REVISÃO
A luz
como forma de tratamento da acne vulgar: uma revisão sistemática
The light as form of acne vulgaris treatment: a systematic review
Angélica Rodrigues de
Araújo, Ft., D.Sc.*,
Fernanda Souza da Silva, Ft., M.Sc.**, Natália
Valente Moreira***, Bárbara Hellen Alves de Araújo, Ft.****, Amanda Parreira Armanelli, Ft.****, Ana Caroline Ribeiro da Silva, Ft.****
*Professora Adjunto IV da Pontifícia Universidade Católica de Minas
Gerais. **Professora da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais,
***Acadêmica do curso de fisioterapia da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, ****Fisioterapeuta formada pela Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais
Recebido 13 de
novembro de 2017; aceito 15 de fevereiro de 2018.
Endereço
para correspondência:
Angélica Rodrigues de Araújo, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais,
Departamento de Fisioterapia, Av. Dom José Gaspar, 500 Coração Eucarístico
30535-901 Belo Horizonte MG, E-mail: angelica@bios.srv.br; Fernanda Souza da
Silva: nandasouzafisio@yahoo.com.br; Natália Valente Moreira:
nataliavalente52@gmail.com; Bárbara Hellen Alves de Araújo:
bah18araujo@gmail.com; Amanda Parreira Armanelli:
armanelli.amanda@gmail.com; Ana Caroline Ribeiro da Silva: lineacrs@yahoo.com.br
Resumo
A acne vulgar é uma
desordem da unidade pilosebácea que apresenta alta
prevalência e incidência, principalmente em adolescentes. Atualmente, existem
diversas intervenções terapêuticas, porém os dispositivos de baixa intensidade
têm ganhado destaque. Frente a isso, foi realizada uma revisão sistemática
sobre os efeitos da luz de baixa intensidade no tratamento da acne vulgar e
investigado os parâmetros adequados para esta aplicação. Uma pesquisa
bibliográfica foi conduzida no período de maio a junho de 2017, em quatro bases
de dados (Medline, PEDro database, Lilacs e PubMed). Foram incluídos
estudos experimentais, publicados no período entre janeiro de 1970 a junho de
2017, nas línguas inglesa e portuguesa. Avaliou-se a qualidade metodológica e
os parâmetros luminosos. A pesquisa resultou em 21 artigos. Destes, apenas 4 foram estudos randomizados. Na escala PEDro (0 a 10), um estudo recebeu nota 10, 2 receberam
nota 8 e os demais receberam notas de 0 a 5. Nos parâmetros luminosos, os
comprimentos de ondas mais utilizados foram 415 nm e
633 nm e a fluência mais utilizada foi 48 J/cm². No
presente estudo, alguns parâmetros variaram significativamente, não sendo
possível estabelecer qual dose seria a mais adequada para o manejo da acne
vulgar. Desta forma, conclui-se que a luz terapêutica de baixa intensidade tem
vantagens no tratamento da acne, porém são necessários novos estudos com
amostragens maiores, controlados e randomizados, para melhor determinar os
parâmetros adequados.
Palavras-chave: acne vulgar,
terapia com luz de baixa intensidade, fototerapia.
Abstract
Acne vulgaris is a disorder of the pilosebaceous
unit that has a high prevalence and incidence, especially among teenagers.
Currently, there are various therapeutic interventions, but the low-power
devices have been highlighted. Accordingly to this, we performed a systematic
review on the effects of low-power light treatment of acne vulgaris and to determine
the appropriate parameters for this application. A literature search was
conducted from May to June 2017, in four databases (Medline, PEDro database, Lilacs and PubMed). We included
experimental studies, published from January 1970 to June 2017, in english and portuguese.
The methodological quality and light parameters were assessed. The
bibliographic search resulted in 21 articles. About these only 4 were
randomized trials. In the PEDro scale (score 0 to 10)
one study received the total score (10), two studies received score 8 and the
others received scores between 0 and 5. The wavelengths most commonly used were
415 nm e 633 nm. The fluency more used was 48 J/cm². In the present study, some
parameters varied significantly, not been possible to establish what would be
the most appropriate dose for the management of acne vulgaris. By this, we
conclude that low-power light therapy has advantages in the treatment of acne,
but new studies with larger samples, monitored and randomized, are necessary to
best determine the parameters.
Key-words: acne
vulgaris, low-level light therapy, phototherapy.
Acne vulgar é uma
desordem da unidade pilosebácea [1], onde observa-se a presença de comedões
abertos e/ou fechados e de lesões de caráter inflamatório, conhecidas como
pápulas, pústulas ou nódulos [2-4].
Essa afecção
apresenta alta prevalência, afetando de 35% a 90% de adolescentes, com
incidência de 79% a 95% entre os adolescentes do ocidente [5]. Está relacionada
a diversos fatores como obstrução do folículo piloso secundária à descamação
anormal dos queratinócitos foliculares [4], produção
excessiva de sebo [3], alterações hormonais [2] e aumento da colonização por Propionibacterium acnes (P. acnes), com consequente
desenvolvimento de respostas imunes e inflamatórias [4,5,6].
Estudos sugerem que
as alterações induzidas pela acne vulgar têm influência direta na vida
psicossocial do indivíduo [4], desencadeando quadros de depressão [7],
ansiedade [1], baixa autoestima [1], perda de confiança [7] e isolamento social
[4]. O tratamento dessa afecção é, portanto, de fundamental importância para a
saúde e o bem estar do indivíduo.
Atualmente, existem
diversas intervenções terapêuticas que visam à redução da atividade da glândula
sebácea, e da hiperqueratinização, a inibição da P.
acnes e o controle médico de desequilíbrios hormonais [8,9]. Entretanto, essas
opções possuem diversas limitações e importantes efeitos colaterais.
A observação de que a
exposição solar era benéfica em até 70% dos indivíduos com acne [10] foi o
ponto de partida para a introdução da terapia com luz para o manejo dessa afecção[11]. Desde então, diversos dispositivos luminosos,
de alta ou de baixa potência, associados ou não a substâncias fotoativadoras vem sendo utilizados como forma de
tratamento [12].
Os dispositivos
luminosos de baixa intensidade têm ganhado destaque em relação aos de alta
potência e a terapia fotodinâmica principalmente por não possuírem ações
ablativas, cujos efeitos colaterais são mais significativos [4,6,7].
Eritema, edema, alterações da pigmentação,
formação de crostas e descamação
epitelial estão entre as principais complicações
decorrentes da aplicação da
luz de alta potência e da terapia fotodinâmica [4,7]. Estas
complicações são
consequentes da destruição da camada epidérmica e
das camadas superficiais da
derme pela alta concentração de energia térmica
fornecida ao tecido por esses
dispositivos [4].
Apesar da crescente
aplicabilidade clínica os mecanismos de ação da luz de baixa intensidade ainda
não estão claros e os parâmetros luminosos adequados para o manejo dessa
afecção são bastante controversos. Frente a isto, o objetivo desse estudo foi
realizar uma revisão sistemática sobre os efeitos da luz de baixa intensidade
no tratamento da acne vulgar e determinar os parâmetros adequados para esta
aplicação.
Uma pesquisa
bibliográfica foi conduzida no período de maio a junho de 2017, em quatro bases
de dados (Medline, PEDro database, LILACS e PubMed), utilizando as palavras-chave acne vulgaris, laser diode,
light therapy, light emitting
diode, laser therapy, phototherapy, acne vulgar, fototerapia e LED.
Além das bases de
dados eletrônicas, a busca foi completada por uma pesquisa manual, tendo como
referência à bibliografia dos artigos previamente selecionados.
Foram incluídos nesta
revisão apenas ensaios clínicos randomizados e não randomizados, publicados no
período entre janeiro de 1970 a junho de 2017, nas línguas inglesa e
portuguesa, que possuíam texto completo.
Foram selecionados
estudos realizados em humanos, de ambos os sexos, que apresentavam diagnóstico
de acne vulgar.
Foram incluídos os
estudos que utilizaram dispositivos luminosos de baixa intensidade: Light Amplification
by Stimulated Emission of Radiation
(LASER), Light Emitting
Diode (LED), lâmpadas fluorescentes ou lâmpadas
de infravermelho como forma de tratamento da acne vulgar. Trabalhos que
utilizaram outras terapias associadas no mesmo grupo foram selecionados somente
se o efeito do dispositivo luminoso pudesse ser separadamente identificado.
Foram excluídos da
revisão os artigos que utilizaram dispositivos luminosos de alta potência
(1450-nm diode laser, Pulsed
Dye Laser, Luz Intensa Pulsada), terapia
fotodinâmica, terapias não-luminosas e outras formas
de acne. Estudos de caso e trabalhos de revisão também não foram incluídos.
Três revisores
independentes selecionaram os artigos pelo título e pelo resumo. Caso este
fornecesse informações suficientes para sua inclusão ou o estudo fosse
potencialmente útil, uma cópia completa do texto era solicitada. Na presença de
divergências entre os examinadores, estes reuniam para que um consenso fosse
obtido. Permanecendo o desacordo, uma quarta pessoa era convidada para a
resolução do problema.
A qualidade
metodológica dos artigos foi avaliada utilizando a escala PEDro (Physiotherapy Evidence Database) [13]. As notas
variam de 0 a 10 pontos, sendo que, pontuação inferior a 4
indica estudo metodologicamente fraco, entre 4 a 7 pontos, estudo de moderada
qualidade e entre 7 a 10 pontos, estudo de alta qualidade. Três revisores
independentes pontuaram os artigos de acordo com os critérios da escala PEDro. A similaridade entre as
notas foi esperada. Na presença de divergências, os três revisores reuniram
para que um acordo fosse obtido. Não ocorrendo, uma quarta pessoa era
consultada para que um consenso fosse alcançado.
Para a análise da
qualidade metodológica foi utilizada uma adaptação da análise qualitativa do
estudo de Reid e Rivett
[14].
A análise dos
parâmetros luminosos utilizados nos artigos selecionados foi realizada com base
no trabalho de Tunér e Hode
[15]. Segundo os autores, os parâmetros luminosos podem ser subdivididos em
três categorias: Parâmetros técnicos, parâmetros de tratamento e parâmetros
médicos.
Destes parâmetros,
foram selecionados para a análise dos artigos 5
parâmetros técnicos (nome do instrumento, tipo de luz e comprimento de onda,
emissão pulsada ou contínua, potência de saída e densidade de potência) e 7
parâmetros de tratamento (área de tratamento, fluência, fluência total,
fundamentação da dosagem, método de tratamento, número de sessões e frequência
das sessões).
A pesquisa
bibliográfica resultou em um total de 470 artigos. Desses, 94 foram
selecionados e 73 foram excluídos, restando 21 estudos para a revisão
[11,16-35].
Na base PubMed foi encontrada a maior
porcentagem de artigos incluídos (62%), seguida pelas bases Medline
(30%), Lilacs (4%) e PEDro
(4%). Alguns artigos foram encontrados em mais de uma base de dados. Nenhum
estudo foi selecionado por meio da pesquisa manual.
Características
dos estudos e qualidade metodológica
As principais
características dos estudos estão resumidas na tabela I. A amostra utilizada
era predominantemente de indivíduos do sexo feminino (66%), com idade entre 14
e 57 anos. Apenas quatro estudos [16-19] apresentaram randomização adequada.
Nos estudos de Zane et al. [22]; Baugl e Kucaba
[27]; Tzung et
al. [34], apesar de apresentarem grupo controle, a randomização não foi
feita de modo adequado. Os demais estudos [11,20,22,23-26,28,35]
não apresentaram grupo controle. Todos os estudos avaliaram pacientes com acne
vulgar de leve a moderada. Os instrumentos de medida utilizados foram
fotografias (53%), Escala de Burton (28%), Escala de Michaelson
(24%), questionário de satisfação do paciente (24%), medidor de sebo (20%),
Escala Visual Analógica (15%), biópsia (15%), Sistema de classificação geral da
acne (15%), Índice de gravidade da acne (5%) e Avaliação de Cunlife
(5%).
Os artigos incluídos
analisaram a efetividade do tratamento luminoso por meio da melhora de um ou
mais dos seguintes desfechos: contagem do número de lesões (37%), grau da acne
(17%), nível de umidade (8%), nível de sebo (6%), grau de eritema (6%), tamanho
das lesões (4%), avaliação subjetiva do paciente (4%), nível de pH (4%), número de colônias de P. acnes (4%), aparência
geral (4%), biópsia (2%), nível de lipídeos (2%) e nível de melanina (2%).
Todos os estudos
analisados relatam resultados positivos da aplicação dos dispositivos luminosos
no tratamento da acne. Porém, em apenas 52,4% dos estudos [11,17-19,21-23,26,28,29,33] os resultados relatados apresentaram
relevância estatística.
Na análise da
qualidade metodológica, 52,4% dos artigos [20,21,23-27,30-32,34]
revisados obtiveram nota menor ou igual 3 (limitada qualidade metodológica) na
escala PEDro, 33,3% dos artigos
[11,16,22,27,29,33,35] apresentaram notas 4 a 7 (moderada qualidade
metodológica) e apenas 14,3% dos estudos [17-19] notas entre 8 a 10 (alta
qualidade metodológica). As falhas metodológicas mais comuns dentre os estudos
incluídos foram: ausência de grupo controle [11,20,21,23-32],
ausência de alocação secreta [11,20-25], cegamento do paciente [11,16,19-35],
terapeuta [11,16,17,19-35] e avaliador [17,20-25,27-35] e análise de intenção
de tratar [11,16,20,21,23-25,31,34].
Nível
de evidência
A busca literária
resultou em apenas 4 ensaios clínicos randomizados
(ECR), sendo 3 de alta qualidade metodológica [17-19] e 1 de moderada qualidade
metodológica[16], sugerindo um nível de evidência moderada sobre os efeitos da
luz de baixa intensidade no tratamento da acne vulgar.
Parâmetros
luminosos
A maioria dos estudos
[17-21,23,24,26,28-32,34,35] (71,4%) utilizou o LED
como forma de tratamento, 9,5% utilizou a Lâmpada Fluorescente [11,16], 9,5%
utilizou o LASER KTP [27,33], 4,8% utilizou o LASER HeNe
e LASER AsGa [25] e 4,8% a Lâmpada de infravermelho
[22]. O comprimento de onda mais utilizado foi o de 415 nm,
visto em 42,9% dos estudos [26,28-32,34,35], seguido
dos estudos que utilizaram os comprimentos de 415 nm
e 630 nm associados [16,18,21,23,24](23,8%). Nos
demais estudos, 9,5% utilizou o comprimento de 630 nm
[20,23] e 9,5% o comprimento de 532 nm [27,33]. Um
estudo associou o comprimento de 415 nm ao de 830 nm [20] e outro associou o comprimento de 632 nm ao de 904 nm [25]. O modo de
emissão contínuo foi utilizado em 71,4% dos estudos [17-21,23-25,28-32,34,35]. A densidade de potência na abertura da sonda foi
um parâmetro que variou muito. No comprimento de onda de 415 nm, oito estudos [20,32,23,24,27,31,35]
utilizaram a potência de 40 mW/cm2, os demais utilizaram 6,1 mW/cm2
[18], 4,23 mW/cm2 [16], 70 a 90 mW/cm2 [26] e 200 mW/cm2
[30]. Nos estudos que utilizaram o comprimento de onda de 630 nm [16,18,19,21-24] a potência
variou de 2,67 mW/cm2 a 80 mW/cm2. Em seis estudos [17,25,28,32-34] a densidade de potência não foi citada, os
dados não foram encontrados nos sites do fabricante ou não foram fornecidos
dados suficientes para o cálculo da mesma. Os parâmetros técnicos dos estudos
estão resumidos na tabela II.
Os parâmetros de
tratamento utilizados pelos artigos analisados variaram consideravelmente,
principalmente em relação à fluência, cujos valores foram entre 0,5 J/cm² a 126
J/cm². Em 28,6% dos estudos [20,21,23,24,29,31]
utilizou-se a fluência de 48 J/cm², 28,6% não informaram a fluência e nos
demais estudos todas as fluências utilizadas foram diferentes entre si. Em
relação à fundamentação da dosagem, em apenas quatro estudos a mesma foi
justificada [19,25,33,34]. O método de tratamento
utilizado variou muito entre os estudos. Nota-se que em 47,6% dos estudos [16,22,23,26-28,31-33,35] a distância entre o equipamento
utilizado e a pele não foi citada. Nos demais estudos a mesma variou de menos
de 1 cm a 40 cm. Em relação ao tempo de tratamento 38,1%
dos estudos [11,16,22,23,25,32-34] não apresentaram
dados referentes a esse parâmetro. Em 19,04% dos estudos [19,26,30,35]
15 minutos, 19,04% utilizou 20 minutos, 4,8% utilizou 2 a 5 minutos, 9,5%
utilizou 20 a 30 minutos e em 4,8% dos estudos utilizou-se 2 minutos de
tratamento. O número de sessões variou de 4 a 112 sessões, sendo que em 47,6%
dos estudos [20-24,26,29,30,34,35] realizou-se 8
sessões, 2 vezes por semana, durante 4 semanas. Os parâmetros de tratamento dos
estudos estão resumidos na tabela III.
Os resultados dos
estudos avaliados neste trabalho sugerem que há moderada evidência de que os
dispositivos luminosos de baixa intensidade são eficazes para o tratamento da
acne vulgar. Geralmente, na análise dos níveis de evidencia participam apenas
estudos randomizados. Considerando-se que a grande maioria dos estudos
selecionados para o presente trabalho eram não randomizados (17 estudos) e,
destes, 11 apresentaram baixa qualidade metodológica [20,21,23-27,30-32,34],
classificar o nível de evidência como moderado pode ser inadequado. A
literatura tem sugerido, entretanto, que os ECR’s não
são os únicos métodos de avaliação da eficácia de procedimentos realizados na
área da saúde [36]. Sendo assim, os achados positivos encontrados em todos os
estudos não-randomizados analisados neste trabalho,
sendo a maior parte com significância estatística, não devem ser ignorados. Com
o desenvolvimento de estudos de maior rigor metodológico, os efeitos promovidos
pela luz no tratamento da acne podem ser melhor
avaliados e o grau de evidência adequado ao tema determinado. Um melhor
entendimento da fisiopatologia da acne e dos efeitos resultantes da interação
luz-tecido pode auxiliar na determinação de um protocolo de tratamento mais adequado, contribuindo para a melhoria da qualidade metodológica do
estudo e tomada de decisão quanto a real eficácia ou não da luz no
manejo da acne vulgar.
Um dos principais
fatores causadores da acne é a multiplicação da P. acnes no canal folicular
[4]. A multiplicação da P. acnes tem
sido associada com a produção de citocinas
pró-inflamatórias como a interleucina (IL-1), de
fator de necrose tumoral (TNF), de granulócitos e de
fator estimulante de colônias de macrófagos (GM-CSF) [21,24]. Acredita-se que a
eficácia das terapias luminosas de baixa intensidade no tratamento da acne
esteja relacionada à destruição da P. acnes [7]. Como parte dos seus processos
metabólicos normais e reprodutivos, a P. acnes produz porfirinas, principalmente
protoporfirina, uroporfirina
e coproporfirina [37]. Essas são substâncias
fotossensíveis que têm a característica de absorver a energia da luz e usá-la
para realizar reações químicas nas células e nos tecidos do corpo [12]. Quando
a luz é absorvida pelas porfirinas ocorre a formação de espécies reativas de
oxigênio (radicais livres) [3,20,23], que induzem a um
dano na membrana e morte celular da bactéria [6]. A ocorrência destes efeitos
são, entretanto, dependentes dos parâmetros luminosos
de tratamento, principalmente do comprimento de onda (nm)
e da fluência (J/cm²). Segundo a literatura, esses parâmetros estão intimamente
relacionados à localização do alvo terapêutico e ao objetivo da intervenção,
respectivamente [15,38], fatores que devem ser considerados na determinação dos
parâmetros de tratamento.
O espectro de
absorção das porfirinas situa-se na faixa espectral de 400 a 700 nm, com o mais alto pico de absorção da luz ("Soret Band") ocorrendo na faixa do azul (440 a 485 nm) e do violeta (380 a 440 nm),
especificamente em 415 nm [12]. Desta forma,
comprimentos de onda em torno de 415 nm seriam os
mais indicados para o tratamento da acne vulgar, quando o objetivo principal
for a destruição da bactéria P. acnes.
A luz azul e violeta
tem baixa profundidade de penetração na pele; já a luz vermelha (665 a 740 nm) possui maior capacidade de penetração, podendo atingir
as glândulas sebáceas [39]. Segundo a literatura, em comprimentos de ondas mais
longos (450 a 700 nm), as porfirinas possuem picos de
absorção mais fracos ("Q-Bands"), sendo
esses, portanto, menos eficazes para sua ativação [3,12]. Frente a isso, os
efeitos da luz nessa faixa espectral sobre a acne vulgar poderiam estar
relacionados a uma ação anti-inflamatória [24] e de inativação da glândula
sebácea [18], promovidas pela luz vermelha. Segundo Young et al. [40] a luz na faixa espectral do vermelho é capaz de
influenciar a liberação de citocinas por macrófagos e
de aumentar a síntese de fatores de crescimento fibroblástico
a partir de células fotoativadas. Os mecanismos que
envolvem a inativação da glândula sebácea, entretanto, ainda não foram bem
esclarecidos. Know et al. [18] sugerem que a inativação da glândula sebácea (e
consequente diminuição da produção de sebo) possa estar relacionada ao
decréscimo de SREBP-1 (Sterol Regulatory Element-Binding Protein-1), um regulador mestre da
síntese lipídica em glândulas sebáceas, promovido pela luz com comprimento de
onda de 660 nm.
Na presente revisão,
cinco estudos combinaram comprimentos de onda na faixa espectral do
violeta/azul (415 nm) e do vermelho (660 nm) para o tratamento da acne vulgar [16,18,21,23,24].
Em todos os estudos, os autores observaram melhora das lesões inflamatórias e não-inflamatória no grupo em que as luzes foram aplicadas em
conjunto e, no estudo conduzido por Know et al. [18], houve também uma diminuição
da quantidade de sebo e do tamanho médio das glândulas sebáceas. Estes achados
sugerem que a combinação das luzes violeta/azul e vermelha, por possibilitar
uma ação sinérgica antibiótica e anti-inflamatória - modulação direta da
atividade biológica e um fotodano das células
sebáceas - possa realmente ser um meio efetivo para o tratamento da acne
vulgar.
Em relação a fluência, Tunér e Hode [15] citam que quando o objetivo da intervenção com
luz incluir a potencialização da ação da bomba de sódio e potássio, o estímulo
à produção de ATP, o restabelecimento do potencial de membrana, o aumento do
metabolismo e da proliferação celular, doses abaixo de 10 J/cm² e potência de
50 W ou menor, deveriam ser utilizadas. Já doses acima de 10 J/cm² são ditas
como tendo efeitos inibitórios. Há também uma tendência de que regimes de
emissão pulsados sejam preferenciais ao modo contínuo [41]. No presente estudo,
as fluências, potências, regimes de emissão e o número e a frequência das
sessões variaram muito entre os trabalhos revisados (em alguns estudos essas
informações estavam omissas), não sendo possível estabelecer quais parâmetros
seriam mais adequados para o manejo da acne vulgar. Pode-se observar,
entretanto, uma tendência de se usar afluência de 48 J/cm², presente em 48,6%
dos estudos, embora resultados positivos também tenham sido observados com
doses mais baixas, em especial nas lesões inflamatórias.
A acne é uma doença
em que as taxas de recaída são elevadas após a interrupção do tratamento, sendo
o período de remissão das lesões variável entre os pacientes [39]. Quando a
terapia luminosa é utilizada com parâmetros voltados para promovera inativação
da P. acnes, os benefícios obtidos
geralmente têm curta duração e requerem tratamentos continuados. Já os efeitos
promovidos por dano seletivo as glândulas sebáceas,
são ditos como de maior duração. Sendo assim, o acompanhamento dos pacientes
pós-tratamento é fundamental quando se tem por objetivo avaliar a eficácia de
determinado procedimento terapêutico. Dos estudos analisados, apenas alguns
realizaram um follow-up, sendo este, entretanto, de até três meses. Embora as
alterações temporárias promovidas pela luz de baixa intensidade possam ser
suficiente para diminuir a produção de sebo e resultar na diminuição da acne a curto prazo, ainda ha controvérsias sobre a durabilidade
dos benefícios desse tratamento a longo prazo, que devem, portanto, ser melhor
estudado.
Os estudos demonstram
que as terapias luminosas podem levar a uma melhora dos quadros de acne vulgar,
em especial das lesões inflamatórias. Os efeitos colaterais em geral são poucos
e bem tolerados. O uso combinado dos comprimentos de onda na faixa espectral do
violeta/azul e do vermelho, por suas propriedades antibióticas e
anti-inflamatórias, respectivamente, parece ser uma boa opção para o tratamento
de acne vulgar. Entretanto, a diversidade de parâmetros entre os autores e a
ausência de justificativas que embasem as escolhas, principalmente em relação
às fluências, pode dificultar a escolha dos parâmetros na prática clínica.
São necessários novos
estudos com amostragens maiores, controlados e randomizados, para determinar
melhor os critérios de seleção dos parâmetros mais eficazes das terapias
luminosas para o tratamento da acne vulgar. É preciso esclarecer dados
relacionados à fluência da irradiação, o número de sessões e o intervalo do
tratamento. Além disso, faz-se necessário um acompanhamento em longo prazo para
mensuração das taxas de recidiva e de possíveis efeitos colaterais à glândula
sebácea.