Enferm Bras 2022;21(5):583-95

doi: 10.33233/eb.v21i5.5106

ARTIGO ORIGINAL

Avaliação de enfermeiros da Estratégia Saúde da Família acerca do atributo orientação familiar

 

Milena de Oliveira*, Lorena Alves Fiorenza**, Carolina Isabel Bergenthal***, Ânderson Rosauro Eich****, Keity Laís Siepmann Soccol, D.Sc.****, Mara Regina Caino Teixeira Marchiori, D.Sc.****, Naiana Oliveira dos Santos, D.Sc.****

 

*Enfermeira mestranda em Saúde Materno Infantil, Universidade Franciscana, Santa Maria/RS, **Acadêmica de Enfermagem, Universidade Franciscana, Santa Maria/RS, ***Enfermeira residente em Saúde da Família e Comunidade, Grupo Hospitalar Conceição, Porto Alegre/RS, ****Enfermeiro, Universidade Franciscana, Santa Maria/RS

 

Recebido em 18 de fevereiro de 2022; Aceito em 30 de maio de 2022.

Correspondência: Lorena Alves Fiorenza, Rua Dona Luiza 211/102, Nossa Senhora do Rosário, Santa Maria RS

 

Milena de Oliveira: enfmilenatuzin@gmail.com

Lorena Alves Fiorenza: lorenafiorenzza@gmail.com

Carolina Isabel Bergenthal: carolinabergenthal@gmail.com

Ânderson Rosauro Eich: anderson_eich1@hotmail.com

Keity Laís Siepmann Soccol: keitylais@hotmail.com

Mara Regina Caino Teixeira Marchiori: mara.marc@hotmail.com

Naiana Oliveira dos Santos: naiana.santos@ufn.edu.br

 

 

Resumo

Introdução: A Atenção Primária em Saúde é a porta de entrada do Sistema Único de Saúde e possui atributos essenciais e derivados para sua consolidação no Brasil. Objetivo: Avaliar o atributo derivado orientação familiar, na perspectiva dos enfermeiros da Estratégia Saúde da Família. Métodos: Trata-se de um estudo descritivo, transversal quantitativo realizado no período de março a maio de 2021, com 14 enfermeiros das Estratégias Saúde da Família do município de Santa Maria, que responderam o instrumento PCATool-Brasil (versão profissionais) e um questionário sociodemográfico de forma online. Resultados: O atributo derivado apresentou um escore de 7,9 considerado um elevado grau de orientação familiar. Conclusão: A avaliação, presença e extensão desse atributo, promove a garantia de um cuidado integral, universal e de qualidade para as famílias adscritas nas Estratégias Saúde da Família.

Palavras-chave: atenção primaria à saúde; avaliação de serviços de saúde; Enfermagem.

 

Abstract

Evaluation of nurses from the Family Health Strategy about the family orientation attribute

Introduction: Primary Health Care is the gateway to the Unified Health System and has essential and derived attributes for its consolidation in Brazil. Objective: Evaluate the attribute derived from family guidance, from the perspective of professional nurses in the Family Health Strategy. Methods: This is a descriptive, quantitative cross-sectional study carried out from March to May 2021, with 14 nurses from the Family Health Strategies in the city of Santa Maria, who answered the PCATool-Brazil instrument (professional version) and a questionnaire sociodemographic online. Results: The derived attribute had a score of 7.9, considered a high degree of family orientation. Conclusion: The assessment, presence and extension of this attribute promotes the guarantee of comprehensive, universal and quality care for the families enrolled in the Family Health Strategy.

Keywords: primary health care; health services research; Nursing.

 

Resumen

Evaluación de enfermeros de la Estrategia Salud de la Familia sobre el atributo orientación familiar

Introducción: La Atención Primaria de Salud es la puerta de entrada al Sistema Único de Salud y tiene atributos esenciales y derivados para su consolidación en Brasil. Objetivo: Evaluar el atributo derivado de la orientación familiar, en la perspectiva de los enfermeros en la Estrategia Salud de la Familia. Métodos: Este es un estudio cuantitativo descriptivo, transversal, realizado de marzo a mayo de 2021, con 14 enfermeros de las Estrategias de Salud de la Familia en la ciudad de Santa Maria, que respondieron el instrumento PCATool-Brasil (versión profesional) y un cuestionario sociodemográfico en línea. Resultados: El atributo derivado presentó una puntuación de 7,9, considerado un alto grado de orientación familiar. Conclusión: La evaluación, presencia y extensión de este atributo promueve la garantía de atención integral, universal y de calidad para las familias inscritas en la Estrategia Salud de la Familia.

Palabras-clave: atención primaria de salud; mecanismos de evaluación de la atención de salud; Enfermería.

 

Introdução

 

A Atenção Primaria em Saúde (APS) é a principal porta de entrada dos usuários ao sistema de saúde brasileiro e responsável por um conjunto de ações individuais, familiares e coletivas que circunda a promoção, prevenção, proteção, diagnóstico, tratamento e reabilitação, entre mais ações de saúde [1]. A APS deve ser desenvolvida também por uma equipe interprofissional, que se configura como uma forma articulada de trabalho, permitindo a colaboração e participação de diferentes profissionais, para atender às necessidades de saúde dos usuários e suas subjetividades. A equipe interprofissional atua como um quadro de profissionais, evitando a duplicação de cuidados, esperas e adiantamentos desnecessários, possibilitando maior resolutividade das unidades de saúde no país [2].

No Brasil, a APS tem na Estratégia de Saúde da Família (ESF), sua tática prioritária para expansão e consolidação como modelo de assistência. Conforme a Política Nacional da Atenção Básica, o enfermeiro e demais membros da equipe devem participar do processo de territorialização, reconhecendo os grupos que vivem neste território, além de realizar o cuidado integral da população adscrita dentro e fora das unidades de saúde, como em escolas, domicílios e espaços comunitários [1].

Os serviços de APS são definidos com clareza em seus atributos essenciais onde podemos citar: acesso de primeiro contato, longitudinalidade, integralidade e coordenação do cuidado. Definimos também os atributos derivados: orientação familiar, orientação comunitária e competência cultural em que oferecem melhores indicadores de saúde, tratamento eficiente de doenças crônicas, maior resultado relacionado ao cuidado, e no fluxo dos usuários que usam o sistema, utilização de práticas de prevenção e maior satisfação dos usuários; além de reduzir as desigualdades de aproximação aos serviços de saúde [3].

Ainda em relação aos atributos derivados da APS, o atributo orientação familiar avalia a necessidade única do paciente relacionando-o com o contexto familiar e seu potencial de cuidado, incluindo ferramentas para tal abordagem. A atenção voltada à família ocorre quando há integralidade e essa está focada na atenção à saúde do usuário e a sua família no seu próprio ambiente [4].

Para que haja a integralidade e a longitudinalidade do cuidado focado no indivíduo e sua família, a equipe de saúde torna-se fator essencial nos serviços de APS. Deve, portanto, estimular a atuação de profissionais de diversos conhecimentos, competências e habilidades para atravessarem as barreiras do cuidado individual, trabalhando o usuário de forma holística, englobando a sua família, considerando seus determinantes sociais e estimulando sua autonomia no processo de cuidado. Além disso, o compartilhamento dos saberes e a discussão dos casos é uma forma de repensar as ações de saúde e reavaliá-las com frequência [5].

Pesquisas voltadas para a avaliação da APS na visão de profissionais e usuários são importantes para determinar a qualidade dos cuidados que são oferecidos. Portanto, avaliar o desfecho das ações ou até mesmo suas fragilidades é fundamental para o delineamento, gestão e cuidados oferecidos de forma apropriada aos usuários, tornando-se ferramenta essencial para aumentar melhorias na APS [6]. Nesse sentido, este estudo teve como questão de pesquisa: Como o atributo derivado “orientação familiar” é avaliado pelos enfermeiros que atuam na ESF? O objetivo desta pesquisa foi avaliar o atributo derivado orientação familiar, na perspectiva dos enfermeiros da Estratégia Saúde da Família.

 

Métodos

 

O estudo foi realizado no período de março a maio de 2021, em uma cidade no interior do Rio Grande do Sul, Brasil. No momento da pesquisa, a cidade contava com aproximadamente 290 mil pessoas e contava com a cobertura de 24 Equipes de Saúde da Família [7]. Ao todo, 14 participaram da pesquisa. Utilizou-se como critério de inclusão estar na equipe há, no mínimo, seis meses de trabalho, considerando que o tempo é fator determinante para o estabelecimento de vínculos entre os profissionais e os usuários e foi critério de exclusão estar afastado das atividades por motivo de férias ou licença médica.

Para a coleta de dados, utilizou-se a plataforma Formulários Google, onde estavam presentes o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e uma avaliação sociodemográfica dos participantes, que contava com questões referentes ao sexo, idade, tempo de formação, escolaridade e outros vínculos empregatícios. Ainda, o formulário contava com o Instrumento de Avaliação da Atenção Primária PCATool-Brasil, para profissionais médicos e enfermeiros versão extensa. O link de acesso a essa plataforma foi encaminhado para o correio eletrônico (e-mail) dos participantes, que foram previamente solicitados em contato por telefone com o serviço de saúde. O tempo para o retorno foi considerado 15 dias, mas pela baixa adesão dos participantes, estendeu-se por mais 30 dias. O tempo estimado para responder ao formulário foi de aproximadamente 30 minutos.

O PCATool-Brasil, instrumento de avaliação para os atributos da Atenção Primária em Saúde, é uma ferramenta validada que foi publicada no ano de 2010 pelo Ministério da Saúde. No ano de 2020, a última edição desse instrumento foi publicada na íntegra, de forma gratuita, em suas versões para pacientes crianças, pacientes adultos, médicos e enfermeiros e, por último, em saúde bucal para profissionais dentistas. A versão utilizada para a realização dessa pesquisa visa avaliar os atributos essenciais e derivados na perspectiva de profissionais médicos e/ou enfermeiros. Para este estudo, o atributo analisado será o de Orientação Familiar, correspondente a letra G, que conta com 14 questões no instrumento, conforme mostra o Quadro 1 [8].

 

Quadro 1 - Perguntas para avaliação do atributo “orientação familiar”

 

Fonte: Brasil, 2020

 

As alternativas de respostas, para cada item do PCATool-Brasil, são fundamentadas na escala Likert: “com certeza sim” (valor = 4); “provavelmente sim” (valor = 3); “provavelmente não” (valor = 2); “com certeza não” (valor = 1) e “não sei/ não lembro” (valor = 9). O PCATool-Brasil permite o alcance de escores para os atributos. O escore do atributo orientação familiar, conforme orientação do Manual do PCATool-Brasil, é calculado pela média aritmética simples dos valores das respostas para cada pergunta ({escore = G1+G2+G3+G4+G5+G6+G7+G8+G9+G10+G11+G12+G13+G14/9}) e, posteriormente, transformado em uma escala contínua de 0 a 10, utilizando a fórmula ordenada: [(escore obtido – 1) X 10] / 3 [8].

As respostas dos participantes ao Formulário foram armazenadas em uma planilha no Drive do Google. Após o download, os dados foram organizados no Microsoft Excel para realização da análise estatística descritiva por meio de frequência absoluta e relativa e cálculo do escore (média aritmética) e posterior transformação em escala de 0 a 10. Foi utilizado o valor de referência de ponto de corte de 6,6, sendo que os valores > 6,6 são considerados de alto escore e de forma automática refletem a efetividade da atenção primária em relação aos atributos e, também, que os serviços apresentam orientação para a APS. Já os valores < 6,6 foram considerados de baixo escores [8].

Este estudo faz parte de um projeto matricial denominado “Atributos da atenção primária à saúde na percepção de enfermeiros das Estratégias de Saúde da Família no município de Santa Maria - RS”. Todos os aspectos éticos foram atendidos de acordo com a Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde [9], sob parecer do Comitê de Ética em Pesquisa nº 4.364.738, sob CAAE nº 38772220.8.0000.5306.

 

Resultados

 

Dentre os 24 profissionais de enfermagem das ESF, 14 aceitaram participar deste estudo. Os outros 10 profissionais se recusaram a participar do estudo ou não foram encontrados após três tentativas de contato via telefone e e-mail também.

A predominância entre os participantes da pesquisa foi do sexo feminino (100%). A idade variou entre 26 e 52 anos, a maioria entre 31 e 40 anos (42,85%). Uma parcela significativa das participantes (57,14%) possuía mestrado. O tempo médio em que as profissionais estavam trabalhando na ESF foi de 2 a 10 anos (71,42%). Das participantes (21,4%) possuíam outro vínculo empregatício além do exercido da ESF.

  O atributo derivado “orientação familiar” alcançou um escore de 7,90 (Tabela I). Na análise dos itens que compõem esse atributo, os maiores percentuais de respostas “com certeza sim” estavam concentrados em quatro questionamentos: G2. 71,4% Você pergunta sobre doenças ou problemas de saúde que podem ocorrer na família dos pacientes. G5. 71,4% Discussão sobre fatores de risco familiares (ex.: genéticos) G7. 78,5% Discussão sobre fatores de risco sociais (ex.: perda de emprego) G9. 71,4% Discussão sobre estado de saúde de outros membros da família.

 

Tabela I - Distribuição de frequência dos itens do atributo “Orientação Familiar”, na perspectiva de enfermeiras das ESF do município de Santa Maria, RS, Brasil, 2021

 

G1 = você pergunta aos pacientes quais são as suas ideias e opiniões ao planejar o tratamento e o cuidado do paciente ou alguém da família? G2 = você pergunta sobre doenças ou problemas de saúde que podem ocorrer na família dos pacientes? G3 = você está disposto (a) e capacitado (a) para se reunir com membros da família dos pacientes para discutir um problema de saúde ou familiar? G4 = uso de genogramas e/ou outros instrumentos de avaliação do funcionamento familiar; G5 = discussão sobre fatores de risco familiares (ex.: genéticos); G6 = discussão sobre recursos econômicos da família dos pacientes; G7 = discussão sobre fatores de risco sociais (ex.: perda de emprego); G8 = discussão sobre condições de vida (ex.: refrigerador em condições de funcionamento); G9 = discussão sobre estado de saúde de outros membros da família; G10 = discussão sobre as funções parentais; G11 = avaliação de sinais de abuso infantil; G12 = avaliação de sinais de crise familiar; G13 = avaliação do impacto da saúde do paciente sobre o funcionamento da família; G14 = avaliação do nível de desenvolvimento familiar. Fonte: elaborada pelos autores

 

Em relação aos itens, um resultado positivo foi a questão sobre os riscos sociais, na qual o enfermeiro questiona sobre os determinantes sociais de saúde doença, renda familiar, estado de moradia, escolaridade dos familiares e no que isso influencia na sua condição de vida diária. Observa-se que as questões relacionadas a doenças ou problemas de saúde juntamente dos fatores de risco familiares entre eles genéticos, tiveram um bom alcance relacionado a estes itens.

Além disso, foi bem avaliado o item relacionado ao estado de saúde de outros membros da família, o qual frisa as comorbidades e situação atual de algum familiar com doença crônica, também se existe um cuidador e se esta pessoa necessita de um cuidado amplo da família, se estão sendo discutidas algumas questões como a divisão dos cuidados entre os familiares, também a questão financeira, se conta com o apoio do governo ou uma parte dele, e até mesmo uma rede de apoio da própria família. Já, as respostas dos enfermeiros referentes ao uso de genogramas e/ou outros instrumentos de avaliação do funcionamento familiar (G4) foram negativas.

 

Discussão

 

Em relação a outros estudos já realizados na APS, observa-se que o perfil feminino de profissionais é predominante nesta área. As práticas em enfermagem possuem um importante delineamento no que tange a variável gênero, pois há uma prevalência na participação de mulheres nessas práticas, sendo pioneiras e responsáveis pela sua criação e sistematização [10]. Nesta pesquisa, percebe-se que o sexo feminino foi predominante, pois todos os profissionais que responderam o instrumento eram mulheres.

É necessário que os profissionais se conscientizem a respeito das necessidades da orientação familiar promovendo a saúde e prevenindo doenças [11]. Percebemos que neste estudo o atributo derivado “orientação familiar’’ alcançou um score considerado alto, 7,90 mesmo que apenas 10 profissionais enfermeiros das 24 ESFs respondessem o instrumento, pode-se analisar que a questão familiar teve uma avaliação positiva, pois ressalta que este atributo está sendo bem pontuado na APS com um grande foco na família atendida e refletindo na forma de saúde recebida pelos usuários.

O item que se refere a pergunta sobre doenças ou problemas de saúde, que podem ocorrer na família dos pacientes, e a discussão sobre o estado de saúde de outros membros da família, teve um resultado de grande importância para estas questões. Avaliando esses resultados, podemos citar as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), na qual representam uma das principais causas de adoecimento e morte em todo o mundo [12]. A literatura apresenta que esse cenário atinge principalmente as pessoas que moram em regiões de risco e vulnerabilidade, elencado por problemas de financiamento, gestão, provisão de profissionais e estruturação dos serviços. Com isso, a APS em conjunto com a ESF elabora um cuidado em relação às necessidades de cada indivíduo e de seus familiares [13].

É importante que o enfermeiro entre em discussão sobre os fatores de risco que a família possa enfrentar, como, por exemplo, as doenças genéticas, crônicas e até mesmo hereditárias. Em relação a esta discussão, um dos elementos que podemos citar é a constituição da Rede de Atenção à Saúde das pessoas com doenças crônicas não transmissíveis na qual serve para garantir equidade no acesso e integralidade do cuidado com esses usuários [14]. Uma importante estratégia na estruturação dessa rede é a definição de linhas de cuidado direcionadas às doenças crônicas, facultando ações de promoção, vigilância, prevenção e assistência, a partir de necessidades de condições de vida e a saúde individual e coletiva destes usuários [15].

Ainda, o Ministério da Saúde lançou, no ano de 2021, o plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas e agravos não transmissíveis no Brasil, que possui duração de 2021 a 2030. Nesse documento destaca-se que em 2019, 54,7% dos óbitos registrados no Brasil tiveram como causa as DCNT. Nesse sentido, os organizadores elaboraram metas para o enfrentamento das DNCT no Brasil, como: reduzir em um terço a taxa e a probabilidade incondicional de mortalidade prematura (30 a 69 anos); reduzir a mortalidade prematura por câncer de mama em 10%; reduzir a mortalidade prematura por câncer de colo do útero em 20%; reduzir a mortalidade prematura por câncer do aparelho digestivo em 10% [16].

Além disso, esse mesmo documento [16] traz metas relacionadas aos fatores de risco das DCNT, tais como: reduzir a prevalência de obesidade em crianças e adolescentes em 2%; aumentar a prática de atividade física; aumentar o consumo recomendado de frutas e de hortaliças; reduzir o consumo de alimentos industrializados e ultra processados e reduzir o consumo de bebidas alcoólicas em 10%. Com isso, evidencia-se a necessidade de o serviço de saúde atuar promovendo saúde e prevenindo agravos para que, dessa maneira, o Brasil consiga alcançar as metas apontadas por esse plano e, ainda, que a população possua maior expectativa de vida e que consiga viver de forma saudável, não necessitando de hospitalização por agravos de DCNT que costumam resultar em mortalidade prematura.

Em relação aos fatores de riscos sociais, os enfermeiros sinalizaram considerar esses aspectos. Com isso, podemos frisar que a visita domiciliar (VD) do enfermeiro é uma forma relevante para discutir este assunto, podendo criar intervenções que facilitem a aproximação com os determinantes do processo saúde doença no grupo familiar. Além disso, VD é um instrumento muito rico que permite coletar dados significativos para a realização das ações em saúde com base no contexto social e familiar da população adscrita [17]. Porém, para que as visitas sejam efetivas, é necessário que os profissionais compreendam a verdadeira importância desse momento, considerando os determinantes sociais em saúde, as condições familiares, os fatores genéticos e todas as múltiplas dimensões que envolvem o ser humano na sociedade.

Ainda, evidenciou-se a baixa utilização de instrumento como o genograma e ecomapa. O genograma tem referência a uma representação gráfica através de símbolos, que apresenta o grupo familiar em três gerações e os relacionamentos básicos estabelecidos no núcleo familiar. Este instrumento permite a visualização dos membros que constituem a família e informações como idade, ocupação, profissão, escolaridade e retratar o lugar de cada um dentro da estrutura familiar. Já o ecomapa é um diagrama das relações, dinâmicas, entre a família e a comunidade podendo caracterizar a existência ou a carência de recursos sociais, culturais e econômicos, sendo o retrato de determinado momento na vida dos membros de uma família [18].

Os dois instrumentos costumam ser utilizados em conjunto, pois demonstram o desenvolvimento e formato da estrutura da família, além de fornecer informações acerca do contexto atual da família. Entretanto, apesar de serem considerados ferramentas complementares na coleta de dados, são utilizados mais em pesquisas e estudos teóricos do que como instrumentos para a avaliação da família pela enfermagem brasileira, refletindo nos achados encontrados pelo presente estudo [19].

Nesse sentido evidencia-se a necessidade de ações de educação permanente voltadas à utilização dos genogramas e ecomapas. Ainda, políticas públicas, que evidenciem a necessidade desses instrumentos na avaliação das famílias brasileiras, são de extrema importância para que a qualidade da atenção seja eficaz e atenda todas as singularidades e demandas da população.

 

Conclusão

 

Esta pesquisa teve como objetivo avaliar o atributo derivado orientação familiar na perspectiva dos profissionais enfermeiros das Estratégias Saúde da Família da cidade de Santa Maria. Através do instrumento citado pode-se identificar suas fragilidades e potencialidades para auxiliar nas ações e estratégias podendo contribuir para cada vez mais o aperfeiçoamento da orientação familiar no processo de trabalho do profissional. 

A pesquisa avaliando este enfoque teve um escore positivo, considerado alto na perspectiva dos profissionais enfermeiros das ESF para a APS. Os profissionais que responderam este instrumento, de maneira geral, tiveram uma boa avaliação sobre a orientação familiar. Com isso, sugere-se que, apesar de uma boa avaliação desse atributo, as equipes de saúde se tornem cada vez mais esclarecedoras e incentivadoras aos usuários, em relação às ações à família e que continuem ampliando o vínculo tornando-se parceiras no cuidado da família, valorizando e respeitando suas necessidades, seu contexto social, econômico e cultural de forma singular.

Este atributo deve ser trabalhado no processo formativo, através dos processos de educação permanente, buscando incentivar os gestores a promover às equipes interdisciplinares, bem como incentivá-los a conhecer a família, considerando a singularidade de cada uma como também garantir a continuidade do cuidado, para uma melhor atenção à saúde. É através dessa educação permanente que há o fortalecimento das ações na APS e, ainda, pode ser utilizada para qualificar os profissionais quanto ao uso dos dispositivos e instrumentos auxiliares da prática de saúde, como é o caso dos genogramas e ecomapas.

Os enfermeiros são responsáveis por trabalhar com o vínculo e a proximidade com os usuários e sua família, além da escuta ativa e qualificada juntamente do diagnóstico situacional, ele é um dos elos da comunidade com o serviço de saúde. Dessa forma, sugere-se que este estudo amplie outras discussões que incentivem o fortalecimento da prática profissional não só dos enfermeiros, mas também da equipe interprofissional que atua no cenário das ESF. Dessa forma, a interprofissionalidade torna-se uma forte aliada na integralidade do cuidado, fortalecendo, ainda, as relações interprofissionais que trazem múltiplos benefícios para a comunidade e equipe de saúde.

Como limitações para nossa pesquisa, identificamos a baixa adesão dos enfermeiros na pesquisa, tendo em vista que apenas 14 dos 24 responderam os questionários. Dessa maneira evidenciamos a necessidade de mais estudos primários que avaliem o atributo orientação familiar e suas singularidades, não só na perspectiva de enfermeiros, mas de outros profissionais e até mesmo os usuários do sistema de saúde.

 

Conflitos de interesse

Declaramos não termos conflitos de interesse.

 

Fontes de financiamento

Declaramos não termos recebido fontes de financiamento.

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Oliveira M, Eich AR, Bergenthal CI, Santos NO; Coleta de dados: Oliveira M, Eich AR, Bergenthal CI, Fiorenza LA, Santos NO; Análise e interpretação dos dados: Oliveira M, Eich AR, Bergenthal CI, Fiorenza LA, Santos NO; Redação do manuscrito: Oliveira M, Eich AR, Bergenthal CI, Fiorenza LA, Santos NO, Soccol KS, Marchiori MRCT; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Oliveira M, Eich AR, Bergenthal CI, Fiorenza LA, Santos NO, Soccol KS, Marchiori MRCT

 

Referências

 

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