RELATO DE CASO

Infusão controlada de CO2 no tratamento de fibrose pós criolipólise

Controlled infusion of CO2 in fibrosis treatment after cryolipolysis

 

Lídia Vieira Dantas*, Sandra Panta de Paula*, Mirian Evelyn Peres Mansor Coleti*, Juliane Caroline Frazão*, Taís Amadio Menegat**

     

*Aluna de Pós Graduação Lato Sensu em Biomedicina Estética do Instituto IBECO, **Orientadora, Fisioterapeuta Dermato-Funcional  

 

Recebido 3 de maio de 2017; aceito 15 de junho de 2017

Endereço para correspondência: Lídia Dantas, Coordenadora da Pós Graduação em Biomedicina Estética da Faculdade Método de São Paulo, Av. Jabaquara, 1314 Mirandópolis 04046-200 São Paulo SP, E-mail: dantaslidia@yahoo.com.br; Sandra Panta de Paula: sandrapanta.mk@gmail.com; Mirian Evelyn Peres Mansor Coleti: mirianmansor@gmail.com; Juliane Caroline Frazão: jcafrazao@gmail.com; Taís Amadio Menegat: tamadiomenegat@gmail.com

 

Resumo

Introdução: A fibrose está associada à deposição excessiva de fibras da matriz extracelular, onde os fibroblastos são a principal fonte de produção de colágeno. Neste processo pode ocorrer uma disfunção e a produção de colágeno ocorrerá de forma desordenada. A infusão controlada de CO2 no tecido subcutâneo é um procedimento para fins terapêuticos visando a melhora dos sintomas de doenças inflamatórias e isquêmicas. Posteriormente, verificou-se que a infusão de CO2 através de agulhas melhorou não só a circulação sanguínea em tecidos isquêmicos, como aumentou o aporte de oxigênio localmente. O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia da aplicação da infusão controlada de CO2 em lesão fibrótica decorrente da aplicação de criolipólise. Métodos: Foi realizado um estudo descritivo. No relato em questão, a paciente apresentou fibrose na região tratada 15 dias após ter sido submetida à criolipólise. O tratamento proposto foi infusão controlada de CO2 associada à massagem Vibrocell®. Resultados: A partir da 5ª sessão foi observada redução do processo fibrótico. Conclusão: A associação dos procedimentos de infusão controlada de CO2 e Vibrocell® nos parâmetros apresentados neste relato de caso foram satisfatórios no tratamento da fibrose pós criolipólise com dissolução total após a 8ª sessão.

Palavras-chave: dióxido de carbono, fibrose, criolipólise.

 

Abstract

Introduction: Fibrosis is associated to excessive deposition of extracellular matrix fibers, where fibroblasts are the main source of collagen production. In this process the production of collagen can occur in disordered form. Controlled infusion of CO2 in the subcutaneous tissue is a procedure for therapeutic purposes aimed at improving the symptoms of inflammatory and ischemic diseases. Later, it was verified that CO2 infusion through needles not only improved the blood circulation in ischemic tissues, but also increased the oxygen supply locally. The objective of this study was to evaluate the efficacy of the controlled infusion of CO2 in fibrotic lesions due to cryolipolysis. Methods: A descriptive study was carried out. The patient presented fibrosis in the treated region 15 days after being submitted to cryolipolysis. The treatment was a controlled infusion of CO2 associated with Vibrocell® massage. Results: After the 5th session, the fibrotic process was reduced. Conclusion: The association of controlled infusion of CO2 and Vibrocell® in the parameters presented in this case were satisfactory in the treatment of fibrosis after cryolipolysis with total dissolution after the 8th session.

Key-words: carbon dioxide, fibrosis, cryolipolysis.

 

Introdução

 

A fibrose é um processo de cicatrização patológica que geralmente ocorre pós-trauma ou dano e na maioria dos casos está acompanhada por uma inflamação [1,2]. De acordo com Altomare e Machado [3], o processo de restauração se inicia logo após o trauma, causando inicialmente a ruptura dos vasos sanguíneos, onde plaquetas formam um coágulo inicial, atraindo células inflamatórias e outras substâncias responsáveis pelo processo de reparação tecidual e o tecido que possui fibrose se regenera de forma irregular.

Concomitantemente ao processo inflamatório, estas células são substituídas por tecido cicatricial, composto principalmente por fibras de colágeno. De acordo com Guirro e Guirro [4], o colágeno é a proteína mais abundante do corpo humano, representando 30% do total de proteína e 70% do peso da pele seca. Quando os macrófagos sinalizam que o organismo foi lesado, estas células se movem em direção ao local da ferida e começam a produzir grande quantidade desta proteína de forma a preencher o local, podendo causar a fibrose.

A criolipólise é considerada um recurso não invasivo e eficaz no tratamento de adiposidade localizada utilizado em diversos países [5]. Inicialmente sua eficácia foi demonstrada em um estudo piloto no qual um animal de espécie suína foi submetido ao frio extremo. Após três meses dessa exposição verificou-se a diminuição mensurável da espessura da camada adiposa superficial [6-8] demonstrando que a exposição do tecido ao frio induz apoptose adipocitária sem causar danos à pele e as estruturas adjacentes.

A cristalização e a isquemia fria dos adipócitos alvo induzem apoptose adipocitária e uma resposta inflamatória pronunciada [9,10]. Esta inflamação é, portanto, considerada o elemento desencadeador do fenômeno de apoptose, sendo esta última, sugerida como a chave para a morte dos adipócitos, da redução da gordura localizada e, consequentemente a responsável pelo resultado estético do tratamento [11,12].

A infusão controlada de gás carbônico medicinal (CO2) no tecido subcutâneo é um procedimento realizado desde a década de trinta, sendo utilizado para fins terapêuticos melhorando os sintomas de doenças inflamatórias e isquêmicas [13]. Posteriormente, verificou-se que a infusão de CO2 através de agulhas melhorou não só a circulação sanguínea em tecidos isquêmicos, como aumentou o aporte de oxigênio localmente [14,15].

A presença de altos níveis de CO2 e prótons (H+) nos capilares teciduais, promovem a liberação do O2 pela hemoglobina, esta reação dependente do pH meio é conhecida como Efeito Bohr [12]. Convêm ressaltar que com a vasodilatação melhora-se o fluxo de nutrientes, dentre eles, as proteinases necessárias para remodelar os componentes da MEC e para acomodar a migração e reparação tecidual [14].

Como a fibrose é uma complicação importante na medicina atual, sendo complexa e de causa multifatorial [15], é compreensível o motivo pelo qual é uma complicação temida por profissionais e não aceita por pacientes que realizam procedimentos estéticos, como a criolipólise por exemplo.

O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia da aplicação da infusão controlada de CO2 em lesão fibrótica decorrente da aplicação de criolipólise.

 

Caso clínico

 

Paciente T.F.G., gênero feminino, 36 anos de idade, casada, raça branca, portadora de fibromialgia crônica. A paciente foi submetida a uma única sessão de criolipólise em 01/09/2014, mas durante a anamnese, apesar da paciente fazer uso de corticoide oral desde 2005, essa informação não foi fornecida ao profissional responsável durante a avaliação corporal. A paciente foi exposta ao aparelho de criolipólise FusioMed® por 60 minutos nas região de abdômen superior e inferior. Quinze dias após submeter-se à sessão de criolipólise, a paciente apresentou fibrose na região tratada (Figura 1A).

O tratamento realizado para reverter à fibrose foi de infusão controlada de CO2, que teve início em 16/09/2014, tendo uma preparação da região com Vibrocell®, equipamento que incorpora vibração acústica e micropercussão estimulando os tecidos subdérmicos. A aplicação do Vibrocell® foi realizada no abdômen superior e inferior por 10 minutos com frequência de 30 Hz, a máxima permitida pelo equipamento. Após a aplicação com Vibrocell®, foi realizada antissepsia local com clorexidina 0,5% e infusão controlada de CO2 na lesão fibrótica em plano profundo, com agulha introduzida a 90º em relação à pele, com método descrito por Abramo [13], onde foi realizado modo punturação com 1,5 ml vezes o peso ponderal da paciente e velocidade alta de 180 ml/min. Em cada fibrose foram realizadas três punturações com distância de 2 cm entre cada uma.

Verificou-se que a partir da 5ª sessão da infusão controlada de CO2 houve redução do processo fibrótico, tendo sua dissolução total após a 8ª sessão (Figura 1 B e C).

 

 

Figura 1 - A - Lesão fibrótica 15 dias após sessão de criolipólise. B - Lesão fibrótica após 5ª sessão. C - Finalização do tratamento.

 

Discussão

 

Apesar do pouco tempo de existência no mercado mundial, o crescente interesse pela criolipólise vem tornando esta técnica extremamente popular entre os profissionais e pacientes. As pesquisas iniciais com modelos animais [6,17] e estudo in vitro [7], indicaram que a criolipólise é capaz de induzir a apostose adipocitária por meio da geração de paniculite local. De acordo com Zelickson et al. [17], uma resposta inflamatória (paniculite lobular) induzida pelo resfriamento dos adipócitos precede a redução da camada de gordura. Esta inflamação é considerada o elemento desencadeador do fenômeno da apoptose, responsável pelo resultado estético do tratamento [8,11,12].

No caso clínico em questão, a paciente, submetida a uma sessão única de criolipólise, apresentou lesão fibrótica quinze dias após a realização do procedimento. Efeitos adversos ao tratamento também foram reportados por Coleman et al. [11], que observaram redução transitória da função sensorial, a qual foi restabelecida em menos de quatro semanas.

Na literatura consultada foram referidos alguns protocolos envolvendo a associação de outros recursos terapêuticos, como ondas sonoras (ultracavitação, ultrassom terapêutico, e ondas de choque), radiofrequência, carboxiterapia, entre outros, intencionando aumentar a paniculite e, consequentemente, potencializar os resultados. Ferraro et al. [12] utilizaram a criolipólise com ondas de choque no tratamento de lipodistrofia localizada e fibro edema gelóide, tendo sido observada redução significativa da espessura da gordura.

Resultados semelhantes foram descritos por Boey e Wasilenchuk [18] que determinaram se a adição de manobras de massagem manual pós-tratamento incrementaria a eficácia da criolipólise. A média de redução da camada de gordura foi 44% maior no lado massageado em comparação ao contralateral, sem evidencia de necrose ou fibrose resultante da massagem.

A terapêutica proposta neste estudo constou da utilização de infusão controlada de CO2, com o objetivo minimizar o evento adverso causado pela criolipólise (fibrose).

A carboxiterapia é um tratamento indicado para tratar estrias, flacidez de pele, fibro edema gelóide, lipodistrofia, olheiras, rugas finas ao redor dos olhos e boca, rejuvenescimento facial, podendo também ser utilizada como tratamento complementar à lipoaspiração, pós-operatório de cirurgias plásticas e calvície. Com o desenvolvimento de um equipamento capaz de controlar o fluxo injetado por minuto e o volume total injetado possibilitou a aplicação da carboxiterapia e seu reconhecimento terapêutico nos países da Europa, principalmente Itália e França, onde é reconhecida para uso em Saúde Pública [14].

Desde o estudo realizado por Brandi et al. [19] que comprovou a eficácia do gás carbônico no tratamento de lipodistrofia localizada, mostrando a redução das medidas da circunferência abdominal, coxa e região do joelho, existe um interesse mundial nessa terapia em várias áreas da medicina estética e convencional, por ser um procedimento seguro, sem efeitos adversos ou complicações importantes, tanto locais quanto sistêmicas.

Neste estudo foram necessárias cinco sessões para que ocorresse melhora na região comprometida pela fibrose, tendo o quadro apresentado resultados estéticos satisfatórios após a 8ª sessão de tratamento com a infusão controlada de CO2.

 

Conclusão

 

A fibrose é um processo patológico que ocorre após trauma ou dano e, na maioria das vezes, é acompanhada por inflamação. Apresenta causas multifatoriais influenciadas pela susceptibilidade de cada indivíduo, sendo reversível em alguns casos, apesar de não existir uma terapêutica padrão eficaz. Entretanto, a associação dos procedimentos de infusão controlada de CO2 (carboxiterapia) e massagem com equipamento Vibrocell® nos parâmetros apresentados neste relato de caso foram satisfatórios no tratamento da fibrose pós criolipólise, com dissolução total após a 8ª sessão.

 

Referências

 

  1. Sanjuan MA, Dillon CP, Tait SW, Moshiach S, Dorsey F, Connell S et al. Toll-like receptor signaling in macrophages links the autophagy pathway to phagocytosis. Nature 2007;450(7173):1253-7.
  2. Anders HJ, Muruve DA. The inflammasomes in kidney disease. J Am Soc Nephrol 2011;22(6):1007-18.
  3. Altomare M, Machado B. Cirurgia plástica: terapêutica pré e pós. In: Borges FS, ed. Dermato-funcional: modalidades terapêuticas nas disfunções estéticas. São Paulo: Phorte; 2006.
  4. Guirro ECO, Guirro RRJ. Fisioterapia dermato-funcional: fundamentos, recursos e patologias. 3ed. rev. e ampliada. São Paulo: Manole; 2004.
  5. Brightman L, Geronemus R. Can second treatment enhance clinical results in cryolipolysis? Cosmetic Dermatol 2011;24(2):85-8.
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  7. Preciado JA, Allison JW. The effect of cold exposure on adipocytes: examining a novel method for the non-invasive removal of fat. Cryobiology 2008;57(3):327.
  8. Nelson AA, Wasserman D, Avram MM. Cryolipolysis for reduction of excess adipose tissue. Semin Cutan Med Surg 2009;28(4):244-9.
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  13. Abramo A. Infusão controlada de CO2 - Carboinsuflação; 2010.
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  15. Diji A, Greenfield AD. The local effect of carbon dioxide on human blood vessels. Am Heart J 1960;60:907-14.
  16. Pestana E, Gabriel F, Sampaio F. Reabilitação de cicatrizes - Artigo de revisão. [citado 2015 jun 12]. Disponível em URL: http://news.fm.ul.pt/Content.aspx?tabid=75&mid=515&cid=1603
  17. Zelickson B, Egbert BM, Preciado J, Allison J, Springer K, Rhoades RW, et al. Cryolipolysis for noninvasive fat cell destruction: initial results from a pig model. Dermatol Surg 2009;35(10):1462-70.
  18. Boey GE, Wasilenchuk JL. Enhanced clinical outcome with manual massage following cryolipolysis treatment: a 4-month study of safety and efficacy. Lasers Surg Med 2014;46(1):20-6.
  19. Brandi C, D’Aniello C, Grimaldi L, Bosi B, Dei I, Lattarulo P et al. Carbon dioxide therapy in the treatment of localized adiposities: clinical study and histopathological correlations. Aesthetic Plast Surg 2001;25(3):170-4.