Enferm Bras 2022;21(5):556-68

doi: 10.33233/eb.v21i5.5008

ARTIGO ORIGINAL

Representações sobre ansiedade na perspectiva de pessoas idosas em tempo de distanciamento social pela COVID-19

 

Pietro Teixeira Piazza*, Felipe Ferreira de Sousa Nilo*, Marcelo Fernandes Roma*, José Vitor da Silva, D.Sc.**, Guilherme Luiz Nascimento Quintiliano, M.Sc.***, Karita Santos da Mota****, Rogério Donizeti Reis, M.Sc.*****

 

*Acadêmico do Curso de Medicina, Faculdade de Medicina de Itajubá (FMIT), **Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL), ***Docente e Coordenador do Curso de Enfermagem na Universidade do Vale do Rio Verde (UninCor), ****Docente IFSULDEMINAS Campus Machado, *****Fisioterapeuta e Enfermeiro, Doutorando em Enfermagem, Docente na Faculdade de Medicina de Itajubá (FMIT)

 

Recebido em 1 de dezembro de 2021; Aceito em 19 de julho de 2022.

Correspondência: Rogério Donizeti Reis, Av. Reno Júnior, 368, 37502-138 Itajubá MG

 

Pietro Teixeira Piazza: pietro.piazza97@gmail.com

Felipe Ferreira de Sousa Nilo: felipenilo21@gmail.com

Marcelo Fernandes Roma: marceloromafr@gmail.com

José Vitor da Silva: enfjvitorsilva2019@gmail.com

Guilherme Luís Nascimento Quintiliano: guilhermeluisnquintiliano@hotmail.com

Karita Santos da Mota: karita.mota@ifsuldeminas.edu.br  

Rogério Donizeti Reis: rogerioreisfisio@yahoo.com.br  

 

Resumo

Introdução: A ansiedade em tempo de pandemia pela COVID-19 é uma situação inédita que requereu mudanças radicais na vida das pessoas idosas, o que gerou medo, frustrações, preocupações e fragilidade emocional, deixando essa população mais propensa a desencadear psicopatologias diversas. Objetivo: Conhecer os significados de ansiedade entre pessoas idosas, no contexto do distanciamento social pela pandemia da COVID-19. Métodos: Estudo de abordagem qualitativa, do tipo descritivo e exploratório. Participaram do estudo 30 pessoas idosas de ambos os sexos. Para a análise de dados, utilizou-se o método do Discurso do Sujeito Coletivo. Resultados: Do tema explorado, “significado de ansiedade durante o distanciamento social pela pandemia da COVID-19”, foram evidenciadas duas ideias centrais: “Sentimentos inibidores” e “querer fazer tudo agora”. Conclusão: O distanciamento social foi um recurso de prevenção da COVID-19, porém foi também o motivo de comprometimentos da saúde mental.

Palavras-chave: ansiedade; COVID-19; idosos.

 

Abstract

Representations about anxiety from the perspective of elderly people in a time of social distancing by COVID-19

Introduction: Anxiety during the COVID-19 pandemic period is an unprecedented situation that required radical changes in older individuals' life, which generated fear, frustration, worry and emotional fragility, making this population more prone to triggering several psychopathologies. Aim: To understand the meanings of anxiety among the elderly in the context of social withdrawal by the COVID-19 pandemic. Methods: Qualitative, descriptive and exploratory study. Thirty elderly people of both sexes participated in the study. For data analysis, the Collective Subject Discourse method was used. Results: From the explored theme, "meaning of anxiety during social distancing by the COVID-19 pandemic", two central ideas were evidenced: "inhibiting feelings" and "to want to do everything now". Conclusion: Social distancing was a COVID-19 prevention resource, but it also was the reason for mental health compromises.

Keywords: anxiety; COVID-19; elderly people.

 

Resumen

Representaciones sobre la ansiedad desde la perspectiva de los adultos mayores en tiempos de distanciamiento social por el COVID-19

Introducción: La ansiedad en tiempo de pandemia por la COVID-19 es una situación inédita que requirió cambios radicales en la vida de los adultos mayores, lo que generó miedo, frustraciones, preocupaciones y fragilidad emocional, dejando esta población más sensible a las psicopatologías diversas. Objectivo: Conocer los significados de ansiedad entre adultos mayores, en el contexto del alejamiento social por la pandemia de la COVID-19. Métodos: Estudio de abordaje cualitativo, descriptivo y exploratorio. Participaron del estudio 30 adultos mayores de ambos sexos. Para el análisis de datos, se utilizó el método del Discurso del Sujeto Colectivo. Resultados: Del tema explorado “significado de ansiedad durante el aislamiento por la pandemia del COVID-19”, fueron evidenciadas dos ideas centrales: “sentimientos inhibidores” y “querer hacer todo ahora”. Conclusión: El distanciamiento social fue un recurso de prevención del COVID-19, pero fue también el motivo de comprometimientos de salud mental.

Palabras-clave: ansiedad; COVID-19; adultos mayores.

 

Introdução

 

As pessoas idosas, desde os primeiros boletins epidemiológicos da pandemia pelo novo coronavírus, têm sido apontadas como um dos principais grupos de vulnerabilidade pela COVID-19 [1]. Taxas elevadas de mortalidade, limitações e complicações, especialmente acentuadas na presença de comorbidades prévias, impulsionaram e estimularam a necessidade da instituição de medidas preventivas para minimizar o avanço da doença [2,3].

Frente a esse contexto, a sociedade teve que reaprender a viver e trabalhar por meio de novos mecanismos, dentre eles o isolamento e o distanciamento sociais, quarentena e outras mudanças na vida social [4]. Estes mecanismos usados não constituem novidade no meio científico e dizem respeito a medidas de saúde pública, não farmacológicas, historicamente consagradas para o controle de epidemias, em especial na ausência de imunobiológicos e medicamentos antivirais [5].

Define-se isolamento social como a separação das pessoas doentes daquelas não infectadas com o objetivo de reduzir o risco de transmissão da doença. A quarentena é a restrição do movimento de pessoas que se presume terem sido expostas a uma doença contagiosa, mas que não estão sintomáticas, porque não foram infectadas, porque ainda estão no período de incubação ou mesmo porque, na COVID-19, permanecerão assintomáticas e não serão identificadas [5].

Já o distanciamento social envolve medidas que têm como objetivo reduzir as interações dos indivíduos de uma comunidade, que pode incluir pessoas infectadas, ainda não identificadas e, portanto, não isoladas. Como as doenças transmitidas por gotículas respiratórias exigem certa proximidade física para ocorrer o contágio, o distanciamento social permite reduzir a transmissão. Exemplos de medidas que têm sido adotadas com essa finalidade incluem o fechamento temporário de escolas, universidades, alguns tipos de comércio e outros locais de trabalho, bem como a suspensão de eventos populares para evitar aglomeração de pessoas.

O distanciamento social é particularmente útil em contextos com transmissão comunitária, nos quais as medidas de restrições impostas, exclusivamente, aos casos conhecidos ou aos mais vulneráveis são consideradas insuficientes para impedir o avanço da doença. O caso extremo de distanciamento social é a contenção comunitária ou bloqueio (em inglês, lockdown), que se refere a uma intervenção rigorosa aplicada a toda uma comunidade, cidade ou região através da proibição da circulação de pessoas – exceto para a aquisição de suprimentos básicos ou a ida a serviços de urgência – com o objetivo de reduzir drasticamente o contato social [5].

Assim, os mecanismos preconizados, principalmente o distanciamento social, trouxeram diversos fatores que parecem contribuir para alterações na saúde mental dos indivíduos, como, por exemplo, sentimento de impotência e desesperança, ansiedade, humor deprimido, estresse, excesso de informações falsas e repercussões geradas, principalmente, pelo desemprego, que tirou o sustento de muitos trabalhadores. Considera-se também a perda de entes queridos, causadora de um grande impacto aos seres humanos por ser uma adversidade inesperada. Essas situações citadas, quando associadas, podem favorecer os agravos ou o surgimento de condições relacionadas à saúde mental [6].

Deste modo, no momento pandêmico, grupos vulneráveis, tais como as pessoas idosas, são mais susceptíveis a desenvolverem tais alterações por apresentarem alterações decorrentes da senescência ou senilidade [7,8]. Há um destaque dado àqueles que já possuem algum comprometimento cognitivo, uma vez que perdas cognitivas, afetivas e o distanciamento podem ser fatores de risco para o desencadeamento de distúrbios mentais e para produção de impacto direto na qualidade de vida das pessoas idosas [9].

Este fato pode levar ao desenvolvimento de alterações emocionais nesta população, motivadas pela ansiedade e pelo medo de contaminação e do desconhecido, sendo assim uma situação estressora e negativa durante o período de distanciamento. Assim, são provocadas mudanças na condição de saúde mental, assim como agravar as condições daqueles que por ventura já são acometidos [10].

É importante mencionar que grande parte da população brasileira apoiou e aderiu ao distanciamento social, objetivando a proteção contra a COVID-19, assim como a atenuação da curva de contágio da doença no país. Contudo, o processo de distanciamento social tem causado muitos impactos importantes nas atividades diárias das pessoas e na sociedade. Por exemplo, sabe-se que a restrição do contato social entre as pessoas idosas trouxe consequências negativas em toda dimensão biopsicosocial e espiritual, principalmente sentimentos como ansiedade [11].

Esse sentimento de ansiedade associa-se também à perda de familiares e de amigos [12,13]. O sofrimento pela possibilidade de contágio da doença tornou a vida dos longevos em tempo de pandemia uma incógnita [14].

Ainda, é notório dizer que a ansiedade faz parte da psique humana e ora nos beneficia, ora nos prejudica. Quando a intensidade desse fenômeno ultrapassa a homeostasia mental, as patologias mentais e físicas começam a surgir [15]. De acordo com o dicionário Aurélio, ansiedade é um desconforto físico e psíquico: agonia, aflição ou angústia. Definida, também, por um “sentimento vago e incômodo de desconforto ou temor, acompanhado de resposta autonômica, sentimento de apreensão causado pela antecipação do perigo, e é considerado um sinal de alerta que chama a atenção para um perigo iminente, o que permite ao indivíduo tomar medidas para lidar com a ameaça” [16,17]. Os transtornos de ansiedade caracterizam-se pela presença e duração de respostas inadequadas, como preocupação excessiva e persistente, pensamentos com conteúdo negativo, sintomas físicos como palpitação, formigamento e respiração acelerada e comportamentos que causam sofrimento no dia a dia do indivíduo [16,17].

Neste contexto, e considerando que no senso comum o termo ansiedade é utilizado quando sentimentos negativos se sobrepõem, proporcionando nas pessoas certo desespero, o objetivo deste estudo foi conhecer os significados de ansiedade entre pessoas idosas no contexto do distanciamento social pela pandemia da COVID-19.

 

Métodos

 

O presente estudo foi desenvolvido por meio da abordagem qualitativa, do tipo descritivo e exploratório. O enfoque qualitativo é selecionado quando se busca compreender a perspectiva dos participantes (indivíduos ou pequenos grupos de pessoas que serão pesquisadas) sobre os fenômenos que os rodeiam, aprofundando em suas experiências, ponto de vista, opiniões e significados, isto é, a forma como os participantes percebem, em sua subjetividade, a realidade [18].

Participaram do estudo pessoas idosas residentes em Itajubá/MG, tanto da área urbana como da rural. A amostra foi constituída por 30 seniores. A amostragem foi do tipo intencional, em que o pesquisador seleciona, a seu critério, intencionalmente as pessoas que apresentam potenciais de falas adequadas, pois poderão contribuir melhor não só com a entrevista, mas, sobretudo, seu conteúdo [19].

Em relação ao método qualitativo, este tipo de amostragem é o mais adequado. Os critérios de inclusão foram: ter 60 anos ou mais com conhecimento de uso de WhatsApp, o que foi comprovado por meio da resposta à entrevista; pessoas idosas que se encontravam em distanciamento social. O critério de exclusão foi: conteúdo das entrevistas gravadas que não atenderam ao teor da pergunta semiestruturada.

A coleta de dados teve início após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), da Faculdade de Medicina de Itajubá.

Considerando as medidas de prevenção, proteção e biossegurança da pessoa idosa, nessa fase de pandemia da COVID-19, foram adotados os seguintes procedimentos para a coleta de dados: foi enviando um link, por meio do WhatsApp, para os 30 participantes. Nesse link constava o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), o qual convidava, orientava e solicitava a anuência das pessoas idosas. Se ele(a) concordasse em participar, ao final do TCLE deveria clicar na afirmativa: “concordo em participar”, caso contrário, “não concordo em participar”. Se a sua opção foi o consentimento em participar, a seguir estava à sua disposição o instrumento de pesquisa com a pergunta aberta, “Se um amigo lhe perguntasse: o significado de ansiedade durante o distanciamento social pela pandemia da COVID-19, qual seria sua resposta?”

Após responder a essa pergunta, as pessoas idosas deveriam clicar em enviar e seria visualizado o agradecimento por ter participado do estudo. Os participantes e o pesquisador responsável salvaram uma cópia, no arquivo pessoal, do documento de Registro de Consentimento de Pesquisa.

Para a análise de dados, utilizou-se o método do Discurso do Sujeito Coletivo, que consiste em um discurso-síntese elaborado com partes de discursos de sentido semelhante, por meio de procedimentos sistemáticos e padronizados, fundamentado na Teoria das Representações Sociais e representado por quatro figuras metodológicas: 1) Expressão-chave (ECH), que são partes ou todo o conteúdo das transcrições literais do discurso de cada sujeito; 2) Ideia Central (IC), que são nomes ou expressões linguísticas que revelam e descrevem, da maneira mais sintética, precisa e fidedigna possível, o sentido de cada um dos discursos analisados; 3) Ancoragem (AC), que é a manifestação linguística explícita de uma determinada teoria, ou crença que o autor do discurso professa e que, na qualidade de afirmação genérica, está sendo utilizada pelo enunciador para “enquadrar” uma situação específica; e 4) Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), reunião das ECH presentes nos depoimentos, que têm ICs e/ ou ACs de sentido semelhante ou complementar. No presente estudo, adotou-se três figuras metodológicas, excluindo a Ancoragem. Levando em consideração a tipologia dos participantes, a dispensa dessa figura não traz alteração alguma ao método do DSC [20].

O presente estudo foi aprovado pelo CEP da Faculdade de Medicina de Itajubá, sob o parecer número: 4.660.951. Obedeceu-se aos preceitos estabelecidos pela Resolução nº 466/12, de 12 de dezembro de 2012, do Ministério da Saúde, que trata da ética em pesquisa envolvendo seres humanos e pela especial proteção devida aos participantes das pesquisas científicas.

 

Resultados

 

A seguir serão apresentados os resultados referentes às ideias centrais agrupadas, aos participantes do estudo e à frequência.

 

Quadro 1 - Ideias centrais agrupadas, participantes do estudo e frequência referente ao tema explorado

 

 

Em seguida, os quadros 2 e 3 apresentam o tema explorado, suas respectivas ideias centrais agrupadas e o Discurso do Sujeito Coletivo correspondente:

 

Quadro 2 - Tema explorado, ideia central agrupada e seu respectivo DSC


 

 

Quadro 3 -Tema explorado, ideia central agrupada e seu respectivo DSC


 

 

Discussão

 

Do tema explorado, “significado de ansiedade durante o distanciamento social pela pandemia da COVID-19”, foram constatadas duas ideias centrais agrupadas, descritas a seguir: “Sentimentos inibidores” e “Querer fazer tudo agora”.

A ideia central “Sentimentos inibidores” aponta para as definições empíricas sobre a ansiedade em tempo de distanciamento social causada pela COVID-19. A apropriação e o conhecimento das manifestações e somatização dos sintomas de ansiedade pelas pessoas idosas indicam uma tomada de consciência dessas sensações.

As características dos transtornos de ansiedade são o medo e ansiedade em excesso e perturbações comportamentais [21]. Considera o medo como uma resposta de ameaça iminente real ou percebida e a ansiedade, por sua vez, como uma antecipação de uma ameaça futura. Tal condição difere-se do medo e da ansiedade adaptativa por persistir por longos períodos, apropriados ao nível de desenvolvimento.

Além disso, sabe-se que, na atual situação da pandemia de COVID-19, emergiram profundas mudanças no modo de vida, bem como nas relações afetivas e sociais. Alguns estudos apontam a pandemia em si como fator de risco à saúde mental da população, principalmente, entre as pessoas idosas [22,23,24]. Esses fatores se associam tanto ao medo iminente de contrair a doença, quanto a processos decorrentes da situação de isolamento social, luto, procrastinação, desânimo, dificuldade de concentração, entre outros.

A pandemia e as normas do isolamento afetam a população em várias dimensões, principalmente, na saúde mental, causando transtornos mentais, sofrimento psíquico e alteração do sono. Desse modo, efeitos negativos no dia a dia e na qualidade da saúde mental são consequências reconhecidas. Nesse contexto, também podem aumentar os riscos para o desenvolvimento de doenças crônicas e virais [22].

Os principais fatores que causaram estresse em epidemias anteriores foram a duração da quarentena, o medo da infecção, os sentimentos de frustração e de aborrecimento, a informação inadequada sobre a doença e seus cuidados, as perdas financeiras e o estigma da doença. Visto isso, relacionou-se o aumento dos sintomas psicológicos, distúrbios emocionais, estresse e insônia em grande parte da população [25].

Portanto, considerando o cenário atual de pandemia e isolamento social, é comum que os idosos sofram de ansiedade devido à sua vulnerabilidade diante da doença e suas consequências. Além disso, a dificuldade em solucionar os problemas diários se intensificou, dando-lhes a sensação de impotência. Outrossim, com a imprevisibilidade da situação, sintomas como insônia, nervosismo e tristeza levam a sensações maiores de desespero e ansiedade.

Nota-se que, diante das representações da pessoa idosa em relação à COVID-19, a ansiedade foi o fator de desequilíbrio mental, emocional, comportamental e social. Essas somatizações tendem a desenvolver um estado de medo e fuga absoluta, que retrata a situação atual dos participantes do estudo. Nitidamente, é possível observar, no contexto pandêmico, que os sintomas de ansiedade se exacerbaram. Desta maneira, ficaram evidenciadas dificuldades de enfrentamentos e mecanismos que fazem com que essas pessoas respondam satisfatoriamente às manifestações que foram destacadas, e isso levou essas pessoas idosas a ficarem mais vulneráveis biopsicossocial e espiritualmente.

Ao analisar a ideia central agrupada “Querer fazer tudo agora”, notou-se o teor do imediatismo das pessoas idosas e o modo como a ansiedade é vivenciada, o que, muitas vezes, tornam-se limitantes e incapacitantes.

Diversas sensações e percepções foram emergidas como uma resposta esperada diante da magnitude do evento da pandemia da COVID-19. A ansiedade nas pessoas idosas traz efeitos de medo, frustração e atitudes imediatistas. Nesse sentido, o isolamento físico e social pode agregar prejuízos maiores, nocivos à saúde mental dos indivíduos idosos e da população em geral, o que pode levar a um quadro psicopatológico. Observou-se que as pessoas idosas foram mais propensas a exacerbar sintomas ansiosos quando comparadas ao restante da população. Entender as pessoas idosas nesse momento pandêmico pode nos ajudar a minimizar os efeitos deletérios e as consequências desse evento traumático, tanto no bem-estar quanto na qualidade de vida desse grupo etário [26].

O fato de a pessoa idosa estar com mais dificuldade resolutiva dos problemas diários acarreta manifestações ansiosas e depressivas, o que pode ser evidenciado por reações de estresse. A perda ou a diminuição do controle que envolve essas circunstâncias é recorrente, haja vista que, em muitos casos, o contexto impossibilita que a pessoa idosa saiba prever o tempo em que a crise será solucionada [27]. Sentimentos de incertezas, assim como os limites impostos pelas medidas preventivas de isolamento social, presença iminente de alterações abruptas nos planos futuros, além da falta de contato com o ambiente social e familiar do indivíduo, tornam-se gatilhos constantes para desencadear os sintomas de ansiedade e de quadros depressivos [27].

Observou-se que, além do medo constante da pessoa idosa contrair o coronavírus, a ansiedade também pode estar relacionada com a incerteza quanto a duração do isolamento social, uma vez que as doenças crônicas de base não tratadas de forma completa, devido às novas diretrizes hospitalares durante a pandemia, podem somatizar quadros negativos na qualidade de vida e impactar os sintomas emocionais em relação à doença velada [12].

Dessa maneira, o novo contexto pandêmico exigiu novas medidas de controle e prevenção dessa doença até então não aplicadas, nas últimas décadas, para uma outra doença. Tal fato impacta significativamente na saúde psíquica da população, principalmente, acerca da ansiedade [22].             

Em suma, é notável que, quando a pessoa idosa é impossibilitada de exercer suas atividades essenciais diárias para manutenção de sua vida, saúde e desenvolvimento de sua rotina e afazeres, emergem sentimentos de ansiedade devido ao desejo de realizar algo, entendido aqui como imediatismo.

Limitações do estudo

 

            A principal limitação deste estudo foi o fato de a pesquisa ter sido realizada em uma única cidade do interior do Sul de Minas Gerais, de natureza tradicional, tendo como cultura o convívio social das pessoas idosas com amigos, familiares e socialização diária em praças públicas, cafés e com constantes atividades sociais e religiosas programadas.

 

Conclusão

 

Manter-se em distanciamento social mesmo que de forma obrigatória foi a conduta de precaução e prevenção imposta mais importante para minimizar o avanço da pandemia da COVID-19. Isto, por sua vez, proporcionou duas situações: uma de natureza positiva e outra de natureza negativa. A positiva foi relacionada ao ficar em casa sendo necessária, importante e imprescindível. Entretanto, o homem é um ser humano constituído de diversas dimensões e o ato de ficar em casa infelizmente não contemplou os domínios psicológico, social e espiritual e consequentemente isto lhe trouxe sérios efeitos do ponto de vista da sua saúde mental, como, por exemplo, atender aos seus compromissos financeiros, necessidades de saúde do ponto de vista crônico, convívios religiosos e familiares. Logo, essas foram lacunas consideradas de aspecto negativo que contribuíram sensivelmente para a ansiedade da parcela populacional em questão.

A pandemia ainda não está encerrada. Como as pessoas idosas devem proceder? Não há orientação alguma nesse sentido. O que realmente, no dia a dia, ainda se pode ou não realizar? Tudo isto ainda continua nebuloso, não há práticas e orientações sistemáticas sobre o que e não fazer. Será que esta situação atual é tranquilizadora para as pessoas idosas?

Assim como a vacina foi um recurso de prevenção da doença, será que não estão faltando estratégias de saúde mental para atenuar os problemas da mesma, decorrente do distanciamento social? O que realmente as pessoas idosas devem fazer ou não no contexto atual? Considerando que em determinadas cidades houve incremento de novos casos de COVID-19 e já determinaram novamente o uso de máscara, será que o próximo recurso sanitário não será o distanciamento social mais uma vez?

 

Conflitos de interesse

Os autores declaram que não houve quaisquer conflitos de interesse.

 

Fonte de financiamento

Não se aplica

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Piazza PT, Nilo FFS, Reis RD; Coleta de dados: Piazza PT, Nilo FFS, Roma MF; Análise e interpretação dos dados: Piazza PT, Nilo FFS, Quintiliano GLN, Roma MF, Reis RD; Redação do manuscrito: Piazza PT, Nilo FFS, Quintiliano GLN, Roma MF, Silva JV, Mota KS, Reis RD; Revisão crítica e aprovação do final do manuscrito: Silva JV, Quintiliano GLN, Mota LS, Reis RD

 

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