Enferm Bras 2022;21(6):787-99

doi: 10.33233/eb.v21i6.5148

REVISÃO

Evidências acerca da visita familiar ampliada em Unidade de Terapia Intensiva adulto

 

Iago Vieira Gomes*, José Rocha Gouveia Neto*, Nataly da Silva Gonçalves**, Maurício Caxias de Souza***, Douglas Silva Martins****, Natália Pessoa da Rocha Leal, M.Sc.*****

 

*Enfermeiro, Mestrando em Enfermagem pela Universidade de Pernambuco e Universidade Estadual da Paraíba – UPE, UEPB, **Enfermeira, Residência em Enfermagem Cirúrgica pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Residente em Oncologia pelo Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), Recife, PE, ***Enfermeiro, membro do Grupo de Estudos e Pesquisa em Saúde Coletiva (GEPSC/CNPq) da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), Campo Grande/MS, ****Enfermeiro, Escola Superior de Saúde de Arcoverde (ESSA), Arcoverde, PE, *****Enfermeira, docente do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ), João Pessoa, PB

 

Recebido em 18 de abril de 2022; Aceito em 5 de dezembro de 2022.

Correspondência: Iago Vieira Gomes, Rua Doutor João Lacerda, 203, Cordeiro, 50711-280 Recife PE

 

Iago Vieira Gomes: iagovgomes@hotmail.com

José Rocha Gouveia Neto: jr.gneto@hotmail.com

Nataly da Silva Gonçalves: natalys.goncalves@hotmail.com

Maurício Caxias de Souza: mauriciocaxias_@hotmail.com

Douglas Silva Martins: martinsdouglas03@gmail.com

Natália Pessoa da Rocha Leal: natalia.pessoa@unipe.edu.br

 

Resumo

Objetivo: Analisar as evidências científicas acerca da visita familiar ampliada nas unidades de terapia intensiva adulto. Métodos: Revisão integrativa realizada em julho de 2021. Utilizaram-se os descritores “terapia intensiva”, “humanização” e “visitas a pacientes”. Distribuídos na Base de Dados de Enfermagem, Scientific Electronic Library Online, Medical Literature Analysis and Retrieval System Online, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde; disponíveis nos idiomas inglês, português ou espanhol, entre 2016 e julho de 2021, obtendo um total de nove artigos viáveis que se adequaram ao objetivo da pesquisa. Resultados: Diante da análise dos estudos encontrados, identificou-se que a visita ampliada nas unidades de terapia intensiva reduziu fatores de ansiedade e estresse por parte dos familiares, sem que houvesse aumento dos índices de infecção; porém não obteve impacto significativo em eventos como o delirium. Conclusão: A presença de familiares na unidade de terapia intensiva permite uma evolução na condição psicossocial, na redução de estresse e ansiedade frente a doença. No entanto, os benefícios para a condição clínica são poucos, sendo necessários mais estudos que observem o fenômeno.

Palavras-chave: unidades de terapia intensiva; humanização da assistência, visitas a pacientes.

 

Abstract

Evidence about the extended family visit at adult Intensive Care Unit

Objective: To analyze the scientific evidence about extended family visits in adult intensive care units. Methods: Integrative review carried out in July 2021. The descriptors “intensive care”, “humanization” and “patient visits” were used. Distributed in the Nursing Database, Scientific Electronic Library Online, Medical Literature Analysis and Retrieval System Online, Latin American and Caribbean Health Sciences Literature; available in English, Portuguese or Spanish, between 2016 to July 2021, obtaining a total of nine viable articles that fit the research objective. Results: In view of the analysis of the studies, it was identified that the extended visit to the intensive care units reduced anxiety and stress factors on the part of family members, without an increase in infection rates; however, it had no significant impact on events such as delirium. Conclusion: The presence of family members in the intensive care unit allows an evolution in the psychosocial condition, in the reduction of stress and anxiety regarding the disease. However, the benefits for the clinical condition are few, and more studies are needed to observe the phenomenon.

Keywords: intensive care units; humanization of assistance; visitors to patients.

 

Resumen

Evidencia sobre la visita extendida de la familia a la Unidad de Cuidados Intensivos para adultos

Objetivo: Analizar la evidencia científica sobre las visitas extendidas de familiares en unidades de cuidados intensivos de adultos. Métodos: Revisión integradora realizada en julio de 2021. Se utilizaron los descriptores “cuidados intensivos”, “humanización” y “visitas de pacientes”. Distribuidos en la Base de Datos de Enfermería, Biblioteca Electrónica Científica en Línea, Sistema de Análisis y Recuperación de Literatura Médica en Línea, Literatura Latinoamericana y del Caribe en Ciencias de la Salud; disponible en inglés, portugués o español, entre 2016 y julio de 2021, obteniendo un total de nueve artículos viables para la investigación. Resultados: A partir del análisis de los estudios encontrados, se identificó que la visita prolongada redujo los factores de ansiedad y estrés de los familiares, sin un aumento en las tasas de infección; sin embargo, no tuvo un impacto significativo en eventos como el delirium. Conclusión: La presencia de familiares en la unidad de cuidados intensivos permite una evolución en la condición psicosocial, en la reducción del estrés y la ansiedad por la enfermedad. Sin embargo, los beneficios para la condición clínica son pocos y se necesitan más estudios para observar los impactos de este fenómeno.

Palabras-clave: terapia intensiva; humanización de la atención; visitas a pacientes.

 

Introdução

 

Para o paciente e seus familiares, a UTI é um dos ambientes mais indesejáveis de uma unidade hospitalar, devido à forte caracterização de hostilidade, solidão e proximidade com a morte, evidenciados pelos cuidados críticos desenvolvidos [1,2]. Diante da alta complexidade e alto potencial de contaminação, não é comum a presença de familiares, o que ocasiona um afastamento das informações sobre o quadro clínico, cuidados e procedimentos realizados [1,3].

A Unidade de Terapia Intensiva (UTI) está relacionada a alta tecnologia e atendimentos especializados complexos, a fim de garantir uma assistência adequada ao paciente crítico [2,4]. Desse modo, a internação hospitalar para cuidados intensivos constitui um fenômeno gerador de estresse, o que evidencia condições emocionais exacerbadas, com impacto clínico [3,4].

Por muitas vezes, a UTI está relacionada com a manifestação de infecções bacterianas resistentes a terapêutica antimicrobiana. Dentre as principais bactérias multirresistentes de alta letalidade, destacam-se a Pseudomonas aeruginosa e o Staphylococcus aureus [2]. Nesse contexto, a equipe de saúde deve resgatar o processo de humanização para além da clínica, mediante uma assistência holística e integral, ponderando os aspectos sociais, econômicos, psicológicos e espirituais [4].

Diante da necessidade de implementação de práticas humanizadas, é importante o envolvimento da equipe de trabalho, dos gestores, dos pacientes e familiares/cuidadores. Portanto, a interprofissionalidade na Terapia Intensiva vai além de simplesmente unir profissionais das diversas áreas, mas reflete a comunicação entre eles, em busca de um cuidado integral, universal e igualitário, como preconizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS) [5,6].

Desse modo, a Política Nacional de Humanização (PNH) de 2003, objetiva atender as demandas de saúde da população com base em princípios da ética e bioética, retomando o cuidado numa perspectiva ampliada, de essência humana, livre da assistência mecanizada [7]. A troca entre gestores, trabalhadores e usuários produz mudanças no gerir e no cuidar, com sensibilidade sobre suas emoções, empatia e construção de confiança [8].

Com o intuito de comtemplar os princípios do SUS e proporcionar um cuidado humanizado e centrado nas necessidades, a visita ampliada em UTI busca compreender o indivíduo, suas relações familiares e o impacto na saúde [4]. A visita familiar ampliada consiste na inserção de até dois familiares por paciente, com a finalidade de permanecer até 12 horas por dia na unidade, com variação de acordo com o protocolo de cada instituição de saúde [9].

Dentre as estratégias para o cuidado humanizado em saúde e a visitação em UTI, destacam-se o processo de acolhimento e escuta qualificada, a fim de abarcar a complexidade do cuidado intensivo e o impacto das relações familiares na condição clínica do sujeito [9,10]. Ao analisar a problemática da visitação em UTI e seus impactos, é nítida a importância da estruturação do serviço de saúde para contemplar as demandas dos pacientes críticos. Mediante o envolvimento das perspectivas dos familiares e profissionais de saúde, o objetivo deste estudo é analisar as evidências científicas acerca da visita ampliada e seus impactos na Unidade de Terapia Intensiva adulto.

 

Métodos

 

Este estudo concerne de uma pesquisa descritiva, do tipo revisão integrativa, na qual se refere a um conjunto de estudos de diferentes metodologias para unificar informações e resultados que expliquem uma determinada problemática. Divide-se em seis etapas: escolha do tema e elaboração da pergunta norteadora; busca na literatura; categorização dos dados; análise crítica dos estudos; interpretação e síntese dos resultados; e apresentação da revisão [11,12].

O tema foi elaborado com base no seguinte questionamento: Quais são as evidências científicas acerca da visita familiar ampliada em detrimento da condição clínica dos pacientes internados em Unidade de Terapia Intensiva? Para responder esta questão, utilizou para busca de artigos a Biblioteca Virtual de Saúde (BVS).

Foram utilizados os descritores “Terapia Intensiva”, “Humanização” e “Visitas a Pacientes”, o que resultou em 72 artigos, distribuídos nas bases de dados a seguir: Base de Dados de Enfermagem (BDENF), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (Lilacs), Sistema On-line de Busca e Análise de Literatura Médica (Medline) e na biblioteca Scientific Eleetronic Library Online (Scielo), A busca foi realizada em julho de 2021.

Dentre os artigos encontrados, nove foram incluídos no estudo de acordo com os critérios utilizados: estudos publicados entre 2016 e julho de 2021, e em português, inglês ou espanhol. Foram excluídos 35 artigos mediante análise do título e resumo, por não se tratar da temática. Além desses, sete artigos foram excluídos após leitura aprofundada, sendo considerados inelegíveis para inserção no estudo. Após a seleção final dos estudos, elaborou-se um fluxograma com base na Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses – PRISMA (Figura 1) [13].

 

 

Figura 1Modelo de Moher (2009) do Diagrama de PRISMA

 

A análise dos dados foi realizada através da análise categórica de conteúdo de Bardin com inserção de eixos temáticos [14]. Vale ressaltar que durante a realização deste estudo e os trâmites percorridos, levaram-se em consideração as diretrizes éticas da resolução do Conselho Federal de Enfermagem - COFEN n° 564/2017 que dispõe sobre ensino, a pesquisa e a produção técnico científica na área da Enfermagem [15].

 

Resultados

 

Os resultados encontrados mostram que 63 (87,5%) dos artigos encontrados durante as combinações e pesquisa nas bases de dados não estavam adequados para esta revisão integrativa, decorrentes dos títulos e resumos inapropriados, estudos repetidos, revisões da literatura e artigos que não contemplaram a temática estudada. Desse modo, nove (12,5%) estudos foram adequados ao objetivo e inseridos na revisão.

Observa-se o aumento de estudos ao longo dos anos de publicação, e dentre os nove artigos selecionados, seis (66,7%) foram desenvolvidos a partir do ano de 2019. A base de dados com o maior número de artigos, foi a biblioteca Scielo, com cinco artigos incluídos no estudo, representando 55,5%. Os estudos retratam os impactos da implementação da visita ampliada nas Unidades de Terapia Intensiva em todo território brasileiro, bem como as dificuldades e as barreiras deste processo, na percepção de profissionais e familiares, além dos aspectos estruturais.

No que se refere ao delineamento metodológico das pesquisas realizadas, sete (77,8%) dos estudos são de abordagens qualitativas e descritivas, que visam a observação de um fenômeno e seu comportamento frente ao objeto de estudo, mediante a análise de discursos das pessoas envolvidas, e relatos de experiências vivenciadas por pesquisadores inseridos no contexto da visita ampliada em UTI.

 

Discussão

 

Os pontos a serem discutidos foram elencados mediante a análise aprofundada da temática da revisão. Buscando contemplar as nuances do processo de implementação da visita ampliada em UTI, quatro eixos temáticos foram levantados como destaques na discussão do fenômeno estudado, são eles: 1) Percepção dos familiares acerca dos impactos da visita ampliada na UTI; 2) A visita ampliada na UTI sob o olhar dos profissionais de saúde; 3) Impactos da visita ampliada no quadro clínico de pacientes de UTI; 4) Desafios da implementação da visita ampliada na UTI.

 

Percepção dos familiares acerca dos impactos da visita ampliada na UTI

 

Os pacientes internados em UTI passam por diversas situações complexas que aumentam os níveis de estresse e ansiedade, impactando também no bem-estar biopsicossocial dos familiares. Os eventos depressivos, de ansiedade e estresse pós-traumático são maiores em familiares do que nos próprios pacientes internados, podendo perdurar por um longo tempo, com necessidades terapêuticas [16].

A internação em UTI é vista por muitos como um sinal iminente de morte, uma experiência difícil, cheia de inseguranças que permeiam o processo de adoecimento. Através da ótica de Queiroz et al. [17], a visita é percebida positivamente pelos familiares, principalmente por ser configurada como uma forma humanizada de assistência, e que, associada a comunicação efetiva, pode reduzir significativamente os sinais depressivos, de ansiedade e estresse, durante a internação hospitar.

Nesse contexto, os familiares inseridos no processo de cuidado à saúde em terapia intensiva podem ser considerados privilegiados, à medida que possam observar de perto seu ente adoecido, com a possibilidade de acompanhamento do quadro clínico em tempo real e acessibilidade à equipe de saúde dentro do setor [9]. Portanto, observa-se a importância do relacionamento interpessoal entre família e equipe de saúde.

Com base no aprofundamento da literatura, é possível inferir que os familiares, desde que bem orientados e acolhidos em suas demandas e necessidades, podem usufruir de benefícios terapêuticos, considerando as estratégias educacionais e o compromisso com a gestão institucional, na perspectiva do cuidar de quem cuida [1,9].

Desse modo, evidencia-se a ineficácia da visitação ampliada, pautada na ausência de comunicação e orientações aos familiares, visto que a transparência de informações promove um ambiente agradável, com redução significativa de conflitos, e melhoria do fluxo de atendimento às demandas dos pacientes e familiares.

 

A visita ampliada na UTI sob o olhar dos profissionais de saúde

 

A interdisciplinaridade no processo assistencial em saúde confere uma atenção integral ao sujeito internado e suas famílias, uma vez que está atrelada ao cuidado humanizado em saúde. Faz-se necessário, então, que haja empatia por parte dos profissionais de saúde, bem como o reconhecimento dos familiares como componente ativo, integrante no universo assistencial do sujeito [8].

      Desse modo, a visitação ampliada de familiares na UTI surge como uma proposta de aproximação entre o profissional, paciente, e família, com o intuito de proporcionar um atendimento humanizado, livre de danos, centrado nas necessidades dos pacientes e seus familiares, evidenciando o protagonismo do sujeito frente ao cuidado, como preconizado pela política Nacional de Humanização (PNH) [10,18].

Segundo Gabarra et al. [4], a existência da consciência empática sobre a importância da visita ampliada é algo perceptível nos profissionais de saúde, e o envolvimento das equipes acontece por meio da compreensão das crenças deste fenômeno. Desse modo, o olhar do profissional sofre influência da sobrecarga de trabalho, prejuízos na organização da rotina e os conflitos vivenciados.

A prática vivenciada nas Unidades de Terapia Intensiva é dicotômica do que é preconizado pelo projeto de visitação familiar ampliada, como visto em estudo realizado por Santos et al. [19], no qual apenas 2,3% dos profissionais eram especializados na área de terapia intensiva. Knalski et al. [2] relata, ainda, a ausência de profissionalismo, capacitação e interação por parte das equipes de saúde, com falhas de comunicação, falta de informações fidedignas e orientação eficazes, além da inflexibilidade frente a visitação [2].

Um estudo realizado no Brasil demonstrou que 72,7% das equipes apontaram interrupções dos familiares em seus afazeres profissionais, prejudicando o fluxo de atendimento e a assistência prestada aos doentes, e 59,4% relatam prejuízos da organização dos cuidados com os pacientes, em decorrência da falta de estrutura e de conhecimento por parte dos familiares, acerca das condutas tomadas [16].

É possível refletir acerca dos pontos negativos elencados pelas equipes de saúde, destacando a ausência de infraestrutura das unidades, carência de suporte emocional para pacientes, família e profissionais, e os conflitos com familiares mediante as condutas tomadas [4,10]. Todos esses pontos refletem a falta de estrutura geral das unidades, dificultando a implementação eficaz da visita ampliada.

 

Impactos da visita ampliada no quadro clínico de pacientes de UTI

 

O processo clínico de adoecimento dentro da unidade de terapia intensiva constitui um evento de alta complexidade para tratamento de pacientes em estado crítico, sendo necessários requisitos de qualidade da assistência em saúde. O ambiente de cuidados intensivos é dotado de alta densidade tecnológica associada a complexidade de procedimentos realizados, por isso exige profissionais capacitados e especializados, visando minimizar os riscos de iatrogenias [17].

Nesse contexto, as infecções hospitalares no ambiente de UTI é uma das grandes preocupações da equipe multiprofissional de saúde, uma vez que diversos microrganismos multirresistentes como a Pseudomonas aeruginosa e o Staphylococcus aureus estão presentes em grande parte das infecções relacionadas a saúde [2], com impacto direto na condição clínica dos pacientes internados, e na percepção dos familiares sobre prognóstico [16,17,18,19,20].

Observa-se, ainda, que os principais fatores causadores de infecção dentro das Unidade de Terapia Intensiva estão relacionados aos procedimentos invasivos realizados pelos próprios profissionais, com veiculação de patógenos [16]. Um estudo comparativo apontou que a incidência de infecção entre pacientes com visita ampliada e visita restrita não é significativa [21], reforçando as evidências acerca da veiculação de microrganismos por parte dos trabalhadores da saúde, com foco na assepsia dos procedimentos invasivos e antissepsia das mãos.

Uma das principais complicações desenvolvidas durante o processo de internamento em UTI é o delirium, seja causado mediante a presença de um agente infeccioso ou não. É caracterizado por confusão mental, incapacidade de percepção reflexiva, desorientação, falta de clareza e flutuações do nível de consciência. Em ensaio clínico randomizado realizado em 33 UTIs no Brasil, apontou-se que não houve redução significativa do delirium em pacientes com flexibilização da visita (18,9%) em detrimento dos pacientes em visita restrita (20,1%) [18].

Percebe-se com a leitura aprofundada e reflexão da temática, que as complicações clínicas inerentes a hospitalização em cuidados intensivo, independe da presença de familiares na Unidade de Terapia Intensiva, não sendo relevante a influência desses no processo de recuperação dos indivíduos internados no que diz respeito as condições clínicas, principalmente ao quadro de infecção, já que essas estão intimamente relacionadas a assistência à saúde.

 

Desafios da implementação da visita ampliada na UTI

 

É notória a existência de pontos positivos e negativos observados nas falas e posicionamentos de profissionais, pacientes e familiares, acerca do processo de visitação ampliada na UTI, bem como a importância de discutir as necessidades básicas do indivíduo e coletividade, pautadas nos princípios orgânicos do SUS, para o cuidado em excelência [6].

No entanto, para grande parte dos profissionais das equipes de saúde, existem diversas limitações que dificultam a implementação e condução eficaz da visita ampliada em sua totalidade, por exemplo, a estrutura física das unidades de terapia intensiva, o desenvolvimento de orientações e capacitações para as equipes e familiares, a prática do acolhimento, a estrutura logística de trabalho, a comunicação interpessoal com envolvimento da família, e o gerenciamento de conflitos [10].

Um dos maiores desafios da visita familiar ampliada é a comunicação interpessoal efetiva, impactando diretamente no sucesso da sua implementação, uma vez que o desenvolvimento dessa habilidade gera impressões positivas, com diminuição dos conflitos e das barreiras dentro da UTI, convergindo com os princípios da ética e bioética, e humanização em saúde [8,16]. Desse modo, ressalta-se a importância da comunicação efetiva entre a equipe e familiares.

O relacionamento interpessoal deve ser desenvolvido de maneira saudável, plena, transparente e com clareza de informações, visando as necessidades dos pacientes e seus familiares em um dado momento das suas vidas, em detrimento de uma condição de saúde adversa. Portanto, o uso da comunicação clara e objetiva permite a eficiência das ações e combatem os conflitos e barreiras que são propiciados no ambiente da Unidade de Terapia Intensiva, sendo inversamente proporcionais.

Desse modo, percebe-se que os desafios que permeiam o processo de implementação da visita ampliada dependem da atuação da equipe de saúde frente a demanda do paciente e seus familiares. Além disso, é de extrema importância que o gerenciamento do processo por parte da gestão hospitalar, seja feito com excelência, visando a organização do cuidar em saúde e seus benefícios, visando o bem-estar geral entre familiares, profissionais e paciente.

 

Conclusão

 

Foram identificados um maior número de estudos qualitativos que abordaram principalmente aspectos familiares e profissionais acerca da visita ampliada em UTI, bem como as barreiras para sua implementação. Não são muitos os estudos realizados no Brasil, mas é possível observar resistência dos profissionais e as lacunas da gestão na elaboração de estratégias eficazes, sendo necessárias capacitações e orientações às equipes de saúde.

Observa-se, ainda, que o desenvolvimento da visita ampliada não gerou impactos nos índices de infecção hospitalares, nem alterações significativas no quadro clínico de delirium dos pacientes internados, sendo percebida positivamente pelos pacientes e familiares que desfrutaram desse privilégio, como redutor de ansiedade e estresse.

O presente estudo permite um olhar claro, amplo e sucinto, sobre a visita familiar ampliada e seus impactos estudados nos últimos anos, a fim de contribuir com a comunidade científica para desenvolvimento de novas pesquisas que abordem este fenômeno de maneira aprofundada, bem como auxiliar a gestão de estratégias para a sua implementação eficaz, a fim de fortalecer as relações interpessoais na Unidade de Terapia Intensiva.

 

Conflitos de interesse

Não há conflitos de interesse no presente estudo.

 

Fontes de financiamento

Financiamento próprio dos autores, sem outras fontes.

 

Contribuições dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Gomes IV, Leal NPR; Coleta de dados: Gomes IV, Gouveia Neto JR, Souza MC, Martins DS; Análise e interpretação dos dados: Gomes IV, Gouveia Neto JR, Gonçalves NS; Redação do manuscrito: Gomes IV, Gonçalves NS, Martins DS; Revisão crítica de conteúdo intelectual: Gomes IV, Souza MC, Leal NPR

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