Enferm Bras. 2023;22(1):6-19

doi: 10.33233/eb.v22i1.5374

ARTIGO ORIGINAL

Perfil clínico-epidemiológico da hanseníase no município de Coroatá/MA

 

Fabiane Melquiades Matos1, Maurienne Araújo Pereira2, Adrielly Haiany Coimbra Feitosa3, Luzia Helena Silva Chaves Viana4, Márcia Daiane Ferreira da Silva1, Kezia Cristina Batista dos Santos1

 

1Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), São Luiz, MA, Brasil

2Secretaria Municipal de Saúde de Paço do Lumiar, Paço do Lumiar, MA, Brasil

3Hospital Macrorregional Tomás Martins, Santa Inês, MA, Brasil

4Docente do Centro Universitário UNIPLAN, Brasília, DF, Brasil

 

Recebido em: 30 de dezembro de 2022; Aceito em: 8 de fevereiro de 2023.

Correspondência: Kezia Cristina Batista dos Santos, e-mail: kezia_cristinabs@hotmail.com

Como citar

Matos FM, Pereira MA, Feitosa AHC, Viana LHSC, Silva MDF, Santos KCB. Perfil clínico-epidemiológico da hanseníase no município de Coroatá/MA. Enferm Bras. 2023;22(1):6-19 doi: 10.33233/eb.v22i1.5374

 

Resumo

Objetivo: Caracterizar o perfil clínico-epidemiológico dos casos de hanseníases no município de Coroatá, Maranhão. Métodos: Estudo epidemiológico, retrospectivo, descritivo e quantitativo. Utilizaram-se dados de pacientes com hanseníase, referentes ao período de 2012 a 2021, obtidos a partir da base de dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação, disponibilizados pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde. Resultados: No período analisado, notificaram-se 646 casos de hanseníase. Observou-se maior frequência no sexo masculino (56,7%) e na faixa etária de 15-59 anos (60,1%). Quanto aos aspectos clínicos, 56,3% eram da forma dimorfa, 74,9% classificados como multibacilar e 60,1% sem incapacidades físicas. Apresentaram algum grau de incapacidade 226 casos (34,9%). O diagnóstico da hanseníase ainda é realizado tardiamente devido à detecção da classificação multibacilar e forma clínica dimorfa, além da presença de incapacidade física no momento do diagnóstico. Conclusão: Os resultados demonstraram que a hanseníase continua sendo um grave problema de saúde pública no município necessitando de implementação de políticas públicas que impactem diretamente nos indicadores para redução da doença.

Palavras-chave: hanseníase; perfil de saúde; saúde pública.

 

Abstract

Clinical-epidemiological profile of leprosy in the city of Coroatá/MA

Objective: To characterize the clinical-epidemiological profile of leprosy cases in the city of Coroatá, Maranhão. Methods: Epidemiological, retrospective, descriptive and quantitative study. Data from patients with leprosy were used, referring to the period from 2012 to 2021, obtained from the database of the Notifiable Diseases Information System, made available by the Department of Informatics of the Unified Health System. Results: In the analyzed period, 646 cases of leprosy were reported. The frequency was higher in males (56.7%) and in the 15-59 age group (60.1%). As for clinical aspects, 56.3% were borderline, 74.9% classified as multibacillary and 60.1% without physical disabilities. 226 cases (34.9%) presented some degree of disability. The diagnosis of leprosy is still carried out late due to the detection of the multibacillary classification and borderline clinical form, in addition to the presence of physical disability at the time of diagnosis. Conclusion: The results showed that leprosy remains a serious public health problem in the municipality, requiring the implementation of public policies that directly impact the indicators for reducing the disease.

Keywords: leprosy; health profile; public health.

 

Resumen

Perfil clínico-epidemiológico de la lepra en la ciudad de Coroatá/MA

Objetivo: Caracterizar el perfil clínico-epidemiológico de los casos de lepra en la ciudad de Coroatá, Maranhão. Métodos: Estudio epidemiológico, retrospectivo, descriptivo y cuantitativo. Se utilizaron datos de pacientes con lepra, referentes al período de 2012 a 2021, obtenidos de la base de datos del Sistema de Información de Enfermedades de Declaración Obligatoria, puesta a disposición por el Departamento de Informática del Sistema Único de Salud. Resultados: En el período analizado fueron notificados 646 casos de lepra. Hubo una mayor frecuencia en el sexo masculino (56,7%) y en el grupo de edad de 15 a 59 años (60,1%). En cuanto a los aspectos clínicos, el 56,3% eran limítrofes, el 74,9% clasificados como multibacilares y el 60,1% sin discapacidades físicas. 226 casos (34,9%) presentaron algún grado de discapacidad. El diagnóstico de lepra aún se realiza de forma tardía debido a la detección de la clasificación multibacilar y forma clínica borderline, además de la presencia de discapacidad física al momento del diagnóstico. Conclusión: Los resultados mostraron que la lepra sigue siendo un grave problema de salud pública en el municipio, lo que requiere la implementación de políticas públicas que impacten directamente en los indicadores para la reducción de la enfermedad.

Palabras-clave: lepra; perfil de salud; salud pública.

 

Introdução

 

A hanseníase é uma doença infectocontagiosa crônica, causada pelo Mycobacterium leprae, que se manifesta de forma lenta, por meio de sinais e sintomas dermatoneurológicos. Infecta os nervos superficiais da pele e troncos nervosos periféricos, podendo causar incapacidades físicas e deformidades [1].

A transmissão ocorre pelas vias aéreas superiores e por contato próximo e prolongado entre pessoas contaminadas e pessoas suscetíveis. O bacilo é eliminado no ar por gotículas de saliva, tosse e espirro, no entanto, com o início do tratamento a transmissão é interrompida. A hanseníase tem um longo período de incubação geralmente de dois a sete anos, antes do aparecimento dos sintomas. Acomete pessoas de ambos os sexos, idade e classe social [2].

O diagnóstico é clínico, com base na história epidemiológica do paciente. Realiza-se o exame físico geral e dermatoneurológico para identificação de lesões com perda de sensibilidade térmica, dolorosa e tátil, assim como palpação dos nervos periféricos e comprometimento das suas funções. Exames laboratoriais como a baciloscopia de raspado intradérmico ou histopatológica cutânea ou de nervo periférico sensitivo e exames eletrofisiológicos são usados para identificar comprometimento cutâneo e neural, e identificar diagnóstico diferencial com outras neuropatias periféricas [3].

No Brasil, a classificação dos casos de hanseníase baseia-se na Classificação Internacional de Madrid (1953), que considera como formas clínicas a Hanseníase Indeterminada (I), a Tuberculoide (T), a Dimorfa (D) e a Virchowiana (V). Para fins de tratamento, estas são agrupadas em Paucibacilares – PB (I e T) e Multibacilares – MB (D e V) [4].

Após a confirmação da doença, o tratamento é iniciado através de poliquimioterapia (PQT), que consiste na associação de medicamentos como Rifampicina, Dapsona e Clofazimina. Deve-se iniciar o tratamento medicamentoso a partir da primeira consulta. O diagnóstico precoce é um fator determinante para o controle e a eliminação do bacilo de Hansen [5].

Em 2020 foram reportados à Organização Mundial da Saúde (OMS) 127.396 casos novos da doença no mundo. Brasil, Índia e Indonésia reportaram mais de 10.000 casos, correspondendo a 74% dos casos detectados em 2020. No Brasil, no mesmo ano, foram notificados 17.979 casos o que corresponde a 93,6% de casos novos da doença. O país ocupa o segundo lugar entre aqueles com maior número de casos de hanseníase no mundo, ficando atrás, apenas da Índia, em números absolutos [6].

No estado do Maranhão, entre os anos de 2018 e 2020, foram notificados 10.776 casos, com média de 3.592 casos/ano. No ano de 2018, 4.195 casos foram registrados em oposição a 2020, que teve uma baixa nos casos notificados com 2.316 casos, sendo o menor número registrado nos últimos 3 anos [7]. Em 2021 o estado registrou a primeira posição em número de casos em menores de 15 anos, com 126 casos, um indicador importante, que mostra a transmissibilidade ativa da hanseníase em ambiente familiar [6].

O programa Nacional de Controle da Hanseníase (PNCH) foi desenvolvido em 1976, com o objetivo de controlar a hanseníase no país, por meio de ações para orientar as práticas de promoção da saúde, aumentar as ações de vigilância epidemiológica da hanseníase, orientar os profissionais de saúde com alvo na educação permanente e a assistência integral aos portadores da doença. Essas ações foram remanejadas para a rede de Atenção Primária à Saúde (APS) e coordenadas pela Estratégia da Saúde da Família (ESF), a fim de facilitar o acesso da população aos serviços [8].

O enfermeiro tem um papel importante no desenvolvimento das ações de controle realizadas na Unidade Básica de Saúde (UBS). Por meio da consulta de enfermagem é realizado o histórico de saúde, exame físico, suspeição diagnóstica, prescrição e evolução de enfermagem. Além de auxiliar o doente durante todo o tratamento medicamentoso e auxiliar no fator psicológico, ajudando na superação do preconceito e discriminação ocasionados pela doença [9].

Como exposto, a hanseníase é uma doença com alta infectividade e baixa patogenicidade, considerada silenciosa e com grande número de infectados subnotificados na comunidade, capaz de causar danos físicos, neurológicos e sociais aos indivíduos. Neste sentido, conhecer o perfil epidemiológico da hanseníase pode auxiliar na compreensão do problema e na elaboração de políticas públicas municipais para enfrentamento da doença. Assim, objetivou-se com este estudo caracterizar o perfil clínico-epidemiológico dos casos de hanseníases no município de Coroatá, Maranhão.

 

Métodos

 

Trata-se de um estudo epidemiológico, descritivo, retrospectivo e quantitativo.

Foram utilizados dados de pacientes com hanseníase, referentes ao período de 2012 a 2021, obtidos a partir da Ficha de Notificação Individual de Hanseníase contida na base de dados do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), disponibilizados pelo Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS) do Ministério da Saúde, via aplicativo Tabnet, disponível no endereço eletrônico: http://www.datasus.gov.br.

A coleta de dados foi realizada no mês de junho de 2022, a partir de formulário próprio, elaborado pelos pesquisadores contendo questões fechadas relacionadas às variáveis de interesse do estudo.

Foram considerados como critérios de inclusão: todos os casos de hanseníase diagnosticados em Coroatá e notificados no SINAN entre os anos de 2012 e 2021. As variáveis investigadas no estudo foram: número de casos, ano de notificação, faixa etária, sexo, forma clínica, classificação operacional e grau de incapacidade física.

O conjunto de dados para análise foi selecionado e obtido por meio do aplicativo Tabnet, a partir de suas caixas de opções (linha, coluna e conteúdo). Os dados coletados foram inseridos em um banco de dados do programa Microsoft Excel 2016. Logo após, foram exportados e analisados usando recursos da estatística descritiva, utilizando o R (versão 4.5.1).

Foram calculadas frequências absolutas e relativas das variáveis do estudo e apresentados em forma de tabelas. A discussão dos dados foi feita com base na produção científica sobre a temática.

Por se tratar de dados secundários de um banco de domínio público, não foi necessário submeter o trabalho ao Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos (CEP) como consta na Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016 e Resolução 466 de 12 de dezembro de 2012, que tratam dos aspectos éticos da pesquisa envolvendo seres humanos.

 

Resultados

 

No período analisado foram registrados 646 casos de hanseníase. O ano em que ocorreu o maior número de registro de casos novos foi o de 2013, com 19,2% e o menor, no ano de 2020, com 4,2% dos casos. Em relação à faixa etária, a hanseníase apresentou maior percentual entre 15-59 anos correspondendo a 60,1%. Entretanto, observa-se também a ocorrência de casos novos de hanseníase em crianças menores de 15 anos e em idosos com 60 anos ou mais, correspondendo a 9,2% e 26,0%, respectivamente, no período analisado (Tabela I).

 

Tabela I - Distribuição dos casos novos de hanseníase por faixa etária e ano de notificação. Coroatá, Maranhão, Brasil, 2012 a 2021

 

Fonte: DATASUS, 2022

 

Houve predomínio do sexo masculino (56,7%), quando comparado ao sexo feminino (43,3%) por ano de notificação. No ano de 2013, observou-se a mesma percentagem de casos novos tanto para o sexo feminino quanto para o masculino (Tabela II).

 

Tabela II - Distribuição dos casos novos de hanseníase por sexo e ano de notificação. Coroatá, Maranhão, Brasil, 2012 a 2021

 

Fonte: DATASUS, 2022.

 

Quanto à distribuição das formas clínicas, observou-se predomínio da dimorfa em todos os anos investigados, 56,3% do total de casos registrados no período do estudo. Observaram-se registros de 0,9% de casos não classificados, com destaque para os anos 2012, 2013, 2014 e 2018 somando-se seis casos neste período (Tabela III).

 

Tabela III - Distribuição dos casos novos de hanseníase por ano de notificação, segundo formas clínicas. Coroatá, Maranhão, Brasil, 2012 a 2021

 

Fonte: DATASUS, 2022.

 

Considerando a classificação operacional, a maioria dos casos foi do tipo multibacilar, registrando-se 484 casos (74,9%) durante o período analisado (Tabela IV).

 

Tabela IV - Distribuição dos casos novos de hanseníase por ano de notificação, segundo classificação operacional. Coroatá, Maranhão, Brasil, 2012 a 2021

 

Fonte: DATASUS, 2022.

 

A Tabela V mostra o grau de incapacidade entre os casos investigados, constatando-se que o Grau Zero foi predominante, sendo inclusos nesta classificação 388 casos (60,1%). Entretanto, observou-se que 226 casos (34,9%) apresentaram algum grau de incapacidade, correspondendo 26 % ao Grau I e 9 % ao Grau II.

 

Tabela V - Distribuição dos casos novos de hanseníase por ano de notificação segundo grau de incapacidade física. Coroatá, Maranhão, Brasil, 2012 a 2021

 

Fonte: DATASUS, 2022.

 

Discussão

 

O presente estudo permitiu identificar o perfil clínico e epidemiológico da hanseníase em Coroatá, localizado no estado do Maranhão, situada no centro leste do estado, no vale do Itapecuru, a 260km da capital São Luís, na região nordeste do Brasil. No período analisado notificaram-se 646 casos novos de hanseníase, destacando-se o ano de 2013 com 127 casos.

Em relação à idade, houve predominância de adolescentes, adultos jovens e adultos (15 a 59 anos) o que demonstra que a hanseníase tem afetado a classe economicamente ativa, este dado é semelhante a outros estudos realizados [10,11]. O alto índice de contaminados nesta faixa etária causa um impacto social e emocional na vida destas pessoas, pois a hanseníase tem alto grau incapacitante, capaz de gerar repercussões negativas na vida social dos indivíduos, principalmente traumas físicos e neurológicos o que acaba conduzindo a perdas financeiras e diminuição da qualidade de vida [12].

Observou-se também a ocorrência de casos novos de hanseníase em crianças menores de 15 anos. Os dados demonstram que ocorre uma deficiência na vigilância e no controle da doença em menores de 15 anos, pois a transmissão familiar indica infecção ativa e contínua na comunidade.

Devido ao longo período de incubação e atraso na percepção dos sinais e sintomas, em muitos casos ocorre atraso no diagnóstico, associado a baixa qualidade na assistência voltada à hanseníase, nos serviços de saúde. As populações vulneráveis socialmente são mais acometidas, assim como foi encontrado em outros estudos [13,14,15].

Em relação aos idosos com 60 anos ou mais, o aumento no número de casos pode relacionar-se à presença de casos não tratados ou demora na busca pelos serviços de saúde, para diagnóstico. Associada ao longo período de incubação da doença, esse diagnóstico tardio culmina no aumento do período de contato, favorecendo a disseminação da hanseníase entre os comunicantes [16].

Quanto ao sexo, observou-se maior frequência de casos de hanseníase no sexo masculino, evidenciando uma provável carência na procura dos serviços de saúde pelo público masculino, que colabora para o aumento na taxa de casos. Culturalmente, os homens procuram os serviços de saúde quando já é nítido o comprometimento físico, além de não terem hábitos de prevenção da saúde e monitoramento anual da saúde. Por outro lado, as mulheres cuidam mais do seu bem-estar, procuram as redes de saúde, observam mais o corpo e seus aspectos naturais alertando-se para o aparecimento anormal no aspecto físico, conforme demonstram outros estudos [17,18].

A presença da forma clínica dimorfa demonstra que o diagnóstico da hanseníase está sendo realizado tardiamente no município o que pode influenciar no aumento da transmissibilidade da doença. Estudo realizado na cidade de Pinheiro (MA) reportou maior número de casos com forma clínica dimorfa, o que aumenta os níveis de detecção de incapacidades físicas e o desenvolvimento de complicações neurais, devido à demora do paciente buscar os serviços de saúde, aumentando as chances de sequelas graves [19].

Quanto à classificação operacional, houve predominância dos casos multibacilar, assim como ocorreu em estudo realizado na região nordeste do país onde os casos multibacilares eram maiores no estado do Maranhão. Os dados apontaram que o estado apresenta alta carga da doença, contaminação ativa e diagnóstico tardio [20].

O diagnóstico da doença nas formas multibacilares (dimorfa e virchowiana) indica manutenção contínua da cadeia de transmissão do M. leprae na população e detecção tardia da doença [21]. As formas multibacilares são as formas mais contagiosas da doença, o que deve ser um alerta para as redes de saúde, para um maior mapeamento e alcance de diagnóstico precoce, na tentativa de mudar esse quadro, uma vez que existe risco de uma maior possibilidade de instalação das incapacidades físicas, principalmente, nas áreas mais carentes e desassistidas da cidade [22].

Em relação ao grau de incapacidade física, os resultados apontaram baixo comprometimento neural diagnosticado entre os casos, resultado semelhante ao encontrado em um estudo realizado em São Luís, capital do Maranhão, entre os anos de 2010 a 2020 [23].

O acometimento grau l e II foi inferior ao encontrado em outros estudos. O grau 1 de incapacidade ocorre quando há diminuição ou perda de sensibilidade nos olhos, mãos e pés e grau 2 de incapacidade quando há lesões mais graves nos olhos, mãos e pés [24].

A avaliação do Grau de Incapacidade Física é um indicador epidemiológico, que permite uma estimativa indireta da efetividade das ações de detecção precoce da doença, o diagnóstico precoce, auxiliando na identificação de pacientes com maior risco de desenvolver reações e novas incapacidades, durante o tratamento, no término da poliquimioterapia e após a alta [1]. As deficiências físicas adquiridas são consideradas as principais causas de estigma e isolamento social e representam forte impacto econômico e psicológico na vida das pessoas atingidas [25].

O percentual elevado de casos de hanseníase notificados com grau 2 de incapacidade física e o predomínio das formas multibacilares, reforçam a afirmativa da persistência do ciclo da doença na região e, consequentemente, a prevalência oculta com diagnóstico tardio ou falha/despreparo dos profissionais na Atenção Básica para o diagnóstico correto e oportuno na busca ativa de novos casos [26].

A atuação do profissional de saúde é fundamental para o diagnóstico precoce da doença, e um fator fundamental para eficácia do tratamento, e sua possível cura [27]. No entanto, a falta de conhecimento e capacitação da equipe reflete em falhas assistenciais, tais como ausência de diagnóstico oportuno, que culmina em evolução das complicações da doença e manutenção da transmissão, dificultando a adoção de medidas de controle capazes de reduzir a incidência da doença [28].

Observou-se, neste estudo, que a proporção de casos novos de hanseníase com grau de incapacidade física não avaliados no momento do diagnóstico aumentou de 0,6% para 4,0% o que demonstra falha por parte da equipe de saúde [22]. A avaliação do Grau de Incapacidade Física constitui uma importante ferramenta na identificação de pacientes com maior risco de desenvolver reações e novas incapacidades físicas [1]. Porém, as dificuldades de acesso dos doentes aos serviços de saúde, a pouca qualificação de profissionais que reflete na realização de avaliação física pouco criteriosa, o atraso no diagnóstico da doença, entre outros fatores, auxilia na evolução de algum grau de incapacidade física e aumento de mais pessoas infectadas [29].

A atuação do enfermeiro da Atenção Primária à Saúde promove e garante acesso aos pacientes suspeitos ou com hanseníase, pois estes profissionais agem na prevenção da doença, promoção da saúde, diagnóstico e tratamento, prevenção de incapacidades físicas, acompanhamento dos casos registrados em domicílio, administração do sistema de registro da vigilância epidemiológica, efetivação de notificações compulsórias dos casos, supervisão e execução da dose dos medicamentos poliquimioterápicos e o acompanhamento na cura do paciente e no pós-alta [30].

Nesta perspectiva, a ESF representa um importante papel. A equipe multidisciplinar composta por médico, enfermeiro, técnico de enfermagem e agente comunitário de saúde, precisa estar capacitada e atuando em conjunto, visando um maior alcance das medidas de controle da hanseníase na comunidade, promovendo atividades de educação em saúde, busca ativa de casos novos, assistência humanizada e integral, garantindo a oferta e o acesso a todos os serviços da rede de saúde, conforme atribuições profissionais de cada componente da equipe de saúde buscando o controle da doença e diminuição dos casos [31].

Quanto às limitações do presente estudo, aponta-se que o uso de dados secundários não permite ao pesquisador controlar possíveis erros decorrentes de digitação e de registro, além de possíveis subnotificações. Apesar disso, acredita-se que, por se tratar de dados oficiais e de preenchimento obrigatório em todos os serviços de saúde, seus resultados permitiram o alcance do objetivo proposto.

 

Conclusão

 

A hanseníase foi predominante no sexo masculino, idade entre 15-59 anos e forma clínica dimorfa. O ano em que ocorreu o maior número de registro de casos novos foi o de 2013. O diagnóstico da hanseníase ainda é realizado tardiamente devido à detecção da classificação multibacilar e forma clínica dimorfa, além da presença de incapacidade física no momento do diagnóstico.

Os resultados demonstraram que a hanseníase continua sendo um grave problema de saúde pública no município necessitando de implementação de políticas públicas que impactem diretamente nos indicadores para redução da doença.

 

Conflito de interesses

Não há conflito de interesses.

 

Fontes de financiamento

Os autores declaram que não receberam subsídios financeiros para elaboração deste estudo.

 

Contribuição dos autores

Concepção e desenho da pesquisa: Matos FM, Reis BMCB, Pinheiro RP, Santos KCB; Coleta de dados: Matos FM, Reis BMCB, Pinheiro RP; Análise e interpretação dos dados: Matos FM, Reis BMCB, Pinheiro RP, Santos KCB; Redação do manuscrito: Matos FM, Reis BMCB, Pinheiro RP, Santos KCB; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Matos FM, Reis BMCB, Pinheiro RP, Pacheco LKS, Santos KCB.

 

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