Enferm Bras. 2023;22(1):64-78
ARTIGO ORIGINAL
Impacto da sobrecarga em
cuidadores informais de pessoas idosas
José Vitor da Silva1,
Rogerio Donizeti Reis2, Fabiana de Souza
Orlandi1
1Universidade Federal de São Carlos
(UFSCar), SP, Brasil
2Faculdade de Medicina de Itajubá
(FMIT), MG, Brasil
Recebido em 22 de julho de
2022; Aceito em 20 de fevereiro de 2023.
Correspondência: José Vitor da Silva, E-mail: enfjvitorsilva2019@gmail.com
Silva JV, Reis RD, Orlandi FS. Impacto da
sobrecarga em cuidadores informais de pessoas idosas. Enferm Bras. 2023;22(1):64-78.
doi: 10.33233/eb.v22i1.5228
Resumo
Introdução: Os problemas físicos, psíquicos,
sociais e espirituais associados à sobrecarga de trabalho prejudicam
acentuadamente a saúde física e mental do cuidador e interferem na dinâmica
cotidiana do ato de cuidar. Objetivos: Identificar as características
sociodemográficas e de saúde e avaliar a sobrecarga dos cuidadores informais de
idosos. Métodos: O presente estudo foi de abordagem quantitativa, do
tipo descritivo e transversal. Participaram do estudo 50 cuidadores informais
de pessoas idosas, de ambos os sexos. A amostragem foi não probabilística, do
tipo snow-ball. Foram utilizados o instrumento de
caracterização pessoal, familiar, social e de saúde e a escala de sobrecarga do
cuidador. Resultados:
A sobrecarga total apresentou média de 44,82 (DP ±
7,78). Em relação aos domínios:
“tensão geral”, alcançou-se média de
15,50 (DP
± 5,70); “isolamento”, obteve-se média de
5,88 (DP ± 1,79); “decepção”,
média
de 8,96 (DP ± 2,00); “envolvimento emocional”,
obteve-se média de 3,70 (DP ±
1,18) e “ambiente”, média de 7,56 (DP ±
1,82). Conclusão: A sobrecarga
geral, assim como os domínios “isolamento”, “decepção” e “envolvimento
emocional”, se classificaram como “bons”. Entretanto, a dimensão “ambiente”
evidenciou-se como “regular” e o “fator tensão” geral se conceituou como
“ruim”.
Palavras-chave: idoso; cuidadores; meio ambiente;
isolamento.
Abstract
Impact of workload on informal caregivers of elderly people
Introduction: Physical, psychological, social and spiritual
issues, associated with increased workload, significantly affect the
caregiver’s physical and mental health and interfere in the daily dynamics of
the act of caring. Objectives: To identify sociodemographic and health
characteristics and assess the burden of elderly people informal caregivers. Methods:
The present study had a quantitative approach, of a descriptive and transversal
type. Fifty informal caregivers of the elderly participated in the study, of
both sexes. The sampling was non-probabilistic, of the “snow-ball” type. The
instrument of personal, family, social and health characterization and the
caregiver burden scale were used. Results: The total overload presented
a mean of 44.82 (SD ± 7.78). Regarding the domains, “general tension” reached a
mean of 15.50 (SD ± 5.70); “isolation” obtained a mean of 5.88 (SD ± 1.79);
“disappointment” hit a mean of 8.96 (SD ± 2.00); “emotional involvement” had a
mean of 3.70 (SD ± 1.18) and the “environment” reached a mean of 7.56 (SD ±
1.82). Conclusion: The general overload, as well as the domains
“isolation”, “disappointment” and “emotional involvement”, were classified as
“good”. However, the “environment” dimension was found to be “regular” and the
“general tension” factor was considered “bad”.
Keywords: elderly; caregivers; environment; isolation.
Resumen
Impacto de la sobrecarga en los cuidadores informales de
personas mayores
Introducción: Los problemas físicos, psíquicos, sociales y espirituales asociados a la sobrecarga de trabajo perjudican la salud fisica
y mental del cuidador e interfieren
en la dinámica
cotidiana de cuidado. Objetivos: Identificar las
características sociodemográficas y de salud, y evaluar la sobrecarga de los cuidadores informales de
adultos mayores. Métodos: Estudio
de abordaje cuantitativa, descriptivo y transversal. Participaron
del estudio 50 cuidadores informales de adultos mayores, de
ambos los sexos. El muestreo
fué no probabilistico, del tipo snow-ball. Se utilizaron el instrumento de caracterizacion sociodemográfica y de salud
y de la escala de sobrecarga del
cuidador. Resultados: La sobrecarga total presentó
media de 44,82 (DS ± 7,78). En
cuanto a los dominios: “tensión general” alcanzó una media de 15,50 (DS ±
5,70); el dominio “aislamiento” obtuvo media de 5,88 (DS ± 1,79); el dominio “desilusión” con media de 8,96 (DS ± 2,00); el dominio “envolvimiento
emocional” tuvo media de
3,70 (DS ± 1,18) y el dominio
“ambiente”, con media de
7,56 (DS ± 1,82). Conclusión: La sobrecarga
general, así como los dominios “aislamiento”, “desilusión” y “envolvimiento
emocional” se clasificaron como “buenos”.
Sin embargo, la dimensión “ambiente” resultó ser
“regular” y el “factor de tensión” general fue
conceptualizado como “malo”.
Palabras-clave: adulto mayor; cuidadores; medio ambiente; aislamiento.
Conforme
a série histórica Laboratório de Demografia e Estudos Populacionais - UFJF, a
população de pessoas idosas passou de 202 milhões em 1950, para 1,1 bilhão em
2020 [1]. Em 2015, conforme dados da Síntese de Indicadores Sociais do IBGE, as
pessoas idosas correspondiam a 14,3% (mais de 20 milhões de pessoas) da
população [2].
Esse
acentuado segmento populacional brasileiro terá simultaneamente resultados
positivos e negativos. Dentro das consequências positivas, podem ser citadas a
qualidade de vida e o envelhecimento ativo e saudável [3].
Nos
aspectos negativos, as doenças crônicas não transmissíveis e a perda da
capacidade funcional são as mais preocupantes. Essas situações exigem a demanda
de cuidadores que assistem às necessidades da pessoa idosa, garantindo desde
cuidados básicos até outras atividades como ir ao supermercado e realizar
tarefas financeiras [4]. O cuidador informal é aquele que realiza assistência
de maneira não remunerada e não possui preparação profissional, sendo muitos,
na maioria das vezes, o próprio familiar [5].
A ação de
cuidar de pessoas idosas abrange a sobreposição de tarefas ou atividades, dos
mais diversos tipos, como diminuição do tempo livre, cansaço, exigências do
cuidar e expectativas relacionadas com a vida pessoal, familiar e social, que
comprometem a qualidade de vida do cuidador [6,7]. Os problemas físicos,
psíquicos, sociais e espirituais, associados à sobrecarga de trabalho,
prejudicam a saúde física e mental do cuidador e interferem na dinâmica
cotidiana do ato de cuidar [8,9]. Embora muitos esforços tenham sido
desenvolvidos para reduzir, os resultados da sobrecarga de trabalho do cuidador
familiar de pessoas idosas [10,11,12], no Brasil, poucos estudos têm-se
desenvolvidos esse assunto [13,14,15,16,17].
O
cuidador familiar se vê frente às responsabilidades incessantes devido à
demanda e à sobrecarga de cuidados especiais, com acentuada variação de
tarefas. Nesse cenário, as complexidades geradas pelo ato de cuidar em
domicílio desencadeiam sentimento de impotência, assim como falta de
conhecimentos técnicos e científicos e falta de apoio e assistência do setor
saúde, excluindo muitas vezes o cuidador do cenário onde está a pessoa idosa
que demanda cuidados. Essa impotência muitas vezes lhe traz desolação,
frustração e desânimo frente ao grande contexto de cuidar de alguém [18].
A
atividade de cuidar de uma pessoa idosa, substancialmente, acaba por levar os
cuidadores informais à sobrecarga física e emocional, além de desencadear
sentimentos de culpabilidade, por se sentirem esgotados e frustrados pela
condição em que a pessoa idosa se encontra. Muitas vezes os familiares
determinam um parente para realização do cuidar de um membro dependente, no
sentido de conduzir e resolver essa situação. Por outro lado, é frequente não
consultar o interesse, a vontade e a disponibilidade desse membro familiar
designado ao cuidado. Numa interpretação objetiva ele é determinado a cumprir
essas funções pelos seus parentes. Com isso, para os familiares o problema do
cuidador está resolvido, porém ninguém se preocupa com os sentimentos de medo,
angústia e revolta desse familiar escolhido [19].
As
sobrecargas do cuidar se configuram por vários fatores, que surgem com a
diminuição da capacidade para o enfrentamento da doença, com a perda de
referência com a sociedade e com amigos, além da fragilidade imposta pela
rotina incessante dos cuidados. Essa sobrecarga gerada pode desenvolver
sintomas de natureza psiquiátrica, fadiga, uso de medicamentos psicotrópicos, o
que torna não aceitáveis as condições para cuidar da pessoa idosa [20].
Com a
incidência das doenças crônicas cada vez mais veloz, assim como as suas
consequências graves, as pessoas idosas tornam-se dependentes e a situação vai
se agravando cada vez mais. Diante desse cenário as pessoas idosas demandam de
cuidadores, que na sua maioria, são os familiares. Com o aumento demográfico
dessas pessoas e da sua longevidade o número de cuidadores familiares também
está muito acelerado. Para avaliar a saúde das pessoas idosas com doenças
crônicas há diversas escalas, entre elas, destacam-se: Escala de Zarit, Escala de Sobrecarga de Cuidador, Escala de
Avaliação da Sobrecarga dos Familiares, Inventário de Sobrecarga do Cuidador, Caregiver Burden Scale (CBS) [21,22,23].
No
presente estudo, optou-se pela Caregiver Burden Scale (CBS) devido a sua
abrangência de domínios, o que permite abarcar o cuidador em uma situação de
vida mais completa.
Diante
desse cenário, o presente estudo buscou identificar as características
sociodemográficas e de saúde do cuidador informal de pessoas idosas e avaliar o
impacto da sobrecarga dos cuidadores informais de pessoas idosas.
O estudo
foi de abordagem quantitativa, do tipo descritivo e transversal. A amostragem
foi não probabilística, do tipo snow ball. Participaram do estudo 50 cuidadores informais de
pessoas idosas, de ambos os sexos, residentes em Itajubá, Sul de Minas Gerais,
tanto da zona urbana, quanto rural, não havendo desistência alguma. O critério
de inclusão foi ser cuidador informal há, pelo menos, seis meses é ter
capacidade de comunicação verbal.
Os
critérios de exclusão foram: residir em outras cidades ou estados e exclusão do
candidato quando não era encontrado, após o segundo agendamento da entrevista.
A entrevista foi realizada pelos próprios pesquisadores no próprio domicílio do
cuidador, durante o período de março a junho de 2016. A entrevista foi
estruturada direta.
Utilizaram-se
dois instrumentos: o primeiro foi à caracterização sociodemográfica e de saúde
do cuidador informal e o segundo a escala Caregiver Burden Scale
(CBS), na versão
traduzida, adaptada e validada para o Brasil. A escala é
composta de 22
questões divididas em cinco subgrupos: Tensão Geral
(questões 1 a 8) pontuação
mínima 8 pontos e máxima 32 pontos; Isolamento
(questões 9 a 11) pontuação
mínimo 3 e máximo 12 pontos; Decepção
(questões 12 a 16) pontuação mínimo 5 e
máximo 20 pontos; Envolvimento Emocional (questões 17 a
19) pontuação mínimo 3
e máximo 12 pontos; e Ambiente (questões 20 a 22)
pontuação mínimo 3 e máximo 12 pontos. As respostas de cada item fornecem
escores que variam de 1 a 4, sendo 1- de modo algum, 2- raramente, 3- algumas
vezes, 4- frequentemente. Quanto maior a média do domínio, maior o grau de
dificuldade percebido pelo cuidador no domínio avaliado, sendo a pontuação
mínima 22 pontos e a máxima 88 pontos, se o resultado obtido for próximo de 22
pontos melhor as dificuldades percebidas pelo cuidador e vice-versa [23,24,25].
Para a
análise dos dados, utilizou-se a frequência absoluta e relativa para as
variáveis categóricas; e medidas de tendência e dispersão central, para as
variáveis contínuas. Da estatística inferencial, utilizou-se o alfa de Cronbach.
Seguiram-se
os preceitos éticos estabelecidos pela Resolução 466/12, de dezembro de 2012,
com aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade Wenceslau Braz
(FWB), com o parecer consubstanciado número 498.103. Antes da participação do
estudo, cada entrevistado assinou em duas vias o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) após conhecimento do mesmo, oficializando a sua anuência ao
estudo.
Em
relação às características pessoal, familiar e socioeconômica, observou-se que
62% eram do sexo masculino; a média de idade foi de 40,7 anos (DP ± 15,8); o
número de filhos por família foi de 1,3 (DP ± 1,3); 54,0% dos participantes
eram casados; 78% eram católicos; 32% tinham ensino fundamental incompleto e
64% pertenciam à família nuclear. Em relação à situação de trabalho, 48%
estavam empregados. O tempo médio de ser cuidador foi de 10 anos com DP ± 4.
Tabela I – Atividade física, percepção de
saúde e informações sobre doença dos participantes do estudo. Itajubá, MG. 2016
(n = 50)
Fonte:
Instrumento de Pesquisa
Observou-se
que 64% não praticavam atividades físicas; 52% percebiam a própria saúde como
boa; 48% consideravam que a própria saúde era a mesma coisa quando comparada ao
último ano; 46% interpretaram que a própria saúde era boa quando confrontavam
com as pessoas da mesma idade e 56% não possuíam doença crônica.
Tabela II – Avaliação da sobrecarga dos participantes
do estudo (n = 50)
Fonte:
Instrumento de Pesquisa
Identificou-se
que a sobrecarga total apresentou média de 44,82 (DP ± 7,78), conceito “bom”.
Em relação aos domínios: tensão geral alcançou média de 15,50 (DP ± 5,70),
conceito “ruim”; domínio isolamento obteve média de 5,88 (DP ± 1,79), conceito
“bom"; domínio decepção, com média de 8,96 (DP ± 2,00), conceito “bom”;
domínio envolvimento emocional teve média de 3,70 (DP ± 1,18), conceito “muito
bom”, e domínio ambiente com média de 7,56 (DP ± 1,82), conceito “regular”.
Os
itens
que mais contribuíram para a sobrecarga foram a
“preocupação em não cuidar de
maneira adequada” e a “sensação de
cansaço e de esgotamento físico”, com média
de 3,38 e 2,64, respectivamente. Por outro lado, os itens que menos
contribuíram foram a “sensação de vergonha
do comportamento do idoso” e a
“vivência de situações embaraçosas e
difíceis mediante outras pessoas”, com
média de 1,14 e 1,26, respectivamente. A avaliação
da consistência interna foi
de 0,839 para a escala total, pelo teste de alfa de Cronbach.
Ao
analisar a percepção do estado de saúde, esta apresentou conceito “bom”, o que
pode ser justificado pelo fato de o cuidador não ser portador de doença
crônica. Já em outros estudos, detectou-se que a o estado de saúde foi
considerado regular e os cuidadores eram portadores doenças crônicas [25,26].
Neste
estudo, constatou-se que, em relação à sobrecarga total (44,82), esta remete ao
conceito “bom”. Essa conceituação pode ser justificada, considerando-se que o
cuidador masculino e casado obtém ajuda da esposa que, muitas vezes, é
considerada cuidadora secundária. Isso, com certeza, alivia a sobrecarga do
homem na condição de cuidador familiar primário.
Diferentemente
dos estudos nacionais e internacionais, o presente trabalho apresentou a
maioria de cuidadores pertencentes ao sexo masculino, com idade de 40 anos
aproximadamente. Sabe-se que a grande maioria de cuidadores é do sexo feminino,
porém pode-se inferir que essa mudança para o sexo masculino pode estar
relacionada com o fato de a mulher estar assumindo no mundo do trabalho cargos
e funções profissionais, não permanecendo mais única e exclusivamente nas
funções domésticas [27].
Em
relação à idade, o presente estudo também se faz distinto porque há estudos que
mencionam pessoas idosas cuidando de outras pessoas idosas. A possível
explicação para este fato pode estar relacionada à situação das pessoas idosas
serem viúvas, embora esse dado não seja evidenciado porque o participante do
estudo é o cuidador e não a pessoa dependente de cuidados. Entretanto, na
coleta de dados, observou-se que a pessoa idosa sob cuidados era viúva. O
estado civil viúvo de certa forma responsabilizava os filhos para cuidarem de
seus pais e essa pode ser a possível explicação pela média de idade ser baixa
[28].
No
tocante que diz respeito ao desemprego, pode-se inferir que o mesmo esteja
relacionado ao ato de cuidar, que passa a ser prioridade, pois é impossível
trabalhar e exercer a função de cuidador, visto que exige tempo integral
(manhã/tarde e noite), todos os dias da semana a presença do mesmo, associado a
isso, sabe-se ainda que a pessoa idosa demanda cuidado para suas necessidades
básicas e específicas a serem atendidas ou cuidadas [29].
Por outro
lado, pode-se afirmar que, muitas vezes, as pessoas estão exercendo a função de
cuidador familiar por falta de trabalho no mercado, substituindo a falta de
trabalho, exercendo funções laborais como cuidador e usufruindo dos proventos
da aposentadoria da pessoa idosa sob cuidados para o atendimento de suas
necessidades humanas básicas. Corrobora esta interpretação quando se relata que
diversos são os motivos que levam uma pessoa a ser cuidadora familiar e, entre
eles, as dificuldades financeiras como no caso de filhas desempregadas que
cuidam dos pais em troca do sustento [29,30].
Ao
refletir sobre os diversos domínios da sobrecarga, encontrou-se que a dimensão
tensão geral foi conceituada “ruim”. Justifica-se esse dado por diversos
fatores, sendo a escolaridade uma situação importante, a qual pode dificultar
ou impedir a compreensão de informações profissionais sobre a pessoa idosa, o
que pode gerar tensão frente à responsabilidade de ser o cuidador. Outro fator
que contribui para a tensão geral é a instabilidade ou a piora do longevo sob cuidado.
Essas situações podem ser interpretadas, pelo cuidador informal, como
inadequação e ausência de cuidados necessários. Isso se acentua quando algum
familiar realiza comentários nessa direção, não só tensionando o cuidador, mas
lhe trazendo percepções de incompetências.
O domínio
ambiente mostrou-se regular. Isso pode ser entendido pelo estado de saúde da
pessoa idosa em cuidados. A gravidade do estado geral ou a interpretação do
cuidador a respeito da condição de saúde de seu longevo pode trazer um ambiente
positivo ou negativo. Presumidamente, o conceito “ruim” significa estado geral
comprometido da pessoa idosa, ainda que a sobrecarga tivesse um conceito “bom”.
A falta de experiência na condição de ser cuidador, assim como a baixa
escolaridade, já comentada anteriormente, são situações que podem tornar o
ambiente não agradável ou comprometido.
Sobre o
cuidador informal, no qual prevaleceu o sexo masculino, embora com escolaridade
do nível médio, mas casados, o ambiente também se apresentou “ruim”, o que
corrobora o presente trabalho. Outro aspecto a ser interpretado na condição do
ambiente refere-se à cobrança dos familiares em relação ao ser idoso que se
encontra sob a responsabilidade do cuidador. São frequentes cobranças
acentuadas pelos familiares, porém sem qualquer ajuda destes. Isso contribui
para estabelecer ambiente desagradável e tenso, o que dificultará muito para o
cuidador informal [31].
O
envolvimento emocional é um dos domínios responsáveis pela sobrecarga do
cuidador informal. O advento dessa dimensão está associado com os vínculos
emocionais existentes entre o ser cuidado e o cuidador familiar. À medida que o
tempo passa, esses vínculos vão se solidificando e tornando o convívio
fortalecido ou frágil. A constante interação entre paciente e familiar cuidador
é responsável em assumir qual das duas direções o convívio vai tomar. O
envolvimento emocional pode emergir e tornar-se austero para o cuidador
familiar, quando o estado de saúde do idoso familiar se agrava e traz consigo
sensações com a perda deste [32].
Na
prática profissional, observa-se o surgimento de outro ator no contexto dos
cuidadores, que é o pós-cuidador. Este “ex-cuidador”
no contexto atual encontra grandes dificuldades, pois o cuidador passa por duas
complicadas vertentes: a primeira, relacionada com a perda do ente querido,
trazendo-lhe o luto, muitas interrogações, dúvidas, cobranças e, até mesmo,
certa angústia em ter deixado de fazer algo ao seu ser idoso que acaba de
falecer. A segunda vertente refere-se ao início de outra vida que o cuidador
terá que adotar, analisar e decidir. Isso, muitas vezes, lhe traz envolvimentos
emocionais de desespero, pois, frequentemente, o recomeçar para ele é uma
situação muito difícil devido à idade, ao estado de saúde, ao despreparo para
as exigências do mundo de trabalho e, sobretudo, à escolaridade, que não lhe
oferece vantagem ou capacitação para novas oportunidades de trabalho. Embora
não se encontre literaturas nacionais e internacionais sobre esse assunto, está
tomando vulto e proporções e faz-se necessário estudos com relação a esses ex-cuidadores. Na nossa prática clínica tem sido frequente
“ex-cuidadores” necessitando de muita ajuda nesse
sentido.
De forma
geral, o envolvimento emocional do cuidador pode ser também expandido aos
membros familiares, com sentimentos de rancor e, até mesmo, de revolta, porque
eles, na concepção do cuidador, não deram o suporte necessário para o familiar
idoso que acaba de falecer e ao cuidador, que, inúmeras vezes, sentiu-se sem
suporte dos familiares, até mesmo para o autocuidado [33]. Na literatura,
encontrou-se que o envolvimento emocional estava relacionado com o sentimento
de presunção da perda do familiar sob cuidados, assim como o aumento de
vínculos estabelecidos pela dimensão temporal de ser cuidador [34].
Estudo enfatiza que envolvimento
emocional estava muito fragilizado pela sobrecarga do trabalho desenvolvido ao
longo do tempo, diário e no período de 24 horas, o que impedia o cuidador de
realizar, até mesmo, suas atividades básicas da vida diária. Os cuidadores
analisados mencionavam que a sobrecarga de serem cuidadores estava
comprometendo o envolvimento emocional em relação ao ser idoso [34].
No que se
refere ao conceito “muito bom” para o envolvimento emocional selecionado pelos
cuidadores, este é, muitas vezes, associado com os laços familiares, o que se
torna impeditivo para uma sincera conceituação, considerando ressentimento em
conceituar esse domínio com expressões mais inferiores. O cuidador familiar
sente constrangimento ao categorizar esse domínio, pois, muitas vezes, cuida de
parente próximo e uma conceituação inferior pode deixá-lo constrangido junto
aos demais familiares e, para ele, parece improcedente ao fato de ser cuidador
[35].
Na
interpretação da dimensão isolamento, outro fator da escala de sobrecarga,
pode-se comentar que este se relaciona às múltiplas perdas que, ao assumir a
função de cuidador, ele começa a ter em seu cotidiano. Entre as diversidades de
perdas, que o leva ao isolamento familiar, social e profissional, estão as
seguintes: diminuição ou até mesmo inexistência de convívio com os membros
familiares em datas festivas ou comemorativas. Embora, no presente estudo, essa
dimensão tenha sido conceituada “boa”, esse domínio é, geralmente, encontrado
muito comprometido em outros trabalhos, nos estudos realizados por outros
autores. Um estudo realizado corrobora os dados do presente trabalho, embora a
análise dos dados tenha sido feita pela média da pontuação dos itens e não pela
média dos mesmos [36].
Em um
estudo realizado com cuidadores informais, o domínio mais comprometido foi o da
solidão, devido à ausência de pessoas que proporcionassem tempo, pelo menos de
ouvir o cuidador, do ponto de vista pessoal, familiar, profissional e,
principalmente, no que se refere a suas atividades de cuidador [37].
Em
relação ao domínio decepção, é muito comum entre os cuidadores esse sentimento
quando observam piora do estado de saúde, comprometimento e óbito do seu ser
cuidado. Para eles, é uma sensação de fracasso e de impotência, associada ao
sentimento de remorsos pelas impossibilidades de atendimento de alguma
necessidade. São frequentes, entre os estudos realizados, abordagens pelos
cuidadores de que se sentem decepcionados por serem cuidadores, porque, segundo
a avaliação pessoal, não conseguiram aliviar dores ou sofrimentos e consideram
que essa ausência tenha sido a responsável pela morte. Em estudos realizados
encontraram-se diferentes resultados que caracterizam nível de decepção
comprometido e não comprometidos. Estudo realizado com média estabelecida pela
pontuação das opções de respostas, a decepção correspondeu a 1,64 o que
corrobora os dados deste estudo [36]. Outro estudo cujos resultados foram pela
média dos itens encontrou-se esse domínio com média igual 12,53 com DP (± 3,55),
o que caracteriza que os cuidadores estavam comprometidos pelo domínio decepção
[37].
Ainda
que, no presente trabalho, os domínios não tenham apresentados resultados
comprometedores é comum encontrar entre eles situações relacionadas com os
relacionamentos (família e/ou amigos), trabalho, lazer, a própria saúde, entre
outros, onde tudo passou a ter menor valor ao lado da possibilidade e
proximidade da morte do familiar acometido, portanto todo o restante acabou por
ser negligenciado, ou mesmo abandonado, para passar a cuidar integralmente de
seu ente querido [38,39].
Finalmente, vale ressaltar que o cuidador
informal familiar é uma questão de saúde pública no País. Para tanto, urge a
elaboração de políticas públicas que possam sustentar a vida e a saúde de
alguém que se dedica, com exclusividade, a um ser familiar. Os profissionais da
área de saúde precisam estabelecer práticas substanciais e robustas, assim como
especiais, à atenção dos cuidadores, para dedicarem-se à vida do seu ser
cuidado.
Os
cuidadores apresentaram o nível de sobrecarga que oscilou entre os diversos
fatores. Os domínios mais comprometidos foram Tensão Geral e Ambiente. Esses
resultados permitem despertar que a enfermagem venha a estabelecer programas
que possam beneficiar a vida, a saúde e as atividades desenvolvidas por esses
cuidadores que ainda vivem e sobrevivem em um contexto sem ajuda ou
participação do setor saúde. Refere-se a um público que é pressionado, muitas
vezes, pelos familiares, pela situação do próprio paciente e pela falta de
recursos necessários no dia a dia, para o seu ser cuidado.
Espera-se
que futuramente os cuidadores possam ser considerados também como ator
importante e essencial, quando dedicam sua vida a um familiar sem dimensionar
tempo, condições físicas e até mesmo conhecimento, mas revestidos de
comprometimento e dedicação.
Recomenda-se
que outros estudos dessa natureza sejam realizados para confirmar os dados
obtidos ou a possibilidade de novas explorações sobre esse tema que ainda
merece ser aprofundado.
Conflitos
de interesse
Não há
conflitos de interesse
Fontes
de financiamento
Não há
fonte de financiamento
Contribuição
dos autores
Concepção
e desenho da pesquisa:
Silva JV; Coleta de dados: Silva JV, Reis RD; Análise e interpretação
dos dados: Silva JV, Reis RD, Orlandi FS; Análise estatística: Silva JV,
Orlandi, FS; Redação do manuscrito: Orlandi FS; Revisão crítica do
manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Silva JV, Reis RD