Enferm Bras.
2023;22(6):1225-233
REVISÃO
Utilização
de lidocaína na cefaleia por nevralgia do nervo occipital
Leandro
Correa Tavares¹, Mariana David de Lisboa1, João Paulo Santana da
Rocha1, Marlon Vinícios Leite de Melo1,
Stanley Amaro Caldas da Silva1, Jano Alves
de Souza2, Catarine Torquato Barcellos3, Thiago de Mello
Tavares4, Marco Orsini1
1Universidade Iguaçu (UNIG), Nova Iguaçu,
RJ, Brasil
2Universidade Federal Fluminense,
Niterói, RJ, Brasil
3Universidade Estácio de Sá, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
4Universidade do Contestado, Mafra, SC, Brasil
Recebido
30 de Novembro de 2023; aceito 30 de dezembro de 2023
Correspondência: Marco Orsini,
orsinimarco@hotmail.com
Como citar
Tavares LC, Lisboa
MD, Rocha JPS, Melo MVL, Silva SAC, Souza JA, Barcellos CT, Tavares TM, Orsini
M. Utilização de lidocaína na cefaleia por nevralgia do nervo occipital.: uma
revisão de literatura. Enferm Bras. 2023;22(6):1225-233. doi: 10.33233/eb.v22i6.5571
Resumo
Analisar
a utilização de lidocaína na cefaleia por nevralgia do nervo occipital. Na
revisão integrativa da literatura, a escolha de artigos foi realizada nas bases
de dados National Library of
Medicine (PubMed), Latino-Americana
e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Scientific
Eletronic Library Online (SciELO). Infusões intravenosas de lidocaína são
consideradas para tratar enxaqueca crônica refratária. Lidocaína tópica é usada
para várias dores, sendo segura e eficaz em condições como neuralgia
pós-herpética. Doses precisam ser monitoradas para evitar efeitos colaterais.
Lidocaína a 10% pode prolongar eficácia em bloqueios do nervo occipital maior.
Adesivo de lidocaína pode não ser eficaz em cefaleia aguda ou pós-operatória.
Tratamentos multimodais, incluindo infusões de lidocaína, são usados para
enxaqueca, mas evidências a longo prazo são limitadas. Lidocaína tópica é eficaz
na neuralgia pós-herpética, enquanto bloqueios de nervos periféricos são opções
para dor intratável de cabeça ou face. Os estudos revelam a complexidade do uso
da lidocaína no tratamento da dor, com abordagens variadas, incluindo
formulações intravenosas, tópicas e bloqueios de nervos específicos. Cada
método possui vantagens e limitações, refletindo na eficácia diversificada
observada. Estes resultados destacam a necessidade contínua de pesquisas para
compreender os mecanismos de ação da lidocaína e sua aplicação ideal no manejo
da cefaleia por nevralgia occipital, enfatizando a importância da
personalização do tratamento conforme a condição individual do paciente.
Palavras-chave: Lidocaína, cefaleia por nevralgia do
nervo occipital, aspectos terapêuticos com o uso de lidocaína
Abstract
Use of lidocaine in headache due to occipital
neuralgia
To analyze the use of lidocaine in occipital neuralgia
headache, articles were selected from the National Library of Medicine
(PubMed), Latin American and Caribbean Health Sciences (LILACS), and Scientific
Electronic Library Online (SciELO). Intravenous lidocaine infusions are considered for
refractory chronic migraine. Topical lidocaine is used for various pains, safe
and effective for conditions like post-herpetic neuralgia. Dosing needs careful
monitoring to avoid side effects. Lidocaine at 10% can prolong efficacy in
major occipital nerve blocks. Lidocaine patches might not be effective for
acute or post-operative headaches. Multimodal treatments, including lidocaine
infusions, are used for migraines, but long-term evidence is limited. Topical
lidocaine is effective for post-herpetic neuralgia, while peripheral nerve
blocks are options for intractable head or face pain. Studies reveal the
complexity of lidocaine use in pain management, with varied approaches
including intravenous, topical formulations, and specific nerve blocks. Each
method has pros and cons, leading to diverse observed effectiveness. These
results emphasize the ongoing need for research to understand lidocaine's
mechanisms and its optimal application in occipital neuralgia headache
management, highlighting the importance of personalized treatment based on the
patient's specific condition.
Keywords: Lidocaine, occipital neuralgia
headache, therapeutic aspects of lidocaine use.
Nevralgia
occipital ou neuralgia de Arnold é uma inflamação ou lesão dos nervos
occipitais, os quais se estendem até o couro cabeludo a partir do topo da
medula espinhal. Esta inflamação causa, entre outros sintomas, fortes dores na
nuca ou na base do crânio, cefaleia e problemas ou desconforto visual [1].
Existem
várias causas que podem causar estes problemas nos nervos occipitais, seja no
nervo occipital maior ou menor, embora na maioria dos casos a origem seja uma
das seguintes condições anormais: Um trauma que afetou o nervo occipital,
tensão no ligamento nucal, pescoço ou músculos do
pescoço, endurecimento dos tecidos adiposos ou músculos da parte posterior da
cabeça (occipital), arteriosclerose, lesões crônicas devido à má postura
contínua, como manter o pescoço estendido por muito tempo, entre outros.
A
nevralgia occipital é comum na prática clínica2. Seu manejo inclui antiinflamatórios não esteroidais (AINEs),
medicamentos utilizados no tratamento da dor neuropática, além de relaxantes
musculares e, às vezes, opiáceos. Com todos eles, o uso crônico pode ser
necessário, com o consequente risco de abuso, bem como de dependência e
tolerância [2]. Podem ser observadas dores de cabeça mistas, inclusive aquelas
secundárias ao abuso de drogas, que são mais difíceis de tratar. Apesar da sua
eficácia no seu alívio, a infiltração anestésica do referido nervo é pouco
utilizada e também contribui para o diagnóstico da entidade, bem como para
evitar os inconvenientes acima mencionados [3].
Os
anestésicos locais são drogas capazes de interromper de forma reversível a
condução do impulso nervoso, bloqueando os canais de sódio dependentes de voltagem.
Sua fração não ionizada e lipossolúvel é o que acessa o interior do axônio e
determina o tempo de latência. Seu mecanismo de ação, entretanto, depende da
fração ionizada. A associação com medicamento vasoconstritor reduz a absorção
sistêmica do anestésico4,5. Contudo, esta combinação não é recomendada devido
ao risco de necrose tecidual. A escolha de um ou outro anestésico é arbitrária.
As amidas lidocaína 1 e 2% (10-20 mg/ml), mepivacaína
2% (20 mg/ml) e bupivacaína 0,25 e 0,5% (2,5-5 mg)
são comumente utilizadas [4,5].
A
questão norteadora do presente estudo é: como utilizar a lidocaína na cefaleia
por nevralgia do nervo occipital?
Este
estudo utiliza a abordagem de revisão integrativa da literatura, que permite a
associação de vários estudos publicados para concluir sobre uma determinada
área de estudo.
Os
resultados possibilitam buscar, avaliar e sintetizar as evidências disponíveis
sobre um tema e retratam a posição atual do que se investiga, contribuindo para
a efetividade das ações em saúde e evidenciando lacunas direcionadoras de
futuras pesquisas.
O
objetivo desta pesquisa é analisar a utilização de lidocaína na cefaleia por
nevralgia do nervo occipital. Para isso, foram utilizadas as bases de dados
LILACS (Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde), SCIELO
Brasil, (Scientific Eletronic Library Online) e
MEDLINE (Medical Literature Analysis
and Retrieval System Online).
Após
a seleção dos descritores, “lidocaína” “cefaleia por nevralgia do nervo occipital”
e “aspectos terapêuticos com o uso de lidocaína” foram selecionados os artigos.
Foram
adotadas as seguintes etapas: identificação do tema, seleção da questão de
pesquisa, estabelecimento dos critérios de elegibilidade, identificação dos estudos
nas bases de dados e análise crítica, avaliação dos estudos incluídos na
revisão, interpretação dos resultados e síntese do conhecimento.
Para
realizar a seleção, foram pré-selecionados os artigos com base no título e
resumo e, em caso de dúvidas sobre o conteúdo, o artigo foi selecionado para
leitura completa, a fim de decidir sobre a inclusão ou exclusão na revisão.
Foram
incluídos estudos nos idiomas português ou inglês,
disponíveis em texto completo, no formato de artigos, publicados em qualquer
data e que abordavam o tema deste estudo. São descartadas pesquisas que não
respondem à pergunta de busca.
Depois
de concluída a busca os resultados serão comparados, e os artigos que coincidam
serão selecionados, enquanto os estudos alheios descartados.
A
síntese dos artigos incluídos no estudo foi organizada de acordo com os
seguintes itens: título do artigo / autores/ ano de publicação; periódico/;
resultados; e conclusão. (Figura 1). Foram totalizados 12 artigos sobre o tema.
Infusões
intravenosas de um anestésico local, como a lidocaína, têm sido sugeridas como
uma possível opção de tratamento para pessoas com baixa qualidade de vida
devido à enxaqueca crônica refratária ao tratamento. Em um estudo conduzido por
Schwenk et al. [12], foram analisados os
registros hospitalares de 609 pacientes que sofriam de enxaqueca crônica
refratária. Estes pacientes, que tinham pelo menos 8 dias de dor de cabeça
intensa por mês durante 6 meses ou mais, não responderam aos sete tipos
diferentes de medicamentos para enxaqueca disponíveis. Todos eles receberam
infusões de lidocaína, juntamente com outros tratamentos agressivos para
enxaqueca, como cetorolaco, magnésio, diidroergotamina, metilprednisolona
e neurolépticos. Os resultados mostraram que a maioria dos pacientes (87,8%)
experimentou um alívio rápido da dor, indicando benefícios significativos a
curto e médio prazos com essa abordagem terapêutica.
Segundo
Voute et al. [3], a lidocaína tópica é usada
para diversas condições de dor devido à sua absorção limitada e baixa
ocorrência de efeitos colaterais sistêmicos, sendo uma opção atrativa para
pacientes vulneráveis. Foi aprovada para tratar neuralgia pós-herpética em
vários países, com estudos evidenciando sua eficácia e segurança em várias
condições, como PSPP, DPN, síndrome do túnel do carpo, DLC e OA. As autoridades
de saúde globalmente apoiam o uso de analgesia que evite opiáceos, e
tratamentos tópicos, incluindo a lidocaína, desempenham um papel crescente
nesse contexto, devido à sua relação benefício-risco favorável. Portanto, a
lidocaína tópica pode ser uma alternativa excelente por si só ou em combinação
com tratamentos sistêmicos e não farmacológicos.
De
acordo com Sahai-Srivastava et al. [5], é
importante distinguir os efeitos colaterais de diferentes doses de lidocaína
para escolher os pacientes apropriados e fornecer instruções pré-procedimento adequadas. O estudo observou que os
pacientes que apresentaram efeitos colaterais estavam de estômago vazio,
indicando que os pacientes não devem jejuar antes do procedimento. Além disso,
foi sugerido que pacientes que precisam de injeções bilaterais devem recebê-las
com um intervalo de pelo menos 15 a 30 minutos ou em consultas separadas, pois a
maioria dos efeitos colaterais ocorreu quando as injeções bilaterais foram
administradas simultaneamente. Recomendou-se também monitorar os sinais vitais
dos pacientes por 30 minutos após o procedimento como prática padrão.
Kim
et al. [7] observa que os bloqueios do nervo occipital maior (GONB) são
usados para tratar dores de cabeça, mas seus efeitos costumam ser temporários.
Este autor cita um estudo realizado por Ready et al
em coelhos indicou que injeções intratecais com
concentrações de lidocaína de pelo menos 8% causaram alterações neurológicas/
histológicas significativas. Este estudo testa a hipótese de que o uso de
lidocaína a 10% no GONB pode prolongar o alívio da dor. Portanto, a lidocaína a
10% pode ser uma opção útil para estender a eficácia dos bloqueios do nervo
occipital maior.
De
acordo com Bai et al. [9], o uso de adesivo de
lidocaína pode não ser eficaz no controle da dor aguda da cefaleia ou na dor
pós-operatória, não reduzindo a intensidade da dor, o consumo de opioides ou o
tempo de internação hospitalar.
Guerra
et al. [10] enfatiza que tratar o estado de enxaqueca requer uma
abordagem multimodal para reduzir a dor, evitar recorrências e ajudar o
paciente a retornar ao seu estado anterior. As terapias convencionais podem não
ser suficientes, levando ao desenvolvimento de alternativas como bloqueios pericranianos, opioides, levetiracetam
intravenoso, infusões de lidocaína, cetamina e propofol, sendo este último exigindo monitoramento
cuidadoso. Embora essas terapias possam ser eficazes em situações agudas de
emergência, há menos evidências de melhorias a longo prazo.
De
acordo com os autores a seguir, Pan et al. [1] indica que descompressão
cirúrgica, neurotomias e neurólise
são tratamentos de último recurso para a neuralgia occipital, exigindo estudos
maiores e ensaios clínicos randomizados para avaliar sua eficácia e segurança.
Maloney et al. [2] destaca que a
lidocaína tópica é eficaz para a neuralgia pós-herpética, com evidências
limitadas para outros analgésicos tópicos, sendo uma opção benigna para
diversas condições de dor crônica.
Longas
[11] realizou estudos que mostraram a eficácia do adesivo de lidocaína a 5% na
redução da dor contínua e alodinia por até 7 dias,
comparável a outras terapias como capsaicina tópica e gabapentina
sistêmica.
Levin et al. [6] destaca que bloqueios
de nervos periféricos são opções viáveis para pacientes com dor intratável de
cabeça ou face, embora as evidências sejam limitadas.
Observações de Choi et al. [8] sugerem que a lidocaína a 5% pode
ser seguramente usada para analgesia prolongada em pacientes selecionados com
síndromes de dor crônica intratável.
Voute et al. [3] e Bai
et al. [9] trazem à tona a aplicação tópica de lidocaína para condições
dolorosas. Voute et al. [3] destaca a
segurança e eficácia da lidocaína tópica em várias condições, enquanto Bai et al. [9] questiona a eficácia do adesivo de
lidocaína no controle da dor aguda da cefaleia ou na dor pós-operatória.
Sahai-Srivastava et al. [5] discute a importância
de diferenciar os efeitos colaterais de diferentes dosagens de lidocaína,
enfatizando a necessidade de instruções pré-procedimento
adequadas. Kim et al. [7] explora a ideia de prolongar o alívio da dor
no contexto dos bloqueios do nervo occipital maior, usando concentrações mais
altas de lidocaína.
Por
outro lado, Guerra et al. [10] destaca a necessidade de uma abordagem
multimodal para o tratamento da enxaqueca, incluindo terapias como bloqueios pericranianos, opioides, levetiracetam
intravenoso, infusões de lidocaína, cetamina e propofol. Levin et al. [6]
também discute a viabilidade dos bloqueios de nervos periféricos, especialmente
em casos intratáveis de dor de cabeça ou face.
Observações de Choi et al. [8] respaldam o uso prolongado e seguro
da lidocaína a 5% para analgesia em pacientes com síndromes de dor crônica
intratável.
Considerando
os autores Kim et al. [7], Pan et al. [1] e Maloney
et al. [2], a discussão sobre o uso da lidocaína para o tratamento da
dor torna-se ainda mais complexa e abrangente.
Kim
et al. [7] destaca a eficácia limitada dos bloqueios do
nervo occipital
maior, especialmente em relação à sua
duração, levando à exploração de
concentrações
mais altas de lidocaína para prolongar o alívio da dor.
Esta perspectiva
reforça a busca por estratégias que ampliem a
eficácia dos tratamentos,
considerando diferentes formulações e doses de
lidocaína.
Pan
et al. [1] introduz a ideia de que procedimentos como descompressão
cirúrgica, neurotomias e neurólise
podem ser tratamentos de último recurso para condições como a neuralgia
occipital. Esta visão ressalta a necessidade de estudos mais amplos e ensaios
clínicos randomizados para avaliar a verdadeira eficácia e segurança dessas
intervenções, inclusive quando envolvem o uso de lidocaína.
Maloney et al. [2] relata o potencial da
lidocaína tópica, especialmente para casos de neuralgia pós-herpética,
ressaltando sua segurança em comparação com outros analgésicos tópicos. A
abordagem tópica da lidocaína sugere uma alternativa menos invasiva e mais
acessível para o manejo da dor crônica, o que pode ser particularmente
relevante em cenários onde intervenções mais agressivas são desaconselhadas.
Assim,
enquanto alguns autores apoiam fortemente o uso de lidocaína, seja por via
intravenosa, tópica ou por meio de bloqueios específicos, outros ressaltam a
necessidade de estudos mais amplos, instruções precisas e uma abordagem abrangente
para o tratamento da dor crônica e aguda, indicando uma diversidade de
perspectivas e necessidades clínicas na gestão da dor.
Levando
em conta as perspectivas diversas dos estudos pesquisados, é evidente que o uso
da lidocaína no contexto do tratamento da dor é multifacetado. As formulações
intravenosas, tópicas e os bloqueios específicos de nervos oferecem diferentes
abordagens, cada uma com seus benefícios e limitações.
A
variação na eficácia observada em diferentes estudos sugere a necessidade
contínua de pesquisa para entender melhor os mecanismos de ação da lidocaína e
seu papel ideal no manejo da cefaleia por nevralgia do nervo occipital bem como
a importância de personalizar o tratamento de acordo com a condição específica
do paciente.
Conflitos de interesse
Não há conflito de interesse
Fontes de financiamento
Nenhuma
Contribuições dos autores
Concepção e desenho da pesquisa: Tavares, LC; Obtenção de dados: Lisboa, MDCorrêa
ALGP, Nascimento FAP, Nalim IS, Pires JCP, Ribeiro MQ, Almeida NLS; Análise e interpretação dos dados: Corrêa
ALGP, Nascimento FAP, Nalim IS, Pires JCP, Ribeiro MQ, Almeida NLS; Análise
estatística: Almeida BS, Ribeiro MQ, Almeida NLS; Redação do manuscrito: Corrêa ALGP, Almeida BS, Nalim IS, Ribeiro
MQ, Almeida NLS; Revisão crítica do
manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Corrêa ALGP, Almeida
BS, Nascimento FAP, Nalim IS, Pires JCP, Ribeiro MQ, Almeida NLS.