ARTIGO
ORIGINAL
Avaliação
da qualidade de vida em mulheres com câncer de mama submetidas à intervenção
cirúrgica
Assessment of quality of life in women with breast cancer subject to
surgical intervention
Fernanda Cristina
Silva*, Letícia Júnia Ferreira*, Camila Medeiros Costa**, Andrei Pereira
Pernambuco, Ft. D.Sc.***
*Graduanda
em Fisioterapia do Centro Universitário de Formiga (UNIFOR/MG), bolsista no
Programa de Iniciação Científica do UNIFOR/MG, **Graduanda em Biomedicina do
Centro Universitário de Formiga, UNIFOR-MG, voluntária no Programa de Iniciação
Científica do UNIFOR/MG, ***Professor do Centro Universitário de Formiga,
UNIFOR-MG, Orientador do Programa de Iniciação Científica do UNIFOR/MG
Recebido em 11 de
novembro de 2017; aceito em 04 de agosto de 2018.
Endereço
de correspondência:
Andrei Pereira Pernambuco, Rua Araxá, 206, Residencial Morro do Sol 35680-284
Itaúna MG, E-mail: pernambucoap@ymail.com; Fernanda Cristina Silva:
fernandapains93@hotmail.com; Letícia Júnia Ferreira:
letciaferreira@hotmail.com; Camila Medeiros Costa: camilamcosta2009@gmail.com
Resumo
Introdução: O câncer de mama é
a neoplasia mais frequente entre as mulheres. Com a evolução dos tratamentos
disponíveis, houve um aumento da sobrevida das pessoas com diagnóstico de
câncer de mama. Contudo, a maior sobrevida quase sempre é acompanhada de comorbidades físicas e ou psicológicas que podem impactar
na qualidade de vida destas mulheres. Objetivo:
Avaliar a qualidade de vida de mulheres com câncer de mama que foram submetidas
a tratamento por meio de intervenção cirúrgica. Material e métodos: Participaram do estudo 87 mulheres
diagnosticadas com câncer de mama e que foram submetidas à intervenção
cirúrgica. A qualidade de vida foi avaliada pelo questionário QLQ-C30 e
QLQ-BR23. A análise estatística descritiva foi realizada no software GraphPad Prism
v.5. Resultados: No QLQ-C30 foram
observados bons níveis de qualidade de vida, entretanto no QLQ-BR23,
questionário específico para o câncer de mama, observou-se que a qualidade de
vida desses indivíduos estava prejudicada. Conclusão:
Os resultados demonstram que a qualidade de vida de pacientes que passaram por
tratamento cirúrgico de câncer de mama está comprometida. Deste modo, é necessário
que as equipes multidisciplinares de saúde ajam na tentativa de promover a
saúde e a qualidade de vida destas pessoas.
Palavras-chave: qualidade de vida,
câncer de mama, mastectomia.
Abstract
Introduction: Breast cancer is the most common neoplasm among women. With the
evolution of available treatments, the life expectancy of people diagnosed with
breast cancer increased. However, the greater survival is almost always
accompanied by physical and/or psychological comorbidities that may impact the quality
of life. Objective: To evaluate the
quality of life of women with breast cancer submitted to treatment by means of
surgical intervention. Methods:
Thirty-eight women diagnosed with breast cancer participated in the study and
underwent surgical intervention. Quality of life was assessed using the QLQ-C30
and QLQ-BR23 questionnaires. The descriptive statistical analysis was performed
in GraphPad Prism v.5 software. Results: Good quality of life was observed in the QLQ-C30; however,
in QLQ-BR23, a specific questionnaire for breast cancer, it was observed that
the quality of life of these individuals was impaired. Conclusion: The results demonstrate that the quality of life of
patients who undergo surgical treatment of breast cancer is compromised. Thus,
it is necessary to promote the health and quality of life of these patients
with multidisciplinary health teams.
Key-words: quality of
life, breast neoplasms, mastectomy.
O câncer de mama (CM)
é uma doença multifatorial e sua etiopatogenia não
foi totalmente esclarecida. Acredita-se na existência de uma interação entre
fatores genéticos e ambientais que cria condições propícias ao surgimento e
desenvolvimento do câncer [1]. Esse tipo de neoplasia é mais frequente em
mulheres, e representa cerca de 30% das neoplasias encontradas nessa população
[2]. Somente no Brasil, 596 mil mulheres receberam o diagnóstico de CM no ano
de 2016, o que torna essa condição uma das principais responsáveis pela
morbimortalidade dessa população [3].
Diversas técnicas são
utilizadas para o tratamento do CM, dentre as principais destacam-se:
quimioterapia, radioterapia, hormonioterapia e as
cirurgias como, por exemplo, a mastectomia [4]. Essa
última, apesar dos avanços, continua sendo um procedimento bastante agressivo e
mutilador [5]. O aprimoramento das técnicas terapêuticas para o CM reduziu o
índice de mortalidade dos pacientes e aumentou consideravelmente a sobrevida
das mulheres que foram diagnosticadas com esta condição [5,6]. Entretanto, o
aumento da sobrevida está quase sempre acompanhado de um aumento significativo
no número de comorbidades decorrentes da terapêutica
do câncer [6].
As principais comorbidades encontradas em pessoas com câncer de mama
submetidas ao tratamento são: alterações posturais, linfedema,
algias, alterações na sensibilidade, diminuição ou perda total da amplitude de movimento (ADM),
da força muscular do membro superior ipsilateral a
cirurgia e comprometimento da capacidade respiratória [7]. Ademais, podem ser
evidenciadas repercussões no aspecto emocional como ansiedade, dificuldades no
trabalho e depressão. Todas estas complicações isoladas ou em conjunto podem
impactar negativamente na qualidade de vida (QV) das mulheres submetidas ao
tratamento de CM [8].
A QV é definida pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) como a autopercepção
de um indivíduo sobre sua vida. Considera-se sua cultura e sistema de valores
próprios nos quais ele está inserido, seus objetivos, expectativas, padrões e
preocupações. É um conceito de alcance bastante abrangente, subjetivo e que é
afetado de forma complexa pela saúde física, estado psicológico, nível de
independência, relações sociais e relações com as características do meio
ambiente do indivíduo [9]. Ainda de acordo com a OMS, funcionalidade refere-se
a um termo amplo que engloba a integridade das funções e estruturas corporais, somada a capacidade preservada de realizar
atividades da rotina diária ou participar ativamente da sociedade [10].
Importante mencionar
que as alterações das funções emocionais e físicas e, principalmente, da
capacidade funcional, decorrentes do tratamento do câncer podem impactar a QV
das pacientes. Afinal, a capacidade funcional é caracterizada pela habilidade
em realizar as tarefas cotidianas, e esta depende da preservação de habilidades
cognitivas e motoras, que também estão diretamente ligadas à QV [5]. Neste
contexto, o objetivo do estudo foi avaliar a qualidade de vida de mulheres com
diagnóstico de CM que foram tratadas por meio de intervenção cirúrgica.
Cuidados
éticos
Este estudo foi
realizado mediante a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa em Humanos do
Centro Universitário de Formiga (CEPH/UNIFOR-MG), através do parecer número
1.251.833 e do Comitê de Ética do Hospital São João de Deus, através do parecer
número 1.549.175. Importante ressaltar que todas as etapas da pesquisa
obedeceram às recomendações da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde
(CNS). Para a participação do estudo, todas as voluntárias assinaram um Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias.
Participantes
Participaram do
presente estudo 87 mulheres neste studo
observacional, transversal e quantitativo. O recrutamento das voluntárias foi
realizado por meio de busca ativa em consultórios médicos, diretamente com pacientes
e/ou serviços especializados em atendimento ou apoio às pessoas com câncer, nos
municípios de Formiga/MG, Pains/MG, Arcos/MG e
Divinópolis/MG. A priori, foi feito um cálculo amostral que determinou que o
número mínimo de participantes do estudo deveria ser de 84 mulheres. Para o
cálculo amostral, foi considerada a prevalência de câncer de mama de 2% na
população [11]. Admitiu-se um intervalo de confiança de 95% e um erro amostral
de 3%. Para este cálculo foi utilizado o software Epilnfo
3.5.2®. Para a participação no estudo, foi necessário que a voluntária
atendesse a todos os critérios de inclusão e exclusão listados abaixo.
Critérios
de inclusão e exclusão
Para participarem do
estudo as voluntárias deveriam ter passado por intervenção cirúrgica para
tratamento de CM há no mínimo seis meses, terem idade entre 30 a 70 anos e
terem assinado o TCLE. Foram excluídas do estudo as mulheres com CM bilateral, doença ativa loco regional ou à distância, intervenção
cirúrgica realizada no período inferior a seis meses da data do estudo,
alterações funcionais já existentes antes do CM, ausência de intervenção
cirúrgica axilar (linfadenectomia axilar parcial ou total /ou biópsia do
linfonodo sentinela).
Instrumento de coleta de dados
1) European Organization for
Research and Treatment of Cancer 30-Item Quality of Life Questionnaire
(EORTC QLQ-C30) versão 3.0
Questionário composto
por 30 questões, específico e validado para a avaliação da qualidade de vida de
pacientes com câncer. Aborda os seguintes domínios: físico, psicológico, nível
de independência, aspecto social e o ambiente circundante (recursos financeiros
e vivência no lar). Encontra-se dividido em três escalas e 15 subescalas: 1) o estado global de saúde (EG) e qualidade de
vida (QV); 2) a escala funcional (EF) composta pela função física, limitações
funcionais, função emocional, função cognitiva e função social; 3) a escala
sintomática (ES) composta pelas subescalas: fadiga,
náuseas e vômitos, dor, falta de ar, insônia, falta de apetite, obstipação,
diarreia e dificuldades financeiras. Os constructos são apresentados em uma
escala Likert com variação de quatro níveis: 1 - não, 2 - pouco, 3 -moderadamente e 4 - muito. Com
exceção da EG composta por duas perguntas que classificam a saúde geral e QV na
última semana, através de uma nota de um a sete, sendo um
péssima e sete ótima, cada uma das escalas pode ser pontuada de zero a
100 e quanto mais próximo de 100, melhor é o estado do paciente. Em relação aos
sintomas, pontuações mais elevadas demonstram pior estado do paciente.
Para o cálculo de
cada escala, primeiramente é feita a média de pontuação para cada uma delas. A
partir desta média retira-se um ponto do total e divide-se o resultado pela
amplitude máxima da pontuação. No caso da escala funcional, para ter a direção
positiva, antes de multiplicar por 100, a escala é revertida (um menos a
escala). Assim, após os cálculos, quanto maior a escala funcional melhor é a
qualidade de vida [12].
2) Quality of Life Questionnaire
Breast Cancer-23 (QLQ-BR23).
O QLQ–BR23 é um
questionário relativo à qualidade de vida, específico para pacientes com CM.
Ele possui 23 questões (31 a 53) e trata-se de um complemento ao questionário
QLQ-C30. O QLQ-BR23 é composto de duas escalas: 1) EF: aborda a imagem corporal
e a função sexual; 2) ES: enfoca sintomas no braço, na mama e os efeitos do
tratamento sistêmico. As respostas são também apresentadas em uma escala Likert. Os escores são calculados separadamente para cada
escala, todos variando de 0 a 100. O cálculo de cada escala é feito
separadamente e procede conforme o efetuado para o QLQ-C30 [12]. Ambos os
instrumentos utilizados neste estudo possuem validade e confiabilidade
asseguradas na população brasileira [13]. É recomendável que o questionário
específico QLQ-BR 23 seja aplicado conjuntamente com o QLQ-C30 [6].
Análise
estatística dos dados
Foi realizada uma
análise descritiva das variáveis ordinais a fim de se determinar as medidas de
tendência central (média) e as medidas de dispersão (desvio padrão). Os dados
foram apresentados em números absolutos (n) e relativos (%). A análise
descritiva foi realizada no software GraphPad
Prism v.5.0.
As participantes
apresentaram média de idade 54,71 ± 10,23 anos. Quanto à faixa etária, 18,39%
das pacientes tinham idade entre 30 e 45 anos; 47,12% tinham idade entre 46 e
60 anos; e 34,48% das pacientes tinham idade acima de 60 anos. Em relação à
profissão/ocupação, 59 (67,82%) eram do lar, aposentadas e/ou empregadas
domésticas, 28 (32,18%) estavam atuando em ocupações diversas. Quanto ao estado
civil, 50 (57,47%) eram casadas, 11 (12,64%) divorciadas, 14 (16,09%) solteiras
e 12 (13,79%) viúvas. Quanto à procedência, seis (6,90%) eram da cidade
Arcos/MG, 33 (37,93%) de Divinópolis/MG, 36 (41,38%) de Formiga/MG e 12
(13,79%) de Pains/MG (Tabela I).
Em relação ao tratamento cirúrgico,
39,09% das mulheres foram submetidas à intervenção cirúrgica não conservadora
e, 60,91% foram submetidas à intervenção cirúrgica conservadora. Em relação ao
tratamento sistêmico, 60,91% das mulheres realizaram hormonioterapia.
Quanto ao tempo de cirurgia, encontrou-se média de 4,28 ± 3,71 anos, 6 (6,7%) realizaram cirurgia com menos de um ano, 42
(48,28%) realizaram entre um ano e três anos, 14 (16,09%) entre quatro e seis
anos e 25 (28,74%) acima de seis anos. Vale ressaltar que é possível a mesma
mulher ter sido submetida a mais de um tratamento (Tabela I).
Tabela
I – Características sociodemográficas
da amostra.
As características sociodemográficas e clínicas das participantes do estudo
estão categorizadas e os resultados estão expressos em número absoluto (n) e
relativo (%).
A qualidade de vida
para a população total do estudo foi avaliada pela relação dos valores médios
encontrados em cada domínio do questionário QLQ-C30, desenvolvido para
pacientes com câncer. Observou-se um escore na EG de 76,92 ± 18,92 pontos, na
EF de 75,73 ± 15,82 pontos e, na ES a pontuação média foi de 18,10 ± 14,65
pontos (FIG. 1).
Figura
1 - Pontuação obtida nas escalas do questionário
QLQ-C30. Os dados estão apresentados em média ± desvio padrão.
No questionário
específico para câncer de mama (QLQ-BR23), observaram-se escores na EF de 27,23
± 16,11 pontos e na ES o escore médio foi de 24,47 ± 14,87 (fig.2).
Figura
2 - Pontuação obtida nas escalas do questionário
QLQ-BR23. Os dados estão apresentados em média ± desvio padrão.
Segundo o Ministério
da Saúde (2009), a partir dos 35 anos de idade o número de novos casos de CM
aumenta progressiva e rapidamente [14]. No presente estudo, a maior parte das
participantes possuía idade entre 46 e 60 anos. De acordo com Silva e Simões
(2008) na faixa etária dos 30 anos ocorre um caso de CM para cada 2.200
mulheres, já na faixa etária dos 80 anos, essa proporção pode ser de um caso
para cada oito mulheres [15]. Esses dados reforçam a importância da adoção de
medidas preventivas e que promovam a saúde em mulheres com idade acima dos 30
anos. Além disso, sugerem que tais medidas devam ser reforçadas à medida que
ocorre o avanço da idade.
O tipo de
procedimento cirúrgico a ser adotado caso necessário é determinado pelo estadiamento clínico e pelo tipo histológico da lesão,
podendo ser conservadora ou não conservadora (mastectomia).
Atualmente ambos os tipos são associados à linfadenectomia axilar total ou
parcial [6]. Nos estágios iniciais do câncer é indicada a cirurgia
conservadora, que consiste na retirada do tumor com uma margem de segurança,
acompanhada de realização de radioterapia e esvaziamento axilar, e outro
tratamento complementar para impedir a recorrência da doença [16]. Dentre as
técnicas cirúrgicas não conservadoras são incluídas a mastectomia
simples ou total que consiste na retirada da mama com pele e complexo aréolo-papilar com conservação do músculo peitoral, a mastectomia radical preserva de um ou dois músculos
peitorais e mastectomia radical consiste na retirada
do músculo peitoral e acompanhada pela linfadenectomia axilar [6]. Nesse
estudo, cerca de 40% das participantes haviam sido submetidas ao tratamento
cirúrgico não conservador.
Ainda que a mastectomia radical seja eficiente para controle loco
regional da doença, as técnicas radicais modificadas são mais recomendas
assegurando resultados semelhantes a radical, obtendo melhor aspecto funcional
e estético e possibilitando a realização da reconstrução plástica da mama e
diminuir as morbidades associadas [15, 16].
Em relação às
características sociodemográficas, observou-se neste
estudo que o perfil das participantes foi de mulheres com idade entre 46 e 60
anos, casadas e do lar. Tais características corroboram um estudo que
caracteriza o perfil sociodemográfico de usuárias do
SUS [17]. De acordo com o estudo mencionado, o perfil dessa população exige do
profissional da saúde maior atenção nos processos educativos, e esses precisam
ser ajustados ao nível de entendimento das pacientes. Nesse sentido, o
principal enfoque dos profissionais de saúde deve estar na orientação sobre
medidas preventivas e na detecção precoce das recidivas.
No presente estudo
foram utilizados dois questionários para avaliar a QV de mulheres com
diagnóstico de CM [12]. O QLQ-C30, apontou para melhores níveis de qualidade de
vida nas voluntárias com CM do que o QLQ-BR23. Essa contradição pode ser
explicada pelo fato de um dos questionários, o QLQ-C30, ter sido validado para
a mensuração da qualidade de vida de pessoas que apresentam qualquer tipo
câncer [12,13]. Ao passo que o QLQ-BR23 foi desenvolvido, testado e validado
para uso em pessoas com câncer de mama [13]. É necessário destacar que o QLQ-23
trata-se de um complemento do QLQ-C30 e a aplicação conjunta dos questionários
é recomendada [6]. A utilização dos dois questionários é necessária
principalmente pelo fato de que eles abordam questões distintas e
complementares, além disso, o QLQ-23 não apresenta a escala geral de saúde tal
como o QLQ-C30.
Nesse sentido, é
provável que os sintomas manifestados especificamente por pessoas com CM não
possam ser tão bem avaliados pelo QLQ-C30, já que este não possui sensibilidade
ajustada para a mensuração de sintomas específicos do CM como, por exemplo:
efeitos colaterais da terapia sistêmica, sintomas da mama, do braço e queda de
cabelo. Entretanto, apesar desta ressalva, o uso de ambos os questionários
atende de forma ampla às demandas dos pacientes com CM e está adequada às
principais diretrizes internacionais.
Um estudo de Hopwood
et al. [18] apontou um déficit
considerável na QV geral e suas múltiplas dimensões em pacientes com CM,
avaliados pelo questionário QLQ-C30. Esses achados não corroboram os do presente
estudo e nem os de Bezerra et al. [19]. Uma
hipótese que pode justificar a diferença de dados entre os estudos, é que o Hopwood et al. [18]
conduziram seus estudos em 2007, já Bezerra et
al. [19] o fizeram em 2013 e o presente estudo foi conduzido em 2016.
Acredita-se que a evolução terapêutica ocorrida de 2007 até o ano de 2013 possa
justificar a melhor qualidade de vida encontrada em participantes dos dois
estudos mais recentes.
No QLQ-BR23
observaram-se alterações mais significativas na EF. Neste questionário, a EF
engloba principalmente a imagem corporal e a função sexual. É sabido que grande
parte das mulheres com CM submetidas à mastectomia
desenvolve uma determinada resistência em relação a sua imagem corporal e em
consequência disto, diminuem a sua função sexual [20]. Cerca de 30% das
mulheres com CM evoluem com disfunções sexuais além de dispareunia,
incapacidade ou dificuldade de excitação e de orgasmo, prejudicando seriamente
a função sexual e a imagem corporal das vítimas do CM [21].
Além disso,
deformidades da mama, queda de cabelos e perda da simetria corporal são
comumente relatados nessas mulheres implicando negativamente na percepção da
imagem corporal [22]. Estudos realizados por Rebelo et al. [23] confirmam que a imagem corporal esta positivamente
relacionada a satisfação sexual. No presente estudo, não se buscou por uma
associação entre os determinantes da qualidade de vida das participantes. Mas é
possível pressupor que a função sexual esteja realmente interferindo nos níveis
de QV. Essa hipótese é apoiada pelo fato de que não foram evidenciadas
alterações na QV quando se utilizou um instrumento de abordagem generalista,
mas quando se utilizou do QLQ-BR23, que possui vários domínios relacionados à
função sexual, observaram-se níveis baixos de QV.
Alguns sintomas
reportados com frequência por mulheres com CM, como: sensação de peso,
restrição da amplitude de movimento do ombro e dor no braço estão fortemente
relacionados à presença de linfedema decorrente do
ato cirúrgico [24]. Apesar da avaliação de sinais e sintomas não ser objeto do
presente estudo, por diversas vezes as participantes apresentaram queixas
semelhantes às mencionadas acima. Segundo Faria, o tratamento fisioterapêutico
é indispensável para qualquer indivíduo submetido à cirurgia oncológica [25].
Afinal, contribui para a redução de quadros álgicos e evita complicações
pós-cirúrgicas, principalmente as associadas aos longos períodos de
imobilização. Sendo assim, o tratamento oncológico precoce pode desempenhar um
papel importante na prevenção e redução dos efeitos adversos causados pelo
tratamento do CM. A fisioterapia oncológica pode minimizar os riscos de
complicações e favorecer a recuperação da integridade cinético-funcional de
órgãos e sistemas [7,25]. De acordo com o mencionado, seria importante que as
participantes do estudo fossem submetidas ao tratamento fisioterapêutico
precoce e contínuo, não só com o objetivo de recuperar a saúde, mas, sobretudo,
a fim de se prevenir e promover a saúde.
A QV em mulheres que
realizaram tratamento para o CM demonstrou-se prejudicada, quando avaliada por
um questionário específico para esta doença. Apesar de se tratar de um estudo
descritivo e transversal, este permitiu a análise de fatores determinantes da
qualidade de vida de mulheres que tiveram CM. Todos os fatores aqui discutidos
poderão ser considerados durante o processo de pensamento e tomada de decisão
clínica, a fim de se realizar uma conduta terapêutica baseada nas reais
necessidades do paciente, conforme determina a OMS.