-sectional and descriptive study, with a quantitative approach, developed in 2019/2020 with 201 pregnant women from a city in the south of Minas Gerais. After being approved by the Research Ethics Committee, data were collected using a questionnaire with 26 questions. Descriptive analysis of the variables was used, by means of absolute, relative frequency, measures of central tendency and dispersion. Results: Most fit in the age group of up to 25 years old, married or with partners, Catholics, monthly family income from 1,001 to 2,000 Reais, did not smoke or consumed alcohol and did not have a chronic disease. They also did not plan their pregnancy, they were not planning prenatal care for their usual risk, they were not at their first delivery and their gestational age was between 14 and 27 weeks. Conclusion: It is important to know the profile of pregnant women attended in health services to raise awareness of the social context, subordinated to comprehensive and humanized care.

Keywords: gestation; prenatal; women's health; Nursing.

 

Resumen

Perfil de mujeres embarazadas atendidas en Estrategia Salud de la Familia

Introducción: El embarazo es una época de cambios en la vida de la mujer y es necesaria una atención prenatal calificada, para prevenir complicaciones. Objetivo: Conocer el perfil sociodemográfico, hábitos de vida, enfermedades crónicas y datos de embarazo de mujeres en el período gestacional atendidas en Estrategias de Salud de la Familia. Métodos: Estudio transversal y descriptivo, con enfoque cuantitativo, desarrollado en 2019/2020 con 201 gestantes de una ciudad del sur de Minas Gerais. Una vez aprobados por el Comité de Ética en Investigación, los datos fueron recolectados mediante un cuestionario con 26 preguntas. Se utilizó análisis descriptivo de las variables, mediante frecuencia absoluta, relativa, medidas de tendencia central y dispersión. Resultados: La mayoría encajaba en el grupo de edad de hasta 25 años, casadas o en pareja, católicas, ingresos familiares mensuales de 1.001 a 2.000 reales, no fumaban ni consumían alcohol y no padecían una enfermedad crónica. Tampoco planificaron su embarazo, no planificaron atención prenatal por su riesgo habitual, no estaban en su primer parto y su edad gestacional estaba entre las 14 y 27 semanas. Conclusión: Es importante conocer el perfil de las gestantes atendidas en los servicios de salud para concientizar sobre el contexto social, subordinado a la atención integral y humanizada.

Palabras-clave: gestación; prenatal; la salud de la mujer; Enfermería.

 

Introdução

 

A gestação é um momento que surgem diversas mudanças na vida da mulher, visando condições adequadas para o crescimento e o desenvolvimento fetal em equilíbrio com o organismo materno [1]. Embora seja um momento individualizado, gestar um filho é uma fase de destaque na vida da mulher. É um processo que associa mudanças corporais e psíquicas, e que exige adaptação, de ordem afetiva, social, familiar, econômica e estrutural [2].

A mulher pode vivenciar durante o período gestacional transformações físicas, hormonais e psíquica, o que predispõe à ocorrência de alterações mentais [3]. É durante este período que as alterações emocionais se apresentam como condições psicopatológicas, que podem influenciar no comprometimento do desenvolvimento da gestação, resultando em consequências para o binômio mãe/feto [4].

Diante disso, é necessário um acompanhamento pré-natal qualificado, visando prevenir intercorrências. Para uma assistência holística, devem-se considerar os aspectos socioeconômicos, emocionais e familiares da gestante, pois eles podem contribuir para a preservação da saúde materno fetal, favorecendo o vínculo com consequente adesão às consultas e redução da morbimortalidade materna e neonatal [5].

Para que a mulher tenha um pré-natal humanizado e qualificado, é importante que os profissionais de saúde da Estratégia de Saúde da Família (ESF) conheçam o perfil epidemiológico da gestante. Deste modo, é possível compreender o contexto social em que vive, para o correto planejamento de ações [6].

Dentro deste contexto, o pré-natal pode ser realizado pelo médico ou enfermeiro. Com isso, os profissionais enfermeiros podem desempenhar um papel importante na identificação, no suporte e na referenciação das mulheres grávidas, vivenciando problemas sociais e de saúde mental durante o período perinatal [7].

Diante do exposto, justifica-se a necessidade de realizar estudos para conhecer o perfil de mulheres grávidas nas ESF, visto que é de suma importância conhecer o contexto social e emocional, para um melhor planejamento das ações. Além disso, os resultados encontrados nesta investigação podem trazer contribuições para o conhecimento científico, principalmente para a área da Enfermagem, para auxiliar a elaboração de protocolos, e a realização de educação continuada direcionada aos enfermeiros, com o intuito de promover uma assistência qualificada e integral às gestantes.

Este estudo teve como objetivo conhecer o perfil sociodemográfico, hábitos de vida, doença crônica e dados da gestação das mulheres no período gestacional atendidas em Estratégias de Saúde da Família.

 

Material e métodos

 

Estudo transversal e descritivo, com abordagem quantitativa, desenvolvido com gestantes atendidas nas ESF urbanas de um Município do Sul de Minas Gerais. Neste município, existem 16 ESF urbanas, todas possuem atendimento à mulher no pré-natal. O delineamento de estudo transversal foi adotado para responder o objetivo proposto no estudo, por se tratar de uma pesquisa de caracterização de perfil da população analisada.

A população do estudo foi composta por 230 gestantes que realizavam consultas de pré-natal e todas foram convidadas a participar da pesquisa. Assim, foram adotados os critérios de inclusão: possuir idade de 18 anos ou mais, estar no período gestacional e ser assistida nas ESF urbanas do município. Deste modo, a amostra do estudo constituiu-se por 201 mulheres, visto que 29 gestantes não aceitaram participar da pesquisa. As ESF rurais não foram incluídas neste estudo, devido a questões logísticas e, também, por possuírem características diferentes das ESF urbanas.

Para coletar os dados, utilizou-se um questionário semiestruturado, desenvolvido pelos pesquisadores, com 26 questões, para avaliar dados de caracterização sociodemográfica, hábitos de vida, doença crônica e dados sobre a gestação, com o conteúdo embasado nas literaturas nacionais e internacionais.

As variáveis que constituíram o questionário foram: idade, estado civil, crença religiosa, número de filhos, renda familiar mensal, tipo de moradia, escolaridade, consumo de bebida alcoólica, tabagismo, uso de drogas ilícitas, prática de atividade física, doença crônica, uso de medicamentos contínuo, gravidez planejada, tipo de pré-natal, tipo de parto desejado, primeiro parto, idade gestacional, preocupação na gravidez, problemas na gravidez, ajuda para cuidar do recém-nascido, relação com o pai do recém-nascido, mudança de humor e influência da mudança física durante a gestação na vida da mulher.

Este instrumento foi submetido a um processo de refinamento, com avaliação de cinco juízes. Posteriormente, foi realizado um teste piloto, para verificar sua efetividade e aplicabilidade.

A coleta de dados foi realizada entre dezembro de 2019 e janeiro de 2020, por meio de entrevistas, que foram feitas após as consultas de pré-natal das gestantes nas ESF, de forma que não interferiu no andamento das atividades e na dinâmica do serviço. As entrevistas foram realizadas em um ambiente adequado, disponibilizado pela coordenação da unidade, garantindo-se a tranquilidade e privacidade da gestante.

Deste modo, foram apresentadas às mulheres os objetivos da pesquisa e solicitada sua participação voluntária. Posteriormente, foi apresentado o instrumento e iniciado a coleta das informações. O instrumento foi preenchido pelos pesquisadores, em formato de entrevista, conforme as respostas das gestantes, uma vez que as mulheres poderiam apresentar alguma dificuldade para o autopreenchimento. Assim, cada entrevista teve duração de, aproximadamente, 15 minutos por gestante.

Os dados coletados foram digitados em planilha do MS-Excel, versão 2010, para a elaboração do banco de dados. Posteriormente, foram transportados para o software IBM Statistical Package for the Social Science, versão 20.0, para a análise descritiva das variáveis, por meio de frequência absoluta e relativa para as variáveis qualitativas e medidas de tendência central (média, mediana, mínimo e máximo) e dispersão (desvio padrão) para as variáveis intervalares.

Com base na Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 466/2012, que trata de pesquisa envolvendo seres humanos, esta pesquisa foi avaliada e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, conforme parecer nº 3.398.379.

 

Resultados

 

Ao analisar o perfil sociodemográfico das gestantes, verificou-se que a faixa etária predominante foi de até 25 anos (média: 26,02; mediana: 26; desvio padrão: 5,817; mínimo: 18 e máximo: 40). A maioria delas era casadas/com companheiro, católicas e tinha até dois filhos (média: 0,84; mediana: 1; desvio padrão: 0,915; mínimo: 0; máximo: 4) (Tabela I).

 

Tabela I - Distribuição das mulheres no período gestacional de acordo com as características sociodemográficas. Sul de Minas Gerais (n = 201)

 

Fonte: da autora

 

A renda familiar mensal com maior frequência entre as mulheres foi de 1.001 a 2000 reais (Tabela I) (correspondendo a aproximadamente de 1 a 2 salários-mínimos) (média: 1736,74; mediana: 1500,00; desvio padrão: 925,445; mínimo: 300 e máximo: 8000).



Tabela II - Distribuição das mulheres no período gestacional de acordo com os hábitos de vida. Sul de Minas Gerais (n = 201)

 

*Somente mulheres no período gestacional que consumiam bebida alcoólica; **Somente mulheres no período gestacional que usavam drogas ilícitas; ***Somente mulheres no período gestacional que usavam tabaco

 

Com relação aos hábitos de vida das mulheres gestantes, observou-se que a maioria delas não fazia uso de álcool, drogas ilícitas e tabaco. Constatou-se que a maioria das entrevistadas não praticava nenhuma atividade física (Tabela II).

Verificou-se que parte das mulheres possuía doença crônica, principalmente asma e hipotireoidismo; e, a maioria fazia uso de algum medicamento de uso contínuo e/ou diário, sendo os complexos vitamínicos os mais usados (Tabela III).

 

Tabela IIIDistribuição das mulheres no período gestacional de acordo com as variáveis de doença crônica e o uso de medicamentos. Sul de Minas Gerais (n = 201)

 

*Somente mulheres no período gestacional que possuíam doença crônica; **Somente mulheres no período gestacional que possuíam doença crônica. Houve mais de uma resposta por entrevistada. HAS =Hipertensão Arterial Severa; DM = Diabetes mellitus

 

Com relação às informações do período gestacional das mulheres, observou-se que a maioria não planejou a gravidez, tinha pré-natal de risco habitual e não seria o primeiro parto. A maior parte das mulheres tinha idade gestacional entre 14 e 27 semanas (média: 21,86; mediana: 21,0; desvio padrão: 9,393; mínimo: 03 e máximo: 41) (Tabela IV).

 

Tabela IVDistribuição das mulheres no período gestacional de acordo com as variáveis de informações gestacionais. Sul de Minas Gerais. (n = 201

 

*Somente mulheres no período gestacional que tiveram mais de um parto

 

A ausência de preocupação na gravidez foi mais frequente entre as gestantes, porém, dentre as que apresentaram, a preocupação com o parto foi a mais relatada. Quanto à problema na gravidez, parte das gestantes afirmaram ter preocupações, principalmente com a prematuridade ou perdas anteriores. Quando questionadas sobre relação com o pai do recém-nascido, a maior parte das gestantes afirmou ser boa (Tabela V).

 

Tabela VDistribuição das mulheres no período gestacional de acordo com as variáveis de informações gestacionais. Sul de Minas Gerais (n = 201)

 

*Somente gestantes que apresentam preocupação na gravidez; houve mais de uma resposta por entrevistada; **Somente gestantes que apresentam problema na gravidez; Houve mais de uma resposta por entrevistada

 

            Evidenciou-se, ainda, que a maioria das gestantes terá ajuda para cuidar do recém-nascido, sendo que a pessoa que mais ajudará é a família. A mudança de humor mais relatada pelas participantes foi a irritação. Com relação a influência da mudança física durante a gestação na vida da mulher, 65,2% delas responderam que não houve (Tabela V).

 

Discussão

 

No presente estudo, observou-se que a amostra foi constituída por mulheres no período gestacional com maior frequência na faixa etária de até 25 anos, casada ou com companheiro(a), católicas, com filhos, com renda familiar mensal de R$ 1001 a 2000 reais e ensino médio completo.

Em uma pesquisa realizada com 160 gestantes, no município de São Luís, MA, constatou-se que a maioria delas (48,7%) apresentava a faixa etária de 19 a 35 anos. É ressaltado que as mulheres são mais férteis entre 15 e 30 anos. Assim, é considerada “idosa” a grávida acima de 35 anos. No entanto, a definição de idade materna avançada mais recente foi elevada para 40 a 45 anos [8].

Em contraponto, um estudo realizado em Francisco Beltrão, PR, verificou-se que a maioria das gestantes tinha idade entre 15 e 35 anos, ou seja, estas gestantes estavam em idade fértil. Destaca-se que é considerado um fator de risco a gravidez na adolescência, assim como, nas mulheres com idade superior a 35 anos [9].

Em investigação realizada em Fortaleza, CE, evidenciou-se que a maioria era casada, com ensino médio completo e com até dois filhos [10]. Resultado semelhante também foi constatado em estudo que 85,5% das mulheres avaliadas viviam com o companheiro [9]. Estas informações corroboram os achados do presente estudo.

No que se refere a variável número de filhos, a taxa de fecundidade pode ser consequência de alguns fatores e que permeiam a temática do projeto de ter filhos, como: o processo de escolha entre ter ou não filhos, a transição para a parentalidade como projeto conjugal, o momento certo para se ter um filho, e os conflitos que permeiam o processo de escolha [11]. Em uma investigação realizada em Santarém, PA, mostrou que 59,0% das gestantes eram multíparas [12], o que também foi evidenciado no presente estudo.

A maioria das gestantes desta investigação tem alguma influência da religião católica e outras crenças religiosas, como a evangélica e o espiritismo. Em pesquisa realizada com gestantes, mostrou que a fé vai além da religião, sendo benéfico o apoio que podem trazer no ciclo gravídico [10]. Foi constatado em pesquisa com 920 gestantes que a maioria (60,1%) era casada e 67,20% era da crença religiosa católica [13].

Com relação à variável renda familiar mensal, em investigação realizada com 48 participantes, 67,0% delas apresentavam a renda familiar mensal de um a dois salários-mínimos, o que entra em consonância com os achados do presente estudo. Vale ressaltar que a renda familiar pode ter impactos diretos na saúde materna e fetal, como é visto em pesquisa realizada na Argentina, em que apontou que a redução na perda de renda pode ter impacto negativo na saúde infantil e materna, devido à redução do consumo de insumos produtores de saúde [12,14].

Já para a variável escolaridade, um estudo realizado com gestantes evidenciou-se que a maioria (41,2%) apresentava ensino médio completo [8]. Resultado similar também foi encontrado em investigação que encontrou que as gestantes estudaram mais de oito anos (77,8%), o que corrobora os dados da presente pesquisa [13].

No que se refere ao uso de bebidas alcoólicas, os achados nas investigações estão com valores percentuais de gestantes que consomem este tipo de bebida superiores ao encontrados no presente estudo, em que apenas 5,0% das entrevistadas consumiam álcool. Pesquisa realizada em Juiz de Fora, MG, com 1958 participantes, constatou-se que 42,8% delas faziam uso de bebida alcoólica [15].

Quanto ao uso de tabaco, é visto que nas últimas décadas houve um aumento desse consumo em mulheres, o que pode gerar repercussões negativas no organismo. Na gestação esse quadro ainda é mais preocupante, uma vez que essas substâncias trazem consequências severas à saúde materno-fetal [16].

É notável que durante a gestação, a maioria das mulheres apresenta alterações de ordem física, psicológica e social, com maior suscetibilidade a diversos agravos. Quando associado ao envolvimento com drogas, sejam elas ilícitas ou lícitas, o contexto de vulnerabilidade dessas mulheres é ampliado, e pode repercutir diretamente sobre a relação do binômio mãe-feto [17].

E, com relação ao uso de drogas ilícitas, em investigação realizada em Araguari, MG, encontrou-se que 1,4% das mulheres utilizavam maconha e 5,7% cocaína e crack durante a gestação [18]. Os resultados achados na presente pesquisa corroboram os citados anteriormente.

Neste contexto, é importante que os profissionais de saúde que atuam nas consultas de pré-natal, principalmente o enfermeiro, trabalhem de forma intensa no combate ao consumo de álcool, tabaco e outras drogas, no intuito de prevenir complicações no ciclo gravídico-puerperal.

No que concerne à variável doenças crônicas e uso de medicamentos contínuos e/ou diários, pesquisa realizada no Sul de Minas Gerais evidenciou que 88,0% das gestantes negaram ter problemas de saúde, das quais a HAS (40,0%) e o DM (20,0%) foram os mais presentes e 90,7% não faziam uso de medicamentos diários [19], o que corrobora o presente estudo.

Em outra investigação desenvolvida no Rio Grande do Sul, foi evidenciado que há uma maior frequência de gestantes com HAS, associada ou não a outros fatores. Neste contexto, é necessário que a assistência durante o pré-natal seja específica a cada gestante, sendo essencial para prevenir a morbimortalidade materna e fetal que pode ser decorrente de complicações de problemas de saúde maternos [20].

Já quanto a variável gravidez planejada, foi constatado em pesquisa realizada no Paraná, que a maioria delas (61,9%) não planejou a gestação [21], o que está em consonância com os resultados do presente estudo. Em investigação realizada na cidade de Sindhupalchowk-Nepal, com 164 gestantes, constatou-se que 24 não planejaram a gravidez [22].

Com relação ao primeiro parto, grande parcela das participantes entrevistadas no presente estudo respondeu que não (53,7%), o que diverge com os resultados apresentados em pesquisa realizada com 10 gestantes, na cidade de Fortaleza, CE, que evidenciou que 60,0% delas estavam vivenciando o primeiro parto [10].

Ao discutir a variável idade gestacional, é importante mencionar uma investigação similar com gestantes em São Luís, MA, onde a maioria das participantes (46,2%) estava no terceiro trimestre de gestação [8]. Esta informação está em discordância com o presente estudo.

A presente pesquisa mostrou que houve predominância de gestantes que não apresentaram algum tipo de preocupação com relação à gestação, das que apresentaram a preocupação com o parto foi a mais citada. Paralelamente, um trabalho realizado em uma maternidade do sertão paraibano mostrou que as gestantes demonstraram receio quanto ao parto (34,0%) [23].

Com referência aos problemas na gravidez, é possível destacar que 14,4% das gestantes avaliadas neste estudo possuíam algum tipo de problema, sendo a prematuridade ou as perdas anteriores as mais citadas. Em pesquisa realizada na Austrália, encontrou-se que 17,9% das mulheres sofreram aborto [24].

Diante dos principais problemas de saúde durante a gestação, é necessário que a equipe multiprofissional de saúde, incluindo o enfermeiro, esteja capacitada para prestar uma assistência adequada durante o pré-natal, em todos os níveis de atenção à saúde da mulher, visando identificar precocemente as possíveis situações de risco e seu adequado manejo [25].

No presente estudo grande parcela das gestantes afirmou que terão ajuda para cuidar do recém-nascido, tendo suporte da família. A ajuda para cuidar do recém-nascido é um processo que pode envolver afeto, empatia, respeito, informações, auxílio financeiro e tempo dedicado e, além disso, pode contribuir para a adaptação à gestação, às vivências e às rotinas [26]. Em estudo realizado no nordeste do Brasil, resultou que a ajuda dispensada pela família é essencial para a mulher, principalmente em ações rotineiras, como trocar fralda, cuidar da casa e dos outros filhos [27].

Já a variável relação com o pai do recém-nascido, é essencial ter uma relação satisfatória com o companheiro, visto que é importante para o enfrentamento das mudanças ocorridas nesse período. O parceiro é integrante da rede social de apoio, facilitando o processo de seguimento do bem-estar durante a gestação [10]. Pesquisas remetem que a relação com a mulher e a participação do pai durante o acompanhamento do pré-natal tem influência positiva no desfecho da gestação, resultando em um melhor bem-estar da mulher, proporcionando alegria, confiança, tranquilidade e apoio [28,29].

Constatou-se na presente pesquisa que a maioria das gestantes avaliadas apresentou alguma mudança de humor, sendo irritação a mais citada. Um estudo realizado em Campinas, SP também evidenciou que a mudança de humor está presente nesta etapa [30].

Em relação às mudanças físicas durante o período gestacional, as mulheres vivenciam inúmeras alterações no corpo, quanto à forma e ao peso. É um momento que envolve percepções, crenças, sentimentos e comportamentos relacionados ao corpo [1,31]. Por isso, as alterações corporais que a mulher sofre durante o período gestacional, aliadas ao afastamento do padrão corporal idealizado, ressaltam a importância do acompanhamento destas no período gestacional [32].

Em estudo desenvolvido na Inglaterra foi encontrado que os sentimentos relacionados ao corpo no início da gravidez influenciam diretamente a satisfação corporal das mulheres no decorrer da gestação [33]. Em outra investigação realizada na Austrália, evidenciou-se que, enquanto para algumas grávidas o ganho de peso era considerado assustador, outras relataram que se sentiam liberadas para “serem gordas” [34].

O presente estudo apresentou algumas limitações, devido ao desenho transversal, por isso, não foi possível verificar a relação causa-efeito dos resultados encontrados. Entretanto, tal desenho foi relevante por permitir caracterizar o perfil das gestantes, observando a situação da mulher no período gestacional. Outra limitação foi o acesso à população de estudo, sendo baixa a adesão ao pré-natal do município em que foi realizada a pesquisa. Porém, mesmo assim, foi possível atingir a meta proposta do quantitativo de gestantes, para compor a população de estudo, o que forneceu informações relevantes para a pesquisa e maior compreensão deste fenômeno.

 

Conclusão

 

Foi possível concluir que as gestantes tinham uma faixa etária de até 25 anos, casadas ou com companheiros(as), católicas, com até 2 filhos, com renda familiar mensal de 1.001 a 2.000 reais e ensino médio completo. Ademais, a maior parte das entrevistadas não consumia bebida alcoólica, drogas ilícitas e nem tabaco, não praticava atividades físicas, não possuía outras doenças crônicas e fazia uso de medicamentos contínuos e/ou diários.

Além disso, a maioria das gestantes não planejou a gravidez, realizou pré-natal de risco habitual, não estava no primeiro parto e tinha idade gestacional entre 14 e 27 semanas. A maior parte destas mulheres não teve preocupação e nem problema na gravidez, apresentou mudança de humor e achou que a mudança física durante a gestação teve influência na sua vida. Afirmaram ainda ter boa relação com o pai do recém-nascido e que terão ajuda para cuidar do mesmo.

Ao conhecer o perfil das gestantes, os profissionais da saúde, incluindo os da enfermagem, conseguem se sensibilizar ao contexto social da mulher, visando prestar uma assistência integral e humanizada. Assim como aproveitar o momento para reforçar os laços com elas, com consequente melhoria do vínculo paciente-profissional e maior adesão desta no serviço de saúde e menor risco em todo o ciclo gravídico-puerperal.

Esta pesquisa poderá trazer avanços no conhecimento científico e na área da enfermagem para embasar a elaboração de ações como educações continuadas e protocolos, com estratégias que visem a humanização, a integralidade e a continuidade da assistência prestada à mulher grávida de acordo com o seu perfil e contexto social.

 

Financiamento

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

 

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