Enferm Bras 2022;21(2):179-94
REVISÃO
Complicações neurológicas
da COVID-19 em crianças: revisão de escopo
Maria Clara Soares Dantas*,
Ana Cláudia de Queiroz*, Maria de Fátima Cabral da Silva*, Giovanna Gabrielly Custódio Macêdo**, Nathanielly
Cristina Carvalho de Brito Santos*, Anajás da Silva Cardoso Cantalice*
*Universidade Federal de
Campina Grande, PB, **Universidade de Pernambuco, PE
Recebido em 28 de julho de
2021; Aceito em 21 de março de 2022.
Correspondência: Maria Clara Soares Dantas,
Universidade Federal de Campina Grande, Rua Aprígio Veloso, 882 Universitário
58428-830 Campina Grande PB
Maria
Clara Soares Dantas: dantasclarinha@gmail.com
Ana
Cláudia de Queiroz: claudia.ana.queiroz@gmail.com
Maria de
Fátima Cabral da Silva: fatima_cabral@live.com
Giovanna Gabrielly Custódio Macêdo: cmacedogiovanna@hotmail.com
Nathanielly Cristina Carvalho de
Brito Santos: nathaniellycristina@gmail.com
Anajás da
Silva Cardoso Cantalice: anajascardoso@gmail.com
Resumo
Introdução: Na criança, os casos de COVID-19,
infecção causada pelo novo Coronavirus ou SARS-CoV-2,
são geralmente mais discretos, com taxa de incidência e gravidade bem menores
quando comparadas a outras faixas etárias, entretanto há evidências de que possa
atingir os sistemas nervoso central e periférico, com possibilidade de resultar
em inúmeras deficiências. Objetivo: Identificar as principais
complicações neurológicas da COVID-19 em crianças a partir da literatura
internacional. Métodos: Revisão de escopo realizada em base de dados
eletrônicas. A busca na literatura ocorreu em janeiro de 2021. Para a
construção da questão de pesquisa, adotou-se a estratégia PICO. O processo de
seleção dos estudos foi realizado por meio das recomendações da Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta Analyses (PRISMA). A
amostra foi composta por 14 artigos. Resultados:
A análise identificou
que as complicações neurológicas mais comuns
são: infecções e inflamações do
sistema nervoso central, síndrome de Guillain-Barré,
edema pulmonar neurogênico
e crises epilépticas. Conclusão: Observou-se que o SARS-CoV-2 pode
acarretar sérias complicações neurológicas em crianças infectadas, sendo as
mais descritas nos estudos avaliados: infecções do SNC, inflamações do SNC,
síndrome de Guillain-Barré, edema pulmonar neurogênico e crises epilépticas.
Palavras-chave: criança; doenças do sistema nervoso;
infecções por coronavírus.
Abstract
Neurological complications of COVID-19 in children: scoping review
Introduction: In children, cases of COVID-19, an infection caused
by the new Coronavirus or SARS-CoV-2, are generally more discreet, with a much
lower incidence and severity when compared to other age groups; however, there
is evidence that it can affect the central and peripheral nervous systems, with
the possibility of resulting in numerous deficiencies. Objective: To
identify the main neurological complications of COVID-19 in children from the
international literature. Methods: The scope review carried out in an
electronic database. The literature search took place in January 2021. To
construct the research question, the PICO strategy was adopted. The study
selection process was carried out using the recommendations of the Preferred
Reporting Items for Systematic Reviews and Meta Analyzes (PRISMA). The sample
consisted of 14 articles. Results: The analysis identified that the most
common neurological complications are: central nervous system infections and
inflammations, Guillain-Barré syndrome, neurogenic pulmonary edema and
epileptic seizures. Conclusion: It was observed that SARS-CoV-2 can
cause serious neurological complications in infected children, being the most
described in the evaluated studies: CNS infections, CNS inflammations,
Guillain-Barré syndrome, neurogenic pulmonary edema and epileptic seizures.
Keywords: child; nervous system diseases; coronavirus
infections.
Resumen
Complicaciones neurológicas del
COVID-19 en niños: revisión de alcance
Introducción: En los niños, los
casos de COVID-19, una infección causada por el nuevo Coronavirus
o SARS-CoV-2, son generalmente
más leves, con una incidencia
y gravedad mucho menor en comparación con otros grupos de edad, pero hay evidencia de que puede afectar el
sistema nervioso central y periférico, lo que puede resultar en numerosas deficiencias. Objetivo:
Identificar las principales
complicaciones neurológicas del
COVID-19 en niños en la literatura internacional. Métodos:
Revisión de alcance realizada en
una base de datos electrónica. La búsqueda
bibliográfica se realizó en
enero de 2021. Para la construcción de la pregunta de investigación se adoptó la estrategia PICO. El proceso de selección de estudios se llevó a cabo
utilizando las recomendaciones
de elementos de informe preferidos para revisiones
sistemáticas y metanálisis. La muestra
consta de 14 artículos. Resultados: El análisis
identificó que las complicaciones neurológicas más comunes
son: infecciones e inflamaciones
del sistema nervioso
central, síndrome de Guillain-Barré, edema pulmonar neurogénico
y convulsiones epilépticas. Conclusión: Se observó que el SARS-CoV-2 puede ocasionar graves complicaciones
neurológicas en niños
infectados, siendo las más
descritas en los estudios evaluados: infecciones del SNC, inflamaciones del SNC, síndrome de Guillain-Barré, edema pulmonar neurogénico y convulsiones epilépticas.
Palabras-clave: niño; enfermedades
del sistema nervioso;
infecciones por coronavirus.
A
COVID-19 é descrita como uma infecção causada pelo novo Coronavirus
ou vírus SARS-CoV-2, que emergiu em Wuhan, China, no final de 2019, e
disseminou-se rapidamente por todo o mundo. Assim, em 11 de março de 2020, a
Organização Mundial da Saúde declarou estado de pandemia em virtude da
proporção global da doença. No entanto, inicialmente os registros eram mais de
indivíduos adultos, e os casos neonatais e pediátricos foram identificados
apenas com o avanço da crise sanitária [1,2].
Os casos
de COVID-19 em crianças são, geralmente, mais discretos, em sua maioria na
forma assintomática da infecção, com taxa de incidência e gravidade bem menores
quando comparadas a outras faixas etárias e a incidência de casos fatais
significantemente baixa. Com o avanço da pandemia, houve um crescente aumento
no número de complicações pediátricas, além de aumento razoável no quantitativo
de mortes [3]. Nessa conjuntura, estudos apontam que cerca de 20% das crianças
infectadas desenvolve a forma grave da doença, necessitando de hospitalização,
e 5% evoluem com sequelas [4].
No
Brasil, no ano de 2020, ocorreram 14.638 internações de crianças e
adolescentes, na faixa etária de 0 a 19 anos, e 1.203 óbitos. Em 2021, até o
dia 01 de março, foram notificadas 2.057 hospitalizações e 121 mortes desse
grupo em decorrência da doença [5,6].
No
contexto geral, a COVID-19 está associada a uma grande variedade de
complicações, das quais se destacam as respiratórias, como pneumonia,
insuficiência respiratória e síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA),
seguidas das não respiratórias, como as cardíacas, endoteliais, neurológicas,
inflamatórias, renais e insuficiência de múltiplos órgãos [4,7].
Além das
complicações citadas, a população infantil está mais propensa a apresentar a
Síndrome Inflamatória Multissistêmica (MIS-C) [8],
que seria a inflamação em diferentes órgãos, como coração, rins, pulmões,
cérebro, pele, olhos ou sistema gastrointestinal. Dentre as causas do
MIS-C permanecem desconhecidas e, associada a esse quadro, há relatos que o
SARS-CoV-2 pode atingir os sistemas nervoso central e periférico, com
possibilidade de resultar em inúmeras deficiências [9].
Cabe
ressaltar que a ocorrência de complicações neurológicas relacionadas à COVID-19
em crianças, além da possibilidade de interferir no desenvolvimento infantil,
gera sobrecargas financeiras e estruturais para os sistemas de saúde em
decorrência da superlotação das unidades pediátricas. Ademais, os impactos
podem ser familiares, comunitários e socioeconômicos associados à ocorrência
dessas complicações e as possíveis sequelas.
A
necessidade de compreender e reconhecer as complicações neurológicas
pediátricas em tempo hábil, e, assim, proporcionar intervenções em tempo
oportuno, que sejam capazes de contribuir para o desenvolvimento
neuropsicomotor infantil justifica essa investigação considerando, sobretudo, a
escassez de estudos e as contribuições científicas acerca da temática. Dessa
maneira, o objetivo da presente pesquisa é identificar as principais
complicações neurológicas da COVID-19 em crianças a partir da literatura
internacional.
Trata-se
de um estudo descritivo, qualitativo delineado como revisão de escopo ou scoping review, realizado em cinco etapas: elaboração da
questão norteadora (“Quais as principais complicações neurológicas da COVID-19
em crianças?”.); busca da literatura relevante nas bases de dados; extração; análise;
e apresentação dos resultados [10].
Para a
construção da questão de pesquisa, adotou-se a estratégia PICO [11]. O acrônimo
correspondeu, respectivamente, a P - população: crianças; I - interesse:
complicações neurológicas; Co-contexto: COVID-19. Em
seguida, foram definidos os descritores controlados por meio do Descritores em
Ciências da Saúde (DeCS) e Medical Subject Headings (MeSH): “criança”, “doenças do sistema nervoso” e “infecções
por coronavirus”, como operador booleano o “AND”.
Dessa
maneira, foi construída a estratégia de busca “Children
AND Nervous System Disease
AND Coronavirus Infections”
e investigou-se nas bases de dados US National
Library of Medicine (PubMed),
Web of Science, Scopus e Cumulative Index to Nursing and Allied
Health Literature (Cinahl).
Os
critérios de inclusão englobaram artigos que respondessem ao objeto de estudo,
sem limite temporal, com acesso gratuito e disponíveis na íntegra. Não foram
limitados idiomas para os artigos. Os critérios de exclusão, por sua vez,
incluíram estudos duplicados, teses, dissertações, revisões de literatura,
cartas ao editor, artigos de opinião, anais, cartilhas e artigos nota prévia.
O
processo de seleção dos estudos foi realizado por meio das recomendações da Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta Analyses (PRISMA) [12].
O método de análise do corpus se baseou na técnica de Análise de Conteúdo [13].
A partir
da aplicação da estratégia de busca nas bases de dados, foram encontrados 323
artigos, dos quais, após aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, 14
constituíram o corpus, conforme apresenta a Figura 1 de seleção dos artigos
segundo as recomendações PRISMA.
Fonte:
Autoria própria (2021)
Figura 1 - Fluxograma de seleção dos estudos
conforme as recomendações do PRISMA
A maioria
dos artigos não foi selecionada por não atender a temática proposta, que
correspondeu a 91,6% (283). Dentre os demais, 4,2% (13) foram excluídos em
virtude de estarem indisponíveis na íntegra, 2,6% (8) por serem artigos de
revisão, 1,3% (4) por se tratarem de cartas ao editor e 0,3% (1) por ser
cartilha.
A
caracterização do corpus de análise está disposta no Quadro 1 conforme
informações acerca do ano de publicação e autores, título do artigo, objetivo,
desfecho e título do período.
Quadro 1 - Caracterização do corpus de
análise da pesquisa (ver PDF anexo)
A
análise do corpus foi possível identificar que as complicações neurológicas
mais comuns são: infecções e inflamações do sistema nervoso central, síndrome
de Guillain-Barré, edema pulmonar neurogênico (NPE) e crises epilépticas,
conforme apresenta o Quadro 2.
Quadro 2 - Corpus de análise da pesquisa
Infecções e inflamação do
SNC
As
infecções do SNC causadas em associação à infecção por COVID-19 foram avaliadas
em (44%) das crianças, que apresentavam pelo menos um sinal ou sintoma
neurológico e 12% das crianças apresentavam dois ou mais, entre eles,
encontrava a cefaleia (20%) e encefalopatia (16%) foram as manifestações
neurológicas mais comuns em crianças em geral, seguidas de convulsões
(8%). Anosmia (4%), ageusia (3,6%), meningite/encefalite (1,3%) e acidente
vascular cerebral (0,9%) foram menos comuns [28].
A meningite
foi apontada como uma das principais infecções relacionadas ao novo
coronavírus, sendo caracterizada pela inflamação das membranas protetoras do
cérebro, com causas mais comuns as virais, principalmente pelos enterovírus. No
entanto, outros tipos de vírus como os arbovírus e vírus herpéticos também são
fatores etiológicos importantes, assim como possivelmente o novo coronavírus
[18,20,22,23,28].
Foi descrito um caso em uma criança de 9
anos com meningite que apresentou febre, cefaleia e lombalgia 3 dias após o
início dos sintomas da COVID-19. No exame clínico do paciente, foi evidenciado
rigidez dos músculos da cabeça e pescoço e os testes de Brudzinski
e Kernig foram positivos. Além disso, fotofobia e
diplopia com movimento limitado no olho direito e paralisia do sexto nervo
foram observadas [23].
Já em
outro estudo houve um caso único de coinfecção relatado em uma criança
previamente saudável com infecção aguda por SARS-CoV-2, com evidências
laboratoriais e de imagem de meningoencefalite que piorou rapidamente em 2
semanas de doença. Observou-se a presença de dois microrganismos, o do
SARS-CoV-2 e Mycobacterium tuberculosis, causando na
criança meningite tuberculosa associada à COVID-19 [18]. Destaca-se que a
criança estava assintomática durante a infecção primária com o Mycobacterium tuberculosis, mostrando sintomatologia após adquirir a
infecção por SARS-CoV-2, de modo que os autores consideraram que a resposta
imunológica à COVID-19 pode ter contribuído para a disseminação de
microbactérias no SNC e desenvolvimento de quadro sintomático [16].
No que se
refere às principais inflamações do SNC retratadas em crianças que contraíram o
vírus SARS-CoV-2, destacam-se as encefalites, encefalomielite aguda disseminada
(ADEM) e a mielite transversa. Estudo realizado na China com 183 pacientes
pediátricos hospitalizados por suspeita de encefalite aguda relatou que 22
(12%) tinham infecção por COVID-19 associada [20].
Em relato
de caso realizado no Peru foi observada encefalite aguda, após a infecção pelo
novo Coronavirus em uma estudante de 13 anos, que
apresentou três dias de quadro clínico viral com cefaleia holocraniana
de intensidade moderada e no quarto dia evoluiu para admissão em pronto-socorro
por sensação de elevação térmica acompanhada de distúrbio sensorial de início
abrupto e dificuldade para ficar em pé [20].
Outro
caso de encefalite foi relatado por meio de disfunção do receptor de aspartato
(anti-NMDAR). Assim como no caso anterior, a criança
apresentou febre e alterações neurocognitivas,
tais
como ausência de interação com os seus cuidadores,
ausência de verbalização e
movimentos de chute e espancamento quase constantes nos braços e
pernas.
Associados a esse quadro, foram descritos ainda agitação,
sono insatisfatório,
constipação e diminuição da ingestão
oral, desidratação, oscilações de humor e
comportamento, convulsões e instabilidade autonômica, que
seguiram com o
diagnóstico de encefalopatia [22].
Um caso
de ADEM que é caracterizada por apresentar neurite óptica, hemiparesia e/ou
sintomas sugestivos de transecção da medula espinhal. Esse caso foi associado à
COVID-19, que, por sua vez, apresentou lesões de alta intensidade na substância
branca do cérebro e medula espinhal, como também quadros convulsivos. O achado
de SARS-COV-2 no líquido cefalorraquidiano nessa situação aponta para a
hipótese de que o coronavírus pode representar um fator etiológico na
patogênese da doença desmielinizante em humanos [15,29].
A
ocorrência de mielite transversa longitudinalmente extensa foi descrita em uma
criança, residente em Navajo, Arizona, de três anos de idade, na qual três
semanas após o início de sintomas respiratórios entre os membros da família, a
criança foi internada em um hospital relatando fraqueza progressiva nas
extremidades e diminuição da sensibilidade. Os sintomas evoluíram para
tetraplegia completa em 12 horas [17].
Associada
às possibilidades de inflamação neurológica por COVID-19, a síndrome
inflamatória multissistêmica (SIRS) em crianças tem
ganhado crescente espaço nas discussões que envolvem a doença. De um
quantitativo de 50 crianças que apresentaram infecção por SARS-CoV-2, 27
evoluíram para características consistentes com a síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica e um total de 4 pacientes, que
correspondeu a 14,8%, tiveram algum envolvimento neurológico relacionado
[19,25].
Enfatiza-se
que a SIRS é caracterizada por uma doença semelhante à Kawasaki, evoluindo com
febre persistente, marcadores inflamatórios elevados e envolvimento de órgãos multissistêmicos. A relação entre a SIRS por COVID-19 e
possíveis complicações neurológicas reflete os efeitos nervosos da resposta
inflamatória sistêmica propriamente dita, não demonstrando associação direta
com a entrada do vírus no SNC, visto que a encefalopatia apresentada
acompanhava a inflamação laboratorial crescente [25].
Síndrome de
Guillain-Barré
A
síndrome de Guillain-Barré (SGB) é uma neuropatia inflamatória de início agudo,
que geralmente se apresenta com sintomas sensoriais e fraqueza com
desenvolvimento ao longo de vários dias, geralmente levando a uma quadriparesia temporária [16].
Estudos
demonstram que aproximadamente 70% dos pacientes relatam uma infecção recente
do trato respiratório ou doença gastrointestinal anteriormente ao início dos
sintomas dessa síndrome. A SGB associada à infecção por COVID-19 foi descrita
em um primeiro momento em pacientes adultos e mais recentemente em crianças
[16].
O caso de
SGB em uma criança foi caracterizado por fraqueza simétrica nos membros
inferiores com potência motora reduzida (3/5), hipotonia, perda de reflexos do
tornozelo e joelho, sensação de formigamento e sensação prejudicada em relação
à dor e toque leve de ambos os pés até o meio das pernas, marcada por déficit
proprioceptivo [16].
A
ressonância magnética do cérebro e da coluna revelou aumento das raízes
nervosas da cauda equina nos achados pós-contraste, apoiando o diagnóstico de
SGB. Além disso, a história da doença mostrou associação entre a infecção por
SARS-CoV-2 e o desenvolvimento de GBS [16].
O início
abrupto de sintomas neurológicos sem um período assintomático após a infecção
por SARS-COV-2 sugere um perfil de doença para infecciosa. Destaca-se que a GBS
causada por essa infecção associada pode incluir efeitos prejudiciais virais
diretos ao SNC ou aos mecanismos imunológicos, ocasionando problemas
neuromusculares graves [21].
Edema pulmonar
neurogênico
O edema
pulmonar neurogênico (NPE) é caracterizado pelo desenvolvimento de edema
pulmonar dentro de minutos a horas devido a um insulto significativo do SNC,
com possibilidade de resolução espontânea em 24 a 48 h [24].
No caso
em que uma criança de 1 ano e 10 meses com crise febril desenvolveu
insuficiência respiratória aguda devido a NPE, três vírus respiratórios foram
encontrados nas amostras nasofaríngeas: hCoV-HKU1, FluC e HPIV2. Dessa maneira, o SARS-COV-2 esteve associado
à patogênese citada, de modo a tornar o hCoV-HKU1 o vírus mais provável por
esse quadro clínico, sendo marcado pelo desenvolvimento de NPE após insulto no
SNC [24].
Crises epilépticas
As crises
epilépticas foram associadas inicialmente ao COVID-19 em situações em que os
pacientes tinham alguma lesão cerebral anterior ou epilepsia previamente
conhecida e estabelecida. Essa condição dispõe de origens variadas, sendo as
causas infecciosas as comumente relatadas em crianças, destacando a recente
associação entre a COVID-19 e a ocorrência de convulsões sintomáticas agudas.
Essas convulsões ocorrem por irritação cortical devido à ruptura da barreira
hematoencefálica pela reação de várias citocinas presentes na infecção viral
[26].
Um estudo
demonstrou o caso de três pacientes que apresentaram sintomas similares a
crises epilépticas durante a infecção por COVID-19, como perda ou rebaixamento
do nível de consciência, convulsões tônico-clônicas,
mordedura lateral da língua, hipersalivação e
incontinência urinária [26]. Apesar do quadro clínico neurológico semelhante,
as seguintes diferenças foram apontadas: uma criança já possuía diagnóstico de
epilepsia e as demais não apresentavam história pessoal ou familiar de
episódios anteriores [26]. O estudo ainda afirmou que o SARS-COV-2 pode
penetrar a barreira hematoencefálica, retardar a circulação cerebral e promover
maior interação viral com receptores do tecido endotelial e glial, predispondo
a crises epilépticas. Ressalta-se que no caso em questão, a ausência de dano
cerebral visível por imagem diagnóstica sugere a ruptura da barreira
hematoencefálica com acúmulo de marcadores inflamatórios, que poderia ter
resultado em irritação cortical [26].
A
limitação do estudo se refere à escassez de informações, dados e
desenvolvimento de pesquisas que respondessem significativamente a questão norteadora desta revisão, visto a carência de
estudos sobre essa temática e a rápida e obscura proporção que a pandemia do
COVID-19 ganhou, inviabilizando a discussão minuciosa do tema abordado.
Sugere-se a realização de novos estudos que abordem de forma ampla e explicita
as complicações neurológicas da COVID-19 em crianças.
Observou-se
que o SARS-CoV-2 pode acarretar sérias complicações neurológicas em crianças
infectadas, sendo as principais: infecções e inflamações do SNC como a
meningite, meningite tuberculosa, encefalites, encefalomielite aguda
disseminada (ADEM) e a mielite transversa, síndrome de Guillain-Barré, edema
pulmonar neurogênico (NPE) e crises epilépticas.
Apesar do
déficit de produções científicas acerca das complicações da COVID-19 em
pediatria, em virtude de se constituir uma temática recente e que dispõe de
diversas pesquisas em andamento ser uma limitação para o estudo, destaca-se que
o mesmo contribui para a sociedade, profissionais de saúde e saúde pública em
geral por ampliar o conhecimento baseado em evidências e fortalecer a
implementação das medidas preventivas no controle da disseminação da COVID-19.
Ademais, tais evidências podem corroborar a compreensão da COVID-19 e o
reconhecimento das complicações e adoção de manejos adequados, no intuito de
proporcionar maior resolutividade na assistência prestada a esse público.
Ante o
exposto, sugere-se a realização de novos estudos mais robustos a exemplo de
clínicos e randomizados, a fim de contribuir com o rastreio de complicações
neurológicas relacionadas à COVID-19 na população pediátrica.
Potencial
conflito de interesse
Não há
conflito de interesse
Fontes
de financiamento
Não houve
fontes de financiamento
Contribuição
dos autores
Concepção
e desenho da pesquisa:
Dantas MCS, Queiroz AC, Silva MFC; Macêdo GGC; Coleta de dados: Dantas
MCS, Silva MFC; Análise e interpretação dos dados: Dantas MCS,
Queiroz AC, Silva MFC, Macêdo GGC, Santos NCCB, Cantalice
ASC; Redação do manuscrito: Dantas MCS, Queiroz AC, Silva MFC,
Macêdo GGC, Santos NCCB, Cantalice ASC