ARTIGO ORIGINAL

A influência da Fisioterapia na redução da intensidade da dor e no efeito global percebido de pacientes com dores musculoesqueléticas

The influence of the Physiotherapy on pain reduction and global perceived effect of patients with musculoskeletal pain

 

Aline de Oliveira Chaves, Ft.*, Renato Santos de Almeida, D.Sc.**, Leticia Amaral Corrêa, M.Sc.***, Felipe José Jandre dos Reis, D.Sc.*, Ney Armando Mello Meziat-Filho, D.Sc.***, Leandro Alberto Calazans Nogueira, D.Sc.****

 

*Departamento de Fisioterapia, Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), Rio de Janeiro, **Departamento de Fisioterapia, Centro Universitário Serra dos Órgãos, Teresópolis, Departamento de Fisioterapeuta, Hospital Universitário Gaffrée e Guinle, Rio de Janeiro, Programa de Pós-graduação em Ciências da Reabilitação, Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), Rio de Janeiro, ***Programa de Pós-graduação em Ciências da Reabilitação, Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), Rio de Janeiro, ****Departamento de Fisioterapia, Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ), Rio de Janeiro; Programa de Pós-graduação em Ciências da Reabilitação, Centro Universitário Augusto Motta (UNISUAM), Rio de Janeiro

 

Recebido em 26 de março de 2018; aceito em 30 de março de 2019.

Endereço de correspondência: Dr. Leandro Alberto Calazans Nogueira, Instituto Federal do Rio de Janeiro, Campus Realengo, Rua Carlos Wenceslau, 343 Realengo 21715-000 Rio de Janeiro RJ, E-mail: leandro.nogueira@ifrj.edu.br; Aline de Oliveira Chaves: alinechaves@gmail.com; Renato Santos de Almeida: renato.fisio@gmail.com, Leticia Amaral Corrêa: leticia.amaral@live.com; Felipe José Jandre dos Reis: felipe.reis@ifrj.edu.br; Ney Armando Mello Meziat-Filho: neymeziat@gmail.com

 

Resumo

A melhora clínica do paciente com dores musculoesqueléticas (DME) deve ser monitorada em conjunto com a percepção do paciente sobre o efeito do tratamento, apesar da falta de informação sobre esse tema. Objetivo: Analisar a influência do tratamento fisioterápico na redução da intensidade da dor e no efeito global percebido de pacientes com DME. Métodos: Foi realizado um estudo observacional analítico retrospectivo em 61 pacientes com DME que responderam uma questão relacionada à intensidade de dor e outra questão sobre o efeito global percebido do tratamento fisioterápico. A intensidade de dor medida após 10 meses de acompanhamento foi comparada aos valores iniciais. Resultados: Os participantes eram predominantemente mulheres (83,3%) adultas (média de idade de 59,6 anos). A média de intensidade da dor na avaliação inicial foi de 6,4 (± 2,7), com média de tempo de dor de 20,3 meses. A média de intensidade de dor após o contato telefônico foi de 4,37 (± 3,9). A análise do efeito global percebido evidenciou melhora na maioria dos participantes (16,7% completamente recuperados; 39,7% melhoraram muito, 26,7% melhoraram pouco). Conclusão: Pacientes com DME apresentaram redução da intensidade da dor e melhora no efeito global percebido após um programa de Fisioterapia.

Palavras-chave: fisioterapia, dor crônica, dor musculoesquelética, intensidade de dor, efeito global percebido.

 

Abstract

The clinical improvement of the patient with musculoskeletal pain (MP) should be monitored together with the perception of the patient about the treatment effect, despite the lack of information on this subject. Objective: To analyze the influence of physiotherapeutic treatment on the pain reduction and global perceived effect in patients with MP. Methods: A retrospective observational analytic study was performed in 61 patients with MP that answered a question about their pain intensity and another question about the global perceived effect of the physical therapy treatment. The pain intensity measured after 10 months of follow-up was compared to the initial values. Results: Participants were predominantly female (83.3%) adults (mean age 59.6 years old). The mean pain intensity at the initial evaluation was 6.4 (± 2.7), with a mean of pain time of 20.3 months. The mean pain intensity after telephone contact was 4.37 (± 3.9). The analysis of the global perceived effect evidenced improvement in most of the participants (16.7% completely recovered, 39.7% much improved, 26.7% slightly improved). Conclusion: Patients with MP showed pain reduction and improvement on the global perceived effect after a Physiotherapy treatment.

Key-words: physical therapy, chronic pain, musculoskeletal pain, pain intensity, global perceived effect.

 

Introdução

 

A dor está presente em mais de 70% dos pacientes que buscam os consultórios brasileiros por motivos diversos [1]. Apesar de a dor ser um problema de saúde mundial, a avaliação, tratamento e prevenção ainda representam desafios na prática clínica. As intervenções fisioterapêuticas têm demonstrado um importante papel no tratamento de pacientes com dor musculoesquelética (DME) [2,3]. Além disso, a DME é a apresentação mais frequente na prática clínica do fisioterapeuta [4]. A avaliação e gerenciamento clínico da dor e de disfunções de movimento vêm sendo ampliados no âmbito clínico recentemente, se apresentando como uma prática diferente do modelo biomédico, que busca investigar possíveis danos estruturais no sistema musculoesquelético (por exemplo: artroses, tendinopatias, bursites, lesões discais) [5].

O exercício físico, a terapia manual, as intervenções psicossociais e o tratamento farmacológico são utilizados no tratamento das DME [6]. A atividade física regular combate diversos fatores de risco relacionados à DME, além de atuar diretamente na redução da intensidade da dor. Diversos estudos já evidenciaram a efetividade de um programa de atividade física regular na população com DME como: dor lombar crônica [7], fibromialgia [8], cefaleia e dor cervical crônica [9]. Murphy et al. [10] demonstraram redução da intensidade da dor, melhora da função física e psicossocial com um programa de exercícios e educação para pacientes com dor lombar crônica.

Além do exercício físico e da educação em dor, pacientes com DME se beneficiam com a utilização da terapia manual. As técnicas de terapia manual desencadeiam efeitos neurofisiológicos que contribuem para alívio da dor [11], além de apresentar um menor custo comparado a outros tratamentos para DME [12]. A combinação de mobilizações e manipulações articulares com exercícios físicos apresenta evidência moderada para o tratamento das desordens na coluna, manguito rotador e cefaleia cervicogênica [13]. Com isso, o tratamento dos pacientes com DME deve compreender uma combinação de técnicas manuais, exercícios e gerenciamento de fatores agravantes da dor.

Na prática clínica, a mensuração dos aspectos relacionados à dor pode ser realizada por instrumentos específicos multidimensionais ou por ferramentas globais voltadas para percepção do indivíduo quanto ao seu estado de saúde geral. Os instrumentos de medida que se baseiam nas perspectivas dos pacientes para avaliar o resultado do tratamento, sintomas, grau de incapacidade, qualidade de vida associada à condição de saúde e satisfação, são denominados patient-related outcome (PRO). Estes trazem informações das condições de saúde ou variáveis a elas associadas pela ótica do paciente, sem interferência direta do profissional de saúde responsável pelo caso [14]. Tais instrumentos de medida apresentam grande utilidade e vêm ganhando relevância juntamente com os debates voltados para o cuidado centrado no paciente, que é uma das dimensões para se alcançar qualidade nos serviços de saúde [15,16].

Assim, os resultados de diversas abordagens fisioterapêuticas multimodais podem ser medidos por meio de instrumentos clínicos que buscam captar as percepções de melhora ou piora sob a ótica dos pacientes e não apenas do terapeuta [14,17]. Desta forma, o objetivo do presente estudo foi analisar a influência do tratamento fisioterápico multimodal na redução da intensidade da dor e no efeito global percebido em pacientes com dores musculoesqueléticas.

 

Material e métodos

 

Tipo de estudo e participantes

 

Trata-se de um estudo observacional retrospectivo de pacientes com dores musculoesqueléticas do ambulatório de fisioterapia do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle (HUGG) que foram atendidos no período de outubro de 2013 e maio de 2014. Todos os pacientes realizaram uma combinação de técnicas de terapia manual, exercícios terapêuticos e orientações sobre a DME. O tratamento foi individualizado de acordo com o julgamento do fisioterapeuta. O ambulatório do Hospital garante atendimento em diversas especialidades da fisioterapia e possui grande volume de atendimento dentro da rede SUS, estando entre os 10 serviços ambulatoriais do município do Rio de Janeiro com maior número anual de procedimentos [18]. O critério adotado para contato era ter tido alta fisioterapêutica registrada no período citado acima. Assim, dentre os 148 pacientes que possuíam registro de alta no período da coleta, 61 foram escolhidos aletoriamente. Não houve distinção de sexo, idade, ou condição de saúde. O referido estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HUGG (CAAE: 14974713.2.0000.5258) e todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

Procedimentos

 

Uma fisioterapeuta com dois anos de experiência em reabilitação musculoesquelética contatou por telefone os 61 pacientes com alta fisioterapêutica selecionados aleatoriamente após 6 meses da alta do tratamento fisioterápico. Após três tentativas sem sucesso de entrevista, o paciente era excluído do estudo. Os pacientes selecionados foram solicitados a responder questões relacionadas à: 1) intensidade de dor e 2) o efeito global percebido do tratamento fisioterápico. A entrevista durava em média 3 minutos, desde a identificação do profissional até as respostas dos pacientes. Outros dados dos pacientes foram registrados a partir do prontuário, tais como idade, predomínio da dor musculoesquelética baseado em seu mecanismo (nociceptiva, neuropática periférica e sensibilização central), presença de doenças crônicas e hábito de prática de atividade física. Os critérios clínicos utilizados pelo estudo para definição do predomínio da dor musculoesquelética baseado em seu mecanismo foram descritos no estudo de Smart et al. [19], o qual classifica o predomínio da dor em nociceptiva, neuropática periférica e sensibilização central, a partir de características de dor e do exame físico realizado.

Considerou-se como dor nociceptiva a presença de três sintomas: dor intermitente e associada ao movimento com provocação mecânica, localizada na área da lesão ou disfunção e natureza clara e proporcional a fatores agravantes; juntamente com a ausência de três sintomas: dor em queimação, dor associada à disestesias e dor noturna, e padrões de movimentos antálgicos. A dor neuropática periférica inclui característica de: histórico de lesão nervosa, dor referida em dermátomo e provocação dolorosa com testes de movimento. A sensibilização central apresenta três características principais: dor desproporcional a extensão da lesão, padrão desproporcional, não-mecânico e imprevisível de provocação de dor em resposta a fatores agravantes, e forte associação a fatores psicossociais com áreas difusas de dor.

 

Instrumentos de medida

 

A intensidade de dor foi avaliada pela Escala Numérica de Dor, que possui valores variando de zero (ausência de dor) a dez (pior dor imaginável). Assim, para avaliação do quadro álgico, foi realizada uma pergunta aos pacientes da seguinte forma: Qual é a sua intensidade de dor no momento, considerando zero ausência de dor e dez a pior dor possível? Os pacientes escolheram o valor numérico que melhor identificou sua intensidade dolorosa no momento para o motivo pelo qual procurou tratamento fisioterápico. A intensidade da dor foi classificada em leve (≤4 / 10), moderada (5 a 7/10) e grave (8 a 10/10) [20]. A melhora da intensidade da dor foi calculada utilizando a seguinte equação: (VI-VF/VF) * 100, onde VI é o valor inicial e VF é o valor final da intensidade da dor.

O efeito global percebido (EGP) avalia o paciente quanto à modificação da sua condição clínica desde algum tempo pré-definido em uma escala numérica ou em opções alternativas. A escala de EGP tem várias qualidades que a tornam uma ferramenta atraente para uso na prática clínica e da investigação por ser elaborada a partir de uma única pergunta, ser de fácil compreensão e rápido de administrar, além de os resultados serem simples de interpretar [21]. O EGP foi avaliado por meio de uma pergunta direta, referente à condição de saúde do paciente: "Até que ponto sua queixa mudou quando comparado com a situação antes do tratamento?", com 7 opções de resposta: a) Completamente recuperado; b) Melhorou muito; c) Melhorou pouco; d) Não mudou; e) Piorou ligeiramente; f) Piorou muito; g) Pior do que nunca.

 

Análise estatística

 

As características da população do estudo foram descritas por média e desvio padrão para as variáveis numéricas e em valores absolutos e percentuais para as variáveis categóricas. A comparação entre os pacientes incluídos e as perdas foi realizada utilizando o teste-t não pareado para variáveis contínuas e o teste do qui-quadrado para as variáveis categóricas. A distribuição dos dados de cada variável de desfecho (intensidade de dor e efeito global percebido) foi verificada através do teste Shapiro-Wilk. A comparação entre o valor inicial da intensidade da dor e o valor da intensidade da dor no período de acompanhamento foi realizada pelo teste Wilcoxon signed rank devido à natureza não paramétrica dos dados. A frequência de classificação do EGP está apresentada graficamente. A análise de correlação entre a melhora da intensidade da dor e o EGP foi realizada utilizando o método de Spearman, devido à distribuição não-paramétrica dos dados. A força da correlação entre as variáveis foi estabelecida da seguinte forma: a correlação acima de 0,90 foi interpretada como muito alta, entre 0,70 e 0,89 como alta, entre 0,50 e 0,69 como moderada, entre 0,30 e 0,49 baixa e abaixo de 0,29 como discreta. Foi considerado o valor de significância menor que 5% (p<0,05). Os dados foram armazenados em arquivo eletrônico utilizando Microsoft Excel e processados no Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) (versão 22). Os gráficos foram realizados utilizando o software GraphPad Prism (versão X7.Oa, San Diego, CA, USA).

 

Resultados

 

Dentre os 148 participantes disponíveis, 61 foram selecionados aleatoriamente. Contudo, 17 não foram localizados (com pelo menos 3 tentativas de contato) e 13 pacientes retornaram ao atendimento por conta de recidivas. Um total de 30 participantes foi perdido para a avaliação do período de acompanhamento. Foram incluídos 31 participantes. A figura 1 apresenta o fluxograma de indivíduos inseridos no estudo. Os registros clínicos dos 61 possíveis participantes evidenciaram uma média de idade de 57,7 (±16,3) anos, com predominância do sexo feminino (75%). A intensidade média da dor foi de 5,8 (±2,8), com média de tempo de dor de 32,3 (±61,5) meses. A mediana de atendimentos foi de 11 sessões, com duração total do programa de tratamento apresentando mediana de 79 dias. Do total destes participantes, 41% praticavam atividades físicas regularmente, 11,5% eram portadores de diabetes mellitus e 26,2% relataram possuir alguma disfunção hormonal. Quanto ao tipo de dor, 49,2% apresentaram predomínio de dor nociceptiva, 19,7% apresentaram predomínio dor neuropática periférica e 16,4% apresentam características de sensibilização central. Ao observarmos o motivo de alta, foi encontrado que 55,7% obtiveram alta por melhora, 34,4% por abandono do tratamento, 4,9% a pedido do paciente, 3,3% por motivos pessoais e 1,6% sem melhora com a intervenção. A Figura 1 ilustra o fluxograma do estudo.

 

 

Figura 1 - Fluxograma de pacientes incluídos no estudo.

 

Dentre os 31 pacientes incluídos, a predominância foi do sexo feminino (83,3%), com média de 59,6 (±13,7) anos. A média da intensidade de dor antes do primeiro atendimento foi de 6,37 (±2,66) e a média do tempo de dor foi de 20,3 meses. A mediana de atendimento nesse grupo foi de 11 sessões com uma mediana de tempo de atendimento de 91 dias e uma mediana de período de acompanhamento de 295 dias entre a alta do tratamento fisioterápico e o contato telefônico. O motivo da alta foi dividido em “melhora da queixa” com 56,7%, em abandono do tratamento 26,7%, “motivos pessoais” 6,7%, “a pedido do paciente” 6,7% e “sem melhoras” 3,3%. A tabela I apresenta as características clínicas da população avaliada no início do estudo, dos pacientes incluídos na avaliação de acompanhamento e também das perdas.

A média de intensidade de dor no momento do contato telefônico foi 4,37 (±3,9), sendo que 36,7% dos participantes estavam assintomáticos, 13,3% apresentavam dor leve (intensidade de dor até 4), 13,3% apresentavam dor moderada (5 a 6) e 36,7% apresentavam dor grave (7 a 10).

 

Tabela I - Características clínicas e demográficas dos participantes do estudo.

 

Os dados estão apresentados como média (DP) para as variáveis contínuas e como frequência (%) para as variáveis categóricas. Diferenças significativas entre os pacientes incluídos e as perdas foram testadas utilizando o Teste-t não pareado para variáveis contínuas e o teste do Qui-quadrado para as variáveis categóricas.

 

Ao compararmos as médias das variáveis clínicas observadas nos prontuários dos indivíduos contatados via telefone com as médias daqueles excluídos (sem entrevista efetiva), não foram encontrados valores estatisticamente significativos (p>0,05), mostrando, assim, que a população inserida para análise tinha um perfil clínico semelhante aos indivíduos excluídos.

O teste de Wilcoxon signed-rank indicou que a mediana da intensidade da dor no período de acompanhamento (mediana = 7; intervalo interquartil = 3) foi significativamente menor do que a mediana dos valores iniciais (mediana = 5; intervalo interquartil = 8; Z = -2,018, p < 0,044) (Figura 2).

 

 

Figura 2 - Comparação da intensidade da dor medida na avaliação inicial e no período de acompanhamento em pacientes com dores musculoesqueléticas submetidos ao tratamento fisioterápico (n=31).

 

Nota: Os dados estão apresentados em média e erro padrão da média.

 

A avaliação do efeito global percebido evidenciou que 81% dos participantes apresentavam uma percepção de melhora após o tratamento fisioterápico. A frequência de classificação do efeito global percebido está descrita na figura 3.

 

 

Figura 3 - Avaliação do efeito global percebido no período de acompanhamento de pacientes com dores musculoesqueléticas submetidos ao tratamento fisioterápico (n=31).

 

A melhora da intensidade da dor se correlacionou de forma moderada e negativa com o efeito global percebido (Rho= -0,548; p=0,002). Portanto, quanto maior a melhora da dor, melhor foi o relato do paciente sobre o efeito global percebido da intervenção.

 

Discussão

 

O tratamento fisioterápico multimodal proporcionou uma redução da intensidade de dor, mantida por 10 meses após a intervenção e a grande maioria dos pacientes com dores musculoesqueléticas percebeu melhora no seu estado global. A magnitude da redução da dor esteve relacionada com a percepção de melhora do paciente. Apesar da menor intensidade de dor no período de acompanhamento, os participantes descreveram estar com dor moderada a qual não influenciou na percepção de melhora uma vez que essa classificação foi positiva. Embora o efeito global percebido tenha sido positivamente avaliado, outros fatores podem interferir nesse desfecho como a relação terapeuta-paciente, um atendimento humanizado, expectativa do paciente e fatores sociais.

A maioria dos participantes (81%) relatou melhora da dor musculoesquelética após a intervenção de acordo com a escala de EGP. Estudar a percepção do resultado do tratamento pela ótica do paciente desempenha um importante papel para o processo de alta fisioterapêutica e consequentemente sucesso no tratamento. O “resultado do tratamento” foi identificado como principal fator preditivo da satisfação dos pacientes com o tratamento, seguido pelo “comportamento dos profissionais” [22]. Neste sentido, a associação encontrada entre melhora da dor e melhora efeito global percebido pelo paciente deve ser destacado como um relevante achado para o gerenciamento clínico de pacientes no campo da fisioterapia.

A redução da intensidade da dor é um dos objetivos principais do Fisioterapeuta no tratamento dos pacientes com dores musculoesqueléticas. Além disso, a redução da intensidade da dor observada no presente estudo está consonante com as recomendações atuais de utilização de abordagem multimodal (incluindo terapia manual, exercícios e educação em dor) no tratamento de pacientes com dores musculoesqueléticas [6]. O presente estudo optou por avaliar pacientes submetidos a abordagens fisioterapêuticas multimodais e não comparar a efetividade clínica de técnicas específicas de maneira isolada. A utilização da abordagem multimodal no tratamento das dores musculoesqueléticas é capaz de gerar modificações funcionais e estruturais no córtex cerebral [2,3,23].

A observação do perfil clínico, do padrão álgico e a abordagem terapêutica multimodal são aspectos fundamentais para o gerenciamento clínico de pacientes com dores musculoesqueléticas [6,24]. Kaiser et al. [25] realizaram um estudo Delphi que apontou alguns domínios relevantes a serem avaliados como medidas de efetividade de tratamento multimodal, especificamente para pacientes com dor crônica, tais como: intensidade e frequência da dor, atividade física e percepções dos pacientes quanto aos objetivos alcançados com o tratamento. Tais achados ratificam a relevância clínica do presente estudo, que utilizou de ferramentas semelhantes às sugeridas pela literatura para avaliar os resultados das abordagens fisioterapêuticas em pacientes com dores musculoesqueléticas.

A abordagem centrada no paciente vem sendo preconizada nos estudos clínicos. Sendo assim, medidas da autopercepção do paciente sobre o nível de dor, fadiga, estresse, depressão, ansiedade, sono e autoavaliação global do estado de saúde devem ser utilizadas como medidas de desfecho clínico [17]. Estas abordagens refletem a preocupação dos clínicos quanto à percepção dos pacientes frente aos resultados dos seus tratamentos e a tentativa de compartilhar com os próprios pacientes o gerenciamento clínico das condições de saúde que os cercam. Contudo, o grau de envolvimento dos pacientes e dos fisioterapeutas pode interferir na percepção dos pacientes. Baker et al. [26] relatam que indivíduos que possuem alto grau de envolvimento com o serviço ou seu terapeuta tendem a atribuir valores elevados quando julgam qualidade do cuidado. O fato de este estudo ter realizado as entrevistas via contato telefônico, por um fisioterapeuta que não conhecia o profissional que realizou os atendimentos, possivelmente possa ter atenuado o grau de constrangimento dos pacientes perante o relato de melhora, diminuindo assim o fenômeno de superestimação da melhora percebida.

O presente estudo apresenta algumas limitações. Houve uma considerável perda dos participantes selecionados devido a não localização para contato telefônico ou retorno ao atendimento fisioterápico. Contudo, com a identificação das características da amostra foi possível observar que a amostra avaliada foi representativa da população selecionada inicialmente. Outra limitação observada foi de que o estudo foi realizado em um único centro. A generalização dos principais achados do presente estudo deve ser feita com cautela devido à falta de um grupo de comparação na intervenção para eliminar a possibilidade de melhora clínica decorrente da história natural ou efeito placebo. Além disso, a validade externa dos resultados pode ser afetada devido ao recrutamento dos pacientes ter ocorrido em um único centro. Com isso, futuros estudos podem avaliar o efeito global percebido em diferentes setores e modalidades de fisioterapia.

 

Conclusão

 

Os pacientes com dores musculoesqueléticas que fizeram fisioterapia apresentaram redução da intensidade da dor após um intervalo de 10 meses. A análise do efeito global percebido evidenciou um alto grau de melhora nos participantes do estudo. O grau de redução da dor interferiu na percepção de melhora do paciente.

 

 

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