Enferm Bras.
2023;22(5):588-607
ARTIGO
ORIGINAL
Cobertura
vacinal e eventos adversos no primeiro ano de vida no estado da Paraíba, Brasil
Anne Milane Formiga Bezerra1, Flávia Jacqueline
Almeida1, Helena Keico Sato2
Elicarlos Marques Nunes3, Kevia Katiucia Santos Bezerra4,
Eitan Naaman Berezin1,
Marco Aurélio Palazzi Safadi1
1Faculdade de Ciências Médicas da Santa
Casa de São Paulo (FCMSCSP), SP, Brasil
2Centro de Vigilância Epidemiológica de
São Paulo (CVE-SP), SP, Brasil
3Centro Universitário de Patos (UNIFIP),
Paraíba, Brasil
4Universidade Federal de Campina Grande
(UFCG), SP, Brasil
Recebido
em: 9 de março de 2023; Aceito em: 21 de agosto de 2023.
Correspondência: Anne Milane
Formiga Bezerra, annebezerra@fiponline.edu.br
Como citar
Bezerra AMF, Almeida
FJ, Sato HK, Nunes EM, Bezerra KKS, Berezin EN, Safadi MAP. Cobertura vacinal e eventos adversos no
primeiro ano de vida no estado da Paraíba, Brasil. Enferm
Bras. 2023;22(5):588-6-7. doi: 10.33233/eb.v22i5.5415
Resumo
O
presente estudo teve como objetivo caracterizar e estimar a cobertura vacinal e
os eventos adversos pós-vacinação (EAPV) na Paraíba, no período de 2011 a 2017,
em crianças menores de um ano de idade. Para isso, foi desenvolvida uma
pesquisa epidemiológica, retrospectiva, de série temporal, do tipo ecológico,
utilizando-se dados secundários armazenados no período de 2011 a 2017,
relacionados a indivíduos com idade igual ou menor a um ano, provenientes do
Sistema de Informações Programa Nacional de Imunização (SI-PNI) e Sistema de
Informação da Vigilância de Eventos Adversos Pós-Vacinação (SI-EAPV) do Estado
da Paraíba. A análise dos dados foi realizada através de técnicas de estatística
descritiva e teste de Qui-quadrado de Pearson, sendo
considerado como significante o valor de p < 0,05. Os resultados deste
estudo revelaram uma heterogeneidade na cobertura vacinal entre os
imunobiológicos estudados, demonstrando aumento ou pelo menos uma manutenção da
estabilidade na cobertura vacinal das vacinas BCG, hepatite B, rotavírus
humano, meningocócica e pneumocócica, ao passo que, para as vacinas pentavalente, poliomielite, febre amarela e primeiros
reforços da meningocócica e pneumocócica foram observadas quedas na cobertura
vacinal para a série histórica avaliada. Evidenciou-se ainda um aumento nas
notificações de EAPV ao longo do período entre 2011 e 2017, com pico no último
ano avaliado. O imunobiológico com maior ocorrência de EAPV foi a pentavalente e o evento mais frequente foi a febre. A
partir dos resultados encontrados nesse estudo pode-se concluir a existência de
instabilidades em toda série histórica relacionada à cobertura vacinal no
Estado da Paraíba.
Palavras-chave: cobertura vacinal; vacina; eventos
adversos.
Abstract
Vaccination coverage and adverse events in the first
year of life in the state of Paraíba, Brazil
The present study aimed to characterize and estimate
vaccination coverage and adverse post-vaccination events (EAPV) in Paraíba, from 2011 to 2017, in children under one year of
age. To this end, an epidemiological, retrospective, time series, ecological research
was developed, using secondary data stored in the period from 2011 to 2017,
related to individuals aged one year or less, coming from the Information
System Program National Immunization System (SI-PNI) and Post-Vaccination
Adverse Event Surveillance Information System (SI-EAPV) of the State of Paraíba. Data analysis was carried out using descriptive
statistics techniques and Pearson's Chi-square test, with p < 0.05 being
considered significant. The results of this study revealed heterogeneity in vaccination
coverage among the immunobiologicals studied,
demonstrating an increase or at least maintenance of stability in vaccination
coverage of BCG, hepatitis B, human rotavirus, meningococcal and pneumococcal
vaccines, whereas, for pentavalent vaccines, polio, yellow fever and first
boosters of meningococcal and pneumococcal, drops in vaccination coverage were
observed for the historical series evaluated. There was also an increase in
EAPV notifications throughout the period between 2011 and 2017, with a peak in
the last year evaluated. The immunobiological with the highest occurrence of
EAPV was pentavalent and the most frequent event was fever. Based on the
results found in this study, it can be concluded that there are instabilities
in the entire historical series related to vaccination coverage in the State of
Paraíba.
Keywords: vaccination coverage; vaccine;
adverse events.
Resumen
Cobertura
de vacunación y eventos adversos en
el primer año de vida en el estado de Paraíba, Brasil
El
presente estudio tuvo como
objetivo caracterizar y estimar la cobertura de vacunación y los eventos adversos
posvacunación (EAPV) en
Paraíba, de 2011 a 2017, en niños
menores de un año. Para ello, se desarrolló una investigación epidemiológica, retrospectiva, de series temporales, ecológica, utilizando datos
secundarios almacenados en el período de 2011 a 2017,
relacionados con individuos
de un año o menos,
provenientes del Sistema de Información
del Programa Sistema Nacional de Inmunizaciones
(SI-PNI) y Sistema de Información de Vigilancia de Eventos Adversos Post-Vacunación
(SI-EAPV) del Estado de Paraíba. El análisis de los datos se realizó mediante
técnicas de estadística descriptiva y prueba Chi-cuadrado de Pearson, considerándose significativo p < 0,05. Los resultados de
este estudio revelaron heterogeneidad en la cobertura de vacunación entre los inmunobiológicos estudiados, demostrando un
aumento o al menos un mantenimiento
de la estabilidad en la cobertura de vacunación de las vacunas BCG, hepatitis B, rotavirus humano,
meningococo y neumococo, mientras
que, para las vacunas pentavalentes,
polio, amarilla fiebre y primeros refuerzos de meningococo y neumococo,
se observaron caídas en las coberturas de vacunación para
la serie histórica evaluada. También hubo un aumento en las notificaciones
de EAPV a lo largo del
período comprendido entre 2011 y 2017, con un pico en
el último año evaluado. El inmunobiológico con mayor ocurrencia
de EAPV fue el pentavalente y el evento más frecuente fue la
fiebre. Con base en los resultados encontrados en este estudio, se puede concluir que existen inestabilidades en toda la serie histórica relacionada con la cobertura de vacunación en el
Estado de Paraíba.
Palabras-clave: cobertura de vacunación;
vacuna; eventos adversos.
O
Programa Nacional de Imunização (PNI) foi institucionalizado pela Lei nº 6.259
em 30 de outubro de 1975, com o objetivo de coordenar ações sistemáticas de
vacinação em esfera nacional, intensificando as atividades de imunização no
país. A política de imunização brasileira tem sido reconhecida nacional e
internacionalmente pelo êxito na fabricação de vacinas, conferindo autonomia e
sustentabilidade ao Programa, fornecimento gratuito e universal de grande
quantidade de vacinas à população e alcance progressivo de elevadas coberturas
vacinais, ainda que, de forma heterogênea, conforme o nível socioeconômico da
população e a região atendida [1].
No
Brasil, os registros de EAPV da rede pública são disponibilizados pelo
Ministério da Saúde no Sistema de Informação da Vigilância de Eventos Adversos
Pós-Vacinação (SI-EAPV). A vigilância no âmbito do Programa Nacional de
Imunização teve início em 1992, enquanto a notificação compulsória foi
instituída apenas em 2005 [2,3]. A ocorrência de EAPV acomete principalmente
crianças, uma vez que essa fase da vida coincide com o período em que o ser
humano recebe o maior número de vacinas, além de ser uma fase de imaturidade
imunológica, considerada mais vulnerável. Por isso, torna-se relevante a
realização de estudos que identifiquem a ocorrência de EAPV em crianças menores
de um ano.
O
estudo das coberturas vacinais e EAPV fornece uma oportunidade para a
investigação acerca da concretização de políticas públicas, isto é,
intervenções programadas e executadas, preferencialmente pelo Estado, buscando
diminuir os casos de doenças imunopreveníveis e
atingir novas metas de seu controle ou eliminação, motivo pelo qual o
fortalecimento da capacidade das ações de vigilância epidemiológica e o aumento
da homogeneidade da cobertura vacinal de rotina tem sido definido como
estratégia pelo Ministério da Saúde, minimizando também as consequências que os
eventos adversos pós-vacinação podem provocar nas crianças e na saúde pública.
Frente
a esses aspectos, a notificação e registro dos EAPV em menores de um ano, por
meio do Sistema de Informação da Vigilância de Eventos Adversos (SI-EAPV), e da
cobertura vacinal, geram o conhecimento, que pode fornecer subsídios
necessários para a formação de políticas públicas, por ser um indicador de
saúde da população adotado pelo Ministério da Saúde. Assim sendo, este estudo
tem por objetivo avaliar a cobertura vacinal e os eventos adversos
pós-vacinação no estado da Paraíba, no período de 2011 a 2017, em pacientes
menores de um ano.
Tipo
de estudo
Trata-se
de uma pesquisa epidemiológica, retrospectiva, de série temporal, do tipo
Ecológico [4,5]. Considerando que esses dados só estão disponíveis no sistema a
partir de 2011 e que a coleta para esse estudo se iniciou em 2018, o corte
temporal analisado no presente estudo compreende o período de 2011 a 2017, com
avaliação do Sistema de Informações Programa Nacional de Imunização (SI-PNI) e
do Sistema de Informação da Vigilância de Eventos Adversos Pós-Vacinação
(SI-EAPV) no estado da Paraíba. Em virtude de estes dados serem provenientes de
bases de dados governamentais, levantados por instituições, eles são
classificados como secundários [6].
Local
do estudo
O
estudo foi realizado no estado da Paraíba, localizado na Região Nordeste. As
unidades de estudo da pesquisa são as macrorregiões de saúde da Paraíba. Elas
se caracterizam a partir da atual configuração do modelo de regionalização da
saúde na Paraíba, que subdivide em 3 macrorregiões de saúde, contemplando juntas
16 regiões de saúde, por meio da Resolução CIB 43/18, de 25 de junho de 2018, a
qual aprovou a nova definição das macrorregiões de saúde no estado da Paraíba.
Os
dados sobre os efeitos adversos das vacinas foram coletados junto ao setor de
Vigilância Epidemiológica da Secretaria Estadual de Saúde da Paraíba. Este
setor recebe informações das dezesseis regiões de saúde do Estado, agrupadas em
três macrorregiões de saúde e doze gerências regionais.
População
e amostra
A
população em estudo é a residente no Estado da Paraíba, Nordeste do Brasil, com
idade igual ou menor a um ano. Constituíram-se como amostra da pesquisa as
crianças que receberam imunobiológicos do Programa Nacional de Imunização (PNI)
e que apresentaram efeito adverso pós-vacinação (EAPV) no período compreendido
entre 2011 e 2017.
Coleta
de dados
Os
dados foram extraídos do SI-PNI, por meio do banco de dados do Departamento de
Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), além de dados referentes aos
nascidos vivos no estado da Paraíba por meio do Sistema de Informação sobre
Nascidos Vivos (SINASC), considerando o período de 2011 a 2017.
Analisaram-se
as variáveis: ano de ocorrência do EAPV, imunobiológico administrado, número de
doses administradas, cobertura vacinal, número de nascidos vivos. Os dados da
cobertura vacinal foram calculados a partir do número de nascidos vivos,
provenientes dos Sistemas de Informação de Nascidos Vivos (SINASC), e do número
de doses de imunobiológicos administradas no período considerado, disponíveis
no Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunização (SI-PNI).
Seguindo
o roteiro de coleta de dados, os dados concernentes aos EAPV foram obtidos
SI-PNI, junto ao Departamento Estadual de Vigilância Epidemiológica da Paraíba
in loco; os referentes à cobertura vacinal foram extraídos do SINASC e do
SI-PNI.
Análise
dos dados
A
fim de realizar a comparação dos dados de modo bivariado, as variáveis de
eventos adversos foram agrupadas conforme desfecho e a análise dos dados foi
realizada através de técnicas de estatística descritiva, sendo utilizadas
medidas de frequência absoluta e relativa. Com a finalidade de comparar a
existência de correlação dos dados, foi realizado o teste de Qui-quadrado de Pearson sendo considerado como significante
o valor de p < 0,05. As análises estatísticas foram realizadas mediante a
utilização do programa estatístico SPSS for Windows (Statistical
Package for the Social Sciences) versão 21.0.
Aspectos
éticos
Este
estudo foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Formação de
Professores, da Universidade Federal de Campina Grande, sendo aprovado sob o
CAAE18867519.5.0000.5575.
A
cobertura vacinal observada no período do estudo variou de 73,13% a 120,35%,
apenas com a vacina da BCG apresentando-se acima da meta estabelecida (90%).
Todos os demais imunobiológicos estiveram abaixo do preconizado no período do
estudo avaliado para o estado da Paraíba
Figura
1 - Cobertura
populacional percentual dos imunizantes avaliados entre os anos de 2011 e 2017,
Paraíba, Brasil
Com
relação à cobertura vacinal para o imunizante BCG para o grupo populacional
avaliado no estado da Paraíba entre os anos de 2011 e 2017, com exceção ao ano
de 2016, a cobertura do imunizante foi superior a 100% no estado. Uma tendência
linear de discreto decréscimo na cobertura foi observada entre os anos
avaliados. Para a vacina para hepatite B em crianças com até 30 dias (1ª dose habitualmente
feita na maternidade) no estado da Paraíba, só foram obtidos dados a partir de
2014, sendo observado um decréscimo entre os anos de 2014 e 2017
Figura
2 - Coberturas
populacionais percentuais das vacinas BCG, Hepatite B em crianças em até 30 dias,
Hepatite B e Rotavírus Humano entre os anos de 2011 e 2017, Paraíba, Brasil
Ao
se observar a cobertura populacional para o imunizante contra a Hepatite B (3ª
dose - série primária) no estado da Paraíba nos anos avaliados, percebeu-se uma
tendência linear de estabilidade na cobertura do imunizante, com altos níveis
de cobertura populacional entre os anos avaliados, variando entre 82,48% e
100,04%. Ao se observar a cobertura vacinal para o Rotavírus humano,
evidenciou-se uma tendência linear de estabilidade na cobertura do imunizante
entre os anos avaliados (Figura 2).
Com
relação à vacina para o Meningococo C, com início de sua inserção no PNI em
2010, observou-se uma tendência linear de estabilidade na cobertura do
imunizante entre os anos avaliados. A vacina pentavalente
no estado da Paraíba teve início no PNI apenas no ano de 2012, o que justifica
a cobertura igual a zero no ano de 2011 e uma cobertura de 29,2% no ano de
2012. Observou-se também para esse imunizante uma estabilidade na cobertura
populacional pelo imunizante, apesar do decréscimo entre os anos de 2013 e 2017
Figura
3 - Coberturas
populacionais percentuais das vacinas Meningococo C, Penta, Pneumocócica e
Poliomielite entre os anos de 2011 e 2017, Paraíba, Brasil
Ao
se observar a cobertura populacional da vacina pneumocócica no estado da
Paraíba nos anos avaliados, percebeu-se uma tendência linear de discreto
aumento na cobertura do imunizante, a qual teve início em 2010, com altos
níveis de cobertura populacional entre os anos avaliados. Para a Poliomielite,
percebeu-se uma tendência linear de redução na cobertura do imunizante entre os
anos de 2011 e 2017, apesar do ano de 2013 ter se apresentado como um ano
atípico, com números de doses que ultrapassaram a estimativa populacional do
ano avaliado (Figura 3).
A
figura 4 apresenta o índice de cobertura populacional percentual para o
imunizante contra a Febre Amarela. Observou-se em todos os anos avaliados um
nível extremamente baixo de cobertura pelo imunizante no estado da Paraíba nos
anos avaliados. Vale ressaltar que no período avaliado, a vacina contra a Febre
amarela não era recomendada no estado da Paraíba, portanto não é uma vacina que
dá para se considerar a cobertura vacinal, uma vez que só era recomendada para
situações específicas, como em caso de viagens para locais de risco.
Figura
4 - Coberturas
populacionais percentuais das vacinas Febre amarela, Pneumocócica (1º reforço),
Tríplice viral (1ª dose) e Meningococo C (1º reforço) entre os anos de 2011 e
2017, Paraíba, Brasil
Com
relação à cobertura populacional para o primeiro reforço da vacina pneumocócica
no estado da Paraíba, só foram obtidos dados a partir de 2013. Ao se considerar
apenas os anos válidos, observou-se uma tendência de estabilidade na cobertura
populacional pelo imunizante. Ao se observar a cobertura populacional para o
imunizante vacina tríplice viral nos anos avaliados, percebeu-se uma tendência
linear de redução na cobertura do imunizante entre os anos de 2011 e 2017,
apesar do período entre 2013 e 2014 ter se apresentado como período atípico,
com números de doses que ultrapassam a estimativa populacional para esses anos
avaliados. Com relação à cobertura populacional para o primeiro reforço da
vacina para o Meningococo C no estado da Paraíba, só foram obtidos dados a
partir de 2013. Ao considerar apenas os anos válidos, observou-se uma tendência
linear de aumento na cobertura populacional pelo imunizante, além de um
decréscimo entre os anos de 2013 e 2015, com leve aumento em 2016, voltando a
regredir no ano de 2017
A
figura 5 apresenta a frequência dos eventos adversos ocorridos dentro da série
histórica analisada por este estudo. Foi possível observar um aumento
considerável dentro dos anos, com flutuações entre 2013 e 2017. Entre 2011 e
2013 foram registrados menos de 10% de eventos adversos, contudo, nos anos
subsequentes existe uma tendência de elevação, atingindo o maior número em
2017, sendo responsável por 30,3% dos eventos nesse ano.
Figura
5 - Frequência de
Número de Eventos Pós Adversos ocorridos na série história, Paraíba, Brasil
Na
tabela I é possível observar a frequência de todos os eventos adversos
ocorridos na série histórica que foram registrados no sistema. Observou-se que
a febre (21,3%) seguido da cianose (19,4%), hipotonia/episódio hipotônico
(17,5%) e convulsão (12,8%) foram os eventos adversos mais prevalentes. Os
outros eventos apresentaram prevalência de menor que 8%.
Tabela
I - Frequência dos
eventos adversos ocorridos em toda série histórica, Paraíba, Brasil (2011-2017)
Fonte:
Sistema de Informação de Efeitos Adversos Pós-Vacinação (SI-EAPV) – Secretaria
Estadual de Saúde da Paraíba (2022)
Os
dados da tabela II fazem menção a frequência de quem tomou cada vacina no
período analisado dentre os que apresentaram eventos adversos. 97,2% dos que
apresentaram eventos adversos tomaram a vacina Penta-valente, 40,3% dos que
tomaram a vacina Pólio inativada tiveram algum tipo de evento adverso. Já para
a vacina contra o Rotavírus, apenas 28,9% dos que tomaram tiveram algum tipo de
evento, resultado igual também foi encontrado para vacina Pneumo10.
Tabela
II - Frequência de
eventos adversos por tipo de vacina, Paraíba, Brasil (2011-2017)
Fonte: Sistema de Informação
de Efeitos Adversos Pós-Vacinação (SI-EAPV) – Secretaria Estadual de Saúde da
Paraíba (2022)
Sobre
o número de reações apresentadas de acordo com o agrupamento do evento, 30,4%
das pessoas que tiveram febre apresentaram 2 reações adversas, enquanto nos
eventos locais, 34,8% também tiveram 2 reações. Os sintomas digestivos
ocorreram mais em quem teve 3 reações (30%). 50% dos que apresentaram alguma
reação neurológica tiveram apenas 1 reação, enquanto nos respiratórios, 7,2%
tiveram 2 reações e 44,9% dos que tiveram outros eventos adversos tiveram 2
reações. Apenas o grupo de sintomas respiratórios não apresentou associação
estatisticamente significativa (Tabela III).
Tabela
III - Análise
bivariada do número de reações apresentadas em cada indivíduo com categoria de
evento, Paraíba, Brasil (2011-2017)
Fonte: Sistema de Informação
de Efeitos Adversos Pós-Vacinação (SI-EAPV) – Secretaria Estadual de Saúde da
Paraíba (2022)
Os
resultados deste estudo mostraram uma heterogeneidade na cobertura vacinal
entre os imunobiológicos estudados, demonstrando um aumento ou pelo menos uma
manutenção da estabilidade na cobertura vacinal das vacinas BCG, hepatite B,
rotavírus humano, meningocócica e pneumocócica, ao passo que para as vacinas pentavalente, poliomielite, febre amarela e primeiros
reforços da meningocócica e pneumocócica foram observadas quedas na cobertura
vacinal para a série histórica avaliada.
Apesar
de nosso estudo ter evidenciado índices de cobertura vacinal na Paraíba como um
todo elevados, não pode deixar de se considerar a não homogeneidade destas
coberturas, que propiciam a existência de regiões com bolsões susceptíveis,
possibilitando a ocorrência de surtos em populações definidas.
Assim,
constata-se que as imunizações no estado da Paraíba variam consideravelmente
entre os seus municípios, demandando planejamento estratégico condizente com as
características de cada localidade, consolidação de tecnologias organizacionais
para serviços de saúde e capacidades ampliadas de humanização para acolher as
demandas da população e evitar oportunidades perdidas de vacinação.
Este
estudo evidenciou que a cobertura vacinal da BCG no estado da Paraíba manteve-se
elevada. Esse achado pode ser explicado pelo fato de que essa vacina é
administrada imediatamente após o nascimento, com os bebês recebendo
rotineiramente sua dose nos municípios da Paraíba nesse mesmo período ainda nas
maternidades. Tais achados corroboram os resultados relatados por Domingues et
al. [7], Silva et al. [8] e Queiroz et al. [9]. Entretanto,
Fonseca e Buenafuente [10] reforçam a heterogeneidade
da cobertura vacinal da BCG entre os estados brasileiros. Destacando que em
Roraima a cobertura vacinal para esse imunizante manteve-se elevada, atingindo
mais de 100%, contudo, para estados como Pará, Maranhão e Bahia, houve
diminuição do número de pessoas que receberam esse imunobiológico. A
heterogeneidade da cobertura vacinal nos estados brasileiros pode ser explicada
pelos nascimentos fora do local de residência da mãe [11]. Nesse sentido, é
possível que a estimativa da população de crianças residentes na Paraíba seja
subestimada, devido ao elevado número de migrantes e seu possível impacto nos
achados deste estudo.
Diante
da alta cobertura da BCG ao longo dos anos, o ano de 2016 foi um ano atípico
para a Paraíba. Contudo, é importante ter em mente que diversos aspectos
interferem diretamente nos números da vacinação no Brasil, e consequentemente
nos estados da nação. Um desses elementos de especial importância é a
disponibilidade de imunobiológicos nas salas de vacina. O desabastecimento de
vacinas ainda é comum no Brasil. Em 2015 e 2017, a Sociedade Brasileira de
Imunizações e o Ministério da Saúde publicaram notas informativas sobre o
desabastecimento da vacina BCG, demonstrando a dificuldade que o país possui em
garantir os insumos necessários para vacinação [12].
A
DM é uma doença imprevisível com variação temporal na incidência e na
prevalência de sorogrupos causadores específicos, incluindo surtos periódicos. No
Brasil, a vacinação meningocócica foi introduzida em 2010, o que justifica os
altos índices de cobertura vacinal encontrados neste estudo para o ano de 2011.
Nunes
et al. [13] avaliaram as mudanças na incidência e mortalidade nacional e
regional da DM entre 2005 e 2018, distribuição de sorogrupos e cobertura
vacinal, e descobriram que os números de casos de DM e as taxas de incidência
foram maiores em 2005–2009, após isso, foi observado um declínio ano a ano de
2011 a 2018. Ao longo do período do estudo, a maioria dos casos ocorreu em
crianças e adolescentes, com aproximadamente 35% envolvendo crianças < 5
anos de idade, embora a prevalência de DM em crianças menores tenha diminuído
substancialmente após a introdução da vacina.
Um
outro achado foi para a cobertura vacinal contra a Febre amarela, com taxas de
cobertura não alcançando nem 1% ao longo dos anos avaliados. Importante
ressaltar que esse resultado decorreu do fato de que, apenas em 2020, a vacina
contra a febre amarela foi incluída no calendário de vacinação no estado da
Paraíba, com meta de vacinar todas as crianças de 9 meses a menores de 5 anos
em todo o estado de forma a atingir uma cobertura vacinal de 95%. Agora, todos
os estados do Nordeste terão esse imunizante à disposição da população, mesmo
sem ser uma região endêmica. A inclusão da vacina foi aprovada na Comissão Intergestores Bipartite [14]. De acordo com a OMS, em 2021,
a vacina contra a febre amarela havia sido introduzida nos programas de
imunização infantil de rotina em 36 dos 40 países e territórios em risco de
febre amarela na África e nas Américas [15].
Ademais,
foi possível evidenciar uma redução linear da cobertura vacinal contra a
Poliomielite entre os anos de 2011 e 2017, com exceção de 2013, o qual foi um
ano atípico, revelando a maior cobertura vacinal entre os anos estudados
(108,24%). Deve-se dedicar atenção especial a esses resultados, uma vez que
ainda existem países onde a doença é endêmica, como Afeganistão, Paquistão e
Nigéria [16]. Em contrapartida, outros locais estão experimentando a
reintrodução do poliovírus, como Guiné Equatorial,
Etiópia, Somália, Camarões, Iraque e Síria, dificultando os esforços de
erradicação da poliomielite [11].
No
ano de 2022, em fevereiro, as autoridades de saúde de Malawi, país que há quase
5 anos não notificava um caso de poliovírus selvagem
e que havia sido considerado livre de pólio em 2020, relataram um caso
importado do Paquistão de poliovírus selvagem do tipo
1. No mês seguinte, um caso circulante de poliovírus
tipo 3 derivado de vacina (cVDPV3) foi confirmado em uma menina não vacinada de
3 anos e 9 meses em Israel, país esse que notificou o último caso de pólio em
1989 [17].
Segundo
dados do Ministério da Saúde, no ano de 2018, mais de 30 municípios da Paraíba
não atingiram a meta de vacinar, pelo menos, 95% das crianças de um a menores
de cinco anos contra a poliomielite [18]. Tais afirmações indicam que a baixa
cobertura vacinal observada representa risco de reemergência
da poliomielite na Paraíba, no Brasil e no mundo [10], uma vez que enquanto
houver infectados com a poliomielite, outras crianças de diferentes países
estão em risco de contrair a doença. Visando a erradicação global, a pólio foi
interrompida em todos os países, exceto no Afeganistão e no Paquistão. Até que
a transmissão do poliovírus seja interrompida nesses
países, todos os países permanecem em risco de importação de pólio,
especialmente os países vulneráveis com serviços de saúde pública e imunização
fracos e ligações comerciais ou de viagens com países endêmicos [15]. Segundo a
OMS, o fracasso de erradicar a poliomielite nesses países pode resultar em 200
mil casos novos por ano [19].
Especificamente
sobre o sarampo, até o final de 2021, 81% das crianças receberam uma dose de
vacina contendo sarampo até seu segundo aniversário em todo o mundo, 183
Estados Membros da OMS incluíram uma segunda dose como parte da imunização de
rotina e 71% das crianças receberam 2 doses de vacina contra sarampo, de acordo
com os calendários nacionais de vacinação [19].
No
Brasil, no período de 1968 a 1991, o país enfrentou nove epidemias dessa
doença, com média de uma epidemia ao ano. A partir de 1992, com a implantação
do Plano de Controle e Eliminação do Sarampo, ocorreu intensificação das ações
de vigilância epidemiológica e campanhas de vacinação em massa, possibilitando
uma acentuada queda na incidência da doença [20]. A partir dos anos 2000,
ocorreram alguns surtos de sarampo de importância epidemiológica no sertão da
Bahia (2006), na Paraíba (2010), em Pernambuco (2013/2014) e no Ceará (2013 a
2015). Após sucessivas ações de vigilância e imunizações, em 2016, o Brasil
recebeu o certificado de eliminação da circulação do vírus do sarampo pela OMS,
declarando a região das Américas livre do sarampo [11]. Contudo, desde janeiro
de 2018, foram verificados surtos de sarampo nos estados de Roraima e Amazonas,
contabilizando, até o mês de junho de 2018, 314 casos. O surto de sarampo
ocorrido no Brasil evidencia as consequências da redução do número de
vacinados, que vem ocorrendo anualmente no país [21].
Este
estudo também buscou traçar um perfil dos EAPV mais relatados em crianças
paraibanas, de acordo com o registro nacional de eventos adversos, relacionados
às vacinas pediátricas obrigatórias. Foi possível evidenciar um aumento nas
notificações do EAPV ao longo do período entre 2011 e 2017, com pico no último
ano avaliado. O imunobiológico com maior ocorrência de EAPV foi a pentavalente e o evento mais frequente foi a febre.
Tais
achados revelam dois aspectos interessantes, o primeiro é a clara variação
sazonal das taxas de casos de EAPV encontrada nesse estudo. O segundo aspecto a
ser considerado é que a notificação contribui para a supervisão da qualidade da
vacinação e dos imunobiológicos, buscando, assim, identificar as possíveis
causas para se ter uma melhor segurança e qualidade na assistência. Nesse
sentido, o aumento das notificações apresentado em 2017 pode não estar,
necessariamente, relacionado ao aumento dos eventos, mas sim à maior adesão ao
sistema decorrente dos benefícios ocorridos com as mudanças do sistema SI-EAPV
e da realização de programas de capacitação dos profissionais de saúde em
relação à notificação dos eventos adversos [22].
Quando
agrupados os EAPV, os eventos neurológicos mostraram-se mais prevalentes ao
longo do período analisado, seguido dos eventos locais. Durante a infância, a
amamentação pode influenciar a resposta vacinal e pode ou não afetar a
incidência de comportamentos adversos, reações locais e febre [23,24]. Nossos
achados concordam com os publicados anteriormente por Costa e Leão [25] e Boix-Amorós et al. [26].
Ademais,
esse estudo demonstrou o predomínio de EAPV relacionados ao imunizante pentavalente. Tal resultado é consistente na literatura
[22,25,27], que indica que vacinas com componente pertussis
de células inteiras, como é o caso da pentavalente
disponibilizada pela rede pública da Paraíba, tendem a apresentar taxas mais
elevadas de EAPV [27]. Tais reações também são justificadas por outros autores
[22,26] pela presença do adjuvante hidróxido de alumínio, componente encontrado
tanto na pentavalente, como em vários outros
imunobiológicos, como a Meningocócica C, Dupla adulto, contra difteria e tétano
(dT), Tríplice bacteriana, contra difteria, tétano e pertussis (DTP) e Hepatite B; estas possuem ainda como
conservante, o timerosal, com exceção da vacina
Meningocócica C. Indivíduos com alergia cutânea ao timerosal
podem apresentar processo inflamatório local [25]. Sendo assim, as altas taxas
de EAPV associadas ao imunizante pentavalente podem
ser explicadas pelo fato desse ser formulado com tais conservantes e
adjuvantes, carregando riscos neurotóxicos e/ou
reações imunes não intencionais [24].
Da
Silveira et al. [28] relataram em seu estudo que os erros de imunização
foram responsáveis por cerca de 70% dos EAPV registrados, confirmando que tais
erros são os principais responsáveis pelos EAPV. Podem ser considerados
como qualquer evento evitável, resultante de falhas no preparo, manuseio,
armazenamento ou administração de imunobiológicos, a fim de reduzir ou anular o
efeito vacinal esperado [29].
Contudo,
é importante ressaltar que os riscos associados ao uso das vacinas disponíveis
não justificam a descontinuação de qualquer formulação disponível no
mercado. Além do mais, o risco associado à “não vacinação” causa
preocupações crescentes em vários países [14,21]. No Brasil, em especial,
a falta de informação e a divulgação de informações infundadas contribuem para
o reaparecimento de doenças infecciosas, como sarampo e
coqueluche. Destacamos também o risco associado à não aceitação de
vacinas, e só podemos esperar a redução dos seus impactos na morbimortalidade
se forem mantidas as condições adequadas de administração e cobertura vacinal
[30].
Importante
destacar que este estudo apresenta limitações a serem consideradas. É um estudo
retrospectivo, utilizando dados longitudinais ao longo de um longo
período. A qualidade dos dados pode ter variado durante o período do
estudo devido a possíveis mudanças no sistema de vigilância e sua estrutura
subjacente que pode ter afetado nossos resultados.
Com
base nos resultados obtidos na presente pesquisa, pode-se concluir que existe
flutuações em toda série histórica relacionada à cobertura vacinal no estado da
Paraíba, observando-se uma heterogeneidade na cobertura vacinal entre os
imunobiológicos estudados. Ademais, verificou-se ainda uma elevada proporção de
EAPV em crianças residentes do estado da Paraíba ao longo do período entre 2011
e 2017, com pico no último ano avaliado, sendo os de maior prevalência febre,
cianose, evento hipotônico e convulsão. O imunobiológico com maior ocorrência
de EAPV foi a pentavalente e o evento mais frequente
foi a febre.
Conflitos
de interesse
Nenhum
Fontes
de financiamento
Nenhuma.
Contribuição
dos autores
Concepção
e desenho da pesquisa:
Bezerra AMF, Safadi MAP; Coleta de dados:
Bezerra AMF; Análise e interpretação dos dados: Bezerra AMF, Almeida FJ,
Sato HK, Nunes EM, Berezin EN, Safadi
MAP; Redação do manuscrito: Bezerra AMF, Safadi
MAP; Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante:
Bezerra AMF, Sato HK, Nunes EM, Bezerra KKS, Berezin
EN, Safadi MAP.