ARTIGO ORIGINAL

Fatores que contribuem para a segurança e insegurança do graduando de enfermagem durante o estágio

 

Kaline Dellys dos Santos*, Marcio Antonio de Assis**

 

*Aluna do Curso de Graduação em Enfermagem, Universidade de Mogi das Cruzes (UMC), **Docente do Curso de Graduação em Enfermagem da Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) 

 

Recebido em 2 de junho de 2015; aceito em 08 de fevereiro de 2017.

Endereço para correspondência: Kaline Dellys dos Santos, Rua Padre Lucio Xavier de Castro, 319, 08720-030 Mogi das Cruzes SP, E-mail: dellys.kaline@gmail.com, Marcio Antonio de Assis: marcioassis80@gmail.com

 

Resumo

O objetivo do estudo foi identificar os fatores responsáveis por gerar insegurança nos discentes do curso de enfermagem durante o primeiro estágio. Trata-se de uma investigação descritivo-exploratório com abordagem quantitativa realizada no curso de uma universidade particular. Trinta e nove discentes participaram do estudo respondendo a um questionário com perguntas abertas e fechadas. Foram identificados sentimentos relacionados ao próprio estudante, ao paciente e ao curso, e dentre os fatores mais evidenciados 69% apresentavam-se muito ansiosos frente à espera para início das práticas, 67% apresentavam sentimento de ansiedade caracterizado por entrada em ambiente desconhecido e 42% sentimento de despreparo. Este estudo contribui para refletir sobre as práticas curriculares dos acadêmicos, proporcionando a visão dos fatores que geram estresse bem como de meios para amenizá-los.

Palavras-chave: estágio clínico, ansiedade, fatores desencadeantes.

 

Abstract

Factors contributing to the security and insecurity of the nursing student in training

The aim of the study was to identify factors responsible for generating insecurity in students of nursing program during the first training period. It is a descriptive and exploratory research with a quantitative approach performed in a private university. Thirty-nine students participated in the study by answering a questionnaire with open and closed questions. Feelings were related to the student himself, the patient and the course, and among the most evident factors 69% of participants had feelings of anxiety while waiting for the beginning of the practices, 67% characterized by entry into unfamiliar environment, and feeling of unpreparedness (42%). This study contributes to think about the academic practices, providing a vision of the factors that generate stress and means to attenuate them.

Key-words: nursing training, anxiety, precipitating factors.

 

Resumen

Los factores que contribuyen a la seguridad y la inseguridad del estudiante de enfermería durante la pasantía

El objetivo del estudio fue identificar los factores responsables de generar inseguridad en los estudiantes del programa de enfermería durante la primera etapa de las prácticas. Se trata de una investigación descriptiva y exploratoria, con abordaje cuantitativo llevado a cabo en ese curso en una universidad privada. Treinta y nueve estudiantes participaron en el estudio respondiendo un cuestionario con preguntas abiertas y cerradas. Se han identificado sentimientos relacionados con el propio estudiante, el paciente y el curso, y entre los factores más evidentes el 69% de los participantes presentaban ansiedad ante la espera del inicio de las pláticas, el 67% presentaba sentimientos de ansiedad caracterizado por la entrada en ambiente desconocido, y sensación de falta de preparación (42%). Este estudio contribuye a reflexionar sobre las prácticas curriculares de académicos, proporcionando una visión de los factores que generan estrés y los medios para amenizarlos.

Palabras-clave: prácticas clínicas, ansiedad, factores desencadenantes.

 

Introdução

 

O estresse é um fator importante de alteração no desempenho e falha na comunicação entre estudante/paciente, estudante/professor e estudante/equipe de enfermagem [1].

O estresse geralmente é desencadeado devido ao relacionamento indivíduo-ambiente e avaliado pelo indivíduo como desgaste ou excessivo aos seus recursos. O estresse é mais complicado que o simples mecanismo de estímulo e resposta, concentrando-se não no enfrentamento da ansiedade, mas, sim, à maneira como o indivíduo, em questão, percebe a ameaça. Sendo necessária na avaliação considerar o significado do estressor e os recursos de apoio que o indivíduo tem para enfrentá-lo [2].

A condição de estresse comumente gerada em situações que exigem responsabilidade, ação e estada em ambiente desconhecido, pode se apresentar de forma diferente em cada indivíduo, servindo como fator de motivação e superação quando em tempo limitado, já em longos períodos como causa de esgotamento fazendo com que o indivíduo sinta-se sobre forte pressão com exigências acima da capacidade por ele apresentada, representando uma ameaça a seu bem-estar, gerando assim um fator, ao contrário do mencionado anteriormente, desmotivador [1].

No início do estágio da graduação em enfermagem os alunos tendem a apresentar grande ansiedade gerada pela entrada em ambiente hospitalar, realização de técnicas e procedimentos aprendidos na teoria e pela interação com o paciente/família. Nessa fase o aluno sente o receio de como será recebido pela equipe, paciente/família e professor [3].

Trata-se de um período de transição do aluno para o profissional e também uma fonte de sofrimento e conflitos gerados pela ansiedade, medo de errar, sentimentos negativos como a impotência, a angústia, comuns à profissão, e despreparo dos alunos que iniciam o estágio, provavelmente por falha no ensino/aprendizagem. Esse processo carrega consigo a estressante natureza da transição para o profissional somada as características de cada acadêmico [4].

Percebe-se que no processo de formação acadêmica de enfermagem encontra-se de um lado o estresse gerado pelas exigências curriculares com estágios complexos e entrada brusca em ambiente desconhecido com situações complexas; e, por outro lado, quando os acadêmicos seguem para o estágio prático, encontram a insegurança do paciente frente a um estudante, o despreparo da equipe para realização de trabalho em grupo e a dificuldade do professor em acompanhar os graduandos durante os processos.

      Sabe-se, ainda, que durante as disciplinas teóricas do Curso de Graduação em Enfermagem são apresentados inúmeros procedimentos e técnicas relacionadas aos cuidados do paciente justamente para prepará-lo para esses desafios, porém, mesmo com essa abordagem, ao se deparar com a prática, o graduando apresenta uma série de dificuldades e inseguranças.

O ensino técnico-científico dos cursos de Graduação em Enfermagem está voltado para a visão e assistência do ser biológico, focando as suas necessidades e desconsiderando o ser humano tanto do paciente como do profissional que o assiste [5].

Dessa forma, durante os estágios, os alunos acabam por ter contato maior com os técnicos e auxiliares de enfermagem, que muitas vezes não estão preparados para o trabalho em equipe e o estudante não é bem aceito no local, o que ocasiona um choque entre a necessidade de desenvolver a assistência e a de aprendizado [6].

Na prática, o aluno se depara com a exigência de uma ação interativa de altruísmo, que exige reflexão, fazendo com que a assistência de enfermagem das disciplinas teóricas calcada em fundamentos e teorias terapêuticas passe a ser uma realidade sociocultural que envolve o cuidado de corpos e mentes [5].

Sendo assim, é importante ter o conhecimento das situações que contribuem para as dificuldades encontradas pelos graduandos de enfermagem em sua primeira experiência prática de assistência, para que isso sirva como subsídio para a elaboração de um método voltado a resolução das lacunas deixadas durante a sua formação ou que não foram supridas no decorrer das disciplinas teóricas.

Dessa forma, compreender o processo das experiências, onde estão as falhas durante o aprendizado teórico e a importância do primeiro contato com o paciente e ambiente é fundamental para amenizar possíveis efeitos negativos que possam ser gerados durante o primeiro estágio do graduando de enfermagem.

Com isso, a identificação das situações e falhas, que colaboram para a geração de situações desconfortáveis e dificuldades dos alunos, contribuirá não só na melhora do desempenho do discente, mas também auxiliará o docente na amenização dos sentimentos de frustração, por meio da melhora na interação entre ambos, permitindo, assim, um melhor preparo para a entrada no ambiente com suas complexas exigências, que são fortes fatores de estresse geradores de conflitos pessoais e interpessoais.      

 

Material e métodos

 

Tratou-se de um estudo descritivo-exploratório com abordagem quantitativa. Realizado em uma instituição privada de ensino superior do município de Mogi das Cruzes/SP. Participaram deste estudo 39 alunos regularmente matriculados entre o 5° e 8° semestre do curso de graduação em Enfermagem, sem experiência prévia na área, que realizaram ou estavam realizando estágio no curso de graduação. A coleta de dados foi realizada por meio da aplicação de um questionário aos graduandos voltado a levantar informações pertinentes às pessoas (graduandos de enfermagem), no sentido de conhecer as dificuldades encontradas por eles no momento da experiência dos primeiros procedimentos durante a prática de estágio. Os resultados obtidos foram descritos em números absolutos e em forma de percentual.

 

Resultados e discussão

 

      Dos 39 discentes que aceitaram responder ao questionário nota-se uma faixa etária média de 25 anos, com predominância do gênero feminino (92%), já compreendido pela história natural das Escolas de Enfermagem, e minoria masculina 8%.

O estudo possibilitou notar a ansiedade apresentada por esses alunos frente ao primeiro contato com o ambiente hospitalar, evidenciado pelas respostas obtidas dos participantes deste estudo, dos quais 69% apresentavam-se muito ansiosos frente à espera para início das práticas.

A ansiedade pode ser considerada como uma reação natural que é produzida diante de certos tipos de situações nas quais a pessoa necessitaria de recursos necessários às mudanças no cotidiano. Em estudos realizados com estudantes de enfermagem a ansiedade é, ainda, referida como uma forma de estresse que aparece ao desenvolverem atividades práticas para as quais não se sentem preparados [1].

O que permite entender, assim, que a entrada dos alunos numa situação desconhecida é o que desencadeia tensões e ansiedade, que podem interferir ou não de modo negativo no aprendizado.

Ao serem questionados sobre as possíveis causas dessa ansiedade, 67% a relacionaram com a expectativa para conhecer a dinâmica hospitalar, conforme demonstrado na tabela I.

 

Tabela I - Apresentação das causas de sentimento de ansiedade pelos alunos frente à espera pela realização das práticas de cuidados com pacientes, Mogi das Cruzes/SP, 2015.

 

 

Colocada em questão a pergunta referente às emoções negativas no primeiro estágio clínico, observaram-se, nos discursos, sentimentos negativos como medo, ansiedade, piedade, necessidade de paciência e empatia. Pois, por mais que saibam a teoria e tenham treinado as técnicas em laboratórios, não tiveram contato anterior com paciente para que essa ansiedade, ocasionada pela falta de experiência e pelo medo do desconhecido diminuísse [1,4].

Além da ansiedade, o início das práticas assistenciais em ambiente hospitalar acarreta mudanças na vida diária dos estudantes de enfermagem. Fato notado nos dados obtidos, dos quais 92% dos discentes relataram que sentiram mudanças no cotidiano acadêmico, sendo caracterizada pela visão da realidade prática (29%), a necessidade de conhecimento adicional (29%) e ao acréscimo de conhecimento prático/teórico (41%).

A ansiedade e o estresse são associados pelos estudantes a sua inexperiência, ao despreparo em lidar com situações críticas e a interferência das horas exigidas para estudos teóricos, não só referente às exigências de sala de aula, como também, aos conhecimentos específicos exigidos e adquiridos em campo prático [1].

A mudança, assim, é sentida no momento em que o estudante entra em contato direto com a realidade do campo prático que permite o desenvolvimento pessoal/profissional e a consolidação de conhecimentos adquiridos no transcorrer do curso, por meio da relação teoria-prática exigida do aluno, denotando assim maior dedicação. A dinâmica exigida, o tempo destinado à permanência no campo de estágio e a necessidade de determinadas habilidades podem ser encarados como somatórios as mudanças relatadas.

Assim, ao serem questionados quanto ao sentimento de preparo para o início do estágio, 56% dos participantes referiram-se não preparados, associando essa característica à falta de aulas práticas (91%), ao sentimento de despreparo (45%) e à necessidade de buscar novos conhecimentos (27%).

Os acadêmicos deixam, assim, explícitos sentimentos, como insegurança e medo, ao notarem que terão que agir com postura profissional junto ao paciente. Sentimentos que se justificam pela dificuldade de comunicação e interação entre paciente/aluno, cuja maior preocupação é a sensação de prejuízo que pode ser causado ao paciente, por suas inabilidades e conhecimentos ainda limitados.

Os sentimentos de preparo são associados ao processo ensino-aprendizagem, relacionado ao regime tutorial e institucional, com boa oferta de base para ensino prático/teórico e supervisão por um profissional capaz de atitudes que permitam o diálogo com o discente, sem preconceitos entre senso comum/ciência que contribuem para o entendimento da realidade. Sendo assim, capaz de proporcionar maior segurança ao aluno [7-9].

Percebe-se que o processo de aprendizagem prática pode passar por diversos tipos de influências e, para minimizar impactos gerados pelo novo ambiente e pelas incertezas vivenciadas pelo estagiário é necessário que se tenha o enfoque em estratégias que minimizem essas características, como a possibilidade de encontrar um bom acolhimento dentro do serviço no qual será inserido. Este foi um dos pontos levantados junto aos discentes que revelaram que foram bem acolhidos apenas por alguns membros da equipe (33%), 36% foram acolhidos e 31% não se sentiram acolhidos.

A entrada do estudante no serviço de saúde pode acarretar mudanças na rotina do setor. Isso afeta diretamente o funcionário que vê sua necessidade de desenvolver tarefas cotidianas chocar-se com as necessidades dos alunos para o aprendizado, e disso pode advir o conflito. Cabendo ao professor se fazer presente neste momento dando suporte, quanto ao empenho do próprio aluno e ao auxílio do enfermeiro atuante [1].

Dessa forma, nota-se, tanto pelo apresentado na literatura quanto pelo obtido no estudo, a necessidade das atividades práticas serem realizadas de maneira adequada, educativas e proveitosas para quem as está aprendendo, é imprescindível um ambiente que favoreça a sua permanência e proporcione tranquilidade. Com isso, os alunos foram questionados sobre alguns aspectos como o desconforto frente à equipe e 54% apresentaram em algum momento essa sensação dentro do serviço de saúde. Esse desconforto sentido pelos graduandos foi associado à baixa receptividade (57%), ao sentimento de despreparo (36%), ao sentimento de estar atrapalhando (21%) e ao fato de não conhecer a equipe (14%).

Verifica-se, então, que os alunos precisam receber apoio da equipe como um todo para sentirem-se mais seguros em realizar as tarefas propostas. Apoio este que pode ser fornecido pela compreensão e paciência da equipe com o compromisso docente/discente, para remanejar funções em direção aos alunos, oportunizando a prática tão esperada por estes [10].

Todavia o ambiente de estágio, no qual o acadêmico está inserido, afeta diretamente os resultados do seu aprendizado. Assim, em relação à estrutura da(s) instituição(s), 31% dos discentes relataram sentir-se desconfortáveis, associando a divergência entre o ensinado na teoria e o vivenciado na prática (43%), fator intimamente ligado a falta de insumos, citado por 86% dos participantes.

É possível notar a preocupação dos alunos com a equipe e a forma de trabalho dela, já que, muitas vezes, é diferente da que é exigida pelos professores, que ensinam a necessidade de atitudes éticas, da prática de técnicas corretas que não afetem a integridade do cliente, o que, a maioria das vezes, diverge da experiência em campo, que nem sempre está em concordância com essas recomendações.

No cotidiano dos serviços de saúde muitas vezes os profissionais justificam a forma como desenvolvem suas práticas laborais com base na infraestrutura do local de trabalho. Para a realização da prática assistencial, faz-se necessário, entre outras condições, a garantia de infraestrutura apropriada, com disponibilidade de equipamentos adequados, de recursos humanos capacitados e de materiais e insumos suficientes à assistência prestada [11].

Nesse contexto a relação aluno/professor torna-se um meio que minimiza ou potencializa as situações e implicações responsáveis por gerar desconforto, bem como as que geram ansiedade e medo. Com base nessa relação, 92% dos discentes relataram ter uma boa relação com o docente, relacionando tal afirmação à acessibilidade do professor para o esclarecimento de dúvidas (85%), ao bom suporte oferecido pelo professor (54%), a paciência e disposição para ensinar (46%), a prestação de auxílio sempre que solicitado e ao feedback apresentado no desempenho dos alunos (31% respectivamente). Outros 5% classificaram a relação como regular, associando ao pouco contato com o professor.

Nota-se a necessidade de o docente estar voltado ao processo do ensino-aprendizagem que é o seu próprio papel no contexto da educação dos discentes, na prática profissional e no relacionamento interpessoal, uma vez que este possui papel fundamental não apenas no processo de ensino-aprendizagem de temas técnicos, como também na formação ética do caráter que será projetado nas atitudes do futuro profissional. Deve-se focalizar um ensino reflexivo, a fim de desafiar, estimular e ajudar os alunos na construção de habilidades e competências que fortaleçam o compromisso profissional [3,5,10].

Em relação ao desconforto sentido, na relação professor/aluno, 41% dos participantes sentiram-no relacionando-o ao sentimento de despreparo, insegurança frente à avaliação e medo de errar (21%), a ansiedade frente ao procedimento e a pouca liberdade com o professor (14%).

Levando-se em conta que o docente funciona como um modelo para o graduando, conduzindo e orientando, este, a uma instrumentalização para formação de futuros profissionais da saúde, o docente deve estar voltado ao processo de ensino-aprendizagem, com o intuito de transmitir todo o arcabouço teórico e prático, capacitando o aluno a assistência de qualidade e estabelecimento de vínculo terapêutico com o paciente.

Neste contexto, os discentes foram questionados em relação ao contato com o paciente, 74% referiram ter tido bom contato, atribuindo-o ao acolhimento e colaboração do paciente (100%), boa comunicação (58%), a troca de experiência (17%) e ao estabelecimento de vínculo (17%). Já 23% relataram experiência regular, dos quais 43% associaram à insegurança na abordagem, ao empecilho da ansiedade (29%) e ao pouco contato com o paciente (29%). Enquanto 3% a classificaram como ruim, atribuindo o constrangimento como fator de classificação.

Os acadêmicos deixam explícitos sentimentos, como insegurança e medo, quando percebem que terão que agir junto ao paciente com a postura de um enfermeiro. Esses sentimentos justificam-se pelo medo do novo, do desconhecido, justificadas pela descoberta do processo de cuidar no início da prática profissional. Por isso, para amenizar a situação, o desenvolvimento da competência de comunicação faz-se cada vez mais necessária, pois somente assim é possível continuar oferecendo cuidado interdisciplinar, personalizado, competente e humanitário [1,5,7].

Estando a relação intimamente ligada aos fatores geradores de desconforto, questionou-se sobre este sentimento frente ao paciente e obteve-se de 46% dos participantes uma relação com esse aspecto, atribuindo-o, em sua maioria (33%), a ansiedade gerada pelo primeiro contato.

A relação do discente com o grupo em que está inserido pode influenciar, significativamente na ampliação ou diminuição da ansiedade, uma vez que a união do grupo promove o auxílio mútuo e amplia as possibilidades de aprendizado por debate e troca de experiências. Questionados, então, quanto à sensação de desconforto frente ao grupo, 15% associaram-na à falta de união e interesse, pressão entre os membros para realização de procedimentos e ao sentimento de isolamento (17%). Considerando-se as situações que geraram desconforto, 69% relataram não tê-las, enquanto 31% relataram senti-las com impactos associados, relacionando-as a falta de técnica durante a realização de procedimentos (31%) e a falta de insumos (15%).

A insegurança pode ser uma grande geradora de ansiedade, principalmente quando está ligada ao preparo técnico para realização das atividades e procedimentos associados ao medo de errar e causar algum prejuízo ao paciente sob seus cuidados. No entanto, quando auxiliados, os estudantes têm competência técnica e capacidade para resolver os problemas junto com os colegas de grupo e professor. Quando recebem o apoio deles a ansiedade diminui e os estágios passam a ser mais simples e mais proveitosos [1].

Nota-se até aqui a complexidade do estudar enfermagem e do passar pelos campos de estágios para se obter o grau de enfermeiro. Este momento torna-se um divisor de águas, devido à confrontação com a realidade da profissão, fazendo com que os alunos sem experiência sintam maior impacto nesse processo. Isso levou-nos a questionar sobre a cogitação da desistência do curso, constatando-se que apenas 8% dos discentes já pensaram em desistir devido a dificuldades de adaptação (20%), a falta de campo para início do estágio (20%), a baixa quantidade de aulas práticas ministradas (20%), a dificuldade na realização de procedimentos (20%) e a visão da responsabilidade que cabe ao enfermeiro (20%).

Quanto aos procedimentos de maior e menor complexidade, identificados durante o processo de estágio, os discentes revelaram ter dificuldades maiores durante a realização de exame físico (46%), anotações de enfermagem (41%), punção venosa (38%), banho no leito (38%), curativos (38%), passagem de sonda (38%), administração de medicamentos (38%) e troca de bolsa de colostomia (33%). Destacando que os procedimentos ainda não realizados pelos participantes não foram assinalados pelos mesmos.

Quanto à realização de procedimentos, os discentes associaram o conhecimento teórico do procedimento (56%), boa habilidade de comunicação (41%), habilidades desenvolvidas em laboratório (38%), boa receptividade da equipe (33%), presença do professor e conhecimentos adquiridos em sala de aula (31%) como fatores geradores de maior ansiedade. Além disso, associaram a diminuição da ansiedade à boa relação com o grupo de estágio (90%), abertura para o processo de ensino/aprendizagem proporcionado pelo professor (85%), boa receptividade do paciente/família (69%), a presença do professor (69%) e ao conhecimento adquirido em aulas teóricas (69%).

Todos esses fatores geradores de ansiedade contribuem para o aparecimento de sentimentos negativos. Por mais que tenham conhecimento teórico, relatam deficiência no conhecimento prático, por pouco treinamento em laboratório e pouco ou nenhum contato com o paciente, fator que não colabora para a diminuição da ansiedade frente à falta de experiência. Essa ansiedade é causada pela entrada em ambiente hospitalar como futuro profissional, ampliada ou ocasionada pela percepção de aspectos externos, que podem ser tanto negativos quanto positivos.

Os aspectos positivos são descritos pelos discentes como sendo aplicação do conhecimento teórico (42%), possibilidade de contato como paciente (38%), possibilidade de ampliação do conhecimento (35%), maior segurança (19%), entre outros. Já os aspectos negativos, em sua maioria (40%) são associados à baixa oportunidade para realização de procedimentos.

Com isso, os discentes foram questionados sobre as possíveis modificações para melhoria das práticas, os quais sugeriram, em sua maioria, maior número de aulas práticas (65%) e ampliação do tempo de estágio (60%).

Pode-se perceber, assim, a necessidade que esses alunos possuem frente a habilidades técnicas, uma vez que o processo de formação, muitas vezes, deixa lacunas nesse sentido, seja pela grande quantidade de alunos em sala, o que dificulta aulas em laboratório, seja por falta de estrutura ou baixa oportunidade em campo. Fato evidenciado pela colocação, como ponto de melhoria, o aumento de aulas práticas, bem como o aumento do tempo de estágio, possível tentativa de maior realização de procedimentos, tempo de contato com paciente e visualização da prática profissional.

Assim é possível perceber uma tríade importante transmissão-participação-atenção no âmbito da sala de aula, ou seja, fatores que interligados concebem uma compreensão do conhecimento transmitido que extrapola a formação profissional para a formação do ser humano como um todo, capaz de contribuir para promoção, recuperação e reabilitação da saúde do indivíduo, família e comunidade [12].

 

Conclusão

 

O objetivo deste trabalho foi conhecer os fatores que geram maior e menor insegurança nos discentes durante o seu primeiro estágio em campo hospitalar. Os resultados obtidos possibilitaram reflexões referentes ao ensino e desenvolvimento de procedimentos técnicos. Nota-se, segundo relatos, a importância de um bom desenvolvimento de aulas práticas que permitam um processo educacional que incite a transmissão, participação e atenção do discente. De forma que possibilite um sistema de ensino/aprendizagem voltado a atender as dificuldades e anseios do aluno, bem como a auxiliar em seu processo de formação um profissional capaz de se adaptar ao constante contato com situações estressantes presentes nos serviços de enfermagem, sem, contudo, perder a qualidade da assistência prestada.

 

Referências

 

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