Enferm Bras. 2023;22(6):845-57

doi: 10.33233/eb.v22i6.5295

ARTIGO ORIGINAL

Os desafios enfrentados por enfermeiros durante as consultas de pré-natal em tempos de pandemia do COVID-19

 

Larissa Carolina Cesar, Fernanda Milani Magaldi, Larissa Vicalvi Rocha Lima, Geovana Custódio da Silva, Sara Rodrigues Rosado

 

Universidade São Judas Tadeu (USJT), São Paulo, SP, Brasil

 

Recebido em: 26 de setembro de 2022; Aceito em: 10 de dezembro de 2023.

Correspondência: Larissa Carolina Cesar, larissacesarenfermagem@gmail.com

 

Como citar

Cesar LC, Magaldi FM, Rocha Lima LVR, Silva GC, Rosado SR. Os desafios enfrentados por enfermeiros durante as consultas de pré-natal em tempos de pandemia do COVID-19. Enferm Bras. 2023;22(6):845-57. doi: 10.33233/eb.v22i6.5295

 

Resumo

Objetivo: Compreender e relatar quais foram os desafios enfrentados por enfermeiros no atendimento às gestantes durante a consulta de pré-natal em meio à pandemia do COVID-19. Métodos: Trata-se de um estudo qualitativo, descritivo e exploratório. Os colaboradores foram enfermeiras que prestam atendimento para gestantes nas consultas de pré-natal. A coleta de dados foi efetuada através de entrevista individual. Foram aplicados dois questionários: o primeiro solicitando informações sociodemográficas e o segundo com questões norteadoras sobre a assistência de enfermagem nas consultas de pré-natal neste contexto. Resultados: Foram entrevistadas sete enfermeiras que efetuaram atendimento para as gestantes nas consultas de pré-natal antes e durante a pandemia de COVID-19. A análise interpretativa das narrativas possibilitou a elaboração de quatro categorias: 1- As principais mudanças relacionadas ao atendimento na assistência de pré-natal durante a pandemia da COVID-19; 2- O medo vivenciado pelos profissionais de enfermagem no contexto; 3- O preparo em prestar assistência frente à nova realidade; e 4- As principais dificuldades enfrentadas. Conclusão: Acredita-se que este estudo possa contribuir para o entendimento da vivência da equipe de enfermagem em uma pandemia sem precedentes, no âmbito dos desafios enfrentados, mudanças de rotina e novas perspectivas pós pandemia.

Palavras-chave: Enfermagem; COVID-19; assistência pré-natal.

 

Abstract

The challenges faced by nurses during prenatal consultations in times of the COVID-19 pandemic

Objective: To understand and report the challenges of care and care for pregnant women during prenatal consultations, in the midst of the COVID-19 pandemic. Methods: This is a qualitative, descriptive and exploratory study. The collaborators were nurses who provide care for pregnant women in prenatal consultations. The data in this work is a collection of questions which was carried out individually first asked about sociographic information and then about prenatal nursing care in this context. Results: In total, 7 nurses were interviewed while a pandemic occurred in prenatal patient care consultations before and during the COVID-19 pandemic. An interpretative analysis of the narratives allowed the elaboration of four: 1- The main changes related to procedures in prenatal care; 2- The fear experienced by nursing professionals in the context; 3- The preparation necessary to face of the new reality; and 4- The main difficulties faced. Conclusion: It is believed that this nursing study can contribute to new pandemic perspectives, routine changes and new pandemic possibility.

Keywords: Nursing; COVID-19; prenatal assistance.

 

Resumen

Los desafíos enfrentados por enfermeros durante las consultas prenatales en tiempos de la pandemia del COVID-19

Objetivo: Comprender y relatar los desafíos que enfrentaron los enfermeros en consultas prenatales durante la pandemia de COVID-19. Métodos: Se trata de un estudio cualitativo, descriptivo y exploratorio. Los colaboradores fueron enfermeras que atienden a las gestantes en las consultas de prenatal. La recolección de datos se llevó a cabo a través de entrevistas individuales. Se aplicaron dos cuestionarios: el primero solicitando información sociodemográfica y el segundo con preguntas orientadoras sobre el cuidado de enfermería en las consultas de prenatal en este contexto. Resultados: Fueron entrevistadas siete enfermeras que brindaron atención a embarazadas en consultas de prenatal antes y durante la pandemia del COVID-19. Un análisis interpretativo de las narrativas permitió elaborar cuatro categorías: 1- Los principales cambios relacionados con la atención prenatal durante la pandemia del COVID-19; 2- El miedo experimentado por los profesionales de enfermería en este contexto; 3- La preparación para brindar asistencia en esta nueva realidad; y 4- Las principales dificultades enfrentadas. Conclusión: Se cree que este estudio puede contribuir para la comprensión de la experiencia del equipo de enfermería en una pandemia sin precedentes, en el contexto de los desafíos enfrentados, cambios de rutina y nuevas perspectivas pos pandemia.

Palabras-clave: Enfermería; COVID-19; asistencia prenatal.

 

Introdução

 

Em dezembro de 2019, houve uma preocupação mundial devido a notificação de vários casos descritos como pneumonia atípica na China para a Organização Mundial da Saúde (OMS). A partir disso, foi detectado o surgimento de uma enfermidade, identificada como um novo coronavírus (Sars-Cov-2), e causador da doença COVID-19, tornando-se epidêmica devido à alta taxa de transmissibilidade [1]. A patologia espalhou-se pelos cinco continentes e em março de 2020 a OMS declarou alerta mundial, pois a situação havia se tornado pandêmica pelo alto índice de infectividade [2].

No Brasil, os casos de COVID-19 foram inicialmente notificados em fevereiro de 2020. Os indivíduos contaminados podem ser assintomáticos ou sintomáticos, sendo que os sintomas mais comuns são: tosse, febre, coriza, congestão nasal, dispneia, ageusia, astenia, distúrbios gastrintestinais ou até sintomas mais graves como pneumonia severa e Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) [3].

No cenário mundial de pandemia, as gestantes estão incluídas no grupo de risco frente à COVID-19 [4]. Neste contexto é necessário atentar-se quanto às manifestações clínicas da doença já que devido a adaptações fisiológicas ou eventos adversos na gravidez como: dispneia, sintomas gastrointestinais, fadiga é possível que se sobreponha aos sintomas do novo coronavírus [3].

Diante desta situação, houve certa exposição destas mulheres a diversos tipos de medos e inseguranças, tornando-as mais vulneráveis não apenas aos aspectos relacionados à enfermidade, mas há carência de informações, desconfiança com relação à qualidade da assistência e dificuldade de acesso às unidades de saúde [5].

A assistência de pré-natal é essencial para acompanhar a situação de saúde das mulheres e do feto no momento da evolução gravídica em todo o período gestacional. Práticas realizadas rotineiramente durante essa assistência, se tornam resultantes de melhores desfechos perinatais [6].

Frente à nova realidade imposta pela pandemia, os profissionais de saúde, inclusive os enfermeiros, necessitam de medidas adaptativas e estratégicas para realizar a assistência de enfermagem durante a gestação com o intuito de proporcionar um atendimento de qualidade e proteger a mulher, o feto e a si mesmo contra a propagação deste novo vírus [7].

É notório que os enfermeiros vêm enfrentando obstáculos para executar a assistência de enfermagem nas consultas de pré-natal, logo, essa pesquisa tem como objetivo compreender e relatar quais foram os desafios enfrentados por enfermeiros no atendimento às gestantes durante as consultas de pré-natal em meio a pandemia do COVID-19.

 

Métodos

 

Trata-se de um estudo qualitativo, descritivo e exploratório, para elaborá-lo, os dados foram coletados e analisados a partir da implementação de três etapas descritas por Bardin (2006) A primeira consistiu na pré-análise na qual há organização de todo o material a ser estudado (gravações, observações, entre outros), ademais, envolveu a leitura de vários documentos necessários para análise do assunto no período de tempo estabelecido para a coleta de informações. A segunda etapa tratou-se da exploração do material, possibilitando a elaboração de hipóteses, e por fim, houve a mensuração e interpretação dos resultados obtidos [8].

Os colaboradores para a pesquisa foram sete (7) enfermeiras atuantes em unidades de saúde, prestando atendimento às gestantes nas consultas de pré-natal. Como critérios de inclusão deste estudo, adotamos: enfermeiros, com experiência na assistência às gestantes durante as consultas de pré-natal, no momento de pré-pandemia e pós pandemia do COVID-19. O critério de exclusão utilizado foi: enfermeiro que não possui experiência na assistência às gestantes, antes da pandemia e/ou não teve a oportunidade de realizar consultas de pré-natal para essas mulheres em tempos de pandemia.

A coleta de dados foi efetuada durante os meses de novembro de 2021, até janeiro de 2022, primeiramente os indivíduos foram convocados através de uma carta convite divulgada nas redes sociais, após confirmar a participação, foi agendado uma entrevista individual por meio de plataforma virtual selecionada pelo participante. Neste momento, ressaltou-se sobre a importância de escolher um lugar que mantivesse sigilo e que fosse silencioso. A entrevista foi gravada em formato de vídeo, posteriormente transcrita e será arquivada por cinco anos pela pesquisadora responsável.

Durante a entrevista, foram aplicados dois questionários, o primeiro contendo informações sociodemográficas, como: idade, sexo, tempo de profissão e outras, o segundo, com questões norteadoras sobre a assistência de enfermagem nas consultas de pré-natal durante a pandemia do COVID-19.

As questões norteadoras estabelecidas inicialmente foram: 1) Você sentiu mudanças relevantes no seu primeiro atendimento à gestante assim que iniciou a pandemia durante a assistência de enfermagem nas consultas de pré-natal? 2) Houve a necessidade de interromper e/ou adiar algumas consultas em consequência da pandemia do COVID-19? 3)Você pode relatar sobre a sua experiência em prestar atendimento às gestantes ao qual sabe-se que faz parte da população de risco do COVID-19, houve medo, insegurança da sua parte ao realizar esta assistência? 4) Você sentiu que houve preparo da instituição em que você atua para prestar assistência às gestantes frente à nova realidade imposta pela COVID-19? 5) Você se sentiu preparado para atendê-las frente à nova realidade imposta pela pandemia? 6) Quais foram as principais dificuldades enfrentadas no atendimento às gestantes durante as consultas de pré-natal em tempos de pandemia? 7) Na sua percepção, houve defasagem na assistência prestada? 8) Quais mudanças você pontuaria, ao comparar a assistência de enfermagem durante as consultas de pré-natal no momento de pré-pandemia e pós-pandemia?

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética de Pesquisas em Seres Humanos (CEP) da Universidade São Judas Tadeu, após a aprovação, o TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido) foi explicado e assinado.

 

Resultados e discussão

 

Ao total, foram entrevistadas 7 enfermeiras ao qual efetuaram atendimento para as gestantes nas consultas de pré-natal antes e durante a pandemia do COVID-19. A faixa etária foi entre 24 e 40 anos e a média de idade foi de 29 anos. Todas referiram apresentar titulação na área. Os relatos coletados demonstraram que, 2 (28,57%) das entrevistadas atuavam de forma autônoma e 5 (71,43%) nos serviços públicos de saúde. Considerando o local em que as entrevistadas residem, 6 (85,88%) destas são do estado de São Paulo, e 1 (14,28%) é do estado de Minas Gerais.

A análise interpretativa das narrativas possibilitou a elaboração de quatro categorias, as quais são descritas a seguir.

 

As principais mudanças relacionadas ao atendimento na assistência de pré-natal durante a pandemia do covid-19

 

Essa primeira categoria apresenta a percepção das participantes em relação às mudanças de comportamento que a pandemia trouxe às consultas de pré-natal.

Um dos papéis cruciais do profissional de enfermagem nas consultas de pré-natal é enfatizar a importância da educação em saúde a qual é propagada para as gestantes compreendê-las como uma ação prévia de promoção da saúde, possibilitando que o público conscientemente consiga tomar decisões que influenciam o processo saúde/doença [9,10].

Em consequência da pandemia por COVID-19, as informações acerca das medidas de prevenção contra o vírus Sars-Cov-2, como: higienização correta das mãos com sabão e álcool em gel, uso adequada das máscaras, entre outros, se tornaram um tópico essencial a ser abordado durante as consultas de pré-natal [11].

Verificou-se nos discursos das participantes que, inicialmente, a pandemia trouxe uma nova cultura amplamente apontada pelas profissionais entrevistadas, assim como estudos realizados.

 

“Eu sempre trabalho muito com educação em saúde, acho que isso é que salva em tudo né, educação em todos os pontos, mas educação em saúde é muito importante porque o pré-natal não é só você medir a barriga da gestante, ouvir batimentos, pesar ela e tchau.” E1

“Eu pelo menos implementei isso no meu atendimento, obviamente antes não existia COVID, então não falava o que poderia acontecer e tal. Hoje eu falo o que pode acontecer se ela pegar COVID, os cuidados, e a gente ainda reforça os cuidados que já conhecemos de prevenção e fala das consequências né, realmente pra ela e para o bebê, assim elas tomam mais cuidados ainda compreendendo o que pode acontecer.”E1

 

As modificações advindas da nova realidade, trouxeram à tona a adição de novas tecnologias em saúde de modo a beneficiar os pacientes e profissionais.

Conseguinte, frente ao cenário, onde pouco sabia-se sobre a doença, muitas unidades de saúde apresentavam-se inseguras ao prestar assistência aos seus dependentes, para apaziguar esta situação com o objetivo de diminuir faltas e cancelamento de consultas, algumas estratégias com o uso da tecnologia foram adotadas, dentre elas houve a utilização da telemedicina definida por Maldonado [12] como: “o uso das tecnologias de informação e comunicação na saúde, viabilizando a oferta de serviços ligados aos cuidados com a saúde especialmente nos casos em que a distância é um fator crítico” [13,7].

Para promover maior segurança às gestantes e ao feto, durante o espaçamento das consultas aconselhado pelo “Manual de recomendações para assistência à gestante e puérpera frente a pandemia do COVID-19”[14], tornou-se viável a utilização das teleconsultas ao qual é uma das especificidades da telemedicina, sendo definida como o atendimento remoto com o profissional especializado [15].

Dessa forma, as entrevistadas relataram sobre a efetividade da utilização dessa inovação tecnológica quando necessário.

 

“Como o COREN aconselhou, foi permitindo também a telemedicina, ajudou bastante então a gente fazia muitas consultas online, avaliava as consultas e os exames, enfim tudo online, solicitava também os exames que ela fizesse, para ela ir no hospital e fazer um exame ou outro...” E1

“O próprio município de São Paulo se preparou bem até, com essa questão de introduzir a telemedicina também nesse momento que precisou.” E6

 

Outra mudança observada, foi em relação aos direitos da gestante. O Programa de Humanização no Pré-Natal e Nascimento instituído pelo Ministério da Saúde, de acordo com a portaria n° 569 de 2000, apresenta dentre suas diretrizes e princípios o direito da mulher em conhecer a maternidade escolhida para realizar o parto e obter a participação do acompanhante de sua escolha [16].

Entretanto, estudos mostraram que houve a impossibilidade de flexibilizar o comparecimento do acompanhante e a visita à maternidade durante as consultas de pré-natal, justificado por instituições como sendo uma medida de prevenção ao COVID-19 [17].

 

“O acompanhante tinha que ficar lá fora da unidade, elas tinham que entrar sozinhas, muitas delas reclamavam, porque não dava pra ficar lá dentro, as salas são pequenas, então a gente recomendava que o acompanhante ficasse do lado de fora da sala...” E4

“Naquele espaço que ela tinha direito de levar 1 acompanhante para conhecer a maternidade e já começar a ter um primeiro contato de onde ela ficaria ali, pelo menos as 48 horas como puérpera de pós-operatório, por força de circunstância, isso teve que ser bloqueado...” E7

 

O medo vivenciado pelos profissionais de enfermagem no contexto

 

Perante dados coletados na literatura atual, um sentimento que protagoniza a rotina dos profissionais de enfermagem frente a situação pandêmica pelo COVID-19, por se tratar de uma doença recente e com alto teor de transmissibilidade, é o medo e a insegurança ao realizar sua função pela possibilidade de contaminar-se e propagar o vírus para seus entes queridos e o público dependente de sua assistência [18,19].

 

“Houve um medo da doença do COVID com relação assim, a gente não sabia o que estava acontecendo...”E2

“O receio mesmo era ter o contato com o paciente sintomático e passar para gestante.”E5

 

 O preparo em prestar assistência frente a nova realidade

 

A literatura atual revela que a situação pandêmica influenciou no surgimento de debilidades dos serviços de saúde relacionados à organização de seus fluxos de trabalho e informação, impactando diretamente no preparo dos funcionários atuantes na área [17].

Ademais, há artigos que evidenciam a falta de comprometimento do governo com muitos profissionais, sendo necessário aos órgãos de saúde dispor de infraestrutura e demais condições para que os mesmos executassem sua função obtendo bem-estar e segurança [19].

 

“Preparo não acho que tenha tido, teve algumas orientações gerais. O que a gente fez mais de preparo, foi relacionado a estrutura da unidade e foi algo interno mesmo, cada unidade pelo município acabou funcionando de uma forma... Mas senti que eles poderiam ter preparado melhor a gente para atender, em especial as gestantes.” E5

 

Em contrapartida, nos dados coletados, houve relatos de profissionais autônomos e atuantes em serviços públicos de saúde que sentiram-se preparados para lidar com os desafios impostos pelo novo vírus, através da busca de cursos e referências contento experiências e informações fidedignas a respeito do assunto.

 

“Eu acho que me senti mais preparada depois que eu fui atrás de estudar mesmo, e principalmente depois que eu peguei alguns casos de gestantes com COVID e das repercussões que deu, ai me deu muito mais experiência para falar do assunto.”E1

“Todo dia eu falava com a minha supervisora, todo dia a gente tinha uma reformulação de protocolo, a gente revia os protocolos, tivemos tempo no serviço para fazer isso... Porque o serviço parou né?! Só pra atendimento de COVID mesmo, então durante esse período a gente teve esse tempo tanto para preparação de protocolos, vamos discutir juntos, vamos pensar juntos, vem aqui supervisora, explica pra gente, fizemos vários cursos, então eu fiz curso tanto móvel quanto presencial antes da pandemia chegar no Brasil pra que a gente se preparasse.” E3

 

As principais dificuldades enfrentadas

 

Segundo o estudo realizado por Reis et al. [17] várias gestantes se ausentaram durante as consultas de pré-natal, referindo que o principal motivo foi pelo medo da exposição à nova doença e suas consequências ao feto devido à escassez de informação sobre o assunto no início do período pandêmico.

 

“A primeira coisa foi realmente abandono de algumas gestantes no pré-natal ou até mesmo do próprio hospital desmarcando as consultas, como era uma coisa muito assim... Da gente não saber com o que estava lidando então todo mundo realmente ficou com esse medo do que poderia repercutir para mãe e para o bebê.” E1

 

Além do abandono efetuado pelas gestantes, muitas unidades de saúde optaram pela suspensão e o cancelamento das consultas no início da pandemia, dificultando a continuidade da assistência [13].

 

 “Houve a necessidade de cancelamento e adiamento das consultas.” E7

“Com a agenda bloqueada ficamos bastante tempo, em média de 5 a 6 meses.”E7

 

Outra dificuldade enfrentada foi o egresso de profissionais durante a pandemia. Costa et al. [20], em seu estudo, evidenciam que houve diversos afastamentos de profissionais da saúde por estarem incluídos nos grupos de risco à doença, além de apresentarem incertezas quanto às características do novo vírus responsável pela pandemia.

Nesse sentido, de acordo com as informações coletadas, muitos profissionais foram referenciados a outros setores e unidades, havendo a necessidade do remanejamento quase constante dos funcionários.

 

“Olha, as principais dificuldades foram: RH insuficiente, porque no período eu lembro que quando estava no pico eu tinha um auxiliar só de enfermagem, e lá na minha unidade tem que ter quatro... Então as dificuldades maiores foram a falta do RH e o espaço mesmo da unidade que é bem limitado.” E4

“Teve também um remanejamento da equipe de enfermagem muito maior, então as auxiliares, técnicas começaram a ter uma rotatividade muito maior.” E5

 

Ademais, ao analisar as narrativas coletadas conectadas ao referencial teórico, notou-se que a barreira física entre profissional e gestante também foi perceptível como dificuldade na assistência durante o período pandêmico, tanto pela adoção de inovações tecnológicas como o teleatendimento, quanto à instituição das medidas obrigatórias de prevenção contra o novo vírus.

 

“O mais difícil também foi em questão do toque, em uma consulta de gestante a gente tem que ter uma proximidade muito grande e a gente faz um toque diferenciado, toca na barriga dela, chegamos próximo a ela, então isso no começo foi bem difícil tanto para o profissional quanto para a gestante.” E6

 

Além disso, o presente estudo demonstra que a utilização deste método pode causar defasagem no atendimento, interferindo na qualidade visto que há possibilidade do surgimento de diagnósticos equivocados, já que não há o contato presencial entre paciente e profissional [21].

 

”Em uma teleconsulta você não vai mensurar a barriga, você não vai acompanhar batimentos cardiofetais, então ficou bem prejudicado nessa questão. Até nesse momento ainda fazemos teleconsultas, hoje elas (as gestantes) até estão frequentando mais a UBS, a gente acaba fazendo a teleconsulta para aquela gestante faltosa, que faz mais de quarenta dias que não vem.” E6

 

Mesmo com as dificuldades de implementação desta metodologia e questionamentos quanto a sua autenticidade, é notório que essas vivências compartilhadas de forma virtual têm oferecido suporte a essas mulheres fazendo com que ambas passem pelo período gestacional com sentimento de acolhimento [22].

Ao observar as narrativas coletadas, o profissional enfermeiro vivenciou mudanças, medos, inseguranças quanto ao preparo e dificuldades ao designar o atendimento para essas mulheres.

 

Conclusão

 

O presente estudo permitiu descrever os principais desafios enfrentados por enfermeiros no atendimento às gestantes durante as consultas de pré-natal em meio a pandemia do COVID-19, através da análise de referenciais teóricos em conjunto com as informações coletadas durante as entrevistas.

Dessa forma, foi possível observar que a pandemia vem desafiando a todos profissionais da saúde, pela insegurança, pelas evidências na escassez de materiais de proteção e pelos ambientes de saúde que necessitam se adequar e se estruturar com o decorrer da evolução da doença no mundo.       

Além disso, acredita-se que a elaboração desta pesquisa possa contribuir para o entendimento da vivência da equipe de enfermagem em uma pandemia sem precedentes, no âmbito dos desafios enfrentados, mudanças de rotina e novas perspectivas pós-pandemia e que mais estudos deverão ser realizados a fim de aprofundar o conhecimento no assunto.

 

Conflito de interesses

Não há conflitos de interesses.

 

Fontes de financiamento

Não houve fontes de financiamento.

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Cesar LC, Magaldi FM; Coleta de dados: Cesar LC, Magaldi FM; Análise e interpretação dos dados: Cesar LC, Magaldi FM; Redação do manuscrito: Cesar LC, Magaldi FM, Lima LVR, Silva GC, Rosado SR; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Cesar LC, Magaldi FM, Lima LVR, Silva GC, Rosado SR.

 

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