ARTIGO
ORIGINAL
Estimulação
pulsada de alta voltagem reduz a área de úlceras de diferentes etiologias: um
estudo piloto
High voltage pulsed stimulation reduces the area of ulcers of different
etiologies: a pilot study
Fabiana Forti Sakabe*, Daniel Iwai Sakabe*, Fátima Regina Marracini Fernandes**, Gisele Reges**
*Prof.
Dr. Departamento de Fisioterapia das Faculdades Integradas Einstein de Limeira,
Limeira/SP, **Graduanda em Fisioterapia, Faculdades Integradas Einstein de
Limeira (FIEL), Limeira/SP
Recebido 6 de março de 2017; aceito 15 de dezembro de 2017.
Endereço
para correspondência:
Fabiana Forti Sakabe,
Avenida Doutor Lauro Correa da Silva, 3805/180 Jardim do Lago 13481-631 Limeira
SP, E-mail: fabifortisakabe@gmail.com; Daniel Iwai Sakabe: dsakabe@hotmail.com; Fátima Regina Marracini Fernandes: fatimamarracini@hotmail.com; Gisele
Reges: giihreges@hotmail.com
Resumo
As úlceras,
independente de sua etiologia, são caracterizadas pela perda circunscrita ou
irregular da epiderme e/ou derme, podendo atingir o tecido subcutâneo e seus tecidos adjacentes.
A estimulação elétrica de alta voltagem (EEAV) pode auxiliar na cicatrização de
tecidos. O objetivo desse estudo foi avaliar o efeito de 30 sessões de EEAV na
cicatrização de úlceras de diferentes etiologias. Participaram 6 voluntários e foram tratadas 10 úlceras cutâneas. Para
quantificar a área das lesões (cm2) foi realizada a fotogrametria a
cada 10 sessões. A intervenção consistiu na aplicação da EEAV (T = 100 ms; f = 100 Hz; tensão de 100 a
150 V), 2 a 3x/semana, por 30 minutos. Os eletrodos ativos (negativo) foram
fixados sobre a lesão e o dispersivo (positivo) fixado no trajeto vascular. Com
relação à área das lesões por pressão, a úlcera sacral reduziu 84,10% da sua
área, a trocanteriana e do maléolo medial
cicatrizaram completamente em 10 sessões. As úlceras neuropáticas fecharam
completamente em 20 sessões. As cinco úlceras venosas (região do tornozelo),
apresentaram redução em sua área de 26,29%, 80%, 44,69%, 28,23% e 6,27%. A EEAV
foi eficaz pois promoveu a cicatrização completa de
quatro úlceras e auxiliou a redução na área de outras seis lesões.
Palavras-chave: estimulação
elétrica, cicatrização de feridas, fotogrametria.
Abstract
Ulcers, regardless of their etiology, are characterized by the
circumscribed or irregular loss of the epidermis or dermis, which can reach the
subcutaneous tissue and its adjacent tissue. The high voltage pulsed
stimulation (HVPS) has been used to stimulate tissue cicatrization.
The aim of this study was to evaluate the effect of 30 sessions of HVPS in the cicatrization of cutaneous ulcers from different causes.
Six volunteers participated in the study and ten ulcers were treated.
Photogrammetry was held every ten sessions to quantify the injuries areas
(cm²). The intervention consisted in the application of HVPS (T = 100 us; f =
100 Hz; intensity = 100 to 150 V), twice or three times a week, 30 minutes
long. The active electrodes (negative) were put on the ulcer and the dispersive
electrode (positive) was positioned on the vascular path. Concerning the area
of pressure ulcers, the sacral ulcer reduced 84.10% of its area, the
trochanteric and the medial malleolus were completely closed after 10 sessions.
The neuropathic ulcers closed after 20 sessions. The five venous ulcers (ankle
region) showed, after 30 stimulation sessions, reduction of wounded areas of 26,29%, 80%, 44,69%, 28,23% and 6,27%. HVPS was effective to
promoted complete cicatrization of four ulcers and
helped in the reduction of other six ulcers areas.
Key-words: electric
stimulation, wound healing, photogrammetry.
As feridas ou úlceras
são conceituadas como lesões graves com perda circunscrita ou irregular da
epiderme e/ou derme, podendo atingir o tecido subcutâneo e seus tecidos
adjacentes [1]. As úlceras crônicas podem apresentar diferentes etiologias,
sendo as mais frequentes: venosa, arterial, traumática, infecciosa e diabética.
O tratamento dessas lesões é dinâmico e depende da evolução da reparação
tecidual [2]. Atualmente, a alta prevalência das úlceras está
significativamente relacionada à idade e a maior ocorrência de comorbidades como diabetes mellitus e acidente vascular
encefálico [3]. As úlceras venosas têm um impacto significativo na qualidade de
vida dos portadores dessas lesões e constituem um problema de saúde pública no
Brasil e no mundo [2,4,5], sendo associadas à ausência
no trabalho, visitas médicas frequentes e altos gastos com o tratamento que é
complexo e com altas taxas de falha. Constituem aproximadamente 75% de todas as
úlceras da perna e são caracterizadas por vários fatores que prejudicam e
atrasam a cicatrização.
A causa das úlceras
venosas é a hipertensão venosa, causada pela incompetência venosa da válvula,
que é comum em varizes primárias e síndrome pós-trombótica, pode afetar os
sistemas venosos superficial, perfurante ou sistemas venosos profundos isolados
ou concomitantemente e apresenta disfunção da bomba muscular do tríceps sural [4].
Furieri et al. [6] relatam que as úlceras por pressão são lesões localizadas
na pele e nos tecidos subjacentes, resultantes do trauma mecânico, podendo
originar-se em todas as posições que um paciente seja mantido por longo
período. O aumento da pressão em determinada área do corpo, causa um aumento
secundário da pressão nos capilares sanguíneos, resultando em uma isquemia
local.
Segundo Kim, Cho e
Lee [7] as feridas diabéticas são comumente associadas com respostas de células
imunes defeituosas ou anormalidade da matriz extracelular. A neuropatia
periférica é o fator de maior risco de úlceras para os pacientes diabéticos,
podendo também ser combinadas por situações isquêmicas, como nas úlceras
arteriais onde o suprimento sanguíneo cutâneo não é adequado para manter a
demanda do metabolismo tissular local, resultando em interrupção da superfície
cutânea.
O processo
cicatricial de feridas é complexo e envolve a organização de células, sinais
químicos e matriz extracelular com o objetivo de reparar o tecido. Esse
processo de cicatrização possui várias fases: inflamatória, proliferativa e de
remodelagem [8], sendo que esta cascata de eventos pode sofrer interrupção nos
casos de feridas crônicas. De acordo Koel e Houghton [3] o atraso na cicatrização das lesões cutâneas
constituem um sério problema para os pacientes, clínicos e para a sociedade.
Na busca por formas
terapêuticas alternativas para esta patologia de grande incidência, a
Estimulação Elétrica de Alta Voltagem (EEAV) apresenta-se como um recurso
fisioterapêutico eficaz que vem sendo utilizado no tratamento de vários tipos
de úlceras. Caracteriza-se por uma forma de onda monofásica de pico duplo, com
uma duração fixa na faixa de microssegundos (até 100 µs) e uma tensão superior
a 100 volts [9].
Estudos anteriores [3,10,11] já mostraram alguns efeitos benéficos da EEAV,
sendo este recurso, um importante objeto de estudo e aplicação no reparo
tecidual utilizados na Fisioterapia atualmente. De acordo com Thakral et al. [12] a EEAV
é uma terapia segura, de fácil
aplicação, simples e de baixo custo. Além disso, esse recurso diminui a
infecção bacteriana, aumenta a perfusão local e acelera a cicatrização de
feridas.
Frente ao exposto, o
objetivo do presente estudo foi verificar o efeito de 30 sessões de estimulação
elétrica de alta voltagem sobre a área de lesões cutâneas de diferentes
etiologias.
O estudo foi aprovado
pelo comitê de ética em pesquisa (CEP-FIEL) sob o protocolo 15/08-259. Todos os
voluntários assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, conforme a
resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS).
A avaliação e a
intervenção foram realizadas na clínica escola de fisioterapia das Faculdades
Integradas Einstein de Limeira – FIEL no período matutino.
Foram avaliados 11
voluntários de ambos os gêneros, portadores de úlceras de diferentes
etiologias, entretanto, 5 foram excluídos pois
desistiram do tratamento antes da finalização das 30 sessões propostas. Desta
forma, participaram efetivamente do estudo 6
indivíduos (59,3 ± 24 anos), 4 do gênero feminino e 2 do gênero masculino. No
total foram avaliadas e tratadas 10 úlceras, sendo 3
úlceras por pressão, 2 úlceras diabéticas e 5 úlceras venosas (Tabela I).
Tabela
I - Idade dos voluntários, etiologia, tempo e
local das úlceras, n = 10 úlceras.
Os critérios de
inclusão para participação no estudo foram a presença
de ferida em qualquer parte do corpo, de qualquer natureza (úlceras arteriais
ou venosas, úlceras de pressão) e que não estivessem fazendo tratamento
medicamentoso, com curativos especiais e/ou fisioterapêutico concomitantemente.
Os critérios de exclusão foram a presença de infecção
na ferida a ser tratada, e estar em tratamento medicamentoso e/ou com curativos
especiais.
Para quantificar a
evolução do tratamento, foi realizado o registro fotográfico padronizado da
ferida para a análise da área, em cm2. Para tanto, utilizou-se uma
câmera fotográfica digital (Sony Cyber-shot DSC-H300
(7,2 megapixels), posicionada a 40 cm da ferida, além de uma régua milimetrada posicionada próximo à lesão para servir de
referência para o software, como utilizado nos estudos de Gui et al. [11] e Davini
et al. [13]. Nesta régua foram
anotadas a data e o número da sessão. Vale salientar que esse registro foi
realizado antes do tratamento e a cada 10 sessões até a finalização do
tratamento proposto.
O tratamento
consistiu na aplicação da EEAV (T = 100 µs; f = 100 Hz; tensão de 100 a 150 V) com
protocolo semelhante ao proposto por Gui et al. [11]. O
equipamento utilizado foi o modelo Neurodyn High
Volt® (Ibramed).
Para a intervenção, o
voluntário permaneceu em decúbito sobre uma maca com a área a ser tratada para
cima. Para a manipulação do local, os pesquisadores utilizaram luvas de
procedimentos. Após a retirada do curativo e a limpeza inicial da lesão com
soro fisiológico, foram posicionadas gazes embebidas em soro fisiológico sobre
a lesão e sobre elas os eletrodos ativos de silicone carbono (com polaridade
negativa) fixados com fita adesiva e um eletrodo dispersivo (polaridade
positiva) auto-adesivo de
8x13 cm (Valutrode® Axelgaard
manufacturing), foi fixado a uma distância de 20 cm
em relação aos eletrodos ativos.
O protocolo proposto
foi de no máximo 30 sessões de estimulação ou até o fechamento da lesão, sendo
realizadas de duas a três vezes por semana e cada sessão teve duração de 30
minutos. Vale destacar que a cada cinco minutos de estimulação, a gaze abaixo
dos eletrodos foi umedecida com soro fisiológico com auxílio de uma seringa.
Ao final de cada
sessão, foi realizada a assepsia dos eletrodos ativos através da lavagem com
água corrente e sabão neutro. Cabe destacar que cada voluntário tinha seu kit
de eletrodos e que, em hipótese alguma, foi utilizado por outro voluntário.
Nenhum outro tipo de tratamento medicamentoso foi utilizado na úlcera tratada,
apenas óleo para hidratação cutânea e gaze para proteção.
Úlceras
por pressão
Três voluntárias
apresentaram úlceras por pressão. Na voluntária 1, a
úlcera sacral apresentou área inicial de 16,26 cm2 e ao final de 30
sessões foi reduzida para 2,59 cm2 (redução de 84,10%), a úlcera trocanteriana teve área inicial de 0,17 cm2 e
cicatrizou completamente ao final de 10 sessões. A voluntária 2 apresentou uma úlcera no maléolo medial foi de 0,06 cm2
e fechou completamente após 10 sessões (tabela II).
Tabela
II –
Área das lesões (cm2) e
porcentagem da redução das lesões dos voluntáriosnos
diferentes períodos de avaliação, n = 6 voluntários e n = 10 úlceras.
MM = maléolo medial;
ML= maléolo lateral, D = direito; E = esquerdo.
Úlceras
neuropáticas
Com relação às
úlceras neuropáticas (tabela II), presentes no hálux
esquerdo e direito do mesmo voluntário (voluntário 3),
a lesão direita apresentou área inicial de 0,31 cm2 e fechou
completamente após 10 sessões e a esquerda apresentou área inicial de 0,38 cm2
e cicatrizou completamente após 20 sessões.
Úlceras venosas
Foram tratadas 5 úlceras venosas de 3 voluntários (voluntários 4, 5 e 6).
No voluntário 4, a úlcera na região do maléolo lateral
apresentou área inicial de 20,98 cm2 e foi reduzida para 15,38 cm2
após as 30 sessões (redução de 26,29% na área da lesão). A voluntária 5 apresentava duas úlceras venosas, uma na região medial
(área inicial de 1,74 cm2 e reduziu para 0,34 cm2,
redução de 80%) e outra na lateral do tornozelo (11,39 cm2 inicial e
reduziu para 6,3 cm2 ao final de 30 sessões). Na voluntária 6, a úlcera medial teve área inicial de 41,93 cm2
e reduziu para 30,09 cm2 e a lateral de 61,11 cm2 foi
reduzida para 57,28 cm2, redução de 28,23% e 6,27%, respectivamente.
A pele humana é
negativa na superfície e positiva nas células mais profundas criando-se assim a
chamada “bateria de pele” [14,15]. Segundo alguns autores [3,8] campos
elétricos e correntes naturais e endógenas surgem espontaneamente após a lesão
de muitos tecidos, especialmente o epitélio, e são necessários para a
cicatrização normal. Desta forma, uma lesão na pele faz com que íons carregados
positivamente se movam da derme para a epiderme, formando uma corrente de lesão
[3] devido à atividade da bomba de Na+ nas células da epiderme e mudanças de
voltagem entre a lesão e a pele adjacente íntegra [14].
Esta atividade
elétrica da ferida é uma resposta regulada e persistente. Aumentar ou inibir
esta atividade elétrica, aumentando ou diminuindo a cicatrização de feridas,
respectivamente [8]. Células que são responsáveis pelo fechamento de feridas
tais como queratinócitos da pele, migram direcionalmente no campo elétrico de magnitude fisiológica.
Desta forma, se a cicatrização de uma ferida é mediada por sinais elétricos,
então pode se esperar que a estimulação elétrica altere o processo de reparo.
Diversos estudos têm
avaliado o efeito da estimulação elétrica de alta voltagem na cicatrização de
lesões com diferentes etiologias [10,11,16,17]. Korelo et al. [16] demostraram efeito positivo da
EEAV no processo de cicatrização de úlceras por pressão graus II e III. Oito
indivíduos (49,6 ± 15,9 anos de idade) foram divididos em dois grupos: controle
(n = 2) e tratado (n = 6). O recurso foi aplicado diariamente, por dez dias.
Polak et al. [10] avaliaram 77 idosos portadores de úlceras por pressão
divididos em 3 grupos: controle, tratados convencionalmente + US (1MHz, 20%,
0,5 W/cm2, 1 a 3 min/ERA, 1x/dia, 5x/semana), tratamento convencional + EEAV (100 Hz, 100
volts, 154 µs, 50 minutos/dia, 5x/semana). Os autores demonstraram que o
percentual na redução da área das úlceras por pressão foi significativamente
maior nos grupos US e EEAV quando comparados ao grupo controle. O grupo EEAV
teve uma proporção significativamente maior de úlceras por pressão que tiveram
redução da área pelo menos 50% ou o fechamento completo em compração
ao controle. Não houve diferença significativa entre US e EEAV, demonstrando
que ambos os recursos foram eficazes na cicatrização das úlceras por pressão.
Gui et al. [11] utilizando um programa de EEAV
similar ao do presente estudo trataram 6 úlceras de 4 voluntários. Houve
fechamento completo de 3 lesões e a redução na área de
outras 3 (93%, 80,40%, 74,38%). A diferença no percentual da redução pode ser
em decorrência do número de sessões deste estudo, que chegou à
100 sessões de EEAV.
No estudo de Polak et al. [17] foram avaliadas 22 mulheres
(42-95 anos) que apresentavam úlceras
por pressão graus II e III, divididas em 2 grupos experimentais: Experimental
(n = 10, com 16 úlceras) e grupo controle (n = 12 com 14 úlceras). Todos os
voluntários receberam tratamento padrão para as feridas. O grupo experimental
recebeu o tratamento com EEAV (100 µs, 100 Hz, 100–150 V) aplicada por 50
minutos/dia, 5x/semana. A área das lesões foi mensurada semanalmente. Após 4 semanas de intervenção, a área e a medida linear das
lesões diminuiram significativamene
em ambos os grupos, entretanto no grupo EEAV a redução foi mais acentuada que
no controle.
Na presente
investigação, das 10 úlceras tratadas, observou-se o fechamento completo de 4 lesões (duas úlceras por pressão e duas neuropáticas) e a
redução da área das demais úlceras tratatas (6
úlceras, sendo uma por pressão na região sacral e outras 5 venosas localizadas
na região do tornozelo). Desta forma, a EEAV foi eficaz para auxiliar a
cicatrização dos tecidos.
A efetividade da EEAV
na cicatrização das lesões pode ser atribuída à melhora na microcirculação
local, uma vez que de acordo com Goldman et
al. [18]
ocorre a produção e liberação de
óxido nítrico, que é vasodilatador e também
um
aumento na pressão transcutânea de oxigênio na borda
da lesão. Segundo Asadi et al. [19] a corrente modula a produção de fatores angiogênicos, o que diminui a duração da fase de
inflamação. Outros autores como Borba et al. [14]
relatam que a estimulação elétrica pode afetar a proliferação de fibroblastos e
a síntese de fibras colágenas. Outros efeitos da corrente são o
restabelecimento da bioeletricidade tecidual com o
incremento do transporte pela membrana plasmática, aumento na síntese de
adenosina trisfosfato e do transporte de aminoácidos,
a aceleração da síntese de proteínas e o estímulo ao crescimento do tecido
conjuntivo [20], inibição do crescimento bacteriano, facilitação da migração do
tecido epitelial e melhora o fluxo sanguíneo [21].
Recio [21], Davini et al. [22] e
Gomes et al. [23] atribuem um efeito bactericida à EEAV, em virtude das
mudanças eletroquímicas que alteram o pH, gerando calor localizado e o
recrutamento de fatores antimicrobianos já presentes no organismo, além do aumento
circulatório.
Outros estudos também
apresentaram resultados similares à presente
investigação. Koel e Houghton
[3] em sua revisão de literatura, verificaram que no
grupo submetido ao tratamento padrão de feridas, associado ao tratamento com
estimulação elétrica, a porcentagem de redução da área das úlceras foi bem
superior àquela encontrada no grupo submetido apenas ao tratamento padrão de
feridas (59,5% de redução no grupo com eletroestimulação versus 21,6% no
tratamento padrão).
Embora tenha sido
observada redução na área das lesões tratadas e até o fechamento completo em 4 delas, uma limitação do estudo atual foi a não
mensuração da profundidade da ferida. Uma vez que a cicatrização ocorre “de
dentro para fora”, poderiam ter sido demonstrados melhores resultados, uma vez
que a redução da área da lesão ocorre posteriormente à redução da profundidade
da mesma. Desta forma, mesmo que não houve redução importante da área de
algumas lesões, observou-se melhora visível na profundidade e no aspecto da
ferida, entretanto esta variável não foi mensurada. Outra limitação foi a
não inclusão de um grupo controle.
Entre as feridas
cutâneas crônicas, nas de membro inferior de ordem neuropática, o reparo só é
alcançado a partir do controle da enfermidade de base e do fator lentifícador do reparo tissular. Devido a esses fatores
observamos que as lesões diabéticas obtiveram resultado positivo, fechando
completamente nas sessões 10 e 20 do tratamento e com a total colaboração do
paciente quanto ao controle do nível glicêmico.
Nas úlceras venosas,
ocorre uma situação hipertensiva que se manifesta mais comumente na região da
articulação do tornozelo, mais frequente sobre o maléolo medial [4]. Todas as
úlceras venosas tratadas no estudo localizavam-se nesta região do tornozelo.
Segundo Falanga [24], as úlceras venosas tendem a ser lesões de longa duração e frequentemente resistem a
muitas modalidades de tratamento. Um dos fatores que pode contribuir para esse
atraso na cicatrização são as infecções e colonizações que frequentemente
ocorrem em úlceras crônicas dos membros inferiores [4]; além da área inicial da
ferida, o tempo das lesões [3,25] e as comorbidades
associadas [3].
Com relação à
duração, o tempo de existência das feridas é um dos fatores que geraram discrepância
no resultado desse estudo, enquanto alguns pacientes contabilizavam poucos
meses de lesão, outros tinham a lesão há 30 anos. Isto pode justificar o fato
de que as lesões venosas foram as que responderam com menor porcentagem de
redução da área em comparação às demais etiologias, uma vez que eram as lesões
mais antigas. Além disso, outro fator importante é o controle da doença de
base, para que o processo de cicatrização seja favorecido. Neste contexto é
imprescindível, nas úlceras venosas, o tratamento com compressão que minimiza
os efeitos da hipertensão venosa no membro afetado [3,4]. A compressão agiria
sobre a macrocirculação por aumentar o retorno
venoso, reduzindo o refluxo patológico durante a marcha e aumentando o volume
durante a ativação do tríceps sural [4]. Vale
destacar que não foi encontrada na literatura, uma exposição clara do tempo das
lesões que compunham suas amostras, deste modo fica difícil buscar comparação
que permita avaliar a eficácia maior ou menor em outros estudos.
Segundo Koel e Houghton [3] fatores como
o tipo e a duração da lesão cutânea, o tipo de estimulação elétrica utilizada,
as características do estímulo elétrico (unidirecional ou bidirecional), as comorbidades associadas e o método de mensuração da área
das lesões podem ter influência sobre os resultados, o que dificulta a
comparação dos estudos.
Numerosas pesquisas
estudaram os efeitos da aplicação positiva ou negativa durante as diferentes
fases da cicatrização em animais e humanos [14]. Com relação à polaridade
utilizada no presente estudo, foi realizada com a estimulação catódica (polo
negativo) sobre as lesões. Davini et
al. [13] sugerem o uso da polaridade negativa sobre as lesões por todo
tratamento, pois a regeneração do tecido tegumentar ocorre com maior
velocidade. Entretanto, de acordo com Reid e Zhao [8] a cicatrização ocorre em 3
fases que se sobrepõem: inflamatória, proliferativa e de remodelamento. Nessas
fases participam eventos diversos e interligados, que fazem parte de um
processo complexo que aborda a regeneração e a formação de cicatriz fibrosa
após a ocorrência da lesão. Desta forma, talvez a inversão da polaridade seja
necessária nessas lesões mais crônicas e profundas para que não tenham o
processo de cicatrização lentificado.
Silva et al. [26] avaliaram 15 voluntários
portadores de úlceras venosas de membros inferiores, divididos aleatoriamente
em dois grupos (EEAV x terapia convencional). A EEAV (100 volts e f = 100 Hz,
eletrodo ativo negativo) foi aplicada em 10 sessões de 30 minutos. Os autores
observaram redução média da área das úlceras de 41,1% no grupo estimulado
enquanto que o tratamento convencional obteve redução média de apenas 4,67%. O
mesmo foi verificado no presente estudo, ocorreu redução de 37,17% em média,
nas lesões dos voluntários 4, 5 e 6 portadores de úlceras venosas.
No estudo realizado
por Porchera, Listo e Bandeira [27] a EEAV foi
aplicada em 5 voluntários com úlceras venosas crônicas
em membros inferiores. O protocolo consistiu na aplicação da corrente
3x/semana, por 30 minutos, durante 8 semanas
consecutivas. Observou-se redução na área das lesões e redução na intensidade
da dor antes e após a intervenção.
Franek et al. [28] avaliaram 50 voluntários (26 tratados e 24 controle)
portadores de úlceras de pressão graus II e
III. Demonstraram
que a área da ferida, a medida linear, o volume e as alterações
do tecido de granulação foram significativas no tratamento com EEAV (100 V, 100
µs, 100 Hz, 50 minutos/dia, cinco vezes por semana, por 6 semanas).
Recio et al. [21] utilizando a EEAV durante 60 minutos, 3 a 5x/semana,
alterando a polaridade negativa e positiva, demonstraram eficácia na
cicatrização de úlceras de pressão graus III e IV. Relatam que as lesões foram
curadas após 7-22 semanas de tratamento.
Como a literatura do passado mostrou que diferentes tipos de células são
atraídos para um polo positivo ou negativo, as polaridades alternadas produzem
resultados tanto na quimiotaxia como no fechamento da ferida.
Salienta-se que todo
cuidado preventivo, como mudanças de decúbito e cuidados terapêuticos
multidisciplinares, como o controle das doenças de base e o estado nutricional
do paciente se faz necessário para diminuir a incidência e prevalências dessas
lesões, aumentando a expectativa de sucesso na cicatrização, melhorando a
qualidade de vida e saúde dos portadores de úlceras cutâneas crônicas.
Diante dos resultados
obtidos, pode concluir que 30 sessões de estimulação elétrica de alta voltagem
(EEAV) foi eficaz em reduzir a área das lesões
tratadas, independentemente da etiologia e promoveu o fechamento completo em
quatro delas; entretanto a resposta foi mais efetiva e evidente nas úlceras por
pressão e diabéticas do que nas úlceras venosas.
Ao Programa de Apoio
à Iniciação Cientifica das Faculdades Integradas Einstein de Limeira
(PAPIC/EINSTEIN).