ARTIGO
ORIGINAL
Avaliação
das tarefas de equilíbrio do teste KTK associado a fatores antropométricos em
escolares de 8 anos de idade
Evaluation of test balance tasks KTK associated with anthropometric
factors in 8 years old school children
Ana Paula Aguiar*, Monalisa da Silva Reis. M.Sc.**, Tailine Lisboa***,
Renata Capistrano***, Juliano Maestri Alexandre****,
Thais Silva Beltrame*****
*Graduanda
em Educação Física, Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), **UDESC,
***Doutoranda em Ciências do Movimento Humano, UDESC, ****Doutorando em
Ciências do Movimento Humano UDESC, *****Docente na UDESC
Recebido em 2 de julho de 2017; aceito em 21 de fevereiro de 2018.
Endereço
para correspondência:
Monalisa da Silva Reis, Rua Bento Brasil, 69063-430
Manaus AM, E-mail: monalisareis-bassal@hotmail.com; Ana Pula Aguiar:
ana_aguiar2007@hotmail.com; Tailine Lisboa:
tai-lisboa@hotmail.com; Renata Capistrano: recapis@gmail.com; Juliano Maestri Alexandre: julianom.alexandre@gmail.com; Thais
Silva Beltrame: tsbeltrame@gmail.com
Resumo
Introdução: O equilíbrio
corporal é fundamental no processo de desenvolvimento da criança, pois é a base
para todos os movimentos corporais. No entanto, sofre influência de vários
fatores antropométricos importantes para sua manutenção. Objetivo: Avaliar as tarefas de equilíbrio do teste Korperkoordinationstest fur Kinder (KTK) associado a fatores antropométricos em
escolares de 8 anos de idade. Métodos: Participaram do estudo 284 escolares de ambos os sexos,
matriculados em escolas públicas do Município de São José/SC. Para a avaliação
do equilíbrio, foi utilizada bateria KTK. E para os fatores antropométricos,
calculou-se o IMC e verificou-se o tipo de pé por meio do pedígrafo
marca (PODO Tech). Resultados:
Observou-se que escolares do sexo masculino apresentaram 72% de chances de
terem dificuldade na tarefa de equilíbrio, assim como escolares com excesso de
peso 94%. Na tarefa salto monopedais foi encontrada
associação apenas com IMC. Conclusão:
Crianças com pés planos, com sobrepeso e do sexo masculino possuem mais chances
de insuficiência/perturbação de coordenação na tarefa da trave de equilíbrio.
Palavras-chave: equilíbrio
postural, criança, pé, índice de massa corporal.
Abstract
Introduction: Body balance is critical in child development process; it is the basis
for all body movements. However, it is influenced by several important
anthropometric factors for its maintenance. Objective:
To evaluate the test balance tasks Korperkoordinationstest
fur Kinder (KTK) associated with anthropometric factors in school 8 years
old. Methods: The study included 284
students of both sexes, enrolled in public schools in São José/SC. For the
assessment of the balance was used battery KTK. And for anthropometric factors,
BMI was calculated and foot type through pedigraph
(PODO Tech). Results: It was observed
that male students had 72% chances of having difficulty in balancing task, as
well as students with overweight 94% chance. In monopedais
jump task was found association only with BMI. Conclusion: Children with flat feet, overweight and males have more
chances of failure/disturbance of coordination in the balance beam task.
Key-words: postural
balance, child, foot, body mass index.
Manter o equilíbrio
parece ser uma tarefa simples, mas é na verdade uma habilidade complexa, pois
requer a sustentação do corpo sobre uma pequena base de apoio, representada
pelos pés [1-3]. Dessa forma, o equilíbrio corporal torna-se indispensável para
o ser humano, uma vez que tem a capacidade de estabilizar o próprio corpo em
diferentes condições estática e dinâmica, alinhando todos os segmentos
corporais contra a gravidade sem cair [4-6].
Durante a infância, o
equilíbrio corporal é fundamental para que a criança possa agir de forma
eficiente e desenvolver um maior repertório motor, no entanto sofre influência
de vários mecanismos sensoriais que ainda não estão completamente
desenvolvidos, importantes para a manutenção tanto em situação estática quanto
dinâmica [4]. Além disso, a infância é marcada por intensas mudanças
antropométricas, tornando-se os movimentos corporais um comportamento complexo
que envolve todo o corpo [7], por isso é importante que se realize uma
avaliação do equilíbrio corporal, para que se tenha uma melhor resposta em relação
às demandas de atividades de vida diárias [8].
Desse modo, estudos
sobre o equilíbrio corporal em crianças vêm sendo objeto de investigação por
vários estudiosos, na qual buscam associar fatores que possam influenciar tal
variável, como o tipo de pé e a massa corporal [9,10]. Esses fatores
antropométricos sofrem mudanças nas suas características durante toda a vida
[11], o que faz com que a manutenção do equilíbrio corporal seja adaptada a
essas modificações [12].
O tipo de pé poderá
influenciar no equilíbrio corporal [12]. Isso pode ser explicado, devido aos
pés se adaptarem a uma postura ereta, para dar equilíbrio e sustentação aos
demais segmentos corporais [2]. Estudos analisados constataram que o equilíbrio
corporal é prejudicado quando a base de apoio é menor [12,13], quando a
estatura e comprimento dos membros inferiores são maiores, e ainda quando há um
aumento da massa corporal [10,12], correspondendo, ambos, por 84% da variação
do equilíbrio [10].
Quando as crianças se
encontram com um índice de massa corporal (IMC), acima do adequado para a sua
idade e estatura, são consideradas com sobrepeso ou obesidade [11], e seu
equilíbrio corporal são prejudicados devido a poucas vivências corporais e as
modificações físicas do corpo [9]. Sucedendo a uma alteração do centro de
gravidade e sobrecarga mecânica sobre os membros inferiores, principalmente os
pés que sofrem variações na sua estrutura, como a diminuição do arco plantar
[14].
As alterações
antropométricas decorrentes nas crianças influenciam o modo de como elas agem
no ambiente [7]. Desse modo, a estratégia locomotora que normalmente é
utilizada modifica-se, o que faz com que o equilíbrio seja uma variável
importante no controle motor [15]. Sendo relevante para a promoção dos
movimentos corporais, no qual a criança interage e atua de forma dinâmica no
ambiente [16]. Tornando-se assim a base essencial de toda a ação diferenciada
dos segmentos corporais [17].
Tendo em vista a
influência dos fatores antropométricos no equilíbrio corporal e a necessidade
de mais estudos que investiguem essas variáveis, o presente estudo objetivou
avaliar as tarefas de equilíbrio do teste Korperkoordinationstest
fur Kinder (KTK) associado
a fatores antropométricos em escolares de 8 anos de idade.
Trata-se de um estudo
descritivo transversal, realizado na cidade de São José/SC, por profissionais
de educação física, no período de setembro a dezembro de 2015.
O estudo é parte do
projeto de pesquisa intitulado “Avaliação das tarefas de equilíbrio corporal
associado a fatores antropométricos em crianças”. Aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa da UDESC, sob número 1.111.625.
A amostra foi
composta por 284 escolares de ambos os sexos, com 8
anos de idade, matriculados no ensino fundamental I, em duas escolas públicas
do Município de São José/SC. Os participantes deste estudo foram selecionados
de forma intencional.
Foram selecionados os
escolares cujos pais e/ou responsáveis autorizaram a participação por meio do
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), escolares que não
apresentassem algum tipo de comprometimento motor, bem como a disposição em
participar das atividades.
Para a avaliação das
tarefas de equilíbrio, foi utilizado o teste Korperkoordinationstest fur Kinder (KTK).
O KTK é um
instrumento composto por quatro tarefas (Traves de equilíbrio, saltos monopedais, saltos laterais e transferência sobre
plataformas) utilizadas para avaliar a coordenação corporal de crianças com
idades entre 5 e 14 anos. Para o presente estudo foram
utilizadas as tarefas trave de equilíbrio e saltos monopedais
[18].
A tarefa trave de
equilíbrio consiste em caminhar de costas sobre três traves com espessuras
diferentes, em três tentativas para cada. Durante a execução, conta-se a
quantidade de apoio (passos), obtendo 72 pontos no máximo.
O salto monopedal consiste em saltar com um único pé, primeiramente
com o preferido e depois com o não preferido, por cima de placas de espuma,
sobrepostas transversalmente à direção do salto, colocadas à medida que o
sujeito obteve êxito e atribuídos de 0 a 3 pontos decorrentes do sucesso nas
tentativas.
O resultado final,
para ambos as tarefas, representará o somatório de pontos conseguidos, que será
verificado na tabela de pontuação indicando o número de escore relacionado à
idade e sexo, obtendo o quociente motor (QM) do sujeito para cada tarefa, que
permite a classificação das tarefas de equilíbrio em cinco níveis: 99-100%
muito bom equilíbrio, 85-98% bom equilíbrio, 17-84% equilíbrio normal, 3-16%
insuficiência de equilíbrio e 0-2% perturbação no equilíbrio.
Para a identificação
do tipo de pé foi utilizado o pedígrafo marca PODO Tech.
Para a análise do tipo de pé foi utilizado o índice de Chippaux-Smirak
(ICS), que é o resultado da divisão entre a menor largura do médio pé e a maior
largura do antepé. Ele classifica em arco elevado
(ICS=0% pé cavo), morfologicamente normal (ISC entre 0,1 e 29,9%),
intermediário (entre 30,0 a 39,9%), rebaixado (entre 40,0 a 44,9%) e pé plano
(a partir de 45%) pés indicando arco intermediário também são classificados
como arco normal [19].
O peso corporal foi
mensurado por uma balança marca Tânita e a estatura
por um estadiômetro profissional Sanny.
Para cálculos do IMC = peso/estatura² e a determinação dos níveis de IMC
(normal e acima do peso) foram definidas segundo as recomendações citadas por
Cole et al. [20].
Foram realizadas
reuniões com a equipe pedagógica para exposição dos objetivos da pesquisa, bem
como para informação sobre os turnos disponibilizados pela escola para a coleta
de dados. As avaliações ocorreram em ambiente adequado e iluminado cedido pela
escola, com duração de 20 a 30 minutos. Os testes foram aplicados
individualmente sendo realizada, primeiramente, a antropometria dos pés seguida
de peso e altura e das traves de equilíbrio e saltos monopedais.
A identificação dos
participantes foi registrada por números, de modo a preservar os escolares e
atender aos princípios éticos, o retorno das informações à escola e aos alunos
(e seus responsáveis) aconteceu por meio de relatórios individuais e gerais,
nos quais foram descritos os objetivos do estudo, os resultados das avaliações
e sugestões.
Os dados foram
analisados no programa estatístico SPSS, versão 20.0, utilizando-se estatística
descritiva (distribuição de frequência). Para as análises estatísticas as
classificações das tarefas do equilíbrio foram agrupadas em (Coordenação
normal/boa e Insuficiência/ Perturbação de coordenação). A associação entre as
classificações das tarefas e as variáveis independentes (sexo, tipo de pé e
índice de massa corporal) foi analisada por meio do teste Qui-quadrado
e Exato de Fisher e regressão logística binária, com método enter, foi realizada análise
bruta para cada variável independente e posteriormente a análise ajustada por
todas as variáveis. Para todas as análises foi adotado o nível de significância
de p < 0,05.
Fizeram parte do
estudo 284 escolares, sendo 158 (55,6%) do sexo masculino e 126 (44,4%) do sexo
feminino.
Os dados descritivos
da tabela I apresentam que a maior parte dos escolares foi classificada com
coordenação normal para ambas as tarefas de equilíbrio. Ainda foi observada
maior frequência na classificação normal quanto ao tipo de pé e IMC.
Tabela
I - Descrição geral quanto à frequência de
classificação das tarefas de equilíbrio, tipo de pé e IMC.
Nas
associações entre
as tarefas de equilíbrio com sexo, IMC e tipo de pé
(Tabela II) foram
encontrados resultados significativos (p < 0,05) ao agrupar as
classificações em
Insuficiência/Perturbação de
Coordenação e Coordenação
Normal/ Boa, foi possível identificar resultados significantes
entre tarefa
trave de equilíbrio e sexo (0,041), associação com
o IMC (0,017) e tipo de pé
(0,014). Na tarefa saltos monopedais foi encontrada
associação apenas com IMC (0,014).
Tabela
II -
Associação das tarefas de equilíbrio com
tipo de pé, sexo e IMC.
*p-valor referente ao
teste Qui-quadrado
A Tabela III mostra
os resultados da regressão logística, quanto à tarefa caminhar sobre a trave em
relação ao sexo, IMC e tipo de pé. No modelo simples, foi possível verificar
associação entre todas as variáveis. Quanto ao modelo ajustado, constatou-se
que a dificuldade de caminhar sobre a trave manteve associação ao sexo e IMC,
mostrando que escolares do sexo masculino têm 1,72 chances de
insuficiência/perturbação e escolares acima do peso apresentam 1,94 chances de
desequilíbrio. Na tarefa saltos monopedais, não foi
realizada regressão, uma vez que não foi identificada associação
estatisticamente significativa com sexo e tipo de pé.
Tabela
III
- Razão de chance bruta e ajustada entre
insuficiência/perturbação de coordenação tarefa trave de equilíbrio com sexo,
IMC e tipo de pé.
*p-valor < 0,05; a
análise ajustada para todas as variáveis.
O presente estudo
teve como objetivo avaliar as tarefas de equilíbrio da bateria Korperkoordinationstest fur Kinder (KTK) associado a fatores antropométricos em
escolares de 8 anos de idade. Para ambas as tarefas
foi indentificada maior frequência entre a
classificação coordenação normal e boa, sendo 54,93% na trave de equilibrio e 71,1% no salto monopedal.
Corroborando estudo feito por Carminato [21] no qual
avaliou o desempenho motor de escolares de 7 a 10 anos de idade de ambos os
sexos, identificando que em ambas as tarefas houve elevado percentual para
classificação coordenação normal e boa, tais resultados podem ser justificados
devido aos escolares estarem em estágio de transição do desenvolvimento, na
qual as habilidades motoras fundamentais são refinadas, recebendo estímulos de
outros sistemas sensoriais (visuais, propioceptores e
vestibulares para o controle de uma postura madura [4,22,23].
Entre os sexos apenas
os resultados da tarefa trave de equilíbrio apresentou associação
estatisticamente significativa (0,041); os meninos apresentaram 1,72 chances de
ter Insuficiência/perturbação de coordenação na tarefa quando comparado ao sexo
feminino, independente do tipo de pé e do IMC. Os resultados se assemelham aos
estudos realizados por Gomes [24], Matos et al. [25], Carminato [21], nos quais as meninas alcançaram melhores
resultados na tarefa da trave de equilíbrio quando comparado aos meninos, assim
como no estudo realizado com 4007 crianças peruanas, entre 6 e 11 anos de idade
[26].
Isso é explicado
devido às meninas iniciarem o processo de desenvolvimento e maturação antes dos
meninos, apontando níveis motores superiores, principalmente em atividades que
exigem equilíbrio, até por volta dos 8 anos [4,27,28].
A classificação da
tarefa da trave de equilíbrio também apresentou associação estaticamente
significativa com o tipo de pé (0,011). As crianças com pés planos têm 1,88
chance de ter insuficiência/perturbação na tarefa quando comparado ao pé
normal. Os pés distribuem forças de reação, absorvem pressões e intermediam
ajustes posturais, representando estruturas fundamentais que fazem parte do
sistema somatossensorial que dá condições de
equilíbrio, uma vez que pequenas alterações na estrutura dos pés podem
influenciar nas estratégias de controle postural [29,30].
No entanto, na
análise ajustada por sexo e IMC, não foi identificada associação entre
insuficiência/ perturbação de coordenação na tarefa trave de equilíbrio e tipo
de pé apontando que o sexo e IMC tendem a ter mais influência no equilíbrio que
o tipo de pé. Porém, Alonso et al. [9], em uma
revisão sistemática sobre fatores antropométricos que interferem no equilíbrio
postural, concluíram que a característica do pé influencia no equilíbrio
postural, mas não se sabe precisamente quais são elas e que alterações
estruturais pioram o desempenho do equilíbrio de diferentes formas. Além disso,
o excesso de peso ocasiona maiores sobrecargas acrescendo o risco de lesões,
provocando maior ajuste postural, diminuindo a estabilidade [31-35].
Na tarefa de saltos monopedais foi identificada associação apenas com a
variável IMC, apontando que os participantes acima do peso apresentaram maior
frequência de insuficiência/ perturbação de equilíbrio. Para a realização dessa
tarefa é exigido o deslocamento do centro de gravidade de forma equilibrada
podendo prejudicar crianças que estão acima do peso [36]. Corroborando esse achado,
Lopes e Maia [37] e Luiz et al. [35] verificaram redução em todas
as provas do KTK, principalmente na tarefa dos saltos monopedais,
em crianças com o IMC elevado. Estudos como de Graf et al. [38]; Beleze et al. [39]; Valdivia et al. [26]; Pelozin
et al. [40]; Carminato
[21]; Poeta et al. [41]; Paulo [22]
mostram uma associação negativa entre coordenação motora e índice de massa
corporal. Esses resultados podem ser justificados pelo fato de as crianças com
um IMC elevado se envolverem menos na prática de atividades físicas, gerando
dessa forma hábitos de vida sedentários, contribuindo pouco para suas
experiências motoras e consequentemente para níveis de desempenho motor
reduzidos [19,20,34].
As limitações
encontradas no presente estudo foram a ausência de
investigar a maturação biológica, hábitos de vida e atividades
extracurriculares praticadas pelos escolares, as quais podem interferir no
equilíbrio postural. Ressalta-se, ainda, que essas limitações necessitam ser
consideradas em estudos futuros.
Conclusão
O estudo apontou que
a maioria dos escolares foi classificada com coordenação normal e boa em
relação às tarefas de equilíbrio da bateria KTK. Na tarefa trave de equilíbrio
a chance de insuficiência/perturbação de coordenação é maior no sexo masculino,
nos classificados com pé plano e com sobrepeso, quando comparados a seus
opostos.
Referências