ARTIGO ORIGINAL

Exploração da prevalência de sintomas osteomioarticulares cervicais em universitários

Exploration of the prevalence of cervical osteomioarticular symptoms in university students

 

Rafael do Nascimento Bentes, Ft.*, Flávia Roberta Bastos Ferreira, Ft.**, Yasmin Andrade Cunha, Ft.**

 

*Pós-graduado em Fisioterapia Traumato-ortopédica pela Universidade da Amazônia (UNAMA), Belém/PA, **Graduada pela UNAMA, Belém/PA

 

Recebido em 30 de agosto de 2017; aceito em 31 de agosto de 2018.

Endereço para correspondência: Rafael do Nascimento Bentes, E-mail: rafael.bentes11@hotmail.com; Flávia Roberta Bastos Ferreira: robertabastos2011@hotmail.com; Yasmin Andrade Cunha: yasmincunha117@hotmail.com

 

Resumo

Introdução: Pela fácil acessibilidade, os smartphones estão cada vez mais utilizados e necessários para o dia a dia. Todavia, o uso em excesso e por longos períodos, má posturas, ausência de alongamentos durante o uso e padrão ergonômico inadequado, somado a movimentos repetitivos, expõem seus usuários a risco de desenvolver processos agudos e crônicos de dor e possíveis lesões osteomioarticulares. Objetivo: O presente estudo teve por objetivos verificar a prevalência de sintomas álgicos, pela utilização de smartphone sobre a região cervical em jovens universitários. Material e métodos: Trata-se de um estudo descritivo e observacional transversal, de caráter quantitativo, composto por uma amostra de 253 universitários com faixa etária acima de 18 anos de idade e de ambos os gêneros. Os dados e variáveis encontrados foram analisados de maneira rigorosa, visando eliminar erros no processo de mensuração e análise pelo pesquisador. Resultados: Obteve-se relevância acerca dos dados encontrados, com a pesquisa direcionando para maioria de jovens entre 18-24 anos, queixando-se de dor em mais da metade da amostra, durante o uso do dispositivo. Quando comparado a outras evidências recentes, os resultados obtidos pelo estudo revelam dados condizentes. Conclusão: A partir dos dados obtidos pode se estabelecer notória prevalência de sintomas osteomioarticulares durante o uso do smartphone, e tais queixas são relacionadas principalmente ao tempo de uso, associado a más posturas adotadas.

Palavras-chave: dor, transtornos de movimento, ergonomia.

 

Abstract

Introduction: With easy access the smartphones are more and more used and become necessary for the daily life. However, with the use in longer and longer periods, bad postures, absence of stretching during use and inadequate ergonomic standard, added to repetitive movements, expose their users to a risk of acute and chronic processes of pain and osteomioarticular lesions. Objective: The present study aimed to verify the prevalence of a series of painful symptoms, by the use of smartphones on the cervical region in university students. Methods: This is a descriptive and cross-sectional, quantitative study, composed of a sample of 253 university students over 18 years and of both genders. The data and variables found were analyzed in a rigorous way, aiming to eliminate errors in the process of measurement and analysis by the researcher. Results: Relevance was obtained regarding the data found, with the survey targeting most young people aged 18-24 years, complaining of pain in more than half of the sample, during the use of the device. When compared to other recent evidence, the results obtained by the study reveal consistent data. Conclusion: Based on the data obtained, a prevalence of osteomioarticular symptoms can be established during the use of the smartphone, and such complaints are mainly related to the time of use, associated with more postures adopted.

Key-words: pain, movement disorders, ergonomics.

 

Introdução

 

Atualmente existe mais de 1,5 bilhão de usuários de smartphones no mundo, tornando este eletrônico como um dos mais populares [1,2]. Esta afirmação é sustentada por tratar de um dispositivo capaz de processar mais informações que os demais telefones, levando ao indivíduo muito além do uso apenas para comunicação, como, por exemplo, fácil acesso a internet, uso de jogos e redes sociais, aplicativo multimídia e fácil envio de mensagens [2,3].

Pesquisadores afirmam o imparável crescimento da necessidade deste pedaço de tecnologia, juntamente com o seu uso excessivo, sendo considerado como vício pelos autores, na medida em que tal uso perturba a vida diária dos usuários [4,5]. Dentro desta estimativa, os jovens universitários são um percentual que chama atenção por utilizarem smartphones em período cada vez maiores, principalmente pela sua acessibilidade, e fácil locomoção, deixando de lado demais tecnologias, como notebook, tablete, netbook. Porém em proporção a estes dados, também cresce a incidência de distúrbios osteomioarticulares nesta população [6-8].

Os distúrbios osteomioarticulares nesses jovens são originados pelos movimentos repetitivos, sendo quase sempre executado em posturas inadequadas e pela tensão mínima na musculatura causada por essa utilização excessiva. Dentre estes distúrbios incluem, cefaleias, dores cervical, nos ombros, cotovelo e punho, limitação de amplitude de movimento, sintomas radiculares (perda ou diminuição da sensibilidade, formigamento), além disso, esse uso excessivo pode levar a problemas como visão turva e alguns problemas mentais ou comportamentais [9].

O presente estudo, portanto, teve por objetivos verificar a prevalência de sintomas álgicos, pela utilização de smartphone sobre a região cervical em jovens universitários de uma instituição privada.

 

Material e métodos

 

Trata-se de um estudo descritivo e observacional transversal, de caráter quantitativo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisas em Seres Humanos da Universidade da Amazônia, sob número CAAE: 66584517.6.0000.5173, tendo em vista que foram feitos todos os ajustes recomendados e que o projeto atende a todos os preceitos éticos definidos na Resolução CNS 466/2012.

A amostra foi composta por 253 universitários com faixa etária acima de 18 anos de idade e de ambos os gêneros. Foi necessário para a participação desses universitários, estar devidamente matriculado no curso de bacharelado em fisioterapia (turnos matutino, vespertino ou noturno), não apresentar diagnóstico clínico de patologias ou limitação física, e também por meio do termo de consentimento livre e esclarecido, assinasse e aceitasse participar da pesquisa. Em contrapartida, foram excluídos automaticamente da pesquisa os indivíduos que não se enquadraram nos critérios de inclusão citados anteriormente: os indivíduos que sentiam dor antes da utilização dos aparelhos, que sentiam dores a todo o momento, independente da utilização dos aparelhos e os que apresentassem qualquer limitação física e/ou lesão de membros superiores relatados pelo participante.

Para a coleta de dados foi utilizado o instrumento do questionário de identificação e uso de tecnologias portáteis desenvolvidos pelos autores, consistindo em perguntas abertas e fechadas sobre as variáveis pessoais, uso de tecnologias e sintomatologia, além da escala visual analógica, para mensurar o sintoma de dor.

Os dados obtidos e variáveis encontradas foram analisados de maneira rigorosa, visando eliminar erros no processo de mensuração e análise pelo pesquisador. Utilizou-se o programa Microsoft Excel® 2010, para a tabulação dos dados e elaboração das tabelas. Os dados coletados foram confrontados com a literatura nacional e internacional sobre o assunto vigente.

 

Resultados

 

A descrição e a análise de distribuição dos dados dos participantes estão expostas nas tabelas I, II, III e IV.

A pesquisa apresentou quanto ao perfil dos universitários, notória maioria de participantes mulheres, cerca de 70% da amostra total, com faixa etária de 18 a 24 anos, conforme tabela I.

Durante a pesquisa, os participantes foram questionados sobre a posição adotada para o uso dos aparelhos, além do tempo de uso. A maioria dos indivíduos relatou usar a tecnologia por mais tempo na posição sentada, seguido da posição deitada, com relato de 51% dos indivíduos, no período de 7-12 horas de uso da tecnologia, como descrito na tabela II.

Quanto à região do corpo em que o indivíduo apresenta dor, pode-se observar que a maioria considerável relatou na região cervical, seguida pelas outras divisões da coluna vertebral e dos demais segmentos do membro superior, como, por exemplo, dor na região da mão, punho e dedos, como pode ser observado na tabela III. É relevante que em 51% dos indivíduos as queixas osteomioarticulares são presentes durante o uso do smartphone, seguido de 31% dos indivíduos que apresentam queixas após o uso, como apresentando na tabela IV.

Acerca dos sintomas apresentados pelos indivíduos, podem-se observar, em grande maioria, como descrito na tabela V, queixas álgicas na região cerevical, correspondendo a 86% dos indivíduos, seguido de cansaço, e sintomas radiculares.

 

Tabela I - Dados referentes ao perfil dos universitários participantes da pesquisa.

 

Fonte: Pesquisa de Campo, 2017.

 

Tabela II - Dados referentes ao uso da tecnologia e tempo de uso.

 

Fonte: Pesquisa de Campo, 2017.

 

Tabela III - Dados referentes à dor nas outras regiões.

Fonte: Pesquisa de Campo, 2017.

 

Tabela IV - Dados referentes à ocorrência do sintoma na região da cervical no uso do smartphone.

 

Fonte: Pesquisa de Campo, 2017.

 

Tabela V - Dados referentes aos sintomas osteomioarticulares na região da cervical dos universitários.

 

Fonte: Pesquisa de campo, 2017.

 

Discussão

 

Os dados presentes na tabela I mostram que a maior parte dos participantes da pesquisa era de faixa etária entre 18-24 anos e de gênero feminino, o que certifica o resultado encontrado na pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [10] sobre a síntese de indicadores sociais, além de respaldar os dados encontrados pelo Instituto Nacional de Estudos e pesquisas Educacionais Anísio Teixeira [11], que mostram as mulheres como a maioria dos ingressos nas universidades.

Os smartphones, além de se apresentarem como a tecnologia mais utilizada pelos participantes, são considerados como o aparelho móvel de comunicação e informação com maior aceitabilidade em toda sociedade, com mais de 68 milhões de usuários, tendendo a crescer tal estimativa com o passar do tempo [12]. Sua fácil acessibilidade, poder usar em qualquer lugar e a qualquer hora, também interferem em adequações posturais, quase sempre má postura e por longos períodos, como pode ser observado na tabela II, gerando uma reação em local e /ou em cadeia e culminando em uma lesão e incapacidade funcional [13].

Assim como relatado anteriormente, também foi apresentado no estudo que os sintomas osteomioarticular nos participantes são principalmente durante o uso desta tecnologia (tabela IV), corroborando alguns outros autores, descrevendo que distúrbios osteomioarticulares estão diretamente ligados com as atividades repetitivas que podem vir a comprometer o sistema osteomioarticular. Este quadro vem como consequência ruim em relação ao desempenho deste indivíduo, tendo como principais sintomas: dor, parestesia, e fadiga muscular [14,15].

Dentre os resultados do estudo, pode se observar que a dor é a maior queixa dentre os usuários universitários do smartphone (tabela V). Verifica-se que tais sintomas foram mais relatados pelos participantes do estudo na região do pescoço (tabela III). Tal relação entre uso de smartphones e dores na região do pescoço se explica devido à tensão muscular gerada nos músculos espinhais cervicais e do trapézio, para que os mesmos se mantenham com a cabeça inclinada para frente durante utilização dos aparelhos, o que segundo estudos, provoca efeitos negativos para a coluna cervical, levando a dores na região [16-18].

Além da região pescoço que foi bastante abordada em estudos anteriores, outras regiões como o ombro e demais segmentos da coluna (torácica e lombar) também precisam ser enfatizadas, afinal foram neste estudo, a segunda e terceira regiões mais relatadas. O ombro por sua relação anatômica, uma relação direta, através da adaptação gerada da musculatura do trapézio, excessiva no que geram facilmente fadiga e tensões, logo, maior probabilidade também de lesões articulares no complexo do ombro [19-21].

Os demais tecidos moles, como os ligamentos, geram juntamente com estímulos no sistema nervoso alterações nos demais segmentos da coluna. Os ligamentos, por se tratar de estabilizadores da estática que sofrem uma excitabilidade de seus proprioceptores, por ter a necessidade da permanência muito tempo em uma mesma posição, geram alterações locais e a distância. A relação com o sistema nervoso por sua vez se dá pela relação da meninge duramater (membrana formada de tecido conjuntivo) que se origina na região cervical alta e tem inserção sobre o cóccix, como também por nervos periféricos, que podem sofrer possíveis compressões neurais, levando a sintomas radiculares [22-24].

 

Conclusão

 

Os resultados deste estudo apresentam importância sobre vários segmentos, principalmente para os estudantes universitários, pois fornece fundamentais informações e descrições acerca do uso de smartphones e possíveis respostas. Porém o estudo de uma maneira geral apresenta limitações, não sendo representativo de toda a população, focalizando especificamente estudantes universitários. E que pode ser ponto de partida para outros estudos, haja vista que é maior a cada dia a população usuária destes aparelhos.

 

Referências

 

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