Enferm Bras. 2023;22(1):51-63

doi: 10.33233/eb.v22i1.5329

ARTIGO ORIGINAL

Validação de instrumento para o risco clínico de criança hospitalizada

 

Thalys Maynnard da Costa Ferreira1, Ronny Anderson de Oliveira Cruz1, Wellyson Souza do Nascimento1, Josefa Danielma Lopes Ferreira1, Marta Miriam Lopes Costa5, Kenya de Lima Silva1

 

1Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, PB, Brasil

 

Correspondência: Ronny Anderson de Oliveira Cruz, Universidade Federal da Paraíba, Centro de Ciências da Saúde - Campus I, Rodovia BR-230, Brisamar, João 58033455 Pessoa, PB

 

Como citar

Ferreira TMC, Cruz RAO, Nascimento WS, Ferreira JDL, Costa MML, Silva KL. Validação de instrumento para o risco clínico de criança hospitalizada. Enferm Bras. 2023;22(1):51-63. doi: 10.33233/eb.v22i1.5329

 

Resumo

Objetivo: Averiguar a validade clínica de um instrumento para coleta de dados quanto à capacidade de mensurar as necessidades humanas básicas através do risco clínico de crianças entre 0 e 5 anos hospitalizadas. Métodos: Estudo metodológico, com abordagem quantitativa, realizado com 150 crianças em uma clínica pediátrica de um hospital escola. Resultados: Confirmou-se a existência dos grupos de baixo, médio e alto risco clínico. Quanto à diferenciação das crianças inseridas nos respectivos grupos, apresentou-se um Tukey test com escore total médio de 114,13 para alto risco. Como produto da aplicação do modelo descritivo de classificação binária Weight of Evidence, verificou-se alteração prioritária das necessidades de eliminação e nutrição. Após análise de agrupamento hierárquico, consolidou-se a informação de que houve grande similaridade entre as necessidades nutrição e hidratação, segurança e crescimento. Conclusão: Clinicamente, o instrumento mostrou-se válido quanto à capacidade de mensurar as alterações a partir do risco clínico.

Palavras-chave: criança hospitalizada; estudos de validação; processo de enfermagem; Enfermagem.

 

Abstract

Validation of instrument for clinical risk to hospitalized child

Objective: To investigate clinical validity of an instrument for data collection regarding the measuring capacity of basic human needs through the clinical risk of hospitalized children between 0 to 5 years. Methods: Methodological study, with a quantitative approach, carried out with 150 children in a pediatric clinic of a teaching hospital. Results: The existence of low, medium and high clinical risk groups was confirmed. Regarding the differentiation of children inserted in respective groups, it was presented a Turkey Test with a medium total score of 114,13 for high risk. As a product of the application of the descriptive model of binary classification, Weight of Evidence, a priority change in the needs for elimination and nutrition was verified. After analyzing a hierarchical grouping, it was consolidated that there was great similarity between nutrition, hydration, security and growth needs. Conclusion: Clinically, the instrument proved to be valid in terms of capacity to measure changes based on clinical risk.

Keywords: child, hospitalized; validation studies; nursing process; Nursing.

 

Resumen

Validación de instrumento por riesgo clínico al niño hospitalizado

Objetivo: Investigar la validez clínica de un instrumento de recolección de datos sobre la capacidad de medir las necesidades humanas básicas a través del riesgo clínico de niños hospitalizados de 0 a 5 años. Métodos: Estudio metodológico, con abordaje cuantitativo, realizado con 150 niños en una clínica pediátrica de un hospital universitario. Resultados: Se confirmó la existencia de grupos de riesgo clínico bajo, medio y alto. En cuanto a la diferenciación de los niños en los respectivos grupos, se presentó una prueba de Tukey con una puntuación total media de 114,13 para alto riesgo. Producto de la aplicación del modelo descriptivo de clasificación binaria Peso de Evidencia, se produjo un cambio prioritario en las necesidades de eliminación y nutrición. Después de analizar una agrupación jerárquica, se consolidó la información de que existía gran similitud entre las necesidades de nutrición e hidratación, seguridad y crecimiento. Conclusión: Clínicamente, el instrumento demostró ser válido en cuanto a su capacidad para medir cambios en función del riesgo clínico.

Palabras-clave: niño hospitalizado; estudios de validación; proceso de enfermería; Enfermería.

 

Introdução

 

Sistematizar a assistência é a chave para a redução do impacto que o cuidar minucioso e complexo da criança hospitalizada traz ao processo de trabalho dos profissionais que atuam em pediatria hospitalar. Além disso, através do Processo de Enfermagem (PE), o enfermeiro se torna o agente central do cuidado direcionado e resolutivo, fundamentando cada etapa de sua atuação sob o saber clínico e técnico-científico, desde o levantamento de dados pertinente ao histórico de enfermagem, até a alta da criança após concluídas as etapas do PE [1].

Ser capaz de conduzir o trabalho por meio de ferramentas que tragam subsídios ao profissional e sua equipe é um dos objetivos que configuram o trabalho do enfermeiro como essencial na pediatria, tornando assim o uso de instrumentos para o cuidar notoriamente necessário [2,3].

Contemplar a condução diagnóstica do enfermeiro por intermédio do levantamento de informações voltadas às características clínicas da criança hospitalizada, fazendo com que se evidencie o risco inerente ao estado atual de saúde da criança atendida e cuidada, torna-se uma nuance a ser discutida e trabalhada, visando o alcance da associação efetiva entre a identificação da condição clínica infantil e o estabelecimento do seu potencial risco. É conseguir aprimorar o cuidar através de uma estratégia concisa, resolutiva e eficaz [2,3].

Para tanto, a construção de instrumentos e a utilização de ferramentas válidas que priorizem o cuidar assistencial têm se tornado alvo de pesquisas, sobretudo aquelas que vislumbram oportunizar a aplicação das etapas do PE às crianças hospitalizadas pelo adoecimento [4].

No que tange à validação clínica de um instrumento, esta compreende a confirmação, no ambiente clínico, dos indicadores empíricos de um instrumento, avaliados pelos especialistas. Para a sua realização, é necessária a anamnese, para a coleta de dados de natureza emocional, social e espiritual; e o exame físico, para os dados de natureza fisiológica [5].

Logo, buscando contribuir para um cuidado efetivo junto ao aprimoramento da atuação do enfermeiro voltado ao raciocínio clínico e diagnóstico, preditivos para a identificação do risco de saúde da criança hospitalizada, desenvolveu-se o estudo em tela, baseando-se nas alterações das necessidades humanas básicas (NHBs) da criança, tendo em vista a ampliada compreensão do quadro de saúde a partir delas, configuradas como essenciais para a identificação das demandas da criança e, por sua vez, do seu risco.

Portanto, o estudo teve como objetivo averiguar a validade clínica de um instrumento para coleta de dados quanto à capacidade de mensurar as necessidades humanas básicas através do risco clínico de crianças entre 0 a 5 anos hospitalizadas.

 

Métodos

 

Trata-se de um estudo metodológico, com abordagem quantitativa, desenvolvido nas seguintes etapas: validação do conteúdo do instrumento de coleta de dados e operacionalização da validação clínica do instrumento.

O presente estudo foi desenvolvido em uma unidade de clínica pediátrica do Hospital Universitário Lauro Wanderley, situado no município de João Pessoa/PB, no período de janeiro a março de 2019. Fizeram parte crianças que se encontravam em processo de admissão hospitalar, inseridas na faixa etária de 0-5 anos, selecionados de forma não probabilística, por conveniência.

Para determinar o tamanho amostral, levou-se em consideração o quantitativo de crianças atendidas no serviço de clínica pediátrica em um período de um ano. A partir disso, identificou-se um quantitativo populacional de 1463 crianças atendidas durante o transcorrer de um ano, destas, 766 (52,3%) se configuraram menores de 5 anos. Devido à demanda de crianças inclusas na faixa etária de 0 a 5 anos atendidas no referido serviço em um ano (766), consolidou-se uma população de tamanho 192 (766/4) para coleta em quatro meses. Assim, para uma amostra de 150 crianças, atingiu-se uma fração amostral de 78,5%. O valor obtido no cálculo de delineamento amostral foi de 148,68, adotando-se 150 pacientes, alcançando-se uma confiança de 96% com erro de 4%.

Como critérios de inclusão, assumiu-se: crianças em processo de admissão hospitalar pelo enfermeiro (implementação do histórico de enfermagem); hospitalizadas na clínica pediátrica; e como critérios de exclusão: crianças que excedessem 48 horas de hospitalização; crianças internadas para execução de tratamentos pontuais com critério de alta após término (pulsoterapia); ausentes da clínica pediátrica no momento da execução do estudo.

O instrumento, base empírica para realização do estudo em tela, é composto por duas partes que caracterizam a necessidade da coleta de dados proposta pela primeira etapa do processo de enfermagem. Primeiro, registra-se as características sociodemográficas e informações inerentes ao percurso hospitalar da criança: diagnóstico médico, queixa principal e histórico de internações. Em seguida, encontram-se as 16 variáveis representadas pelas NHBs, em que é feito o registro do estado inicial de saúde da criança admitida no setor de clínica pediátrica, por meio de sinais, sintomas e pareceres clínicos, os quais são identificados e julgados pelo enfermeiro. O conteúdo clínico inerente às necessidades/variáveis é apresentado de acordo com a teoria das Necessidades Humanas Básicas proposta teórica de enfermagem Wanda Aguiar Horta.

O seguimento ao processo de validação do instrumento respeitou as seguintes etapas:

 

1ª etapa: validação do conteúdo do instrumento de coleta de dados

 

O instrumento foi submetido à validação com expertises na área de pediatria e neonatologia, sendo selecionados sob os critérios de Ferhing estabelecidos e adaptados a este estudo, posteriormente submetidos ao processamento a partir das rodadas de retroalimentação da técnica Delphi [6,7].

Por sua vez, sob o parecer dos 11 especialistas, buscou-se através de 3 rodadas de envio e feedback entre juízes e o pesquisador, consolidar a concordância relacionada às correções e sugestões acerca do instrumento no tocante ao atendimento dos critérios de estruturação do conteúdo quanto à pertinência, sequência de itens e características clínicas analisadas nos domínios do instrumento. Além disso, objetivando unificar o julgamento dos escores inerentes à gravidade clínica da criança frente às variáveis representadas pelas NHBs no instrumento, os juízes se valeram da nomenclatura de 0- Sem risco clínico; 1-Baixo risco clínico; 2- Risco clínico moderado; 3- Alto risco clínico para que, após examinada a criança sob aplicação do instrumento, o escore de risco fosse estabelecido com a soma dos valores de cada variável, totalizando o escore geral.

As NHBs foram configuradas e quantificadas de acordo com cada domínio que compõe o instrumento, levando a uma sistemática de estratificação do risco clínico que a criança apresenta ao se inserir no ambiente hospitalar. Para melhor análise e compreensão dos pareceres clínicos e, consequentemente, quantificação e apreensão do quesito pertinente ao aspecto de mensurar que o instrumento propõe, elencou-se a estratificação do risco clínico como base para o transcorrer da validação clínica da ferramenta. Os especialistas realizaram a apreciação de cada item (Necessidade Humana Básica) do instrumento com o intuito de se alcançar a validação.

 

2ª etapa: operacionalização da validação clínica do instrumento

 

O instrumento estruturado já se mostrando válido, quanto ao conteúdo e portando os indicadores de risco clínico assistencial da criança, foi aplicado por dois enfermeiros especialistas em pediatria e neonatologia. A avaliação clínica criteriosa da criança foi realizada através do exame físico e anamnese pediátrica durante a admissão.

Na etapa de validação do conteúdo, o instrumento foi quantificado frente à análise crítica e clínica dos experts selecionados para a atividade estratificatória, como descrito na etapa 1. Sendo assim, apresentou-se uma medida denominada escore total (soma dos pesos atribuídos aos itens do instrumento) que, por sua vez, representa a gravidade clínica do quadro de saúde apresentado pela criança, obtido com a soma dos escores de cada dimensão inerente ao instrumento, que se buscou ser validado.

Logo, ao aplicar o instrumento, somou-se a pontuação obtida em cada dimensão com os respectivos pesos atribuídos a cada item e, esta soma, conflui no resultado pertinente ao escore total obtido pela criança examinada durante o histórico de enfermagem. Compreende-se então que quanto maior o escore total mais representatividade de um índice com maior gravidade no estado clínico da criança se evidencia.

Para classificação do referido risco, o escore total foi dividido em três categorias. A primeira foi representada pelos 25% menores escores totais (escores abaixo do quartil 1), a qual corrobora o menor risco de saúde, seguida do segundo grupo em que os escores totais situam-se entre o quartil 1 e o quartil 3 (50%), configurando um médio risco de saúde e, o terceiro grupo, caracterizado por possuírem os 25% maiores escores totais (maiores do que o quartil 3), representados por um quadro de saúde mais grave.

Estes grupos foram denominados de Risco Baixo, Médio e Elevado de acordo com o fracionamento dos quartis e as características do perfil numérico inerente a cada um deles em consonância com o risco da criança atendida.

Os dados clínicos foram tabulados, exportados ao software Statistical Package Science Social (SPSS), versão 20.0 e processados pela análise estatística. Para isso, utilizou-se a análise de variância seguida do teste de K-means (Cluster Analysis) como método de agrupamento e o Tukey Test, bem como o modelo descritivo de classificação binária sob o Weight of Evidence (WoE) e análise de agrupamento (AA) para confirmação validatória [8].

O estudo considerou os preceitos éticos das normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos, sendo aprovado sob parecer consubstanciado n° CAAE 76649517.3.0000.5183.

 

Resultados

 

Para a construção do percurso validatório, no tocante à validação do conteúdo do instrumento realizada previamente à validação clínica, alcançou-se um consenso quantificado entre 80% e 95% dos juízes, contemplando pertinência do Conteúdo, Sequência Adequada e Estratificação do Risco Clínico inerente às variáveis e os respectivos itens de cada uma delas, levando em consideração o valor de 75% como critério mínimo para concordância entre juízes [9]. Calculou-se o índice de validade do conteúdo (IVC) e Kappa (K) para cada variável do instrumento e, o IVC/Kappa geral, sendo estes últimos evidenciados pelos valores de 0,94 e 0,71, julgados satisfatórios substancialmente, levando em consideração a referência de ≥ 0,75 e ≥ 0,61 para conteúdo e concordância válidos [10].

A escolha dos grupos de Risco Baixo, Médio e Elevado, mencionados no método do estudo em tela, pode ser confirmada como uma classificação aceitável que discrimina o estado de saúde em três categorias, discriminação que é confirmada com a aplicação do método de agrupamento (Cluster Analysis) K-means, cujo resultado mostra de forma significativa a existência de três grupos (valor-p < 0,001), conforme descrito no quadro 1.

 

Quadro 1Distribuição e comprovação da distinção dos grupos enquanto estratificação da classificação do risco clínico pediátrico da criança examinada. João Pessoa, PB, Brasil, 2020

 

Fonte: Elaborado pelo autor, 2020.

 

Após a aplicabilidade da Análise de Variância (ANOVA) para determinar se os três grupos de risco clínico (elevado, médio e baixo), determinados sob avaliação dos critérios de avaliação da criança submetida ao exame, apresentam diferenças significativas, obteve-se como resultado os dados descritos na Figura 1, onde os grupos criados pela análise apresentam diferença significativa, pois o p-valor é < 0,005, constatando-se inferencialmente que estes três grupos são distintos como forma classificadora do grau de risco da saúde da criança atendida pelo enfermeiro durante o levantamento de dados no histórico, atividade inerente à aplicação do instrumento.

A Figura 1 é a demonstração do produto da aplicação do modelo descritivo de classificação binária WoE que, por sua vez, calcula para cada variável independente (necessidade humana básica) sua influência sobre o desfecho Risco Elevado. Para a aplicação deste modelo, o risco foi dicotomizado em Risco Elevado e Baixo, sendo este último o que contempla as categorias Baixo e Médio.

 

 

Fonte: Elaborado pelo autor, 2020.

Figura 1Estado clínico de saúde da criança e as necessidades humanas básicas. João Pessoa, PB, Brasil, 2020

 

No que diz respeito à alteração clínica da criança submetida à anamnese e exame físico para levantamento de dados durante a aplicação do histórico enfermagem, consequentemente aumento do risco em seu estado de saúde, em ordem de importância de acordo com o maior valor informativo (0,0–1,5) foram Eliminação e Nutrição, classificadas como influência extremamente forte; Crescimento, Oxigenação, Segurança, Integridade da Pele, Regulação neurológica, foram classificadas como influência muito forte; Hidratação, como influência forte e, a necessidade de Percepção e Regulação térmica, como influência fraca (Figura 1).

A Figura 2 apresenta o dendrograma (diagrama de árvore) de uma Análise de Agrupamento Hierárquico (Cluster Analysis) com o método da Ligação Média (Avarage Linkage) e medida de distância euclidiana. Tal análise foi realizada com o objetivo de demonstrar a correlação da capacidade mensuratória do instrumento e o que se propõe analisar a partir de sua implementação (alterações nas NHBs da criança

 

 

Fonte: Elaborado pelo autor, 2020

Figura 2Agrupamento das necessidades humanas básicas conforme alteração hierárquica. João Pessoa, PB, Brasil, 2020

 

O dendrograma evidencia o agrupamento de informações clínicas levantadas a partir da interpretação das alterações evidenciadas nas crianças, que compuseram a amostra, sob estratificação dos agravos clínicos destas, demonstrados pela quantificação dos escores.

Evidenciou-se que as necessidades se alteram sob importância clínica e demanda das crianças, independente do grupo (risco baixo ou elevado) ao qual elas pertençam, porém o que as tornam distintas são as respectivas gravidades delimitadas pelo risco clínico de cada grupo, fator visto por exemplo na necessidade de eliminação, encontrada alterada em ambos, porém com características de gravidade distintas.

 

Discussão

 

Após a análise subsidiada pelo risco clínico das crianças submetidas ao processo de hospitalização, verificou-se que as demandas relacionadas à necessidade de eliminação prejudicada foram consideráveis, tendo em vista os itens que o instrumento possui e, consequentemente, analisa dentro da necessidade eliminação.

Alterações gastrointestinais são corriqueiras nas crianças, principalmente na primeira e segunda infância, em decorrência de fatores como o processo incompleto de formação da microbiota intestinal e exposição a agentes diarreicos e inflamatórios da mucosa intestinal e gástrica, culminando em doenças gastrointestinais que levam a criança à hospitalização. Para o público pediátrico que enfrenta a hospitalização em busca de tratar afecções gastrointestinais, principalmente no que concerne às infecções intestinais, gastroenterocolites agudas e alterações propriamente ditas alternativas a procedimentos enterorráficos (fechamento de ostomias), característico de crianças que possuem comorbidades crônicas, é comum alterar a necessidade de eliminação [11].

Além disso, doenças do trato urinário, como infecções urinárias de repetição e glomerulonefrite difusa aguda são apontadas como fatores que levam a alteração da necessidade eliminação tão evidentemente demonstrada. Os distúrbios hidroeletrolíticos (DHEs) contribuem também para o aumento do quadro de necessidade eliminatória em pediatria, valendo ressaltar a presença destes no grupo de crianças avaliadas com o histórico de enfermagem em estudo [12].

Com a perda volêmica, conteúdo intestinal e até mesmo gástrico, a criança fica propensa à perda efetiva de nutrientes e, em casos graves, pode alcançar quadros de desnutrição. As necessidades humanas de eliminação e nutrição se inter-relacionam fortemente, principalmente no que diz respeito à mensuração de fatores que levam a criança a apresentar tais alterações, objeto de busca do instrumento em pesquisa. A aceitação alimentar, sua via de administração bem como seu estado geral nutricional levantam informações reais necessárias ao enfermeiro para o seu julgamento clínico sobre o quadro nutricional e de doença da criança tornando o instrumento efetivo em seu atributo [13].

A influência muito forte das necessidades de crescimento, oxigenação, segurança, integridade física e cutaneomucosa e regulação neurológica, evidenciam-se na representação devido à grande contribuição biológica e decisória ao quadro de saúde da criança. Diante do que se avalia no instrumento, a aplicabilidade deste em um público de crianças atendidas em clínica pediátrica condiz com as alterações físicas inerentes aos domínios clínicos das necessidades.

A necessidade de regulação do crescimento celular, em pediatria, contempla as alterações relacionadas aos eventos dos marcos do desenvolvimento e crescimento, sendo assim identificados de forma cautelosa durante a hospitalização quando alterados, não alcançados, pela criança inserida no ambiente de clínica. Além disso, explica-se a necessidade de segurança, amor e gregária, associada à necessidade de regulação do crescimento e desenvolvimento, dentro do mesmo espectro de importância clínica, pelo fato da impetração de reconhecimento psicossocial e emotivo da criança no transcorrer da sua maturação neuronal e cognitiva, adquirindo o discernimento sobre o que a cerca e, assim, permitindo a expressão durante o exame clínico do enfermeiro dos fatores psicoemocionais inseridos no instrumento (ansiedade, irritabilidade, apatia, agressão, medo, expressão de sentimentos por outras pessoas, agarra-se ao acompanhante na presença de outras pessoas), a fim de identificá-los e registrá-los mediante análise do profissional [14].

No que tange à oxigenação, o risco de vida é considerado iminente quando se instalam afecções respiratórias em uma criança de 0 a 5 anos, tornando a oxigenação em pediatria clínica algo vital, sendo o enfermeiro responsável pela condução e estabelecimento de cuidados respiratórios em quadros de importante alteração desta necessidade. Sob a perspectiva de implementação do instrumento, avaliar sinais preditivos de sofrimento respiratório como conduta em anamnese clínica de enfermagem para a tomada de decisão é primordial para o cuidado, pois modifica a situação de agravo da criança e atua sob a perspectiva de reversão oportuna do quadro crítico de oxigenação quando instalado [15].

Já no que concerne à necessidade de integridade física e cutaneomucosa, o rastreio das condições da pele e suas afecções em pediatria leva o instrumento a possuir alto valor clínico, tendo em vista que os itens que o compõem levam à identificação precisa das alterações tópicas da criança, facilitando o trabalho clínico do enfermeiro enquanto agente identificador de indicadores clínicos que levam ao diagnóstico de enfermagem e suas respectivas intervenções [16].

A necessidade de regulação neurológica tem efetiva contribuição em crianças com doenças crônicas, objeto de cuidado intrínseco à aplicabilidade do instrumento em clínica pediátrica. Ter um instrumento que contempla uma avaliação do estado geral de consciência, bem como alberga as minuciosidades pertinentes ao exame neurológico infantil, fatores neuromotores afetados pela cronicidade das doenças degenerativas, reflexos primitivos, histórico de afecções convulsivas e compatibilidade do estado neurológico à idade de etapa do desenvolvimento atual, torna essencial e comprovada a pertinência dessa necessidade no estudo [17].

A necessidade de hidratação, regulação hídrica e eletrolítica se apresentou como fator de influência forte, deixando clara a evidência de que as ações de caráter clínico de enfermagem, no histórico, são pertinentes no que diz respeito à detecção do estado inicial de hidratação da criança, mensuração do risco quanto à perda hídrica e à demanda de reposição de substâncias hidroeletrolíticas, tendo em vista a depreciação do quantitativo de eletrólitos e líquidos a cada afecção detectada durante a hospitalização que leva ao estabelecimento do quadro hídrico prejudicado [18].

Observa-se que, tanto na Figura (2a) como em (2b), a necessidade de Eliminação se distingue das demais, fato já verificado na Figura 1. Há grande similaridade entre as necessidades Nutrição e Hidratação, como também entre as necessidades Segurança e Crescimento. Além disso, a necessidade de oxigenação apresenta-se dentro dos dois grupos dicotomizados, enfatizando sua grande demanda clínica e importância analítica frente ao público pediátrico. Portanto, mesmo que os pacientes sejam classificados em grupos de risco elevado e baixo, comprovou-se que a hierarquia de suas necessidades é similar, sendo provável que a diferença é a gravidade de seu quadro clínico, fator este que demarca enfaticamente a importância da delimitação do risco clínico da criança durante o processo de análise do enfermeiro de suas demandas de saúde, através da expressão das necessidades.

No que concerne à criança, autores demonstram a evidência de que as alterações clínicas podem ser mensuradas conforme estratificação de valores e a predição de tomadas de decisão sob julgamentos frente à aplicabilidade do uso de ferramentas durante a assistência de enfermagem, levando a melhorias no cuidado e precisão na medida do atributo o qual o instrumento propõe medir [18,19].

Apresenta-se como limitação do estudo o desenvolvimento do processo de validação clínica em apenas um cenário de pesquisa, havendo abertura para que os resultados se concentrem e traduzam apenas uma realidade, distanciando de outras instituições.

 

Conclusão

 

Diante destas considerações, explicita-se que o instrumento se mostra válido para a avaliação clínica não somente das crianças-alvo, mas também das que serão avaliadas por este instrumento na aplicabilidade clínica do enfermeiro. Desta forma, vale ressaltar que se cumpriu o objetivo de estabelecer uma forma de, utilizando o instrumento para levantamento de dados clínicos da criança hospitalizada, cumprir o requisito da primeira etapa do processo de enfermagem (coleta de dados), além de detectar o risco da gravidade do quadro de saúde da criança, comprovando a capacidade de mensurar o fator clínico que se propõe avaliar com o instrumento em questão a partir da evidente estratificação estabelecida.

 

Conflitos de interesse

Não há conflitos de interesse.

 

Fontes de financiamento

Não houve fonte de financiamento.

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Ferreira TMC, Costa MML, Silva KL; Coleta de dados: Ferreira TMC; Análise e interpretação dos dados: Ferreira TMC, Costa MML, Silva KL; Análise estatística: Ferreira TMC; Redação do manuscrito: Ferreira TMC, Cruz RAO, Nascimento WS, Ferreira JDL; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Ferreira TMC, Costa MML, Cruz RAO, Nascimento WS, Ferreira JDL

 

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