ARTIGO ORIGINAL

Impacto de Exergames na qualidade de vida de idosos

Impact of the Exergames on the quality life of the elderly

 

Pierre Soares Brandão, Ft., M.Sc.*, Ivo Vieira de Sousa Neto, M.Sc.*, Suliane Beatriz Rauber, M.Sc.*, Ruam Pedro Francisco de Assis Pimente**, Michelle Sales Zukowski**, Fabiano Fagundes***, Carmen Silvia Grubert Campbell, D.Sc.****

 

*Doutorando no programa de Pós-Graduação em Educação Física, Universidade Católica de Brasília (UCB), **Graduando em Psicologia, Centro Universitário Luterano de Palmas (CEULP), ***Graduação em Psicologia, Mestrado em Ciência da Computação (UFSC – SC), ****Professora no programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Física da UCB

 

Recebido em 9 de março de 2017; aceito em 24 de maio de 2017.

Endereço para correspondência: Pierre Soares Brandão, Laboratório de Apoio a Instrumentalização Científica, Centro Universitário Luterano de Palmas (TO), Av. Teotônio Segurado, 1501 Sul 77019-900 Palmas TO, E-mail: pierrebrandao@gmail.com; Ivo Vieira de Sousa Neto: ivoneto04@hotmail.com; Suliane Beatriz Raube: suliane.edfisica@gmail.com; Ruam Pedro Francisco de Assis Pimente: ruampimentel@gmail.com; Michelle Sales Zukowski: mizukowski@gmail.com, Fabiano Fagundes: thilfa@gmail.com; Carmen Silvia Grubert Campbell: campbellcsg@gmail.com

 

Resumo

Introdução: A Qualidade de Vida (QV) está relacionada a interações de aspectos físico, psicológico, social e ambiental do ser humano. Com o aumento da expectativa de vida em todo o mundo, surgiu a necessidade de se desenvolver estratégias para manutenção da QV durante o envelhecimento. Os exergames têm sido considerados uma possibilidade de intervenção lúdica para manutenção e melhora da QV em todas as idades. Objetivo: Avaliar a influência de exergames que utilizam o Kinect sobre a QV de idosos sedentários. Métodos: Seis idosos (n = 2M; n = 4F; 64,83 ± 4,07 anos) participaram de 2 sessões semanais de 30 min de atividade de jogos com Kinect durante seis meses. A versão curta do questionário World Health Organization Quality of Life (WHOQOL) foi aplicada pré e pós-intervenção. Resultados: Tanto a QV Geral quanto o Domínio Ambiental melhoraram significativamente após a intervenção (67,72 ± 10,95 vs. 70,82 ± 9,10, p = 0,01; 55,38 ± 3,50 vs. 64,06 ± 6,47, p = 0,02) respectivamente. Já os domínios Físico e Psicológico não apresentaram alteração significativa após a intervenção (67,26 ± 19,35 vs. 72,02 ± 15,87, p = 0,45; 70,13 ± 22,42 vs. 73,61 ± 7,75, p = 0,69) respectivamente. Conclusão: A intervenção com jogos de videogame ativo com Kinect interferiu positivamente na QV geral e no domínio ambiental dos idosos participantes do estudo.

Palavras-chave: qualidade de vida, idoso, exergames.

 

Abstract

Introduction: The Quality of Life (QoL) is related to interactions of different aspects of human life, such as physical, psychological, social and environmental. With increasing life expectancy worldwide, also came the need to seek ways to QoL maintenance during aging. Exergames represent a possibility of playful intervention for maintenance and improvement of QoL in all ages. Purpose: To evaluate the influence of exergames using Kinect on QoL of sedentary elderly. Methods: Six elderly (n = 2M; n = 4F; 64.83 ± 4.07 years) participated in two weekly sessions of 30 minutes of game activity with Kinect for six months. The short version of the World Health Organization Quality of Life questionnaire (WHOQoL) was applied pre and post intervention. Results: Both the general QoL and the environmental domain improved significantly after the intervention (67.72 ± 10.95 vs. 70.82 ± 9.10, p = 0.01; 55.38 ± 3.50 vs. 64.06 ± 6.47, p = 0.02) respectively. As for the physical and psychological domains showed no significant change (67.26 ± 19.35 vs. 72.02 ± 15.87, p = 0.45; 70.13 ± 22.42 vs. 73.61 ± 7.75, p = 0.69) respectively. Conclusion: The intervention with Kinect video games had a positive influence on the general quality of life in general and in the ambient domain of the elderly participants.

Key-words: quality of life, aged, exergames.

 

Introdução

 

A Atividade Física (AF) tem se mostrado uma importante ferramenta para manutenção da qualidade de vida (QV), independência funcional e autonomia de idosos, além de contribuir positivamente com aspectos psíquicos como memória e cognição [1] e sociais como participação, socialização e suporte social [2]. A recomendação de AF para idosos é de, no mínimo, 150 minutos semanais de AF moderada para obter benefícios perceptíveis para a saúde [3]. Todavia, não basta oportunizar quaisquer tipos de AF, pois estudos [4-6] apontam que o gosto pela atividade é um fator que muito influencia a adesão e permanência de idosos em programas de AF.

A nova tecnologia de jogos, baseada na Interface Natural ao Usuário (INU), oportunizou o desenvolvimento dos chamados Exergames (EXGs), que combinam jogos de videogame com AF, deixando o exercício mais lúdico [7]. Esta nova metodologia tem se mostrado uma opção interessante no combate ao sedentarismo [8] e podem ter impacto positivo sobre a adesão e a permanência de idosos em programas de AF [9].

Tanto a Fisioterapia quanto a Educação Física têm utilizado os EXGs com diferentes objetivos [10-12], e o uso desse tipo de jogo entre idosos contribui para a melhora do funcionamento sensorial e autonomia, bem como da QV em geral, como redução da depressão e ansiedade após 10 sessões de jogos ativos [13]. No entanto, apesar da existência de investigações na área, poucos estudos são crônicos e um número ainda menor se destina a avaliar a influência dos EXGs sobre os distintos domínios da QV em idosos brasileiros.

Diante do exposto, o presente estudo analisou a influência de um programa de seis meses de EXGs sobre a QV de idosos saudáveis sedentários. A hipótese inicial é que duas sessões semanais de 30 min durante seis meses promoverão melhoras nos diversos domínios da qualidade de vida dos idosos.

 

Material e métodos

 

Participaram da pesquisa seis idosos do grupo de convivência de um hospital público da cidade de Palmas/TO. O grupo de convivência era composto por 64 idosos de ambos os sexos em diferentes condições de saúde, sendo a maioria hipertensa e alguns saudáveis, porém sedentários. Treze idosos atenderam aos critérios de inclusão para participação do estudo conforme seguem: ser fisicamente independente, não possuir pontuação igual ou inferior a 5 em qualquer item do questionário de Medida de Independência Funcional (MIF) [14], estar fisicamente inativo conforme relato dos próprios participantes, aceitar participar do estudo mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), não obter pontuação negativa no Questionário da Associação Americana do Coração e do Colégio Americano de Medicina do Esporte (AHA/ACSM Questionnaire) para Estratificação Pré-participação em Programas de Atividades Físicas [15], no Physical Activity Readiness Questionnaire (PAR-Q) [16], e não fazer uso de medicamento que pudesse interferir nos resultados do estudo. Os questionários acima mencionados foram aplicados durante o recrutamento.

O protocolo de pesquisa foi submetido à avaliação pelo Comitê de Ética do Centro Universitário Luterano de Palmas – TO (CEULP), tendo sido aprovado em 15/12/2012 com número CAAE 10861612.2.0000.5516.

O estudo foi composto por quatro etapas, conforme apresentado na Figura 1. Na primeira etapa foi realizado o recrutamento dos participantes através da realização de uma palestra para se explicar o que é a tecnologia dos EXGs, bem como sobre a proposta da pesquisa, detalhes dos procedimentos, processo de participação, riscos, possíveis incômodos e desconfortos e os benefícios relacionados à participação no estudo. Ao final da palestra foi feito um convite formal para participação no estudo, disponibilização do TCLE e triagem com aplicação dos questionários AHA/ACSM, PAR-Q e MIF.

 

 

Figura 1 - Fluxograma do desenho experimental.

 

A segunda etapa consistiu em coleta dos dados pessoais, medidas antropométricas e aplicação da versão curta do questionário World Health Organization Quality of Life (WHOQOL) [17], que avalia a QV. A terceira etapa consistiu na intervenção de EXG, que foi dividida em três meses de Sessões Livres e três meses de Sessões Protocolo. A quarta etapa consistiu em uma reavaliação das medidas antropométricas e do questionário de QV. A Figura 2 ilustra as três últimas etapas do desenho experimental.

 

 

EXG = Exergame; WHOQOL-Abr = versão abreviada do questionário World Health Organization Quality of Life.

Figura 2 - Três últimas etapas do desenho experimental.

 

Para observar possíveis benefícios dos EXGs sobre variáveis físicas que possam impactar na QV, tais como alteração na composição corporal e no risco cardiovascular, realizou-se avaliação antropométrica com mensuração da estatura, massa corporal, circunferências da cintura e do quadril e o cálculo do índice de massa corporal (IMC) e da relação cintura quadril (RCQ).

A medida da massa corporal foi realizada com o voluntário descalço, com roupas leves, utilizando-se balança digital (2098 PP, Toledo, São Bernardo do Campo, SP, Brasil) com capacidade de 150 kg e precisão de 100 g. A estatura foi medida por um estadiômetro de parede (Sanny, São Paulo, Brasil), com capacidade de 2.200 mm e precisão de 1 mm. O índice de massa corporal foi calculado pelo peso corporal (kg) dividido pela altura ao quadrado (m2). Os equipamentos foram calibrados no início e ao final de cada dia de avaliação.

As circunferências da cintura (CC) e do quadril (CQ) foram aferidas utilizando-se uma fita métrica inelástica (Sanny, São Paulo, Brasil), dividida em centímetros e milímetros e seguindo a descrição de Resende et al. [18].

Utilizou-se o questionário WHOQOL-abreviado para avaliação da QV. Este instrumento avalia quatro domínios relacionados à QV, tais como domínios físico, psicológico, social e ambiental, além da avaliação da QV geral [19].

O questionário foi aplicado no momento pré-intervenção, anteriormente à semana de familiarização para evitar interferência desta última no resultado dos testes. A reavaliação no período pós-intervenção foi realizada no primeiro dia subsequente a última sessão do período de intervenção. Nos dois momentos o questionário foi aplicado de forma individual e oralmente pelo mesmo examinador, após aplicação do teste seguindo-se as devidas orientações e recomendações [19].

A frequência semanal das sessões foi dialogada com os idosos e definiu-se que seriam realizadas nos mesmos dias dos encontros do grupo de convivência no hospital, de maneira a substituir tal participação, ao mesmo tempo em que se excluiu a possível interferência que a continuidade da participação dos idosos no grupo de convivência poderia exercer sobre os resultados.

Os idosos tiveram uma semana de familiarização com o console e os jogos. Esse período foi destinado à aprendizagem da navegação nos menus de seleção utilizando tanto o controle, quanto o Kinect para utilização dos recursos do dispositivo com liberdade e autonomia. Nesse período o papel dos pesquisadores limitou-se a ligar o console no início da sessão, fornecer orientações sobre a navegação no menu quando solicitados e a desligá-lo ao final da sessão.

Após o período de familiarização, foram realizadas duas sessões individualizadas por semana, com duração de 30 minutos cada, no período vespertino, totalizando em média 30 sessões para cada participante. Durante os primeiros três meses foram aplicadas as sessões livres nas quais cada idoso escolhia os minijogos de seu interesse do KinectTM Sports ou KinectTM Adventures, com objetivo de promover a aderência dos participantes às atividades. Já nos últimos três meses foram aplicadas as sessões protocolo de jogos que incluiu minijogos do KinectTM Sports na seguinte sequência padrão em todas as sessões: 5min de Futebol, 5min de Tênis de mesa, 5min de Atletismo (alternando lançamento de dardo e corrida), 5min de Boliche, 5min de Boxe e 5min de Atletismo (alternando lançamento de dardo e corrida). Cabe ressaltar que as sessões livres e as sessões protocolo só foram diferentes quanto à sequência dos jogos, sendo as sessões livres realizadas com a sequência escolhida pelos próprios idosos, mantendo o volume total de 30min de duração.

Os idosos receberam a recomendação de manter o esforço na faixa de intensidade moderada, entre 64 a 76% [20] da Frequência Cardíaca Máxima (FCMáx) prevista para idade de acordo com Tanaka et al. [21] (208 - (0,7 x idade)) e acompanhada através da frequência cardíaca (FC) verificada por frequencímetro de pulso (Polar, modelo F5, Finlândia), entretanto os participantes permaneceram entre 49 a 63% da FCMáx, sendo esta intensidade considerada leve por Bouchard et al. [20].

Os idosos apresentavam-se motivados para as atividades, incluindo os três idosos que optaram por mudar de atividade, os quais relataram gostar das atividades de jogos, mas terem maior interesse nas aulas de computação. Foram incluídos na amostra apenas os idosos que tiveram no mínimo 75% de participação.

Os resultados são apresentados por meio da estatística descritiva (média, desvio padrão e intervalo de confiança 95%). Depois de avaliada a normalidade dos dados por meio do teste de Shapiro-Wilk, foi utilizado o teste t pareado bicaudal para comparações do perfil antropométrico e qualidade de vida entre os momentos pré e pós-intervenção. Para todas as análises estatísticas o Software Statistical Package for Social Sciences (SPSS, Inc., v. 20.0; IBM Corporation, Somers, NY, USA) foi utilizado, adotando-se um nível de significância de p ≤ 0,05.

 

Resultados

 

Os seis idosos (n = 4F; n = 2M) que concluíram o protocolo de pesquisa apresentaram média de idade de 64,83 ± 4,07 anos. A tabela I apresenta as características antropométricas da amostra nos momentos pré e pós-intervenção, cuja diferença não foi observada.

 

Tabela I - Valores médios (± DP) do perfil antropométrico dos idosos no momento pré e pós-intervenção.

 

DP = Desvio padrão; ΔPós-Pré  = Diferença entre as médias Pós e Pré; IC = Intervalo de confiança; t = estatística do teste t pareado bicaudal; IMC = Índice de massa corporal; CC = Circunferência da cintura; CQ = Circunferência do quadril; RCQ = Relação cintura e quadril.

 

Todos os idosos eram aposentados. A amostra foi composta por apenas um idoso casado e os demais eram viúvos; uma idosa era aposentada e trabalhava na confecção de artesanato; uma idosa possuía ensino médio completo enquanto os demais possuíam ensino fundamental incompleto. No decorrer dos meses de estudo, apenas 6 idosos (n = 4F; n = 2M) concluíram todas as etapas da pesquisa. Os motivos para não conclusão do protocolo pelos outros sete participantes variaram entre: mudança de cidade, de domicílio e/ou viagem (3 idosas), problemas de saúde que inviabilizaram a participação no estudo (1 idoso) e mudança de opção para realizar outra atividade disponibilizada pelo grupo de pesquisa como aulas de computação (2 idosos e 1 idosa).

A intervenção contribuiu para melhora significativa (p = 0,01) da qualidade de vida geral (QV Geral) quando comparados os momentos pré e pós-intervenção (67,72 ± 10,95 vs. 70,82 ± 9,10 respectivamente) (Tabela II). Pode-se observar que o domínio ambiental da QV também sofreu influência significativa da intervenção (55,38 ± 3,50 vs. 64,06 ± 6,47, p = 0,02). Os demais domínios social, físico e psicológico não apresentaram diferença significativa (77,77 ± 6,80 vs. 73,61 ± 16,17, p = 0,56; 67,26 ± 19,35 vs. 72,02 ± 15,87, p = 0,44; e 70,13 ± 22,42 vs. 73,61 ± 7,75, p = 0,69) respectivamente.

 

Tabela II - Valores médios (± DP) dos diferentes domínios da qualidade de vida (QV) e da qualidade de vida geral dos idosos no momento pré e pós-intervenção.

 

DP: = Desvio padrão; ΔPós-Pré = Diferença entre as médias Pós e Pré; IC = Intervalo de confiança; t = estatística do teste t pareado bicaudal; ‡ p < 0,05 em relação ao momento pré-intervenção; † p = 0,01 em relação ao momento pré-intervenção.

 

Discussão

 

Ao compararmos os idosos com eles mesmos, os resultados sugerem que duas sessões semanais de EXGs durante seis meses contribuíram para a melhora da qualidade de vida geral e do domínio ambiental em idosos. Entretanto, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas em relação ao domínio físico, psicológico e social isoladamente.

Para nosso conhecimento, esse é o primeiro estudo que avaliou o efeito de EXGs com Microsoft Kinect sobre diversos domínios da QV. Em estudos prévios com outros dispositivos de EXG também não foram observadas diferenças significativas no domínio físico, psicológico e social isolados.

A ausência de alterações significativas no domínio físico (Tabela II) é acompanhada pela ausência de alterações nas variáveis antropométricas (Tabela I). O domínio físico compõe aspectos de percepção de dor e desconforto, energia e fadiga, sono e repouso, mobilidade, atividades da vida cotidiana, dependência de medicação ou de tratamentos e capacidade de trabalho [19]. A intervenção não promoveu alterações neste domínio talvez pela intensidade, duração e frequência semanal do esforço físico durante o EXGs.

Embora a recomendação para esta população seja de 150 min semanais de AF com intensidade moderada [3], isso não foi possível de ser realizado em virtude do nível de sedentarismo dos idosos, da logística (de recursos materiais e humanos) para execução das coletas de dados junto aos idosos, bem como da própria disponibilidade de tempo dos idosos em participar das intervenções. Assim, a faixa de frequência cardíaca que os participantes permaneceram durante os jogos foi entre 49 e 63% da FCMáx, considerada uma intensidade leve, mas de acordo com outros estudos [22-24] realizados em jogos do KinectTM Sports.

Os resultados observados no presente estudo estão em consonância aos achados por Sposito et al. [25], que não observaram diferenças significativas na capacidade funcional, equilíbrio e QV geral em idosas após nove sessões de 50 min durante três semanas com Nintendo Wii, embora tenham verificado aumento nos scores do equilíbrio e dos aspectos físicos da QV.

Em contraste, estudo conduzido por Domingos [13] reportou que 10 sessões de 80 minutos de jogos ativos contribuíram para a melhora do funcionamento sensorial, autonomia e percepção da QV em idosos. Porém esses achados utilizaram diferentes dispositivos, jogos e duração de sessões, o que dificulta as comparações com o presente estudo.

Vernadakis et al. [26] demonstraram que a incorporação de EXGs na vida diária pode auxiliar crianças e adultos a alcançarem níveis recomendados de habilidades motoras fundamentais e exercerem impacto positivo na participação em AF tradicionais. Porém, estes aspectos ainda precisam ser investigados na população idosa.

Já o domínio psicológico, composto por sentimentos positivos; pensar, aprender, memória e concentração; autoestima; imagem corporal e aparência; sentimentos negativos; e espiritualidade/religião/crenças pessoais [19], de modo que a diferença observada neste domínio possa estar relacionada a mais de uma destas variáveis.

De acordo com Araújo et al. [27], os EXGs geram aprendizagem das regras do jogo, dos movimentos corpóreos necessários para jogá-lo e desenvolve a capacidade de planejamento e organização, utilizada em outras situações cotidianas. O aprender envolve a associação de novas informações à memória [28] permitindo que as informações vividas a qualquer momento sejam evocadas quando necessário [29]. Neste sentido, o uso de EXGs exige que os idosos exercitem suas memórias para interagirem com os jogos, de maneira que a percepção do aprendizado pode contribuir para o domínio psicológico através da melhora da autoestima e do estado de humor [30,31]. Além disso, a atenção necessária durante o jogo pode despertar a percepção de melhora nos aspectos cognitivos (atenção, memória, raciocínio, concentração) [30], com impacto no domínio psicológico, porém, estas variáveis não foram avaliadas em separado neste estudo.

Com relação ao domínio social (relações pessoais e o suporte social) não foi observada diferença significativa após a intervenção. Esse resultado pode estar relacionado à intervenção ter sido aplicada individualmente em cada participante e os intervalos de trinta minutos entre as sessões para preparação dos equipamentos e da sala para a sessão seguinte não permitiram que os idosos estabelecessem relações sociais entre eles. Acreditava-se que os EXGs aplicados nesse estudo poderiam exercer efeito positivo sobre o domínio social, visto que as melhoras da capacidade física e da independência poderiam resultar em melhor aproveitamento das oportunidades de convívio em sociedade, porém a metodologia empregada na intervenção não promoveu alteração neste domínio.

Embora o domínio social tenha o menor impacto sobre a QV geral dentre os quatro domínios [32], deve-se considerar a interação deste com aspectos de outros domínios, como por exemplo, oportunidades de recreação e lazer do domínio ambiental, cujos resultados foram positivos nesse estudo.

A adesão e permanência dos idosos em programas de AF, sejam esses com ou sem EXGs, é um grande desafio a ser superado. Em se tratando de participação de idosos em pesquisa científica, Witham e McMurdo [33] destacam que, embora os idosos tenham interesse em participar de estudos científicos por altruísmo ou por interesses pessoais, muitos terminam sendo eliminados pela presença de comorbidades e fragilidades. Isto pode ser observado na fase de recrutamento do presente estudo, em que dos 64 idosos interessados em participar, apenas 13 atenderam aos critérios de inclusão; desses, 7 interromperam a participação no estudo.

Embora as aulas de computação e o programa de EXGs desenvolvam diferentes aspectos da QV, e que os EXGs possam intervir num maior número de variáveis de diferentes domínios da QV, o interesse dos idosos por estas atividades pode refletir a busca desta população pela inclusão e participação nas novas dinâmicas sociais. Segundo Cardoso et al. [34] os idosos buscam aprender sobre informática com objetivo de socialização e interação.

O interesse dos idosos pela prática de EXGs, quando relacionados com uma prática de AF que envolve tecnologia e participação em novas dinâmicas sociais, poderá ser o diferencial desta modalidade, visto que os demais aspectos relacionados à motivação não parecem diferentes daqueles relacionados aos de AF tradicionais, tais como: a saúde, o prazer pela prática e a sociabilidade [4,5], o apoio à prática por parte de parentes e/ou amigos e a proximidade do local de moradia do local da prática [4].

Algumas limitações metodológicas do presente estudo devem ser destacadas, como por exemplo: o reduzido tamanho da amostra, a ausência de grupo controle, estando este fator relacionado tanto ao rigor dos critérios de exclusão quanto à perda amostral durante o processo de coleta de dados. Outra limitação foi a duração da intervenção e a frequência semanal, bem como as AF realizadas e intensidade do exercício. Tais sugestões de alteração do tempo de prática podem contribuir para uma melhora significativa nos distintos domínios.

Os EXGs com Kinect podem ser uma alternativa lúdica e prazerosa, podendo ainda complementar os programas tradicionais de AF. No entanto, os estudos na literatura não apresentam ou sugerem um protocolo ideal (eficaz e validado), e também apresentam um número amostral pequeno, tornando inconclusivos os benéficos deste tipo de atividade. Sugere-se a necessidade de novos estudos que controlem as limitações aqui comentadas sem deixar de considerar as particularidades e dificuldades peculiares e comuns aos estudos com populações idosas. Apesar destas limitações, este estudo apresenta informações que podem auxiliar e/ou direcionar futuras pesquisas com essa temática.

 

Conclusão

 

O estudo demonstrou que os jogos de videogame ativos contribuem para uma melhor qualidade de vida geral e ambiental de idosos sedentários, porém, não resultaram em alterações significativas nos aspectos físico, psicológico e social após a intervenção.

 

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