Enferm Bras. 2023;22(3):292-310

doi: 10.33233/eb.v22i3.5139

ARTIGO ORIGINAL

Contexto de trabalho e percepções de gestores sobre a saúde dos profissionais da Estratégia de Saúde da Família

 

Edemilson Pichek dos Santos1, Roberto Tadeu Ramos Morais1

 

1Faculdades Integradas de Taquara (FACCAT), Taquara, RS, Brasil

 

Recebido em: 4 de abril de 2022; Aceito em: 19 de junho de 2023

Correspondência: Edemilson Pichek dos Santos, edemilson@sou.faccat.br

 

Como citar

Santos EP, Morais RTR. Contexto de trabalho e percepções de gestores sobre a saúde dos profissionais da Estratégia de Saúde da Família. Enferm Bras. 2023;22(3):292-310. doi: 10.33233/eb.v22i3.5139

 

Resumo

Objetivo: Analisar o contexto de trabalho dos profissionais da Estratégia de Saúde da Família e a perspectiva de gestores da saúde. Estudo de abordagem mista, com projeto de triangulação concomitante, realizada nos municípios da região do Vale do Paranhana/RS. Métodos: Participaram 260 profissionais que responderam ao questionário sociodemográfico e profissional e a Escala de Avaliação do Contexto do Trabalho (EACT). Realizaram-se entrevistas semiestruturadas com seis gestores da saúde, dos municípios que compõem a região. A coleta de dados foi realizada entre agosto e novembro de 2019. Os dados quantitativos foram submetidos à estatística descritiva, os dados qualitativos foram transcritos e submetidos à análise do tipo temática. Resultados: Verificou-se que a organização e condições de trabalho, e relações socioprofissionais são consideradas como críticas. A gestão, na Atenção Primária à Saúde, precisa considerar as relações de trabalho, situação em que a participação dos sujeitos seja fundamental para a saúde do trabalhador. Conclusão: s profissionais das ESFs estão expostos a incoerências entre a proposta abrangente da APS e os imprevistos estruturais dificultando a problematização necessária à transformação dos processos de trabalho. Considera-se que oportunizar um ambiente laboral favorável, e produzir espaços para reflexão do trabalho, inclui uma renormalização dos processos de trabalho, investimentos, qualificação profissional permanente e participação ativa dos sujeitos.

Palavras-chave: atenção primária à saúde; enfermagem; condições de trabalho; gestão em saúde.

 

Abstract

Work context and perceptions of managers about the health of professionals in the Family Health Strategy

Objective: To analyze the work context of Family Health Strategy professionals and the perspective of health managers. A mixed approach study, with a concomitant triangulation project, carried out in the municipalities of the Vale do Paranhana/RS region. Methods: Participants were 260 professionals who answered the sociodemographic and professional questionnaire and the Work Context Assessment Scale (EACT). Semi-structured interviews were conducted with six health managers from the municipalities that make up the region. Data collection was carried out between August and November 2019. Quantitative data were submitted to descriptive statistics, qualitative data were transcribed and subjected to thematic analysis. It was found that the organization and working conditions, and socio-professional relationships are considered critical. Results: Management, in Primary Health Care, needs to consider work relationships, a situation in which the participation of the subjects is fundamental for the health of the worker. Conclusion: FHS professionals are exposed to inconsistencies between the comprehensive PHC proposal and structural unforeseen events, making it difficult to problematize the work processes needed to transform them. It is considered that providing a favorable work environment, and producing spaces for reflection on work, includes a restructuring and reorganization of services, investments, permanent professional qualification and active participation of the subjects.

Keywords: primary health care; nursing; working conditions; health management.

 

Resumen

Contexto laboral y percepción de los gestores sobre la salud de los profesionales en la Estrategia Salud de la Familia

Objetivo: Analizar el contexto de trabajo de los profesionales de la Estrategia de Salud de la Familia y la perspectiva de los gestores de salud. Estudio de abordaje mixto, con proyecto de triangulación concomitante, realizado en los municipios de la región Vale do Paranhana/RS. Metodos: Participaron 260 profesionales que respondieron el cuestionario sociodemográfico y profesional y la Escala de Evaluación del Contexto Laboral (EACT). Se realizaron entrevistas semiestructuradas a seis gestores de salud de los municipios que conforman la región. La recolección de datos se realizó entre agosto y noviembre de 2019. Los datos cuantitativos fueron sometidos a estadística descriptiva, los datos cualitativos fueron transcritos y sometidos a análisis temático. Se constató que la organización y las condiciones de trabajo, y las relaciones socioprofesionales son consideradas críticas. Resultados: La gestión, en la Atención Primaria de Salud, necesita considerar las relaciones de trabajo, situación en la que la participación de los sujetos es fundamental para la salud del trabajador. Conclusión: Os profesionales de la ESF están expuestos a inconsistencias entre la propuesta integral de APS y los imprevistos estructurales, lo que dificulta problematizar los procesos de trabajo necesarios para transformarlos. Se considera que brindar un ambiente propicio para el trabajo, y producir espacios de reflexión sobre el trabajo, incluye una reestructuración y reorganización de los servicios, inversiones, calificación profesional permanente y participación activa de los sujetos.

Palabras-clave: atención primaria de salud; enfermaría; condiciones de trabajo; gestión en salud.

 

Introdução

 

O trabalho sempre acompanhou o homem em sua evolução histórica. Como fundante da práxis social, o trabalho possui uma função psíquica à medida que constitui o sujeito e toda sua rede de significados adquiridos no contexto social, possibilitando ainda o alcance da realização profissional [1]. Além de proporcionar ao indivíduo seu sustento material, o trabalho assume uma função psíquica na estrutura de constituição do sujeito e de sua rede de significados. Por essa razão, a relação do homem com o trabalho torna-se um componente relevante dos processos de identidade e subjetividade [2]. Em decorrência das novas morfologias do trabalho e a produção da subjetividade, o trabalho tem acarretado impactos e transformações na formação humana, sobretudo a partir da intensificação e sofrimento. No cenário contemporâneo, o trabalhador vivencia uma intensa insegurança que interfere diretamente em seu estado de saúde. Associado a estas transformações juntam-se os sentimentos de instabilidade em relação ao emprego, aumentando consideravelmente as doenças laborais [3].

Frente a necessidade do trabalho, os trabalhadores encontram cada vez mais, situações instáveis, precárias, ou vivenciam o flagelo direto do desemprego. O fator trabalho, que é fundamental na formação do ser social, também sofre transformações que contribui para a produção da subjetividade contemporânea, em sua nova essência. Desta forma, ao se voltar unicamente para o produtivismo, o trabalho perde a condição de significação, e transforma a vida humana em um mundo penoso, alienante, aprisionado e unilateralizado. Faz-se presente a ambivalência de que necessitamos do trabalho humano e de seu potencial emancipador e transformador, por outro devemos recusar o trabalho que explora, aliena e infelicita o ser social, tal como o conhecemos sob a vigência e o comando do trabalho abstrato [4].

As demandas provenientes das mudanças sociais, das novas formas de organização do trabalho estão presentes em todas as realidades de trabalho. Na área da Saúde, essa realidade não poderia ser diferente, pois as mudanças na relação de seus profissionais com os pacientes somam-se aquelas relacionadas ao avanço de tecnologias de diagnóstico e tratamento, à cultura de prevenção, ao aumento da expectativa de vida, ao grande crescimento demográfico e à oferta cada vez maior de profissionais no mercado. Além disso, as instituições de saúde, apesar de sua especificidade, têm-se tornado cada vez mais semelhantes àquelas do setor industrial, seja no sentido geral da administração, seja da utilização da tecnologia para satisfazer às demandas de seus usuários, por meio da oferta de serviços de qualidade [5].

Nesse contexto, a busca por maior produtividade e produtos altamente competitivos, constatada pelo aumento dos ritmos e das cargas de trabalho, expõem os trabalhadores a fatores que podem comprometer o processo de trabalho ao executar suas tarefas. Além disso, aspectos do próprio ambiente e das condições laborais, com ênfase na sobrecarga de trabalho, na organização da Rede de Atenção à Saúde (RAS) e na falta de recursos, podem repercutir na qualidade vida e na satisfação com o trabalho, interferindo no processo de saúde e adoecimento dos profissionais [6].

Além disso, ao analisar o modelo de atenção à saúde vigente no Brasil evidenciam-se grandes desafios a serem enfrentados, dentre eles a falta de integração da Atenção Primária à Saúde (APS) com outros níveis da assistência, o que gera dificuldades de coordenação e continuidade do cuidado [7]. Essa condição culmina na ineficiência de mecanismos de gestão e desequilíbrio de poder entre integrantes da (RAS), pela falta de responsabilização dos atores envolvidos, pelas descontinuidades administrativas e pela mudança de gestores por motivos políticos, e ainda uma significativa influência do modelo biomédico hegemônico nas práticas assistenciais [8]. Como resultante, a combinação de diversos fatores organizacionais, estruturais e financeiros, tais como dificuldades gerenciais, burocracia excessiva, sobrecarga de trabalho, precariedade das condições de trabalho, deficiências estruturais, falta de equipamentos adequados, baixos salários e ausência de uma política de educação continuada repercute consubstancialmente na insatisfação dos profissionais das equipes de saúde da família e coloca em discussão questões sobre a qualificação dos profissionais, a resolubilidade dos serviços e a necessidade de monitorar e avaliar a APS. Ainda, essas condições podem resultar em problemas de saúde nos próprios trabalhadores que prestam serviços de saúde.

Essa condição é típica do contexto da ABS, sendo necessário maior aprofundamento dos fatores que promovem a satisfação e a saúde no trabalho, uma vez que ainda existem lacunas importantes relacionadas à temática saúde do trabalhador neste âmbito. Destaca-se que, na atual configuração do Sistema Único de Saúde (SUS), a APS estrutura-se, em sua maioria, nos padrões de Estratégia de Saúde da Família (ESF), em que as equipes, além de prestarem atendimento nas Unidades de Saúde da Família (USF), buscam a realização de assistência integral aos indivíduos e famílias no domicílio e demais espaços comunitários, em todas as fases do desenvolvimento humano [9]. A ponderação de elementos que constituem as dimensões do contexto de trabalho dos profissionais que trabalham na APS, mostra-se fundamental, na medida em que pode favorecer o desvelamento de outros fatores que permeiam o trabalho desses profissionais, e que devem ser considerados na atenção à saúde deste trabalhador.

Diante do exposto, formulou-se o seguinte problema de pesquisa: Qual o contexto de trabalho no âmbito da ABS da região do Vale do Paranhana/RS e quais as perspectivas dos gestores? Valendo-se dos pressupostos da pesquisa, este estudo tem como objetivo: analisar o contexto de trabalho dos profissionais da Estratégia de Saúde da Família e a perspectiva de gestores da saúde.

 

Métodos

 

Com relação ao processo metodológico da pesquisa, valeu-se de uma pesquisa de métodos mistos, portanto, alicerçada em ambas abordagens, quantitativa e qualitativa, com estratégia de triangulação concomitante (QUAN + QUAL) [10]. Nesse tipo de estratégia, os dados quantitativos e qualitativos são coletados concomitantemente e depois comparados com o objetivo de determinar convergências, diferenças e combinações. A utilização desse tipo de projeto justifica-se quando o pesquisador quer triangular os métodos comparando-os e contrastando-os diretamente aos resultados estatísticos quantitativos com os achados qualitativos para propósitos de corroboração e validação.

Realizou-se o estudo nos serviços de saúde da ABS dos municípios que constituem a região do Vale do Paranhana/RS, situada na porção nordeste do estado do Rio Grande do Sul. A região é formada pelos municípios de Três Coroas, Igrejinha, Parobé, Taquara, Rolante e Riozinho, tendo seu nome proveniente do rio que banha os municípios da região. A Atenção Básica à Saúde da região, dispõe de 43 Unidades Básicas de Saúde (UBS), algumas dessas unidades tem entre uma ou duas Estratégias de Saúde da Família (ESF), seis Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), além das Secretarias Municipais de Saúde (SMS) de cada município.

Na abordagem quantitativa foram convidados a participar os profissionais que compõem a equipe mínima da ESF: médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e ACS (n = 476). Dentre os profissionais que compõem a equipe mínima da ESF apenas os dentistas e o técnico/auxiliar bucal não foram incluídos. Foi abordada a população total de trabalhadores das UBS da região estudada. Foram inseridos na pesquisa aqueles que atuavam na UBS há pelo menos seis meses, e excluídos aqueles que estavam afastados, de licença ou de férias. Para alcançar os objetivos propostos, foram aplicados dois instrumentos: O primeiro trata-se de um Questionário Sociodemográfico e Profissional elaborado pelo pesquisador que abordou questões elaboradas pelo autor; o segundo trata-se da Escala de Avaliação do Contexto do Trabalho EACT [11]. Os questionários foram elaborados na plataforma Surveymonkey, disponibilizado via internet, aos profissionais da ABS do Vale do Paranhana. Realizou-se a coleta de dados no período de agosto a novembro de 2019. Para a abordagem qualitativa, participaram os gestores e/ou secretário de saúde de cada município, sendo um total de seis profissionais, ou seja, um representante de cada município. Foram realizadas entrevistas semiestruturadas, individuais, as quais foram realizadas no ambiente de trabalho com agendamento prévio com os profissionais conforme disponibilidade, foram gravadas em áudio digital, transcritas na íntegra.

A análise dos dados quantitativos se deu por análise estatística descritiva e inferencial com apoio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 25.0. A EACT possui cinco pontos que se referem à frequência de ocorrência de determinados fenômenos. Nestas, o valor 1 indica nunca, 2 = raramente, 3 = às vezes, 4 = frequentemente e 5 = sempre. Os resultados da escala tiveram suas análises feitas com base em três níveis diferentes, considerando um desvio padrão em relação ao ponto médio. Para ambas, serão consideradas: acima de 3,7 (grave), entre 2,3 e 3,69 (crítica) e abaixo de 2,29 (satisfatória). Os dados qualitativos obtidos nas entrevistas semiestruturadas foram submetidos à análise do tipo temática. Nesta análise propõe-se identificar os núcleos de sentido das falas dos participantes, observando os temas significativos [12].

O estudo contemplou as prerrogativas bioéticas, conforme as Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa com Seres Humanos, presentes na Resolução 510/2016 do Conselho Nacional de Saúde/CONEP. O projeto foi cadastrado na Plataforma Brasil com vistas à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa das Faculdades Integradas de Taquara (CEP/FACCAT) para devido registro e anuência. Recebeu parecer aprovado com número: 2.837.894, e CAAE 94716818.4.0000.8135. Posteriormente a aprovação da Plataforma Brasil, foi aprovada a liberação pela Secretaria Municipal de Saúde de cada município para a realização da pesquisa, por meio da carta de anuência. Foi garantido o caráter de livre participação da pesquisa aos participantes dos estudos. Todos assinaram o Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para assegurar o anonimato, os discursos foram identificados com as letras “E”, em referência à palavra entrevistado, seguido do número, conforme a sequência de sua realização.

 

Resultados

 

O trabalho nas equipes da ABS do Vale do Paranhana e a avaliação do contexto de trabalho foi identificado mediante aplicação da EACT, em todos os seis municípios e seus respectivos serviços de saúde. A amostra foi composta por 260 participantes. No intuito de caracterizar a amostra nas 43 unidades de saúde, elaborou-se uma tabela com os dados referentes ao sexo, escolaridade, estado civil, cargo/função, tempo de trabalho tipo de vínculo, carga horária semanal, se exerce alguma segunda função remunerada, e se teve algum afastamento do trabalho por problema de saúde relacionado ao trabalho nos últimos seis meses. A caracterização dos dados sociodemográficas e profissionais da amostra segue na Tabela I.

 

Tabela ICaracterização das variáveis sociodemográficas e profissionais dos trabalhadores que atuam na rede de Atenção Básica à Saúde do Vale do Paranhana do Rio Grande do Sul. Taquara, 2019

 

Fonte: Santos EP. Coleta direta de dados por meio de questionário, 2019

 

Apresenta-se, na Tabela II, o número de sujeitos (n), segundo sua classificação nos domínios Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho, as médias, desvio padrão e coeficiente de confiabilidade. Para a análise dos dados as avaliações foram dicotomizadas em Grave/Crítico e Satisfatório.

 

Tabela II - Distribuição dos trabalhadores que atuam na Atenção Básica à Saúde do Vale do Paranhana nos domínios da Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho. Taquara, 2019

 

Fonte dos dados: Santos EP. Coleta direta de dados por meio de questionário,2019

 

Percebe-se que nos três domínios houve um número maior de trabalhadores com risco grave/crítico, mas a Organização do Trabalho foi o domínio avaliado deste modo pelo maior número de trabalhadores da ABS. Os resultados apontam para uma situação crítica. Evidencia-se uma avaliação mais grave associada à organização do trabalho. As avaliações do domínio condições de trabalho, apontam que as avaliações mais críticas estão relacionadas com os instrumentos de trabalho são insuficientes para realizar as tarefas, existe muito barulho no ambiente de trabalho e os equipamentos necessários para a realização das tarefas são precários. No que tange às relações socioprofissionais, em geral, os trabalhadores avaliam suas relações sociais como críticas, destacam as que os funcionários são excluídos das decisões, as tarefas executadas sofrem descontinuidade, existe disputa no ambiente de trabalho e falta apoio das chefias para o seu desenvolvimento profissional.

Quanto à formação dos gestores, todos possuem ensino superior, nas áreas de jornalismo, enfermagem, médica e administração. Os entrevistados foram metade do sexo masculino e metade do sexo feminino; com idades entre 30 e 50 anos; com tempo de formação entre 10 e 25 anos; tempo no cargo inferior a 5 anos; pós-graduados em áreas afins da saúde coletiva; com experiência em gestão e saúde; com jornada de trabalho de 40 horas com dedicação exclusiva; e com percepção de salários superiores a R$ 6 mil.

As respostas dos sujeitos entrevistados foram organizadas em três categorias referentes aos questionamentos realizados: a saúde dos profissionais na percepção dos gestores; fatores facilitadores e/ou dificultadores para efetivação à saúde dos trabalhadores; estratégias de gestão para qualificação de ações em prol da saúde dos trabalhadores. Na identificação dos pontos favoráveis, vislumbrados na gestão do trabalho em saúde, foi apontado que o estabelecimento de um encontro em potencial entre gestores, trabalhadores e usuário constitui-se o cerne do trabalho em saúde, e, nesse contexto, pode representar o compartilhamento de saberes como possibilidade de encontro de potência entre os trabalhadores, repercutindo principalmente no bem-estar/saúde do profissional. Ao serem questionados sobre a percepção da assistência à saúde dos trabalhadores da ABS no município, verifica-se que os gestores apontam para uma nova demanda para a atenção à saúde dos profissionais, conforme os relatos a seguir.

 

Como a gente tem um tempo de caminhada, tu percebes que antes tu tinhas uma grande quantidade de trabalhadores com problemas ergonômicos, enfim, de esforço repetitivo. Hoje os problemas emocionais são muito prevalentes, até pela demanda dos usuários [...] E1.

[...] Hoje a população requer uma atenção maior em saúde mental, acho que isso é sem dúvida nenhuma um desafio para o trabalhador, porque ele não deixa de ser quem ele é em função de ser trabalhador na área da saúde. E essa demanda pela demanda em atenção em saúde mental tem se tornado o maior desafio.” E2

 

Verifica-se a compreensão de que a saúde do trabalhador está associada a diferentes elementos da vida pessoal e profissional, resultando num adoecimento de caráter multietiológico, mas principalmente pelo desgaste cognitivo e emocional resultante desse embate entre elementos exigidos pelos usuários, colegas e organização. Nesse sentido, os gestores apontam que são necessárias ações que promovam a saúde dos trabalhadores e o desenvolvimento de propostas para o não-adoecimento. Entretanto, quando não há o desenvolvimento dessas ações institucionais, contribui-se para o adoecimento, pois o trabalhador não possui espaços para repensar a lógica de indolência, tendendo a reproduzir em si, com usuários e colegas.

 

Tentamos oferecer o melhor para que o profissional da saúde tenha bom acompanhamento. Atenção profissional, um acompanhamento com psicólogo, a realização de exames periódicos aos funcionários, saúde bucal. A gente tenta oferecer as melhores condições de trabalho tentamos priorizar os equipamentos adequados, os EPI necessários, a quantidade de profissionais nas equipes com o número adequado, recursos humanos suficientes, pois são todos fatores que influenciam na saúde dos trabalhadores. E5

 

Observa-se que os gestores reconhecem a decisão compartilhada como importante para a gestão do trabalho, e, consequentemente, para a satisfação dos trabalhadores, a partir da constatação de que o trabalhador precisa estar envolvido na formulação de práticas que façam sentido para ele. Desta forma, verifica-se que os espaços da escuta e da fala no cotidiano dos serviços de saúde representam a possibilidade de compartilhamento de visão e pensamentos que podem ter a potência na proposição de mudanças práticas, refletindo tanto no contexto gerencial, quanto para os profissionais e usuários. Ressalta-se, nos discursos, elementos que sinalizam uma prática de uma gestão por disciplinamento e controle das práticas dos profissionais por meio dos resultados, com base hierarquização, pouca democrática, normalizadores do trabalho prescrito, que priva o trabalhador da sua autonomia e criatividade

 

Um dos pontos favoráveis que a gente tem é a intenção que o executivo municipal tem que o PSF dê certo, então ele cobra muito resultado do PSF, tem que funcionar, tem que funcionar, ele cobra carga horária, tem que conversar com o médico, tem que trabalhar, é isso, o prefeito ele cobra demais. E6

 

Observam-se princípios de divisão hierárquica e a rigidez das normas, e pressão de cumprimentos de prazos, fatores que podem influenciar de maneira negativa a saúde dos trabalhadores. Entre as dificuldades apontadas pelos gestores, aparecem as fragilidades em relação à aceitação, e ao entendimento do modelo de atenção à saúde, pautada pela política de atenção à saúde do trabalhador, assim como às políticas que regem a Atenção Básica à Saúde.

 

Tem sido muito difícil fazer a mudança do modelo [...]. Conciliar isso com a satisfação dos profissionais e com a expectativa da população é um desafio para todos os profissionais. E2

 

Encarar a transição do modelo de atenção flexneriano para o de vigilância em saúde configura-se como uma dificuldade enfrentada tanto para trabalhadores quanto para os gestores. A resistência à mudança implica em obstáculo para o desenvolvimento e a consolidação da Atenção Básica. Os resultados apontam também para questões relacionadas à incorporação naturalista da saúde dos trabalhadores, por parte dos gestores, principalmente à capacidade de adaptação aos novos modelos de atenção à saúde do trabalhador.

A gestão do trabalho em saúde não pode ser compreendida apenas sob o formato administrativo, com base em situações de mando e no controle do prescrito, mas também pode ser uma ação cotidiana, a partir do reconhecimento de que todos os trabalhadores são gestores do seu próprio trabalho, exercendo graus de liberdade na organização e execução de suas atividades, o trabalho real.

 

Sim, isso é fundamental, e o ponto mais favorável é a gestão compartilhada. Porque assim, é… não se toma decisões de cima pra baixo e que as pessoas têm que ir, simplesmente cumprir, e fazer! Discutir as decisões... então eu acho isso muito bom para que o trabalho se desenvolva. E5

 

Quanto aos mecanismos que garantam a continuidade da atenção à saúde dos profissionais, os gestores externam que há um esforço no sentido de dispensar uma vigilância constante, porém conforma-se de forma distinta em cada município. Verifica-se que não há na região um serviço específico organizado criado para participação dos profissionais da rede pública de saúde. Quando há necessidades, através da ABS são encaminhados para o centro de referência. Nos casos de notificações de agravos à saúde, estes ficam a encargo da vigilância sanitária.

 

Através da vigilância sanitária, são realizadas as notificações, por meio das ferramentas instituídas, como por exemplo o RINA, e então é encaminhada para a vigilância, essa ferramenta então fica a encargo da vigilância em saúde. E3

 

Não existe um serviço específico de saúde do trabalhador, como te falei para o trabalhador público, a secretaria faz esse aporte assim, né. São realizadas atividades para dar conta dessas demandas, mas não tem um serviço específico para isso. E3.

 

De acordo com as falas dos gestores, um dos grandes desafios é mudar a cultura assistencial existente nas instituições de saúde, remanescente do modelo de assistência individual, para uma visão ampliada inserida no conceito da Saúde do Trabalhador, centrada na promoção e vigilância. Observa-se que em alguns municípios a gestão procura estabelecer ações institucionais com estratégias potencializadoras relacionadas à temática.

 

Nós temos um sistema de monitoramento, nós temos reuniões periódicas com as chefias das unidades, que são os enfermeiros, então a gente tem o acompanhamento dos gerentes das unidades. Inclusive algumas iniciativas têm sido feitas. Nós temos um processo de Coaching. Temos um acompanhamento nas questões das lideranças. Então nós fazemos esse trabalho, a gestão faz esse apoio, de tecnologias, de ferramentas para que os profissionais se deem conta disso, tanto no aspecto de gestão de pessoas, quanto nessas questões que a gente percebe que são mais emocionais mesmo. E1

 

A fala do gestor demonstra uma preocupação em incluir medidas e estratégias em prol da saúde dos trabalhadores, entretanto as medidas restringem-se a situações esporádicas, e por vezes através de entidades representativas de outros setores sociais. Esta abordagem qualitativa propôs uma aproximação descritiva da percepção dos gestores municipais sobre as questões relacionadas à saúde dos trabalhadores da ABS. Os resultados obtidos apontam para uma dicotomia entre a visão dos diferentes sujeitos participantes do estudo, sobre a temática abordada, pelas normas, legislação vigente e sua respectiva operacionalização, visualizado por meio das ideias centrais reveladas nos discursos dos sujeitos entrevistados.

 

Discussão

 

Em relação aos dados sociodemográficos e profissionais dos sujeitos do presente estudo, percebe-se que a mediana da idade dos trabalhadores foi de 36,65 (DP=9,8). Identifica-se a predominância do sexo feminino, esses resultados já são esperados, visto que o maior contingente das categorias profissionais que compõem a ABS é predominantemente formado por mulheres, especialmente na área da enfermagem. De acordo com o Conselho Federal de Enfermagem (COFEN) e com a Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), para o ano de 2015, o sexo feminino predomina entre os profissionais de enfermagem, sendo 84,6%, enquanto o sexo masculino se apresenta com 15,4%. Contudo, cumpre ressaltar que há um aumento considerável do contingente masculino nessa área da saúde [13].

Considerando a variável escolaridade, houve prevalência do ensino fundamental e médio, isso porque, na atenção básica, o grande contingente de postos de trabalho é para os cargos em que se exige o nível fundamental e/ou médio. Corrobora esses dados estudo realizado em um município do estado do Paraná, no qual os ACS apresentaram uma taxa 85% escolaridade acima da exigida para o cargo. Essa condição representa um grande avanço se comparada à época da implantação do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) no Brasil [14]. Referente ao estado civil, o maior número vive junto com companheiro, dado semelhante ao estudo realizado com profissionais da ABS em um município do Rio Grande do Sul [15].

Quanto ao tipo de vínculo trabalhista, houve um equilíbrio entre contratados e concursados. O vínculo de trabalho estatutário oferece maior estabilidade ao trabalhador, enquanto o vínculo por contrato pode ser instável e impede a realização de planejamento e estruturação da vida a longo prazo [14]. Quanto às categorias profissionais, a mais expressiva foi a dos ACS, os quais atuam nas equipes da ESF e devem constituir percentual suficiente para fazer a cobertura das regiões e microrregiões de abrangência do município e dar continuidade aos programas de saúde, cumprindo as exigências das normas e diretrizes do Ministério da Saúde.

Na análise da variável afastamento do trabalho nos últimos 6 meses, verificou-se que um número alto de trabalhadores teve algum tipo de afastamento relacionado ao trabalho, entretanto o maior percentual não esteve afastado do trabalho por motivos de doença, dado comparado ao estudo realizado em 2015 [15], no qual apenas 20,7% estiveram afastados do trabalho por motivo de doença. Nota-se que os dados encontrados estão converge com a literatura. A existência de trabalhadores multiprofissionais e contratados direto da prefeitura municipal reflete o cumprimento das normas vigentes da legislação brasileira.

A Organização do Trabalho foi o domínio avaliado como pior na Escala de Avaliação do Contexto de Trabalho. O domínio Organização do Trabalho da Escala de Avaliação do Contexto do Trabalho é definido pelas características que abrangem as normas, controles, ritmos de trabalho, jornadas, hierarquia, divisão do trabalho, divisão das atividades, modelo de gestão e responsabilidades. As avaliações mais graves estão relacionadas às tarefas repetitivas, existe fiscalização do desempenho, existe forte cobrança por resultados, existe divisão entre quem planeja e quem executa, e o número de pessoas é insuficiente para se realizar as tarefas. Definida como situação Grave/Crítico, essa classificação pode ser entendida como uma situação limite, e que pode ser fato gerador de sofrimento para o trabalhador. Tais condições podem desencadear danos e afastamento do trabalho, sendo necessária uma avaliação ou intervenção imediata com medidas que possam eliminar ou minimizar tais fontes de riscos relacionados ao trabalho [16].

Esses fatores são importantes e requerem a realização de intervenções dos gestores, na aplicação de medidas que possam eliminar ou minimizar tais situações de risco. No contexto da ESF, observa-se que a reorientação do modelo assistencial sinaliza a ruptura de práticas convencionais e hegemônicas de saúde frente à adoção de novas tecnologias de trabalho. A meta principal dessa estratégia é a reestruturação do modelo assistencial de saúde vigente para o modelo centrado na atenção básica [17].

Aponta-se para o número insuficiente de pessoas para realizar as atividades e tarefas repetitivas como risco grave ao adoecimento, visto que a pressão imposta para cumprimentos dos prazos e cobrança por resultados, a produtividade, a fiscalização excessiva, a divisão do trabalho entre quem planeja e quem executa, são questões críticas que podem causar sofrimento ao trabalhador da ABS. A divisão hierárquica e a rigidez das normas influenciam de maneira negativa as relações socioprofissionais e geram sobrecarga no trabalho [18]. Os resultados encontrados apontam que a ABS ainda carrega vestígios do sistema da organização científica do trabalho proposto no século XX. Apesar de diversas formas mais flexíveis para organização do trabalho, ainda permanece o modelo Taylorista, considerado o principal modelo de organização em meados da década de 50, focada principalmente nos resultados [19].

O domínio Condições de Trabalho obteve mais médias e melhores avaliações por item do instrumento, entretanto num contexto geral foi considerada com grave/crítico. As principais avaliações estão relacionadas à insuficiência de instrumentos de trabalho para realizar as tarefas, além disso, os equipamentos necessários para a realização das tarefas são precários. Através da fala “Estamos fazendo um grande investimento em relação à saúde do trabalhador. Por exemplo, agora, estamos com um trabalho na área de material e revendo toda a questão de ergonomia, ou seja, cadeiras, móveis, postura…” Observa-se que a percepção dos gestores sobre esse aspecto restringe-se às condições de trabalho in lócus de produção e que caracterizam as condições de infraestrutura e de apoio institucional. É necessário considerar os instrumentos de trabalho e os equipamentos, a matéria-prima, além do suporte organizacional [20].

As condições de trabalho podem gerar pressões que o trabalhador sente e reage, levando ao sofrimento e, logo, às estratégias defensivas [21]. Nesse contexto, as condições do ambiente de trabalho são aspectos fundamentais para o desempenho do trabalhador, pois quando são desfavoráveis acabam se tornando fonte de forte tensão que pode evoluir para indicadores críticos, tais como risco de adoecimento e falta de segurança no trabalho de modo que muitas organizações procuram melhorar a qualidade de vida do trabalho dos funcionários modificando condições físicas, materiais, instrumentais e de suporte de trabalho [20]. Ao passo que a organização do trabalho afeta o aparelho psíquico, as condições de trabalho agem sobre o corpo físico. Considera-se que as atividades de trabalho são um processo dialético: de um lado, o sujeito, que dá sentido ao que faz; do outro, as situações de trabalho, as quais interferem sobre as percepções desse trabalhador em relação a todo esse contexto. Diante da situação, ele pode ter vivências de prazer e/ou sofrimento. As vivências de sofrimento podem manifestar-se pelos males causados no corpo, na mente e nas relações socioprofissionais [19].

No que tange às relações socioprofissionais, em geral, os trabalhadores avaliaram suas relações sociais como críticas, destacam-se as que os funcionários são excluídos das decisões, as tarefas executadas sofrem descontinuidade, existe disputa no ambiente de trabalho e falta apoio das chefias para o desenvolvimento profissional. A análise das relações entre os trabalhadores e os demais atores que têm interface com o objeto de trabalho fornece contribuições riquíssimas ao entendimento do contexto laboral, na medida que desvela as relações de poder e os processos de subjetivação que permeiam na atmosfera desse trabalho [22].

Frente a esse contexto, os trabalhadores encontram dificuldades no âmbito das relações sociais no trabalho, vivenciam situações de sofrimento e precisam lançar mão de estratégias de defesa para lidar com as adversidades. Como dito anteriormente, as estratégias de defesa são recursos construídos pelos trabalhadores, de forma individual ou coletiva, para minimizar o sofrimento no trabalho [23]. Destaca-se que o sofrimento não consiste em algo estático - se há sofrimento, há o desencadeamento de estratégias defensivas, tanto no âmbito individual, quanto no âmbito coletivo [24]. Entretanto, como este funcionamento é inconsciente, as estratégias construídas emergem da negação daquilo que faz sofrer. As estratégias defensivas visam evitar o sofrimento, muitas vezes inconsciente, sendo difícil o confronto e a convivência com o mesmo para a manutenção do equilíbrio psíquico, buscando-se no ego a proteção contra os conflitos encontrados na base do sofrimento. Assim, o sofrer não é estado emocional estático e permanente na vida do trabalhador, mas um processo dinâmico que se estende às demandas interligadas ao indivíduo e à organização [25].

Percebeu-se que a falta de autonomia expressa pelas avaliações dos participantes - nos itens como a autonomia é inexistente e são excluídos das decisões, a falta de apoio da gestão e a comunicação entre funcionários é insatisfatória - constituem experiências negativas no ambiente de trabalho e que causam sofrimento, o que se comprova na avaliação grave/crítico desses itens do domínio. Achados semelhantes foram encontrados na pesquisa realizada na ESF de um grupo hospitalar de Porto Alegre/RS [26].

Todos esses problemas incidem negativamente no processo de trabalho em equipe, que é idealizado para o trabalho na ESF. Em outros estudos realizados nas ESF de outras regiões do país: Rio Grande do Sul [15], Distrito Federal [27], e Paraíba [28], mostram que as comunicações no mesmo nível hierárquico, horizontais, também são realizadas com dificuldades, o que impede a integração e a cooperação entre indivíduos e equipes, seja no compartilhamento de recursos e competências, seja na identificação de problemas e na elaboração de soluções.

Dessa forma, o trabalho em equipe é afetado porque a comunicação centra-se nas relações pessoais, não nos profissionais. Com isso, a superação das dificuldades nas Relações Socioprofissionais é essencial para a integração dos trabalhadores que atuam na ABS, pois é inviável fazer gestão sem que todos estejam implicados no processo de trabalho, além disso, não haverá avanços no SUS sem a adesão dos atores sociais que constroem o cotidiano [29]. A participação de todos os integrantes da equipe propicia o trabalho coletivo com coerência e interação dos trabalhadores da saúde, sendo que cada um tem suas atribuições individuais dentro da equipe. A ABS tem como visão a superação do modelo biomédico e tem em vista o cuidado à saúde individual, e objetiva a interação entre os trabalhadores da equipe multiprofissional com habilidades e competências distintas os quais por meio da ESF procuram sanar os problemas de saúde pública das famílias e do coletivo [18].

 

Conclusão

 

O contexto de trabalho dos profissionais de saúde da Atenção Primária à Saúde apresenta riscos críticos de adoecimento relacionado à organização e condições de trabalho e relações socioprofissionais. As tarefas repetitivas, fiscalização e cobrança por desempenho, as divisões entre quem planeja e executa, a falta de materiais, instrumentos de trabalho e condições precárias para o trabalho foram os principais motivos para o risco de adoecimento. Além disso, as relações socioprofissionais também impactam negativamente na saúde dos trabalhadores, principalmente no que tange a exclusão dos funcionários no planejamento das atividades e na tomada de decisões, ao mesmo tempo que as tarefas executadas sofrem descontinuidade.

Observou-se que os gestores influenciam significativamente na saúde dessa população. Mesmo com pequenos esforços in lócus para melhorar a qualidade no processo de trabalho, necessita-se de mudanças na forma de compreender o trabalho, excepcionalmente sob a visão dos gestores de saúde. O que demonstra a necessidade de elaboração de estratégias mais adequadas às necessidades de saúde dos trabalhadores, compromisso e dedicação acentuados, com possibilidades de planejamento estratégico em razão das múltiplas demandas resultantes de deficiências na estrutura da APS e no acesso integrado à RAS.

A investigação sugere a adoção de modelos de gestão mais democráticos, que facilitem aos trabalhadores o uso de si, passando pelo uso de si pelos outros, oportunizando capacidade para a criatividade, sobretudo provocar mudanças que convoquem não apenas os trabalhadores, mas também os gestores para o processo de renormalização dos processos de trabalho. Mobilização para repensar o trabalho na APS, revendo os métodos de organização do trabalho, a fim de elaborar medidas e estratégias que proponham um melhor ambiente de trabalho, com organização flexível que minimizem as exigências decorrentes do contexto de trabalho, bem como, a valorização e reconhecimento do trabalho dos profissionais.

Para finalizar, aponta-se como limitação deste estudo a falta de aprofundamento da compreensão subjetiva e intersubjetiva dos trabalhadores da APS na avaliação de prazer e sofrimento no trabalho. Além do viés de prevalência de cargos políticos na gestão dos serviços de saúde. Sugere-se, portanto, estudos com desenhos longitudinais, ou ainda, a aplicação de novas pesquisas que debatam as políticas públicas da APS na realidade brasileira.

 

Conflitos de interesse

Não há conflitos de interesse

 

Fontes de financiamento

Não houve fontes de financiamento para a pesquisa

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Santos EP; Morais RTR; Coleta de dados: Santos EP; Análise e interpretação dos dados: Santos EP; Análise estatística: Santos EP; Redação do manuscrito: Santos EP; Morais RTR; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual: Morais RTR

 

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