ARTIGO ORIGINAL

Efeitos agudos e subagudos de uma sessão de montaria a cavalo sobre variáveis cardiovasculares de indivíduos jovens e saudáveis

Acute and subacute effects of a horseback riding session on cardiovascular variables in young healthy subjects

 

Denise de Barros Rigoni, Ft.*, Luciana Laureano Paiva, Ft., D.Sc.**, Rubens Severo de Souza, Ft.***

 

*Acadêmica de Fisioterapia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre/RS, **Professora Adjunta do Curso de Fisioterapia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre/RS, ***Fisioterapeuta sócio-proprietário da Equoterapia Paraíso, Porto Alegre e Alvorada/RS

 

Recebido em 19 de junho de 2016; aceito em 10 de março de 2017.

Endereço para correspondência: Denise de Barros Rigoni, Rua Gonçalves Dias, 170/1001, 90130-060 Porto Alegre RS, Tel: (51) 34070840, E-mail: denirigoni@hotmail.com; Luciana Laureano Paiva: lucianalaureanopaiva@gmail.com; Rubens Severo de Souza: ft.rubens@gmail.com

 

Resumo

A Equoterapia utiliza o cavalo como instrumento terapêutico que proporciona diversos benefícios terapêuticos, porém as alterações fisiológicas oriundas da montaria ainda não estão bem esclarecidas e pesquisas existentes apresentam resultados divergentes. Este estudo teve como objetivo verificar os efeitos agudos e subagudos de uma sessão de montaria a cavalo na frequência cardíaca (FC) e pressão arterial (PA). Tratou-se de uma pesquisa quantitativa experimental com 20 indivíduos jovens saudáveis (22,4 ± 2,7 anos) que realizaram uma sessão de montaria. Avaliaram-se os desfechos FC e PA pré e pós-intervenção e dez minutos após o seu término. A FC aumentou após a intervenção ao passo e ao trote (p < 0,001) e retornou aos valores iniciais dez minutos após o seu término. A PA não apresentou diferença significativa imediatamente após a montaria; entretanto a PA sistólica reduziu-se dez minutos após o término da intervenção (p < 0,05) e apresentou efeito hipotensor nos homens quando comparado aos valores iniciais (p < 0,05). As mulheres apresentaram valores de FC mais altos e de PA mais baixos do que os homens em todos os momentos avaliados (p < 0,05). Conclui-se que uma sessão de montaria a cavalo ao passo e ao trote é capaz de gerar efeitos sobre o sistema cardiovascular de indivíduos jovens saudáveis.

Palavras-chave: terapia assistida por cavalos, fenômenos fisiológicos cardiovasculares, pressão arterial, frequência cardíaca, exercício.

 

Abstract

Therapeutic horseback riding uses the horse as a therapeutic tool which provides many therapeutic benefits; however the physiological changes resulting from the horse riding are not well understood yet and existing researches show divergent results. The aim of this study was to investigate the acute and subacute effects of a horseback riding session in heart rate (HR) and blood pressure (BP). This was an experimental quantitative research with 20 young healthy subjects (22.4 ± 2.7 years old) who held a horseback riding session. The HR and BP outcomes were assessed pre- and post-intervention and 10 minutes after the end of the intervention. HR increased after the intervention while walk and trot (p < 0.001) and returned to baseline 10 minutes after its completion. BP showed no significant difference immediately after the horse riding; however, systolic BP was reduced 10 minutes after the end of the intervention (p < 0.05) and showed hypotensive effect in men when compared to baseline (p < 0.05). Women had higher values of HR and lower BP than men in all evaluated moments (p < 0.05). It was concluded that a horseback riding session (walk and trot) is able to inducing effects on the cardiovascular system of young healthy subjects.

Key-words: equine-assisted therapy, cardiovascular physiological phenomena, blood pressure, heart rate, exercise.

 

Introdução

 

A montaria a cavalo representa uma das principais estratégias empregadas na Equoterapia, a qual é baseada nos princípios, fundamentos e técnicas da equitação básica, utilizando o cavalo como instrumento terapêutico em uma abordagem interdisciplinar, nas áreas da saúde, educação e equitação, trazendo benefícios físicos e psíquicos e visando o desenvolvimento biopsicossocial do indivíduo [1,2].

O cavalo realiza movimentos sequenciados e simultâneos que resultam em um movimento tridimensional complexo [3], provocando oscilações nos mesmos planos do movimento humano. Através da transmissão desses movimentos ao corpo do cavaleiro, a montaria pode proporcionar diversos benefícios aos tecidos e sistemas corporais do mesmo [1].

Dentre os principais benefícios promovidos com a Equoterapia podem ser destacados a modulação do tônus muscular, melhora do controle de tronco, da marcha, do equilíbrio, da coordenação, da flexibilidade e da força muscular, correção de padrões de movimentos anormais e integração sensorial [4,5].

Sob outra perspectiva, sabe-se também que o movimento rítmico e repetido do cavalo influencia a circulação sanguínea, auxiliando a sua fluidez, além de melhorar a respiração e o metabolismo [1,6,7]. A demanda energética e metabólica durante a sessão de Equoterapia também pode provocar adaptações em variáveis fisiológicas, como na frequência cardíaca (FC) e pressão arterial (PA). Entretanto, os mecanismos envolvidos nas alterações fisiológicas ainda não estão bem esclarecidos [8], principalmente com relação às respostas cardiorrespiratórias, devido a uma série de fatores que dificultam a precisão de sua mensuração [9].

Os efeitos fisiológicos oriundos do ato de assistir vídeos ou da interação com animais se tornaram tema de estudos, os quais apresentaram achados semelhantes, indicando decréscimo da FC e da PA [10-12]. Porém os efeitos que a montaria a cavalo pode gerar sobre essas variáveis ainda são pouco elucidados. Pesquisas já realizadas demonstraram aumento na FC durante ou após a montaria [13-16], redução da PA e manutenção da FC após a montaria [8,17].

Diante da escassez de publicações científicas a respeito do comportamento da FC e da PA relacionadas à montaria a cavalo, além de divergências entre os resultados dos estudos realizados com populações e metodologias distintas, justifica-se a realização desta investigação. Portanto, o presente estudo se propõe a verificar os efeitos agudos e subagudos de uma única sessão de montaria a cavalo na FC e PA de indivíduos jovens saudáveis.

 

Material e métodos

 

Pesquisa quantitativa do tipo experimental, com delineamento semiexperimental [18], realizada no centro de Equoterapia Paraíso, em Alvorada/RS, de abril a julho de 2015. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob parecer de nº 1.025.916. Foram respeitados os princípios éticos para o desenvolvimento de pesquisa experimental com seres humanos, conforme Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. Todos os participantes leram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido anteriormente a sua participação na pesquisa.

 

Amostra

 

O cálculo amostral foi realizado através de fórmula baseada na estimativa da média populacional [19], utilizando valores de média e desvio padrão dos estudos de Westerling [13] para FC (resultando em n = 6) e de Uchiyama, Ohtani e Ohta [8] para PA (resultando em n = 13), por avaliarem indivíduos saudáveis, semelhante à população do presente estudo. Foi considerado um nível de significância de 5% e erro de estimativa de 10%, além de acréscimo de 40% prevendo-se perdas sobre o maior valor encontrado. Assim, o cálculo amostral apontou um n = 19, entretanto para manter a homogeneidade entre os sexos o tamanho amostral total foi de 20 participantes (10 homens e 10 mulheres).

A amostra foi não-probabilística intencional e os voluntários foram selecionados conforme os critérios estabelecidos. Foram incluídos no estudo indivíduos saudáveis, de ambos os sexos, com idades entre 18 e 30 anos, sedentários ou irregularmente ativos [20]. Os critérios de exclusão corresponderam a prática de montaria a cavalo de forma regular (ao menos uma vez por semana) em algum momento da vida, alterações cardiovasculares, PA de repouso > 140/90 mmHg, fobia de montar a cavalo, índice de massa corporal (IMC) > 30 kg/m2 (obesidade), hérnia de disco, escoliose estrutural > 30°, ferimentos abertos, asma brônquica ou alergias atreladas ao pelo do cavalo ou areia, ser tabagista, ser considerado ativo ou muito ativo pelo Questionário Internacional de Atividade Física (IPAQ - versão curta) [20].

 

Avaliações e desfechos

 

Para a verificação da FC foi utilizado um monitor cardíaco unissex digital Polar FT1 (Polar Electro, Kempele, Finlândia) e, para obtenção dos dados de PA, um monitor de PA automático de mesa Microlife BP A100 (Microlife Corporation, China). O desfecho primário do estudo correspondeu a FC e PA.

 

Procedimentos

 

Após preenchimento da ficha de anamnese com informações como idade, massa corporal, estatura, IMC e vivência prévia de montaria, os monitores de FC e de PA foram posicionados no participante. O sensor de FC foi ajustado no peito do voluntário, logo abaixo do processo xifoide do esterno, e o relógio foi colocado em seu pulso direito. Já a braçadeira para medição da PA foi colocada no braço esquerdo desnudo, dois centímetros acima da fossa cubital, com o tubo alinhado a artéria braquial.

Durante a verificação dos sinais vitais foi recomendado aos participantes a não conversar, manter o membro superior estático e respirar normalmente. Além disso, foi orientada a não ingestão de café, chá, bebidas alcoólicas e medicações nas 24 horas anteriores as coletas, além de alimentos nos trinta minutos que precedessem as coletas, devido à possibilidade dessas substâncias provocarem alterações nas variáveis estudadas.

O estudo consistiu em oito etapas, todas realizadas em um único dia: 1) avaliação inicial da FC e PA, em sedestação, após dez minutos de repouso; 2) adaptação, na qual foram realizados cinco minutos de montaria com o cavalo ao passo; 3) pré-sessão, na qual foi realizada nova avaliação da FC e PA após dez minutos de repouso, em sedestação; 4) sessão de montaria ao passo; 5) pós-montaria ao passo (MP), onde foi verificada a FC e PA imediatamente após a sessão, com os participantes montados no cavalo; 6) trote guiado; 7) pós-montaria ao trote (MT), no qual foi verificada a FC e PA imediatamente após o trote, com os participantes montados no cavalo; e 8) avaliação da FC e PA, em sedestação, dez minutos após o término da intervenção.

A montaria ocorreu em um picadeiro coberto, com terreno arenoso. Para todos os participantes foi utilizado o mesmo cavalo da raça crioula, com passada de média frequência (sobrepista), treinado para Equoterapia. Seu arreamento consistiu em manta com cilhão de uma alça fixa e dois estribos (Figura 1). Os participantes foram orientados a segurar com as mãos na alça ou mantê-las repousadas sobre os membros inferiores conforme sua preferência para maior conforto. Não foram realizadas atividades com os membros superiores ou inferiores. O animal foi guiado pelo mesmo auxiliar-guia, a fim de minimizar movimentos divergentes [21], ao passo constante, e um dos pesquisadores cumpriu o papel de auxiliar-lateral, caminhando ao lado do cavalo durante toda a intervenção. Durante o período do trote, o cavalo continuou sendo guiado e também teve a presença de auxiliar-lateral. Os participantes desfrutaram de uma rampa de acesso para montar e apear do cavalo, além de capacetes de equitação para garantir sua segurança.

A intervenção correspondeu a uma sessão de montaria a cavalo de trinta minutos ao passo, assemelhando-se a uma sessão de Hipoterapia, uma das modalidades da Equoterapia que visa, principalmente, a adaptação do praticante ao cavalo com acompanhamento do terapeuta para sua segurança, com percurso previamente estabelecido, o qual envolvia contorno do picadeiro, percorrendo formas retangulares, movimentos em “zigue-zagues” e desenho de “oito” entre cones (Figura 2). A FC foi monitorada durante todo o percurso, sendo registrada a cada cinco minutos. Na etapa do trote, foi realizada apenas uma grande volta percorrendo toda a dimensão do picadeiro, resultando em um período de aproximadamente um minuto.

 

Análise dos dados

 

Os dados foram tabulados em planilha eletrônica no software Microsoft® Office Excel® 2010 para visualização e síntese dos resultados e, após, analisados com o software Statistical Package for Social Science for Windows (SPSS) versão 21.0 e com o SAS Enterprise Guide 6.1.

A montaria a cavalo representou a variável independente, enquanto as variáveis dependentes corresponderam à FC, PA e às sensações e percepções desencadeadas pela montaria.

 

Análise estatística

 

As variáveis quantitativas foram descritas por média e desvio padrão e as variáveis categóricas foram descritas por frequências absolutas e relativas. Os testes de Shapiro-Wilk e de Levene foram aplicados para confirmar a normalidade e homogeneidade dos dados amostrais.

Para comparar os sinais vitais (FC; PA Sistólica – PAS; PA Diastólica – PAD) ao longo do tempo e nos subgrupos em relação ao sexo foi aplicada a Análise de Variância (ANOVA) para medidas repetidas e complementada pelo teste de Bonferroni. Os momentos inicial e pré-sessão foram comparados com o teste t-Student para amostras pareadas.

O nível de significância adotado para todos os testes foi de 5% (p ≤ 0,05).

 

Resultados

 

A amostra foi composta por 20 indivíduos jovens e saudáveis (10 homens e 10 mulheres), com média de 22,4 ± 2,7 anos, 67,2 ± 13,1 kg, 1,7 ± 0,1 m e IMC 22,7 ± 2,5 kg/m2. Dentre os participantes, 16 (80%) já haviam tido a experiência de montar a cavalo em algum momento da vida e apenas 4 (20%) nunca haviam montado.

Com relação aos momentos inicial e pré-sessão não houve diferença significativa para FC (p = 0,489), PAS (p = 0,828) e PAD (p = 0,234), evidenciando que os valores retornaram ao basal após a adaptação. Na comparação entre os momentos da intervenção, as médias de FC e PAS apresentaram diferenças significativas, enquanto os valores de PAD não (Tabela I).

Independentemente do momento, as mulheres apresentaram FC mais elevada (Figura 3) e PAS mais baixa do que os homens, de forma significativa. Houve efeito de interação entre sexo e tempo na FC (p = 0,022). As mulheres apresentaram um aumento maior do que os homens no trote. Além disso, é possível observar que nas mulheres o aumento foi significativo tanto no pós-MP quanto no pós-MT. Para os homens, o aumento foi significativo apenas no trote; no pós-MP o aumento foi limítrofe (p = 0,056) (Tabela II). Sem considerar o trote, o comportamento de ambos os sexos foi o mesmo do que o geral, ou seja, aumento da FC no pós-sessão e redução após dez minutos, voltando aos níveis basais.

Já com relação à PAS, houve um efeito isolado de sexo (p = 0,040), sendo as mulheres com PAS mais baixa em todos os momentos. Também houve um efeito isolado de tempo (p = 0,005), nos homens. Quando analisados por sexo, a redução significativa dez minutos após o trote foi observada nos homens (p = 0,015), mas não nas mulheres (p = 0,221). Os valores médios de PAD não evidenciaram diferença significativa (Tabela II).

 

Tabela I - Comparação geral dos sinais vitais entre momentos (inicial, pós-MP, pós-MT e 10 minutos após).

 

a,b,c Letras iguais não diferem pelo teste de Bonferroni a 5% de significância; MP - montaria ao passo; MT - montaria ao trote.

 

Tabela II - Comparação dos sinais vitais entre os momentos (inicial, pós-MP, pós-MT e 10 minutos após) por sexo.

 

a,b,c Letras iguais não diferem pelo teste de Bonferroni a 5% de significância; MP - montaria ao passo; MT - montaria ao trote.

 

 

 

Figura 1 - Arreamento do cavalo utilizado em todas as intervenções.

 

 

 

Figura 2 - Figuras de picadeiro utilizadas no percurso da montaria.

 

 

 

Figura 3 - Comportamento da FC de homens e mulheres em todos os momentos avaliados; MP – montaria ao passo; MT – montaria ao trote.

 

Discussão

 

O presente estudo avaliou indivíduos jovens e saudáveis de ambos os sexos e encontrou um aumento da FC imediatamente após uma sessão de montaria a cavalo ao passo e ao trote, enquanto a PA não sofreu alterações significativas. Houve redução da PAS quando se comparou os valores dez minutos após a intervenção aos valores pós-MT. Além disso, a PAS dos homens apresentou efeito hipotensor dez minutos após, comparada aos valores iniciais.

Da mesma forma, com relação à FC, outros autores também obtiveram achados semelhantes em investigações prévias com populações e metodologias distintas [14,16], dentre eles, em praticantes de equitação [13] e em indivíduos jovens e saudáveis [15], como na nossa pesquisa. Por outro lado, Negri et al. [17] avaliaram crianças praticantes de Equoterapia com paralisia cerebral que apresentaram a manutenção da FC após a sessão de montaria a cavalo ao passo. Ainda, McGibbon et al. [22] apontaram decréscimo da FC em crianças com paralisia cerebral, após oito semanas de intervenção com a Equoterapia. Todavia esse último estudo abordou os efeitos no sistema cardiovascular em longo prazo, diferente do presente estudo, cujo objetivo foi avaliar os efeitos agudos e subagudos na FC e na PA após uma única sessão de montaria.

Segundo os nossos resultados de FC, a média dos valores pós-MP indicaram aproximadamente 41% da FC máxima dos indivíduos, ao passo que a média do pós-MT foi de aproximadamente 71%. A literatura evidencia que o exercício físico regular está associado a inúmeros benefícios físicos e mentais, na prevenção e tratamento de doenças crônicas e melhora do sentimento de bem-estar e da qualidade de vida [23]. Com relação ao exercício aeróbio na promoção da saúde, existem diretrizes estabelecidas pela American Heart Association e Organização Mundial da Saúde as quais recomendam para adultos principalmente exercícios de intensidade moderada (55-69% da FC máxima), mas também de intensidade vigorosa (70-89% da FC máxima) por período de tempo menor [24]. Para os participantes do presente estudo considerados saudáveis, o exercício realizado na montaria ao passo pode ser considerado de intensidade leve, porém para outras populações que buscam atendimento na Equoterapia, esse exercício talvez possa repercutir de uma forma mais intensa. Já o trote é menos utilizado na Equoterapia devido as suas maiores demandas e algumas contraindicações, entretanto pode ser adotado como estratégia para aumentar a atividade cardíaca de indivíduos que tenham condições para vivenciar essa andadura ou, ainda, como forma de progressão do tratamento.

Sabe-se que a FC é regulada primariamente pelos ramos simpático e parassimpático (vagal) do sistema nervoso autônomo. A retirada vagal (redução da atividade parassimpática) é responsável pelo incremento na FC no início do exercício ou em exercícios de intensidade leve. Com o aumento da intensidade, acréscimos acima desses valores ocorrem devido à elevação da atividade simpática. Já a recuperação da FC após o exercício envolve a reativação da atividade parassimpática, principalmente, e redução da simpática, ocasionando diminuição da FC [25].

Antelmi et al. [26] verificaram que a recuperação da FC foi mais evidente nos primeiros dois minutos após o exercício e que na maioria dos casos, após cinco minutos, ela não retornava aos valores prévios ao exercício. Também, demonstraram que as mulheres apresentaram uma redução mais acentuada da FC nos primeiros três minutos de recuperação. Corroborando esses achados, no presente estudo as mulheres apresentaram uma média de decréscimo da FC após o exercício maior do que os homens, embora esses valores tenham sido verificados após dez minutos e a diferença não tenha sido significativa. Diferente do estudo de Antelmi et al. [26], os valores de FC no nosso estudo não só retornaram aos valores iniciais anteriores ao exercício, como também apresentaram discreta redução, em ambos os sexos, apesar de não ter sido significativa.

Os efeitos da montaria a cavalo na PA ainda são pouco estudados. Uchiyama, Ohtani e Ohta [8] são alguns autores que já pesquisaram as respostas da PA, além da FC e de outras variáveis, durante essa atividade. Seu estudo comparou a marcha humana e a montaria a cavalo ao passo e seus resultados com relação à PAD mostraram que durante a montaria ela apresentou-se levemente maior que na caminhada, porém os valores de ambas as condições foram significativamente mais baixos do que os valores obtidos antes das intervenções. Em contraste, acréscimos significativos nos valores de PAS e PAD, bem como na FC, já foram encontrados durante a utilização de equipamento simulador de montaria a cavalo, em indivíduos saudáveis [27]. No presente estudo houve somente redução significativa nos valores de PAS dez minutos após o trote, mas a PAD não apresentou diferença significativa entre nenhum momento.

Com relação à PA imediatamente após a montaria ao trote, os resultados do presente estudo vão ao encontro de outros autores, visto que a Equoterapia é considerada um exercício dinâmico e nesses geralmente a PAS aumenta enquanto a PAD se mantém ou reduz. Isso ocorre devido à necessidade de, nesse tipo de exercício, aumentar-se o fluxo sanguíneo aos músculos, o qual ocorre através de adaptações como aumento do débito cardíaco (pelo aumento da FC e do volume sistólico) e redução da resistência vascular periférica (pela vasodilatação da musculatura ativa) [28].

Comparando-se os valores médios iniciais de PA aos valores obtidos dez minutos após o término da montaria (passo e trote), sem considerar o sexo, encontramos redução na PAD e mínima redução na PAS, apesar de não haver diferença significativa entre os dados. Estudos evidenciam a ocorrência da hipotensão pós-exercício (HPE), que se caracteriza pelo decréscimo dos valores da PA de repouso no período após a realização de um exercício aeróbio. Apesar de algumas divergências entre autores, de forma geral, a HPE tende a ocorrer tanto em indivíduos hipertensos quanto em normotensos, em diferentes faixas etárias, e parece acontecer após exercícios de curta ou longa duração, independente de sua intensidade e em ambos os sexos. Entretanto, normalmente indivíduos com níveis de PA iniciais mais altos (principalmente hipertensos) apresentam HPE mais significativa [29,30]. Apesar de, aparentemente, não haver diferenças na HPE em relação ao sexo, o presente estudo demonstrou um maior decréscimo da PA nos homens do que nas mulheres, sendo significativo apenas na PAS dos homens. Uma possível explicação para esses achados foi o fato de os homens terem apresentado valores de PA iniciais mais altos do que as mulheres e, como consequência, obtiveram HPE de maior magnitude, corroborando as informações dos autores previamente citados.

O sexo vem sendo apontado como uma variável que influencia no comportamento do sistema cardiovascular. Evidências indicam que, em indivíduos saudáveis, os homens possuem valores de PA maiores do que as mulheres na mesma faixa etária, ao menos até a meia idade [31]. Com relação à FC de repouso, também em saudáveis, estudos vêm demonstrando que mulheres apresentam FC maior do que homens da mesma idade [32], exceto para indivíduos de meia idade (41-55 anos) [31]. Nossos achados corroboram as informações da literatura, visto que se encontraram valores de PAS e PAD mais altos nos homens e níveis de FC mais altos nas mulheres, não apenas em repouso (inicial), mas em todos os momentos da intervenção.

Algumas limitações do presente estudo podem corresponder à falta de avaliação do controle autonômico, não ter sido possível realizar todas as coletas sempre no mesmo turno do dia (o que pode influenciar as variáveis pelo ciclo circadiano), o fato da intervenção ter sido realizada apenas em um único dia e não ter existido um grupo controle. Sugere-se, portanto, a realização de novas investigações que avaliem também os efeitos da montaria a cavalo nos aspectos cardiovasculares após um protocolo mais prolongado de intervenções e com diferentes populações da Equoterapia.

 

Conclusão

 

Uma sessão de montaria a cavalo ao passo e ao trote foi capaz de promover alterações significativas na FC e PA de indivíduos jovens saudáveis, demonstrando que essa atividade apresenta efeitos benéficos sob os aspectos cardiovasculares da população estudada. Os resultados permitem pensar em uma possível ampliação da visão clínica da Equoterapia para além das indicações tradicionais, após a realização de mais estudos com populações específicas dessa modalidade terapêutica.

 

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