ARTIGO ORIGINAL

Obesidade grau II leva a importantes alterações na capacidade cardiorrespiratória

Changes of cardiorespiratory capacity in obesity grade II

 

Juliana Carvalho Schleder, Ft.,M.Sc.*, Fernanda Vieira Simões, Ft.**, Francielly Binotto Barbosa, Ft.***, Doris Naoko Suzumura, Ft., M.Sc.****, Thatiana Moreira de Paiva, Ft. M.Sc.*****, Luiz Claudio Fernandes, D.Sc.******

 

*Doutoranda em Fisiologia na Universidade Federal do Paraná (UFPR), Fisioterapeuta no Hospital Universitário Regional dos Campos Gerais, **Fisioterapeuta da Clínica de Fisioterapia e Hidroterapia PennaFisio, ***Fisioterapeuta da Clínica de Fisioterapia São Lucas, ****Fisioterapeuta da Prefeitura de Quatro Barras, Especialista em Fisioterapia Oncológica, *****Fisioterapeuta no Hospital Araújo Jorge, Especialista em Fisioterapia Oncológica,******Professor titular do Departamento de Fisiologia da UFPR

 

Recebido em 27 de maio de 2016; aceito em 10 de março de 2017.

Endereço para correspondência: Juliana Carvalho Schleder, Rua General Cândido Rondon, 601/52, 84070-020 Ponta Grossa PR, Tel: E-mail: juschleder@yahoo.com.br; Fernanda Vieira Simões: fernandavsimoes@hotmail.com; Francielly Binotto Barbosa: franciellybinotto.fisio@hotmail.com; Doris Naoko Suzumura: doris.suz@gmail.com; Thatiana Moreira de Paiva: thatiana_paiva@hotmail.com; Luiz Claudio Fernandes: lcfer@ufpr.br

 

Resumo

Introdução: Obesidade é considerada epidemia mundial e um dos maiores problemas de saúde na atualidade, bem como as comorbidades a ela associadas que acarretam alterações nas funções cardiorrespiratórias desses indivíduos. Objetivo: Avaliar parâmetros cardiorrespiratórios em indivíduos sedentários obesos grau II. Os 44 voluntários foram divididos igualmente em dois grupos, obesos (GOS) e eutróficos (GE). Material e métodos: Foram mensuradas variáveis de expansibilidade torácica, força muscular respiratória, pico de fluxo expiratório (PFE), capacidade vital, além das variáveis do teste de caminhada de seis minutos (TC6). Resultados: Comparando os grupos, o GOS apresentou expansibilidade torácica com diferença significativa na inspiração (P = 0,038) e na expiração (P = 0,031) máximas do processo xifoide e na inspiração máxima (P = 0,039) da cicatriz umbilical, e PFE (P < 0,001). No TC6 o GOS apresentou frequência cardíaca (FC) em repouso mais elevada (P = 0,022) no pré-teste e saturação de oxigênio (SpO2) (P = 0,030) e distância percorrida (P < 0,001) menores, e Borg (P < 0,001) maior no pós-teste em relação ao GE. Comparando os parâmetros no pré e pós-TC6 houve alterações significativas da FC, frequência respiratória (FR), SpO2 e escala de Borg (toda com P < 0,001). Conclusão: A obesidade resulta em várias alterações cardiorrespiratórias importantes, incluindo aumento do trabalho respiratório, diminuição da expansibilidade torácica, obstrução ao fluxo aéreo e diminuição da saturação periférica de oxigênio.

Palavras-chave: obesidade, fenômenos fisiológicos cardiovasculares, modalidades de fisioterapia.

 

Abstract

Introduction: Obesity is a worldwide epidemic and one of the largest health problems leading to changes in the cardiorespiratory system. Objective: The aim of this study was to evaluate cardiorespiratory features on sedentary obese grade II subjects. Methods: Forty four individuals were divided into two groups referred as eutrophic (EG) and obese (OG). We measured chest expansion, respiratory muscle strength, expiratory peak flow (EPF), vital capacity and physiological variables in the six minute walk test (6MWT). Results: OG group showed a chest expansion with a significant difference in the expiration (P = 0.038) and expiration (P = 0.031) maximum in the xiphoid process and maximal inspiration (P = 0.039) of the umbilicus, and EPF (P < 0.001) when compared to EG group. In the 6MWT, OG showed at the pretest a rest heart rate (HR) higher (P = 0.022) and oxygen saturation (O2) (P = 0.030) and distance traveled (P < 0.001) lower, and Borg scale (P < 0.001) higher in the post-test when compared to GE. Comparison between pre- and post-6MWT was no significant changes in the HR, respiratory rate (RR), SpO2 and Borg scale (all P < 0.001). Conclusion: Sedentary obese individuals grade II have cardiorespiratory alterations, particularly in the chest expansion, EPF, HR, RR and SpO2.

Key-words: obesity, cardiovascular physiological phenomena, physical therapy modalities.

 

Introdução

 

A obesidade é considerada epidemia mundial, presente tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento [1]. Relatórios publicados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) apresenta uma estimativa para 2015 de 2,3 bilhões de adultos acima do peso e, destes, cerca de 700 milhões, obesos, chamando a atenção para a epidemia global de obesidade e a necessidade de prevenção primária do excesso de peso [2]. Pode ser definida de forma simplificada, como uma doença caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal que pode prejudicar a saúde. A obesidade é consequência do balanço energético positivo, que acarreta repercussões à saúde com perda importante não só na qualidade como na quantidade de vida [3].

Em relação ao diagnóstico, há várias determinações quanto ao tipo de distribuição de gordura, as quais podem ser usadas de forma simultânea ou não. Os índices antropométricos mais utilizados são: índice de massa corporal (IMC) que infere o grau nutricional do indivíduo [4], relação cintura quadril (RCQ) [5] que avalia o acúmulo de gordura na região abdominal e visceral [6], e a circunferência abdominal (CirAb) [7], que é um bom preditor de risco para doenças metabólicas e que dá o percentual de gordura corporal do indivíduo.

A obesidade é um dos maiores problemas de saúde da atualidade, devido às comorbidades associadas: cálculo na vesícula biliar [8], doenças cardiovasculares incluindo hipertensão arterial, dislipidemia [9], resistência insulínica, considerada precursora de diabetes mellitus do tipo 2 [10], maior chance de desenvolver placas ateroscleróticas [11], embolia pulmonar [12] e síndrome da apneia obstrutiva do sono [13]. Essas comorbidades acarretam, direta ou indiretamente, alterações nas funções cardiorrespiratórias desses indivíduos. Ou seja, a capacidade funcional dos obesos é reduzida, gerando um ciclo vicioso entre o aumento da obesidade e a diminuição da capacidade física, o que piora os índices de comorbidades e a mortalidade.

Em obesos mesmo sem comprometimento pulmonar, o sistema de transporte de gases é alterado acarretando intolerância ao exercício devido, também, ao aumento do esforço respiratório dado pelo excesso de adiposidade ao redor do tórax e abdômen [12].

A maior incidência de obesidade é a classificada como severa ou grau II, ou seja, IMC entre 35,0 e 39,9 kg/m2. Indivíduos classificados com obesidade grau I e II possuem uma maior susceptibilidade para alterações funcionais respiratórias [13]. No entanto, na literatura, observam-se lacunas de estudos no que se refere a alterações cardiorrespiratórias nos indivíduos com obesidade grau II.

O objetivo deste trabalho foi mensurar parâmetros cardiorrespiratórios em pacientes sedentários obesos grau II.

 

Material e métodos

 

Trata-se de estudo prospectivo de caráter descritivo, aprovado pelo Comitê de Ética de Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais sob o número 511/CEP.

O presente estudo abrangeu voluntários divididos em dois grupos: eutróficos (GE) que foi o grupo controle, e grupo obeso sedentário (GOS).

Foram incluídos 52 indivíduos não tabagistas, sedentários, de ambos os gêneros, com idade entre 18 e 60 anos, IMC entre 35,0 e 39,9 para o GOS e até 24,9 para o GE. Destes, 8 foram excluídos: 3 por serem portadores de alterações neurológicas dificultando o entendimento do teste e 5 por já terem realizado a cirurgia de gastroplastia. Portanto, a amostra foi constituída de 44 voluntários, 22 em cada grupo, que foram constituídos de 12 voluntárias do sexo feminino e 10 do sexo masculino, com idade de 35,63 (± 11,77) anos. Foi realizada uma avaliação inicial para coleta dos dados físicos e características pessoais dos indivíduos. Em seguida, todos os voluntários foram submetidos à avaliação pneumofuncional para avaliação de parâmetros da mecânica respiratória como: expansibilidade torácica, força respiratória, capacidade vital (CV) e pico de fluxo expiratório (PFE).

Na avaliação da expansibilidade torácica realizada por cirtometria, o voluntário foi posicionado na posição ortostática, coluna ereta, olhando para o horizonte com os membros superiores relaxados ao longo do tronco e os membros inferiores em posição de passo. Foram mensurados três pontos de referência: prega axilar, apêndice xifóide e linha umbilical, utilizando-se de fita métrica flexível posicionada logo abaixo de cada ponto, demarcado com o auxílio de lápis dermatográfico. As medidas da cirtometria foram realizadas em três momentos: repouso, após uma inspiração profunda, lenta e máxima até a capacidade pulmonar total e após uma expiração máxima, lenta, até o volume residual. Todos esses valores foram registrados em centímetros.

Para a verificação da força muscular do conjunto da caixa torácica como um todo, foi utilizado um manovacuômetro (Comercial Médica®), a partir do qual, foram avaliados a pressão inspiratória máxima (PiMax) e a pressão expiratória máxima (PeMax). Durante essas mensurações o voluntário foi posicionado sentado a 90º em cadeira com encosto, com os pés apoiados no chão, e membros superiores relaxados sobre os membros inferiores, clip nasal e adaptador bucal com orifício de aproximadamente 2 mm de diâmetro para evitar a elevação da pressão intra-oral através do escape de ar.

Para a mensuração da PiMax, a inspiração se iniciou a partir do volume residual, isto é, após uma expiração profunda, depois o pesquisador pediu para o voluntário fazer uma inspiração forte sustentando a pressão por aproximadamente 2 segundos. Já para a mensuração da PeMax, o voluntário começou no nível da capacidade pulmonar total, isto é, após uma inspiração profunda e, então, uma expiração forçada sustentando a pressão por 2 segundos. Para ambas as avaliações, foi considerado o maior valor após três tentativas e a unidade de medida utilizada foram milímetros de mercúrio (mmHg).

Para a mensuração da CV foi utilizado o espirômetro de incentivo a volume, Voldyne®. O voluntário permaneceu sentado inclinado a 90º e orientado a fazer uma expiração máxima e, logo em seguida, inspirar o máximo possível. Também, foram realizadas três manobras e considerada a de maior valor. A unidade de medida utilizada foram litros (L).

Para a mensuração do PFE foi utilizado o aparelho Peak Flow® e, com um clip nasal, o voluntário foi orientado a ajustar os lábios ao bocal de maneira a não permitir escape aéreo e executar uma inspiração profunda seguido de uma expiração rápida sem utilizar o músculo bucinador. Também foram realizadas três manobras considerando a de maior valor e a unidade de medida utilizada foi litros por minuto (L/min).

A última etapa desta pesquisa consistiu na avaliação cardiorrespiratória aplicando-se o teste de caminhada de seis minutos (TC6). O voluntário foi posicionado sentado em repouso de 15 minutos antes da realização do teste, a fim de estabilizar parâmetros vitais em níveis basais. Passado esse período, foi mensurado a FC com o uso de um frequencímetro digital (Geratherm®), FR contando-se respirações por minuto com o auxílio de cronômetro digital portátil (Instrutherm® modelo CD – 2800); e PA com o uso de estetoscópio (Rappaport marca Premium®) e esfigmomanômetro marca (Diasyst®) e SpO2 utilizando oxímetro (Nanon®). Esses mesmos parâmetros foram reavaliados após a realização do TC6.

O TC6 foi executado em um corredor de 30 metros de comprimento por 5 metros de largura, onde foram dispostos cones a uma distância de 3 metros entre eles, que indicavam a distância que o voluntário percorreu. O piso foi marcado com um “X” no início e no final do percurso, para que o voluntário não diminuísse a distância a ser percorrida.

Os voluntários foram informados como deveriam seguir as orientações pré-teste de acordo com as recomendações de Rondelli et al. [14], sendo orientados a caminhar o mais longe possível no tempo previsto, sem correr. Durante o teste, eles foram estimulados verbalmente e indicados sobre o tempo a cada minuto.

Junto ao TC6 foi aplicada a escala de Borg modificada que é um marcador descritivo de esforço físico subjetivo a cada número par, onde cada número corresponde um esforço. As quantificações do esforço percebido e da FC estão linearmente relacionadas à intensidade da atividade física.

Inicialmente o teste de Shapiro-Wilk foi utilizado para verificar a distribuição dos dados. Constatada a não distribuição normal, os dados foram descritos em média e desvio padrão, e a estatística analítica foi realizada com aplicação do teste não paramétrico U de Mann-Whitney para amostras independentes. A significância estatística foi estipulada em 5%.

 

Resultados

 

A média do IMC no GOS foi de 36,72 (± 1,15) kg/m2, sendo a máxima de 38,81 kg/m2 e a mínima de 35,15 kg/m2 enquanto a RCQ foi de 0,87 (± 0,07) cm, com máxima de 0,99 cm e mínima de 0,73 cm. A CirAb dos homens foi de 109 (± 11,60) cm, com máxima de 125 cm e mínima de 89 cm e das mulheres foi de 94,17 (± 11,77) cm, com máxima de 112 cm e mínima de 79 cm. A média do percentual de gordura corporal (%CG) do grupo foi de 47,19 (± 12,95)% com máxima de 60,79% e mínima de 26,76%.

Em relação aos hábitos de vida do GOS, 5 eram etilistas e 17 voluntários não; quando questionados a respeito de seus hábitos alimentares, 9 voluntários relataram possuir alimentação balanceada, 2 referiram ter alimentação a base de verduras, 5 a base de proteínas e 6 alimentavam-se predominantemente de carboidratos.

A Tabela I mostra os valores obtidos na cirtometria de ambos os grupos. Os dados referentes à expansibilidade torácica intergrupos, em todos os momentos, estão apresentados na Tabela II, onde foi encontrada diferença estatisticamente significativa durante a inspiração e expiração máxima no processo xifoide, e inspiração máxima na cicatriz umbilical. Os resultados da avaliação da PiMax e PeMax, forças musculares inspiratória e expiratória respectivamente, da CV e do PFE, em ambos os grupos, estão descritos na Tabela III onde apenas o PFE apresentou diferença estatisticamente significativa.

 

Tabela I - Cirtometria.

 

Os dados estão expressos como média (desvio-padrão) e expressos em cm.

 

 

Tabela II - Variância da cirtometria em relação ao repouso.

 

Os dados estão expressos como média (desvio-padrão) e expressos em cm. Análise para verificação da existência de diferença entre as variáveis foi feita a partir do teste não paramétrico U de Mann-Withney. Adotado valor de significância estatística quando p < 0,05.

 

Tabela III - Avaliação pneumofuncional.

 

PiMax (pressão inspiratória máxima), PeMax (pressão expiratória máxima), CV (capacidade vital), PFE (pico de fluxo expiratório). Os dados estão expressos como média (desvio-padrão), com valores arredondados.

 

As variáveis cardiorrespiratórias avaliadas no pré-TC6 estão descritos na Tabela IV, onde encontramos diferença estatisticamente significativa da variável FC. Também na Tabela IV estão os dados das variáveis mensuradas no pós-TC6, nos quais foram observadas diferenças estatisticamente significativas nas variáveis SpO2, escala de Borg e distância percorrida quando comparadas ao controle. Na verificação da diferença estatística dos parâmetros pré e pós-TC6 do GOS, através do teste não paramétrico de Wilcoxon para dados pareados, encontrou-se os seguintes valores de P: SpO2 (P < 0,001), FC (P < 0,001), FR (P < 0,001), pressão sistólica (P = 0,684), pressão diastólica (P = 0,160) e esforço subjetivo (P < 0,001). Alterações significativas nessas variáveis já eram esperadas, uma vez que o TC6 é teste submáximo de esforço. Contudo, a variável pressão arterial não apresentou diferença estatisticamente significativa.

 

Tabela IV - Parâmetros cardiorrespiratórios do pré e pós-TC6 e suas comparações.

 

GE (grupo eutrófico), GOS (grupo obeso sedentário), SpO2 (saturação periférica de O2), FR (frequência respiratória), FC (frequência cardíaca), Diastólica (pressão arterial diastólica), Sistólica (pressão arterial sistólica), Borg (Escala de Borg). Os dados estão expressos como média (desvio-padrão) com valores arredondados e valores de P.

 

Discussão

 

Neste estudo a prevalência de obesidade foi do sexo feminino, com idade média de 35,63 (± 11,77) anos. Esse resultado está de acordo com os dados recentemente divulgados pelo Ministério da Saúde sobre a obesidade no Brasil em que foi apontado que a taxa de obesidade não é muito diferente entre os dois gêneros, porém maior entre as mulheres, com 18,2% enquanto entre os homens a taxa é de 17,9%. Em relação à idade, o índice de obesidade triplica na comparação entre 18 e 24 anos e 35 e 44 anos que sai de 8,5% para 22%, respectivamente [15].

As possíveis complicações relacionadas às doenças crônicas em indivíduos obesos estão bem estabelecidas [16]. A obesidade está associada com morbidades múltiplas, incluindo risco de diabetes, hipertensão, doenças cardíacas, apneia do sono e câncer [17,18]. Nossos dados reportam IMC médio no GOS de 36,72 (± 1,15) kg/m2, indicando alto risco de desenvolver doenças crônicas nesses indivíduos.

A aferição da CirAb reflete de forma indireta o conteúdo de gordura visceral. Os valores médios da CirAb tanto dos homens (109 cm) quanto das mulheres (94,16 cm) estão dentro dos valores estabelecidos pela OMS que preconiza o ponto de corte de 94 cm para homens e 80 cm para mulheres como corte para risco cardiovascular aumentado. Na população brasileira, alguns estudos indicam que estes níveis são bons preditores de risco para doenças metabólicas, principalmente hipertensão arterial. No entanto, poucos estudos no Brasil avaliaram a adequação do uso desse indicador, bem como os pontos de corte mais adequados para a população brasileira [19].

Na presente pesquisa, 37% eram não etilistas e 20% referiram ter uma alimentação balanceada. O que contradiz, em partes, as afirmações da literatura [20] onde relatam que hábitos de vida inadequados em relação ao consumo de álcool, fumo, má alimentação, sedentarismo entre outros, podem acarretar grande probabilidade de obesidade. Todos os voluntários estudados eram sedentários, o que pode explicar como este estilo de vida pode ter contribuído para o desenvolvimento de obesidade da amostra.

Ainda, um estudo recente que avaliou a associação entre fatores de risco cardiovascular e indicadores antropométricos de obesidade encontrou significativa associação da alteração do perfil lipídico, HAS, síndrome metabólica, resistência insulínica e, inclusive, o sedentarismo, como os principais indicadores antropométricos de obesidade. Os autores chamam a atenção que todos os fatores de risco cardiovascular analisados neste estudo são modificáveis, por isso, reforçam a importância de incentivar a adoção de um estilo de vida mais saudável [21].

Verificou-se que o GOS possui tendência a apresentar um padrão respiratório apical, apresentando maior mobilidade ou diferença na inspiração e expiração máximas na linha axilar em relação ao repouso, acredita-se que isso ocorra devido a compressão extrínseca do tecido adiposo que se localiza em maior quantidade nas regiões basais pulmonares em relação às apicais. Além disso, o GOS apresentou expansibilidade torácica significativamente menor em relação ao GE na inspiração máxima avaliada na região do processo xifóide e da cicatriz umbilical e na expiração máxima na região do processo xifóide. Essa alteração da expansibilidade torácica em indivíduos obesos, sem outras enfermidades, foi relatada previamente em outro estudo [22]. A complacência da parede torácica no obeso é menor devido à deposição de tecido adiposo no tórax e abdômen, o que determina consequente retração elástica e redução da distensibilidade das estruturas extrapulmonares. A obesidade afeta a fisiologia respiratória de repouso e a de exercício, e produz padrão ventilatório restritivo caracterizado por redução do volume expiratório de reserva [23].

Ademais, a obesidade diminui a função pulmonar e pode ter efeitos negativos sobre a força e a resistência da mecânica respiratória [24]. No entanto, as médias da PiMax e da PeMax do GOS não diferiram significativamente do GE. Estudos que investigam índices de força muscular respiratória em pacientes obesos comparando-os com indivíduos eutróficos ou com valores normais não apresentam resultados consistentes [25-27].

Kelly et al. [25] não encontraram resultados significativos nos valores de PiMax entre indivíduos obesos (com uma média de 183% do peso previsto) e indivíduos com uma média de 99% do peso. Sarikaya et al. [26] mostraram uma PiMax significativamente reduzida em indivíduos obesos sem diferença significativa em comparação com indivíduos eutróficos. Castello et al. [28] analisaram PiMax e PeMax em 12 mulheres com obesidade mórbida e verificou que as pressões respiratórias máximas estavam claramente reduzidas, possivelmente devido à redução da complacência pulmonar e redução na mobilidade do diafragma.

Já os resultados de Cataneo e Magnani [27] e Gonçalves et al. [29], que avaliaram as pressões respiratórias máximas de 99 e 39 indivíduos obesos mórbidos, respectivamente, sugeriram que a obesidade em si não teria impacto negativo na força muscular respiratória.

Além do aumento no trabalho respiratório, no indivíduo obeso, há uma elevação do diafragma, que quando contrai age sob pressão de um abdômen distendido [31-32]. Essa 'sobrecarga' desencadeia uma variedade de mecanismos na atividade dos músculos respiratórios e causa um efeito de treinamento a longo prazo, o que pode aumentar a força muscular [26,31].

Além disso, estudos com animais mostram que cronicamente o aumento pressão intra-abdominal induz várias alterações histológicas e celulares na composição de músculos abdominais, especialmente o reto abdominal e diafragma [32-33]. Foram observadas alterações na composição das fibras musculares com uma proporção aumentada de fibras musculares tipo II que são fibras de contração rápida [32-33].

O PFE mede a velocidade do ar expirado através de um aparelho portátil e é uma medida simples, quantitativa e reprodutível que permite avaliar o grau de obstrução das vias aéreas. Na presente pesquisa, verificou-se que o GOS apresentou diminuição significativa em relação ao GE. Isso pode ser explicado pelo fato da obesidade resultar em obstrução ao fluxo aéreo causado pelo aumento da resistência em vias aéreas de menor calibre em baixos volumes pulmonares associada à redução do volume de reserva expiratória [23]. A obesidade também pode causar alterações no padrão respiratório, com trocas rápidas e superficiais e pode induzir a responsividade brônquica por mecanismos imunológicos.

Já no aspecto cardiorrespiratório, verificou-se que os voluntários do GOS apresentaram FC em repouso significativamente mais elevada que dos voluntários do GE, o que já era esperado. A FC de repouso é geralmente elevada, refletindo um aumento do débito cardíaco em repouso que se eleva à custa de aumento no volume total de sangue circulante, ocasionando um estado de pré-carga cronicamente elevada, o que favorece aumento nas dimensões ventriculares, levando ao desenvolvimento de hipertrofia ventricular do tipo excêntrica [34]. Esse aumento já foi descrito anteriormente por Ora et al. [35], no entanto os autores não encontraram diferença significativa entre os grupos (obesos e eutróficos), provavelmente, pelo fato da sua amostra ser composta por apenas 12 indivíduos em cada grupo.

No pós-TC6 o GOS apresentou SpO2 significativamente menor, além de referirem maior esforço em relação ao GE. Acredita-se que essa queda na SpO2, possivelmente tenha sido causada pela restrição da capacidade ventilatória máxima encontrada em obesos [36] e esse aumento no esforço tenha contribuído para uma distância percorrida significativamente menor. No entanto, quando comparado com outros estudos envolvendo pacientes obesos, essa distância foi semelhante (512,4 ± 48) à percorrida pelo grupo de obesos saudáveis da pesquisa de Tuttle, Sinacore e Mueller [37] e maior (420 ± 112) do que a distância percorrida pelos participantes do estudo de Launois et al. [38] que avaliaram 45 adultos obesos.

Devido a limitações de recursos não foram possíveis mensurações mais precisas como espirometria, pletismografia e ergoespirometria, para avaliação de volumes e capacidades além do consumo de oxigênio durante a caminhada.

 

Conclusão

 

Comparando os parâmetros no pré e pós-TC6 verificou-se que os obesos apresentaram grande esforço cardiorrespiratório após o teste, pois as variáveis FC, FR e SpO2 sofreram alterações significativas. Esforço esse confirmado também através da avaliação da escala de Borg.

A obesidade resulta em várias alterações cardiorrespiratórias importantes, incluindo aumento do trabalho respiração, diminuição da expansibilidade torácica, obstrução ao fluxo aéreo e diminuição da saturação periférica de oxigênio.

Sugerem-se novas pesquisas para avaliação de volumes e capacidades pulmonares, além do consumo de oxigênio durante o exercício.

 

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