Enferm Bras 2021;20(5):672-84

Doi: 10.33233/eb.v20i5.4855

ARTIGO ORIGINAL

Síndrome de burnout e qualidade de vida em enfermeiros

 

Ana Paula Ramos*, Ana Paula Freitas de Farias*, Adriana de Araújo Saraiva*, Fabíola da Silva Santos Passos**, Gerson Sherrer Júnior***, Kleyton Góes Passos****

 

*Graduanda em Enfermagem, Universidade Federal do Acre (UFAC), Campus Floresta, **Licenciada em Pedagogia pela UFAC, Campus Floresta, ***Enfermeiro, Doutor em Ciências pela Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo (EPE/UNIFESP), ****Enfermeiro, Docente da Universidade Federal do Acre, Doutor em Ciências pela Escola Paulista de Enfermagem, Universidade Federal de São Paulo (EPE/UNIFESP)

 

Recebido em 19 de julho de 2021; aceito em 1 de setembro de 2021.

Correspondência: Prof. Dr. Kleyton Góes Passos, Av. Norte, 958 Tucumã II, 69919-784 Rio Branco AC

 

Ana Paula Ramos: paularamos.czs@gmail.com

Ana Paula Freitas de Farias: anapff24@gmail.com

Adriana de Araújo Saraiva: adrianasaraiva@gmail.com

Fabíola da Silva Santos Passos: fabiolapassos.pedagogia@gmail.com

Gerson Sherrer Júnior: gscherrer@ig.com.br

Kleyton Góes Passos: Kleyton.passos@ufac.br

 

Resumo

A Síndrome de Burnout é definida por Maslach e Jackson como uma reação à tensão emocional crônica desencadeada a partir do contato direto excessivo com outros seres humanos. Objetivo: Avaliar a Qualidade de Vida (QV) e a existência da Síndrome de Burnout em enfermeiros de um Hospital Maternidade na Amazônia Ocidental Brasileira. Métodos: Estudo exploratório, descritivo e de base quantitativa, realizado com 26 profissionais de ambos os sexos que possuem vínculo empregatício com o Hospital da Mulher e da Criança Irmã Maria Inete Della Senta. A coleta de dados foi realizada através da aplicação dos questionários: Maslach Burnout Inventory (MBI) e Short Form (SF-36). Resultados: Pode-se considerar que esta população estudada não apresenta alto índice de Síndrome de Burnout, quanto a QV pode-se classificar como mediana. Conclusão: Os enfermeiros possuem altos índices de satisfação no trabalho e realização profissional, porém apresentam-se exaustos emocionalmente, e com uma QV insatisfatória.

Palavras-chave: burnout; estresse ocupacional; enfermeiros.

 

Abstract

Burnout syndrome and quality of life in nurses

Burnout Syndrome is defined by Maslach and Jackson as a reaction to the chronic emotional tension triggered by excessive direct contact with other human beings. Objective: To assess the Quality of Life (QOL) and the existence of Burnout Syndrome in nurses at a Maternity Hospital in the Western Brazilian Amazon. Methods: An exploratory, descriptive, and quantitative study, carried out with 26 professionals of both sexes who have a job with the Hospital da Mulher e da Criança Irmã Maria Inete Della Senta. Data collection was performed using the questionnaires: Maslach Burnout Inventory (MBI) and Short Form (SF-36). Results: We can consider that this studied population does not present a high rate of Burnout Syndrome, as the QOL can be classified as median. Conclusion: Nurses have high levels of job satisfaction and professional achievement, but are emotionally exhausted, and with an unsatisfactory QOL.

Keywords: burnout; occupational stress; nurses.

 

Resumen      

Síndrome de burnout y calidad de vida en enfermeras

El síndrome de Burnout es definido por Maslach y Jackson como una reacción a la tensión emocional crónica provocada por el contacto directo excesivo con otros seres humanos. Objetivo: Evaluar la calidad de vida (QOL) y la existencia del síndrome de Burnout en enfermeras de un hospital de maternidad de la Amazonía occidental de Brasil. Método: Estudio exploratorio, descriptivo y cuantitativo, realizado con 26 profesionales de ambos sexos que trabajan en el Hospital da Mulher e da Criança Irmã Maria Inete Della Senta. La recopilación de datos se realizó mediante los cuestionarios: Maslach Burnout Inventory (MBI) y Short Form (SF-36). Resultados: Se puede considerar que esta población estudiada no presenta una alta tasa de síndrome de Burnout, ya que la calidad de vida puede clasificarse como mediana. Conclusión: Las enfermeras tienen altas tasas de satisfacción laboral y logros profesionales, pero están emocionalmente agotadas y con una calidad de vida insatisfactoria.

Palabras-clave: burnout; estrés ocupacional; enfermeros.

 

Introdução

 

 

Por meio do trabalho é possível se alcançar crescimento, transformação, reconhecimento e independência pessoal. Em contrapartida este tem proporcionado cada vez mais aos profissionais a exposição a situações indutoras do estresse, que geram problemas, como: insatisfação, desinteresse e exaustão, além de gerar o comprometimento da qualidade do serviço prestado [1].

No momento atual é perceptível o aumento da preocupação com a saúde dos profissionais que exercem suas atividades em organizações de saúde. Visto que as instituições hospitalares possuem uma estrutura organizacional bastante complexa, esta acaba sendo um dos contextos de risco à saúde ocupacional. Há uma prática voltada, quase que unicamente para a efetividade do atendimento ao paciente e, muitas vezes, percebe-se uma menor valorização das condições de trabalho essenciais para a saúde do trabalhador, que permanecem expostos a situações que exigem elevada demanda emocional [2].

Alguns estudos revelam que a enfermagem seria a quarta profissão mais estressante, uma vez que trabalha direta e diariamente com outras pessoas. O profissional de enfermagem, em especial, acaba se tornando mais suscetível a desenvolver psicopatologias, especialmente a Síndrome de Burnout (SB) por estar submetido continuamente a fatores geradores de estresse laboral como escassez de pessoal, sobrecarga, baixa participação nas decisões, sentimento de injustiça nas relações laborais, remuneração inadequada, entre outras situações [3].

Nos últimos anos tem se dado mais importância ao impacto do trabalho na saúde física e mental dos profissionais e, especificamente, em relação ao estresse no contexto ocupacional, destaca-se a SB [1]. Maslach e Jackson a definiram como “uma reação à tensão emocional crônica desencadeada a partir do contato direto excessivo com outros seres humanos, particularmente quando estes estão preocupados ou com problemas” [2]. O termo “Burnout” é originário do inglês “queimar-se” e na Classificação Internacional das Doenças (CID 10) recebe o código Z73.0 [3].

Sendo muitas vezes confundida com depressão ou estresse, a SB é desencadeada por um processo prolongado de níveis de estresse que ocorre quando os métodos de seu enfrentamento falharam ou foram insuficientes. Seu surgimento é gradual e cumulativo, seu incremento é progressivo em severidade, não sendo percebido pelo indivíduo, que geralmente se recusa a acreditar estar acontecendo algo de errado com ele [4].

A síndrome é composta por três dimensões centrais, que são independentes entre si: exaustão emocional, despersonalização e baixa realização pessoal [1]. Na exaustão emocional (EE) ocorre manifestação física ou psíquica caracterizada pela ausência ou pouca energia para o trabalho e sentimento de esgotamento emocional que leva a problemas como desentusiasmo, frustração e tensão.

Segundo Fávero, a Despersonalização (DP) vem a ser o desenvolvimento de sentimentos e atitudes negativas no trabalho como impassividade, insensibilidade ou até dissimulação com os clientes e colegas, tratando-os como objetos e, na baixa realização profissional (BRP), ocorrem sentimentos de inadequação pessoal e profissional, gerando a autoavaliação em caráter negativo, o que gera infelicidade e insatisfação, surgindo então sentimentos de fracasso e incapacidade [3].

As manifestações de SB devem receber uma atenção especial quando se lida com profissionais que atuam no serviço público, local em que se impõem exigências específicas com a população. Na área da saúde, além da demanda natural de trabalho, os profissionais lidam diariamente com doenças e sofrimento [1]. E a vulnerabilidade desta classe levou à problematização deste estudo, que se faz necessário para que se dê a devida importância ao problema em questão e forneça subsídios para gestores e para os profissionais da saúde na elaboração de ações para melhoria das condições do trabalho nos diferentes turnos e propiciando melhoria da qualidade de vida no seu ambiente de trabalho.

Neste contexto, conhecendo o perfil profissional e com isso saber se existe ou não a SB, pode-se minimizar e/ou evitar complicações físicas, mentais e até trabalhistas no que se refere ao enfermeiro e, através desses resultados, contribuir para uma prática assistencial de qualidade na relação enfermeiro/paciente. Como objetivo deste estudo estabeleceu-se avaliar a Qualidade de Vida e a existência da SB em enfermeiros de um Hospital Maternidade na Amazônia Ocidental Brasileira.

 

Métodos

 

Trata-se de um estudo exploratório, descritivo e de base quantitativa, realizado no município de Cruzeiro do Sul, região do Vale do Juruá, Acre, Brasil, no mês de setembro de 2019. O estudo foi realizado no Hospital da Mulher e da Criança do Vale do Juruá.

A população de estudo corresponde a 36 profissionais enfermeiros da unidade hospitalar, na qual contou com a participação de 27 enfermeiros de ambos os sexos que possuem vínculo empregatício com o Hospital da Mulher e da Criança Irmã Maria Inete Della Senta.

Foram excluídos da pesquisa aqueles que por algum motivo não preencheram os instrumentos de estudo de forma adequada ou que não assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), bem como os que estavam afastados da instituição por motivos de férias, licença ou atestado médico no período da coleta. Nesse sentido, apenas 26 participantes constituíram a população de estudo.

A coleta de dados foi realizada através da aplicação de questionários, nas dependências da instituição hospitalar, em ambiente com privacidade durante seu turno de trabalho em períodos com menor demanda. Todos os profissionais enfermeiros presentes durante o período de coleta foram convidados a participar da pesquisa, e nesta ocasião explicitados o caráter e objetivos da pesquisa, bem como a natureza de sua participação voluntária. Os dados foram coletados por meio de instrumentos validados e traduzidos para a língua portuguesa.

Para caracterização dos participantes foi elaborado e aplicado um questionário semiestruturado, composto por variáveis sociodemográficas: (sexo, idade, renda, estado civil, número de filhos, prática de exercícios físicos), variáveis laborais: (carga horária de trabalho, tempo de serviço na enfermagem, tempo de serviço na unidade, se possui vínculo com outra instituição, como classifica a vida financeira, se está satisfeito com o trabalho).

Para investigar a qualidade de vida foi utilizado o Short Form (SF-36), instrumento criado com a finalidade de avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde de maneira genérica, não possuindo conceitos específicos para determinada idade, doença ou grupo de tratamento [5]. O SF-36 é constituído por 36 perguntas, uma que mede a transição do estado de saúde no período de um ano e não é empregada no cálculo das escalas, e as demais são agrupadas em oito escalas ou domínios (capacidade funcional, aspectos físicos, dor, estado geral de saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos emocionais e saúde mental). Não há uma delimitação de pontuação corte, nesse sentido a pontuação varia de 0 (pior estado) a 100 (melhor estado). Sendo assim, para otimizar a classificação da QV baseada nos escores encontrados, foi considerado, para este trabalho, que uma pontuação de até 70 está relacionada ao “pior estado”; já os valores acima de 71 são conceituados como “melhor estado [6].

Para avaliar a presença da SB, utilizou-se o Maslach Burnout Inventory (MBI). É um instrumento composto por 22 itens que exploram três dimensões: exaustão emocional (9 itens), realização profissional (8 itens) e despersonalização (5 itens). Estes são pontuados por uma escala do tipo Likert de cinco pontos, sendo: “1”- nunca, “2” - raramente, “3” - algumas vezes, “4”– frequentemente e “5” - sempre.

Os dados foram organizados utilizando o Software Microsoft Excel® (Excel) versão 2016, e tabulados no software estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 23.0. A análise dos dados foi realizada pela estatística descritiva, por meio das frequências absolutas e relativas, da medida de tendência central (média aritmética) e das medidas de dispersão (desvio padrão).

A coleta de dados ocorreu após a autorização dos profissionais, por meio da anuência e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) pelo participante, respeitando a Resolução do Conselho Nacional de Saúde nº 466 de 12 de dezembro de 2012, e após aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Acre, por meio do parecer consubstanciado de número 3.581.132.

 

Resultados

 

A população estudada foi composta por 26 enfermeiros, de ambos os sexos, dos quais 20 do sexo feminino e 06 do masculino, em sua maioria com faixa etária entre 35 e 44 anos, representando 42% (n = 11), seguido de 38% (n = 10) entre 25 e 34 anos, 12% (n = 03) de 45 a 54 anos e apenas 8% (n = 02) com idade acima de 55 anos, totalizando a média de idade igual a 37,2 anos. Quanto ao estado civil dos participantes 58% (n = 15) são casados (as) ou em uma união estável; 81% (n = 21) possuíam filhos. Dos participantes 62% (n = 16) apresentavam renda superior a 5 salários, 35% (n = 09) com renda entre 4 e 5 salários e 4% (n = 01) de 2 a 3 salários-mínimos. Com relação a prática de atividades físicas, 50% (n = 13) realiza atividade física em conformidade com a Tabela I.

 

Tabela I - Características sociodemográficas e econômicas dos enfermeiros do Hospital Maternidade Irmã Maria Inete Della Senta

 

Fonte: Elaboração própria

 

Acerca das características laborais, 62% (n = 16) dos enfermeiros apresentavam carga horária semanal de 30 horas semanais, 23% (n = 6) 60 horas, 12% (n = 3) 40 horas e 4% (n = 1) 50 horas semanais. Dos enfermeiros entrevistados, 58% (n = 15) apresentaram entre 1 e 10 anos de serviço na enfermagem. Dos profissionais entrevistados, 73% (n = 19) trabalhavam na maternidade entre 1 e 10 anos. Quando perguntados sobre a satisfação no trabalho, 73% (n = 19) dos enfermeiros relataram estar satisfeitos em seu ambiente de trabalho. Quanto ao vínculo empregatício, 62% (n = 16) possuíam outro contrato. Com relação à vida financeira, 42% (n = 11) classificaram como sendo boa e apenas 19% (n = 5) classificaram sua vida financeira como ótima.

 

Tabela II - Características laborais dos enfermeiros da Hospital Maternidade Irmã Maria Inete Della Senta

 

Fonte: Elaboração própria

 

Em relação a qualidade de vida, buscou-se verificar a situação geral da população estudada, na qual calculou-se média, máxima e mínima para cada um dos constructos do SF-36, bem como desvio-padrão. Tais resultados obtidos com a aplicação do SF-36 são disponibilizados na Tabela III.

 

Tabela IIIMédias, mínimo, máximo e desvio padrão dos escores brutos por domínio do SF-36, dos enfermeiros amostrados

 

Fonte: Elaboração Própria

 

Fica claro que a maior média apresentada foi no domínio Capacidade Funcional (Média: 76,53; DP = 18,3), seguidos por Saúde Mental (Média: 69,69; DP = 16,5), Dor (Média: 69,19; DP = 21,2), Aspectos Sociais (Média: 65,86; DP = 26) e limitação por Aspectos Físicos (Média: 63,46; DP = 36,1). Em contrapartida, os domínios limitação por Aspectos Emocionais (Média: 58,97; DP = 40,6), Vitalidade (Média:53,84; DP = 12,7) e Estado Geral de Saúde (Média: 53,8; DP = 17,4) apresentam as menores médias dos escores, indicando valores baixos e um pior escore, uma vez que foi considerado para esta pesquisa, que uma pontuação de até 70 pontos está relacionada ao “pior estado” e os valores acima de 71 pontos são conceituados como “melhor estado" [6].

Fazendo uma análise geral dos resultados, verifica-se que apenas o domínio Capacidade funcional não apresentou média inferior a 70 pontos, demonstrando que a qualidade de vida dos enfermeiros não pode ser avaliada como elevada. O domínio mais crítico foi o que aborda estado geral de saúde, tendo como resultado 53,8.

Quanto à aplicação do questionário MBI, com os escores das pontuações instituíram-se os pontos de corte para cada respectiva dimensão, classificadas em níveis alto, médio e baixo. Para a exaustão emocional (EE): alto (≥ 27 pontos), médio (19 a 26 pontos) e baixo (≤ 18 pontos); reduzida realização profissional (RRP): alto (≤ 33 pontos), médio (34 a 39 pontos) e baixo (≥ 40 pontos); despersonalização (DP): alto (≥ 10 pontos), médio (6 a 9 pontos) e baixo (≤ 5 pontos) [7].

Posteriormente, foi realizada uma classificação dos dados, os altos escores nas dimensões de Exaustão Emocional e Despersonalização, e baixos escores na Reduzida Realização Profissional foram considerados para avaliação da presença da síndrome [7]. É importante salientar que os escores para cada dimensão são considerados separadamente e não estão combinados num único e total escore, neste contexto, os escores são computados para cada dimensão [2].

Ao se distribuir os níveis de cada dimensão do MBI dos profissionais, os resultados apresentados mostraram que 50% (n = 13) dos participantes apresentaram um alto índice de Exaustão Emocional (EE), porém apenas 15% (n = 4) apresentaram escore mais elevados para Despersonalização e 38% (n = 10) alto para o quesito Baixa Realização Profissional (BRP). A maior média de pontos ficou por parte da BRP com 35,2 (Tabela IV).

 

Tabela IV - Distribuição dos resultados Maslach Burnout Inventory (MBI) entre enfermeiros do Hospital Maternidade

 

Fonte: elaboração própria


Logo, pode-se considerar que esta população estudada não apresenta alto índice de SB, visto que combinando as três dimensões estudadas apenas EE está presente em 50% (n = 13) dos pesquisados. Ao realizar uma análise das médias gerais de cada dimensão, evidenciou-se que apenas a dimensão EE se encaixou em um nível alto, enquanto DP e BRP se encaixaram em um nível moderado, conforme mostrado na Tabela IV.

 

Discussão

 

 

A partir dos estudos relacionados ao tema em questão e aos dados coletados e analisados, buscou-se compará-los e questioná-los, a fim de se alcançar os objetivos que foram propostos inicialmente.

Da amostra total, 77% (n = 20) dos enfermeiros eram do sexo feminino, essa predominância feminina no trabalho da área da saúde tem sido evidenciada por muitos estudos. Tal predomínio é atribuído ao caráter histórico de que o cuidar é social e culturalmente atribuído às mulheres, como o cuidado de doentes, idosos, crianças e parturientes [1].

Outro dado relevante foi que 50% (n = 13) dos enfermeiros relataram não praticar nenhuma atividade física, este é um dado muito alarmante, uma vez que a Organização Mundial de Saúde reconhece a atividade física como um dos comportamentos promotores de saúde e de qualidade de vida, configurando-se como um meio privilegiado de melhorar a saúde física e mental [8].

Com relação a qualidade de vida, na avaliação dos resultados obtidos através do questionário SF-36, observa-se que nos domínios Estado Geral de Saúde e Vitalidade encontram-se piores escores, ou seja, os participantes não apresentam bons conceitos da sua própria saúde, e que boa parte do tempo eles não apresentam a sensação de vigor e energia [5].

Semelhante a essa pesquisa, os estudos de Pinheiro, na análise dos domínios Estado Geral de Saúde e Vitalidade apresentam piores escores denotando baixa qualidade de vida [5]. Confrontando esses resultados com outros que utilizaram o SF-36 para a avaliação da qualidade de vida, o estudo de Disconzi, que aplicou o SF-36 em motoristas de táxi apresentam resultados que diferem apontando uma pior média nos aspectos emocionais [9].

Em contrapartida, o domínio que apresentou maior escore foi Capacidade Funcional, indicando que os enfermeiros apresentam quase ou nenhuma dificuldade em realizar atividades cotidianas, corroborando o estudo de Barreto, que verificou uma média nesse domínio de 87,79 [10].

Percebe-se que dentre os 8 domínios avaliados apenas o domínio capacidade funcional apresentou escore acima de 71 pontos, sendo considerado melhor estado e os demais domínios apresentaram escores médios inferiores a 70 pontos considerado pior estado. Levando em consideração as pontuações médias obtidas por constructo e a média geral de 63,91 pontos, pode-se classificar a qualidade de vida dos enfermeiros entrevistados como mediana [9].

Em relação a SB, por meio dos dados obtidos com o questionário MBI, foi possível identificar evidências em alguma das dimensões avaliadas, desta forma 50% (n = 13) dos participantes apresentam um alto índice de Exaustão Emocional (EE), 15% (n = 4) escore elevado para Despersonalização e 38% (n = 10) alto para Baixa Realização Profissional (BRP).

No entanto, um estudo transversal realizado em Maceió/AL com 80 bombeiros militares que atuavam no Grupamento de Socorros e Emergência identificou a presença de SB em 21,2% e porcentagens de risco superiores a 40% nas 3 dimensões estudadas por meio do questionário MBI [11]. Esse resultado difere dos encontrados no presente estudo e isso pode ser explicado pelas características laborais de cada profissão.

Ao analisar individualmente as dimensões, destaca-se a prevalência de 50% de altos índices de Exaustão Emocional, o que levou a problematização desta pesquisa. Um estudo realizado em 2009 com os trabalhadores de enfermagem da UTI adulto na cidade de São Paulo/SP, que contou com a participação de 29 profissionais, encontrou um total de 65,5% dos participantes com alto índice de Exaustão Emocional (EE), e somente 10,34% alto para Despersonalização (DP) e 17,25% alto para reduzida Realização Profissional (RRP), o que se assemelha aos achados do presente estudo [2].

Por meio deste, observa-se que, mesmo que os profissionais apresentem níveis moderados de DP e BRP, ainda, sim, apresentam-se exaustos, e esta manifestação que é caracterizada principalmente pelo esgotamento emocional, desentusiasmo e frustração pode ser um fator percursor para o desenvolvimento da SB.

Dentre os profissionais que apresentaram alto índice de EE, destaca-se o fato de 77% (n = 10) deste grupo ser composto por mulheres e, com relação a idade, 85% (n = 11) possuem faixa etária superior a 30 anos. O resultado encontrado para faixa etária contrapõe outros estudos realizados [12,13], demonstrando que indivíduos mais jovens e consequentemente com menor tempo de profissão estão mais propensos a apresentar SB, associando-se principalmente a expectativas não concretizadas e dificuldades para avistar maiores possibilidades de melhoria nas condições laborais.

Com relação ao gênero, das 11 mulheres (77%) que possuem alta EE apenas uma não possui filhos (10%), logo comparou-se o fato das atividades extralaborais também contribuírem para o quadro encontrado. Merces et al. [7] realizaram um estudo que mostrou também uma predominância de profissionais do sexo feminino, o que relacionou com a tendência ao desenvolvimento da SB, pois além da jornada de trabalho realizam atividades domésticas e fora do trabalho, o que acaba acarretando uma jornada maior se relacionada aos profissionais do sexo masculino.

Galindo et al. [12] explanaram sobre os vários argumentos que têm sido utilizados apoiando a conclusão de que as mulheres são mais vulneráveis a SB, trazendo quatro argumentos que reforçam esta afirmação, dentre eles a questão da dupla jornada de trabalho (no local de trabalho e no lar).

Levando-se em consideração que a SB é desencadeada por um processo prolongado e constituída por um grupo de sintomas que acabam alterando o nível de estresse do profissional. É necessária a avaliação de pontos de risco para o seu desenvolvimento, principalmente quando se fala em profissionais que atuam na área da saúde. Neste estudo evidenciou-se pontos dentro das dimensões que geram riscos consideráveis ao desenvolvimento desta síndrome, o que aponta uma necessidade de realização de intervenções visando a promoção, prevenção e proteção da saúde dos trabalhadores de enfermagem.

 

Conclusão

 

Com base nos resultados, conclui-se que os participantes desta pesquisa apresentam alterações significativas tanto em sua qualidade de vida quanto em aspectos que levam a indicação da presença de SB.

Levando em consideração as pontuações médias obtidas por constructo e a média geral de pontos após a análise dos questionários, pode-se afirmar que a qualidade de vida dos enfermeiros entrevistados seria classificada como mediana, com alterações significativas nas variáveis de Estado Geral de Saúde e Vitalidade. Isso demonstra que a qualidade de vida dos enfermeiros não pode ser avaliada como elevada.

Quanto a SB, constatou-se o indicativo para sua presença de forma moderada nos enfermeiros, ao considerar alterações nas dimensões avaliadas. Mesmo que seja baixa a frequência de burnout na população estudada, os resultados despertam preocupação, particularmente, devido ao caráter sorrateiro da síndrome, uma vez que algum dos seus sentimentos e atitudes constituintes pode estar presente de modo intermitente, avançando com o tempo. Logo se torna perceptível o risco do desenvolvimento de altos níveis da SB na população estudada.

Portanto, mesmo que os enfermeiros apresentem uma boa realização profissional e altos índices de satisfação no trabalho, estes apresentam-se exaustos emocionalmente, e com uma qualidade de vida insatisfatória. Sugere-se a necessidade de intervenções de modo a minimizar os riscos para o desenvolvimento da SB, assim como a melhora da qualidade de vida desses profissionais.

     

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