REVISÃO

Intervenções fisioterapêuticas na função pulmonar em pacientes submetidos a cirurgia bariátrica

Physiotherapeutic interventions in pulmonary function of patients submitted to bariatric surgery

 

Jeferson Santos Miranda, Ft.*, Tamires Barradas Cavalcante**, Rosane Karine Gonçalves Nascimento, Ft.***, Jefferson Carlos Araujo Silva, Ft.****, Carlos Magno Araujo Lima*****, Érika Thalita Nunes Costa*****

 

*Residência multiprofissional em saúde do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão (HU-UFMA), São Luís/MA, **Enfermeira, Coordenadora da unidade de traumatologia e ortopedia do HU-UFMA, São Luís/MA, ***Residência multiprofissional em saúde do HU-UFMA, São Luís/MA, ****Mestrando em Ciências da Reabilitação pela Universidade de Brasília, Brasília/DF, *****Fisioterapeuta do HU-UFMA, São Luís/MA

 

Recebido em 22 de março de 2018; aceito em 17 de setembro de 2018.

Endereço para correspondência: Jeferson Santos Miranda, Universidade Federal do Maranhão, Hospital Universitário Presidente Dutra, Rua Barão de Itapary, 227 Centro 65020-070 São Luís MA, E-mail: jeferson.cfc@hotmail.com; Tamires Barradas Cavalcante: tamiresbarradas@gmail.com; Rosane Karine Gonçalves Nascimento: rosanekarine_fisio@hotmail.com; Jefferson Carlos Araujo Silva: jeffcasilva@gmail.com; Carlos Magno Araujo Lima: ma.agno@hotmail.com; Érika Thalita Nunes Costa: erikathalita2@hotmail.com

 

Resumo

O objetivo desta pesquisa foi buscar na literatura evidências sobre intervenções utilizadas pela fisioterapia em pacientes submetidos a cirurgia bariátrica. Métodos: As buscas foram realizadas nos meses de janeiro e fevereiro de 2018, através do acesso online em bases de dados: Pubmed/Medline, PEDro, Scielo e Lilacs. Utilizou estratégia PICo, onde foram definidos: População (P): Obesidade Mórbida; Interesse (I): Prática baseada em evidências; Contexto (Co): estudos de intervenções. Resultados: Através das estratégias de busca foram encontrados 951 artigos. Após leitura dos resumos, observados critérios de inclusão e exclusão, foram excluídos um total de 901, restando 50 artigos que foram lidos na íntegra e, em seguida, elegeram-se 10 estudos. As evidências das intervenções do treinamento muscular respiratório podem ser observadas nos ensaios clínicos contendo bom rigor metodológico. O treinamento muscular respiratório pode ser considerado como uma intervenção, juntamente com outras terapêuticas (dois níveis de pressão – Bilevel) que compõem o tratamento de pacientes submetidos à cirurgia bariátrica, auxiliando na obtenção de resultados satisfatórios. Conclusão: O nível de evidência atualmente disponíveis do impacto das intervenções fisioterapêuticas, como o treinamento muscular respiratório, na função pulmonar de pacientes submetidos à cirurgia bariátrica se mostrou alto. A análise metodológica realizada neste estudo mostrou poucos números de estudos de ensaios clínicos, retratando a real necessidade de novos estudos que possam integrar a pratica clínica.

Palavras-chave: cirurgia bariátrica, estudos de intervenção, fisioterapia respiratória.

 

Abstract

The objective of this study was to search in the literature for evidence on interventions used by physical therapy in patients undergoing bariatric surgery. Methods: The study was performed in January and February 2018, through online access in databases: Pubmed/Medline, PEDro, Scielo and Lilacs. It was used the PICo strategy, and it was defined: Population (P): Morbid Obesity; Interest (I): Evidence-based practice; Context (Co): intervention studies. Results: We found 951 articles. After reading the abstracts and observing inclusion and exclusion criteria, a total of 901 were excluded, remaining 50 articles that were read in full, and then 10 studies were chosen. Evidence from respiratory muscle training interventions can be observed in clinical trials with good methodological rigor. Respiratory muscular training can be considered as an intervention, along with other therapeutics (two levels of pressure - Bilevel) that make up the treatment of patients undergoing bariatric surgery, helping to obtain satisfactory results. Conclusion: The level of evidence currently available on the impact of physiotherapeutic interventions, like respiratory muscular training, on lung function in patients undergoing bariatric surgery was high. The methodological analysis performed in this study showed few clinical trial studies, showing the real need for new studies that could integrate clinical practice.

Key-words: bariatric surgery, intervention studies, respiratory physiotherapist.

 

Introdução

 

A cirurgia bariátrica é um procedimento eletivo e baseia-se na análise de múltiplos aspectos clínicos do paciente. A avaliação no pré e pós-operatório é multidisciplinar, composta por endocrinologistas, nutricionistas, cardiologistas, pneumologistas, psiquiatras, psicólogos, cirurgiões, dentre outros. Conforme a gravidade, a Organização Mundial da Saúde (OMS) designa obesidade grau I pacientes com o Índice de Massa Corporal (IMC) entre 30 e 34,9 kg/m2, obesidade grau II quando o IMC está entre 35 e 39,2 kg/m2 e obesidade grau III quando o IMC ultrapassa 40 kg/m2. Neste último caso é denominada de obesidade mórbida, sendo indicado o tratamento cirúrgico para redução de peso [1].

No Brasil a prevalência de obesos tem aumentado ao longo dos anos, acompanhando a tendência dos países desenvolvidos. A pesquisa Vigitel 2013 (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) indica que 50,8% dos brasileiros estão acima do peso ideal e que, destes, 17,5% são obesos. Cuiabá/MT lidera o ranking das capitais brasileiras com maior número de obesos, 22,4% dos adultos, e São Luís/MA é a capital com menor percentual de obesos entre os adultos, apenas 13,2%. A pesquisa afirma, ainda, que a perspectiva do número de cirurgias bariátricas vem aumentando, sendo realizadas atualmente uma média de 90 a 95 mil cirurgias por ano [2].

Existem várias técnicas de intervenção em cirurgia bariátrica no mundo atual, sendo a gastrectomia vertical e o bypass gástrico as mais realizadas. O sleeve gástrico ou gastrectomia vertical é um procedimento puramente restritivo que consiste na remoção da grande curvatura do estômago deixando o reservatório novo com formato tubular e alongado, de volume entre 150 e 200 ml [3,4]. Bypass gástrico ou derivações gástricas em Y de Roux, com ou sem anel de contenção, consiste no método de redução da capacidade gástrica para um volume de aproximadamente 20 ml. O estômago remanescente, assim como o duodeno e os primeiros 50 cm de jejuno, ficam permanentemente excluídos do trânsito alimentar. O pequeno reservatório gástrico é então anastomosado a uma alça jejunal isolada em Y (daí a origem do nome, sendo Roux o cirurgião criador da técnica) [5].

A obesidade causa inúmeros comprometimentos sistêmicos no organismo, dentre os quais podemos citar a interferência na mecânica respiratória destes indivíduos, ocasionando diminuição dos volumes e capacidades pulmonares, principalmente do Volume de Reserva Expiratória (VRE) e Capacidade Residual Funcional (CRF). A quantidade de gordura sobre o diafragma, pulmões e caixa torácica ocasiona uma redução da expansibilidade pulmonar, provocada pela diminuição da complacência total do sistema respiratório e aumento da resistência pulmonar [6,7].

Os procedimentos cirúrgicos, especialmente do andar superior do abdome, como a cirurgia bariátrica, produzem efeitos deletérios no sistema respiratório, como alterações na troca gasosa e na mecânica respiratória. O tempo cirúrgico e os anestésicos empregados acarretam maior chance de ocorrência de complicações pulmonares pós-operatórias [8]. Neste contexto, diversos autores relatam que pacientes submetidos à cirurgia bariátrica podem evoluir com complicações respiratórias [9].

O paciente obeso apresenta uma insuficiência pulmonar restritiva decorrente da compressão mecânica sobre o diafragma, pulmões e caixa torácica pelo excesso de tecido adiposo. A força muscular e a endurance podem ficar reduzidas pela ineficiência dos músculos respiratórios, ocasionando aumento do trabalho respiratório e consumo de O2. A fisioterapia atua tanto no pré quanto no pós-operatório de cirurgia bariátrica, objetivando preparar o paciente para o procedimento cirúrgico e prevenir complicações respiratórias que possam surgir no pós-operatório, bem como a terapia de reexpansão pulmonar utilizando pressão positiva após a realização da cirurgia. Outro fator que pode implicar na redução da expansibilidade pulmonar é a geração de dor na incisão cirúrgica frente a inspiração profunda, interferindo na recuperação do paciente, levando-o a adotar uma respiração mais superficial com pouco volume pulmonar [10,11].

Considerando a associação do procedimento cirúrgico com a obesidade, recomenda-se a fisioterapia respiratória, sendo essencial na recuperação da função pulmonar e na prevenção de complicações respiratórias, como infecções, atelectasias, entre outras [10,11]. É de suma importância que os serviços prestados sejam adequadamente realizados, e estes sejam feitos de forma sistematizada. O objetivo desta pesquisa é buscar na literatura evidências sobre intervenções utilizadas pela fisioterapia na função pulmonar em pacientes submetidos à cirurgia bariátrica.

 

Material e métodos

 

Trata-se de uma revisão integrativa da literatura. Dessa forma, a questão norteadora da pesquisa consistiu em: quais evidências e qualidade metodológica dos tipos de estudos das intervenções fisioterapêuticas na função pulmonar em pacientes submetidos a cirurgia bariátrica? O levantamento das publicações indexadas foi realizado nos meses de janeiro e fevereiro de 2018, por meio do acesso online em bases de dados importantes no contexto da saúde: Pubmed/Medline, PEDro, Scielo e Lilacs.

Os termos-chaves da pesquisa foram estabelecidos através de uma variável da estratégia PICo, e definidos como: População/Paciente/Problema (P): Obesidade Mórbida; Interesse (I): Prática baseada em evidências; Contexto (Co): Fisioterapia/estudos de intervenções. Após esta etapa, foi realizada a identificação dos descritores e palavras-chave relacionados aos termos da estratégia PICo. O termo (P) abrangeu os descritores Mesh: “morbid obesity”, “Bariatric Surgery” e palavras chaves: “obese”, “complications postoperative”; interesse (I) abrangeu os descritores Mesh: “ evidence based practice”, “methodological study” e palavras-chave: “level of evidence” e o termo contexto (Co) abrangeu os descritores Mesh: “ intervention studies”, “respiratory function tests”, “ continuous positive airway pressure”, “CPAP ventilation”, “ bilevel continuous positive airway pressure”, “physical therapy modality”, “respiratory muscle”, “ postoperative pulmonary atelectases”, “ postoperative complication”, e palavras-chave: “physiotherapy techniques” e “respiratory physiotherapist”.

No Pubmed realizou-se o cruzamento entre os descritores controlados presentes no MeSH utilizando os operadores booleanos (delimitadores) “OR” e “AND”; o primeiro foi usado para combinação dos descritores comuns a cada componente da estratégia PICo; e o segundo, para finalização da estratégia de busca, foi feita a combinação dos três termos: (P) AND (I) AND (CO). Na base de dados Scielo, dois descritores foram cruzados: “Bariatric Surgery” e “Intervention Studies”. Na base de dados PeDro utilizou-se o descritor “postoperative pulmonar” e na Lilacs foram cruzadas palavras chaves “Bariatric Surgery”, “postoperative pulmonary atelectases” e “ Physiotherapy techniques”.

Foram adotados como critérios de inclusão: artigos com textos completos disponíveis relacionados à referente pesquisa; artigos cujos pacientes foram submetidos somente a cirurgia bariátrica; estudos encontrados tanto diretamente nas bases de dados, como em referências de artigos de revisão; pesquisas produzidas em português, espanhol e inglês; publicações realizadas nos últimos 10 anos e envolvendo seres humanos. Os critérios de não-inclusão contemplaram artigos duplicados, relato de casos informais, os capítulos de livros, as dissertações, as teses, as reportagens, as notícias, os editoriais, os textos não científicos e estudos sem disponibilidade na íntegra.

Com base nas publicações selecionadas durante a busca e, obedecendo rigorosamente aos critérios de inclusão e exclusão apresentados, realizou-se a leitura dos artigos na íntegra. A Figura 1 descreve as etapas realizadas para identificação e seleção dos estudos que compuseram a amostra da pesquisa.

 

 

Figura 1 Organograma da triagem dos artigos.

 

Os dados foram sistematicamente extraídos dos estudos e disposto da seguinte forma: Autoria, Ano, País, Título, Pontuação da escala de PEDro e Nível de evidência e grau de recomendação, resultados e conclusão.

A pontuação da escala de PEDro foi utilizada como indicador de evidência científica com intuito de preservar a relevância do estudo em questão. Desenvolvida para ser empregada em ensaios clínicos, esta escala, atualmente considerada uma das mais utilizadas na área da fisioterapia, permite uma rápida avaliação da validade dos estudos [13,14]. Os artigos foram avaliados segundo essa escala fornecida pelo site no momento da busca [15].

A escala PEDro permite uma pontuação total de dez pontos. Para cada critério apresentado na escala, poderá ser atribuída uma pontuação de um ou zero ponto. “A pontuação só será atribuída quando um critério for claramente satisfeito. Se existir a possiblidade de um critério não ter sido satisfeito, esse critério não deve receber pontuação” [14]. A pontuação final da escala de qualidade PEDro é dada por meio da soma do número de critérios que foram classificados como satisfatórios entre os critérios 2 ao 11. O critério 1 não é considerado para a pontuação final por tratar-se de um item que avalia a validade externa do estudo [16]. A pontuação final pode variar entre 0 e 10 pontos. Para a avaliação do nível de evidência e grau de recomendação foi utilizada a escala de Oxford Centre for Evidence-based Medicine [17].

 

Resultados

 

Conforme o Quadro 1, das dez publicações que compões a amostra deste estudo, quatro foram encontradas no Pubmed, três no PEDro, dois na Lilacs e um na Scielo. Entre os trabalhos selecionados, oito foram desenvolvidos no Brasil, um nos EUA e um na Espanha.

Quanto ao tipo de estudo, os ensaios clínicos predominaram em relação aos demais, sendo seis artigos de ensaio clínico, três estudos transversais e uma série de caso. Quanto à avaliação realizada através da escala PEDro, os cinco artigos de ensaio clínico obtiveram pontuação maior que cinco, sendo considerados de alta expressividade metodológica. Enquanto os outros cinco estudos não se enquadram dentro dos critérios segundo a escala de PEDro. Com relação ao nível de evidência, seis estudos possuíam nível um por se tratarem de ensaios clínicos, três estudos nível dois e uma pesquisa com nível de evidência quatro. No que diz respeito à qualificação dos artigos, identifica-se que os artigos estão em um nível adequado de evidência científica por tipo de estudo.

Como possíveis condutas fisioterapêuticas a serem utilizadas nos indivíduos submetidos à cirurgia bariátrica, os artigos analisados citaram, em sua maioria, treino muscular inspiratório no pré e no pós e a aplicação do CPAP pós-operatório e exercícios respiratórios. Outras condutas, em menor escala, também foram citadas, como o incentivador respiratório e a aplicação do CPAP no pré-operatório.


Quadro 1 - Apresentação dos estudos de acordo com autoria, título, ano, país, escala PEDro, NE/GR, resultados e discussão. São Luís/MA, 2018. (ver anexo em PDF)

Discussão

 

Há um grande número de estudos voltados para evitar ou tratar complicações pulmonares em pacientes submetidos a cirurgia bariátrica. Dentre as terapêuticas utilizadas destaca-se: Pressão Positiva Contínua nas Vias Aéreas (CPAP), treinamento muscular respiratório, Estimulação Diafragmática Elétrica Transcutânea (EDET), incentivador inspiratório a fluxo e a fisioterapia respiratória convencional [10,11].

O levantamento dos estudos sobre intervenções fisioterapêuticas proporcionou conhecimento das inúmeras pesquisas realizadas e a importância de uma sistematização adequada. Em relação à autoria dos estudos inclusos nesta, 80% (N=8) deles são publicações brasileiras, e levando-se em conta o tipo de estudo, 60% (N=6) correspondiam a ensaios clínicos, com realização de intervenções e avaliações pré e pós-operatório.

Segundo Pazzianotto-Forti et al. [18], a aplicação do CPAP promoveu manutenção do volume corrente quando aplicado no pós-operatório da gastroplastia tanto no primeiro quanto no segundo dia do pós-operatório. Isso ficou evidenciado pelo fato das medidas do volume corrente não terem mostrado diferença significativa, na comparação pré e pós-aplicação do CPAP no 1º e no 2º dia pós-operatório, o que sinaliza efeito benéfico, pois aponta manutenção dos volumes pulmonares. Entretanto, o Volume Minuto (VM) demonstrou significativo aumento após a aplicação do CPAP, nos dois dias de tratamento. Tal incremento provavelmente se deve ao aumento da frequência respiratória. Por um lado, mesmo tomando os devidos cuidados durante a aplicação da terapia, não pôde ser descartada a possibilidade de alterações nos ajustes do fluxo, ou da válvula de Pressão Positiva Expiratória Final (PEEP), ou até mesmo da máscara, no momento pré-aplicação do CPAP, e, assim, esses fatores terem propiciado o aumento da frequência respiratória e, consequentemente, o do VM [18].

Souza et al. [18] constataram que as medidas de volume corrente, VM e frequência respiratória não apresentaram significância estatística quando comparados os resultados do pré e pós-operatório tanto no grupo Fisioterapia Respiratória Convencional (FRC), como no grupo FRC+CPAP, bem como quando comparadas os dois grupos entre si tanto no pré quanto no pós-operatório. Concluíram que tanto a aplicação da FRC como a aplicação da FRC+CPAP no período pré-operatório contribuem para a manutenção das variáveis respiratórias nas primeiras 24 horas do pós-operatório. A aplicação do CPAP, por 20 min, antes da indução anestésica, não promoveu benefícios adicionais no pós-operatório de cirurgia bariátrica no que se refere ao incremento dos volumes pulmonares, entretanto, contribuiu para a preservação deles.

O estudo de Brigatto et al. [20] avaliou se a aplicação do BIlevel (dois níveis de pressão positiva nas vias aéreas) no pós-operatório de cirurgia bariátrica pode ser mais efetiva do que quando aplicadas pressões positivas expiratória e inspiratória separadamente, na restauração do Volume de Reserva Inspiratória (VRI), Volume de Reserva de Expiratório (VRE), Capacidade Vital (CV), Capacidade Residual Funcional (CRF) e Capacidade Vital Forçada (CVF) e mobilidade torácica. Os resultados mostraram que há redução significativa das variáveis espirométricas no pós-operatório independentemente do recurso utilizado, e a preservação da mobilidade torácica somente nos voluntários do grupo BIPAP. Essa pesquisa concluiu que aplicação de dois níveis de pressão positiva nas vias aéreas, dentro do protocolo estabelecido pelo estudo, parece para não ser eficaz na restauração de volumes e capacidades pulmonares durante o pós-operatório de cirurgia bariátrica. Porém, a mobilidade torácica melhorou com a aplicação do BIPAP do que quando aplicado pressão inspiratória ou expiratória separadamente.

Costa et al. [21] compararam os efeitos da FRC e FRC associada a EDET nos volumes pulmonares e mobilidade toracoabdominal. Houve aumento do VRI e VRE em pacientes que receberam FRC, em especial ao tratamento associado de FRC+EDET. A fisioterapia é fundamental para a contração da musculatura respiratória, especialmente para o músculo diafragma, e músculos da parede abdominal estimulados pela EDET.

No trabalho realizado por Baltieri et al. [22] foram encontrados resultados semelhantes com os achados de Moulim et al. [23], no qual fez-se a comparação entre inspirometria de incentivo e o uso de EPAP (Expiratory Positive Airway Pressure). Concluíram que a inspirometria de incentivo aumenta os volumes inspiratórios e o EPAP evita o colapso precoce das vias aéreas. Sendo assim, como o modo BIPAP possui dois níveis pressóricos, tanto na fase inspiratória como na fase expiratória, pode-se afirmar que há a combinação dos benefícios promovidos por um inspirômetro de incentivo e um EPAP. Ainda sobre o estudo de Baltieri et al. [22], o uso da PEEP diminuiu a prevalência das atelectasias pós-operatória, porém a maior eficácia para este objetivo foi observado com o uso da PEEP logo após o procedimento cirúrgico, em que a prevalência de atelectasias foi nula. Conclui-se então que o melhor momento considerado para a aplicação da pressão positiva é no pós-operatório, imediatamente após a extubação, pois reduz a prevalência de atelectasias e reduz a perda do volume de reserva expiratória.

Moulim et al. [23] concluíram que a inspirometria de incentivo à fluxo parece exercer melhores efeitos na ventilação pulmonar, na mobilidade diafragmática e toracoabdominal, enquanto a EPAP parece atuar melhor no restabelecimento do VRE no período pós-operatório. No entanto, a inspirometria de incentivo não demostra nenhum efeito no pós-operatório na hipoxemia e nível de SaO2 em pacientes submetidos a cirurgia bariátrica [24].

Para Casali et al. [25], o treinamento muscular inspiratório (IMT) é uma importante intervenção fisioterapêutica para pacientes submetidos a gastroplastia durante o período inicial de pós-operatório. O estudo avaliou os efeitos do IMT na função pulmonar, força muscular e resistência muscular em pacientes submetidos a cirurgia bariátrica. Os resultados mostraram que o IMT melhorou força muscular e resistência e uma recuperação melhor do fluxo de ar pulmonar em pacientes treinados em comparação com o grupo controle. Moulim et al. [26] encontraram que o IMT no pré-operatório aumentou a força muscular inspiratória e atenuou os efeitos negativos no pós-operatório, embora não tenha influenciado o volume pulmonar. Ainda de acordo com este estudo, não houve aumento do movimento diafragmático após o treinamento. Isso implica que mais estudos com diferentes protocolos são necessários para avaliar o efeito de IMT na prevenção de disfunção diafragmática no pós-operatório de gastroplastia.

No estudo de Llorés et al. [27] foram analisados os efeitos do IMT realizado no pré-operatório sobre a oxigenação arterial de pacientes obesos submetidos à cirurgia bariátrica. Os autores observaram que a relação PaO2/FiO2 apresentou-se maior significativamente no grupo que recebeu treinamento em comparação ao grupo controle. Os voluntários do grupo experimental realizaram sessões diárias de 20 min, 30 dias antes da cirurgia de IMT, enquanto o grupo controle não realizou nenhuma atividade antes da cirurgia. Sugerindo que o treinamento muscular inspiratório melhorou a oxigenação no pós-operatório e aumentou a força muscular de pacientes obesos submetidos a cirurgia bariátrica.

As evidências das intervenções do IMT foram observadas nos ensaios clínicos contendo bom rigor metodológico. Nesta revisão, pela análise metodológica realizada através da Escala de PEDro, foi observado que três dos dez estudos analisados, apresentam boa relevância científica, com possibilidade de extrapolação dos resultados para prática clínica. O IMT pode ser considerado como uma intervenção eficaz, juntamente com outras terapêuticas que compõem o tratamento de pacientes submetidos a cirurgia bariátrica, auxiliando na obtenção de resultados satisfatórios [25].

Um ensaio clínico [20] avaliou a aplicação do Bilevel em comparação a aplicação de forma separada das pressões positivas expiratória e inspiratória, os resultados obtidos a partir do ensaio mostraram que ambas as técnicas não são efetivas na restauração da função pulmonar no pós-operatório de cirurgia bariátrica, entretanto a aplicação do BIPAP pode preservar a mobilidade torácica. Este estudo contou com 68 mulheres voluntárias, obesas (IMC entre 40 e 55 kg/m²), com idade entre 25 e 55 anos submetidas à cirurgia bariátrica em Y de Roux por laparotomia. Divididas em três grupo, EPAP, Respiração com Pressão Positiva Intermitente (RPPI) e Bilevel, apresentaram redução do VRI e VRE e na mobilidade torácica, na comparação pré e pós-operatório, não havendo diferença significativa entre os dois momentos de avalição para o tratamento proposto. A análise metodológica do estudo realizada através da Escala de PEDro e dos níveis de evidências apresentam boa relevância científica.

Baltieri et al. [22] demonstraram que o momento ideal para aplicação do BIPAP é no pós-operatório imediato, pois reduz a prevalência de atelectasias e há menor perda do volume de reserva expiratório. O grupo que utilizou Bilevel por uma hora após a cirurgia não apresentou atelectasias, enquanto no grupo controle 25% dos voluntários apresentaram. A aplicação da escala de PEDro neste estudo obteve uma boa relevância científica e ótimo nível de evidência.

 

Conclusão

 

Após análise dos artigos, podemos sugerir que o IMT pré-operatório propõe melhora da força muscular inspiratória, melhora a oxigenação no pós-operatório e atenuou os efeitos negativos da cirurgia bariátrica. Outras técnicas como aplicação do BIPAP no pós-operatório imediato podem reduzir a prevalência de atelectasias, com menor perda do VRE. Desta forma, o nível de evidência atualmente disponível do impacto das intervenções fisioterapêuticas na função pulmonar de pacientes submetidos a cirurgia bariátrica se mostrou alto. Entretanto, a análise metodológica realizada neste estudo mostrou poucos os números de estudos de ensaios clínicos, retratando a real necessidade de novos estudos que possam integrar a prática clínica com maior ênfase de pesquisa científica.

 

Referências

 

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