ARTIGO ORIGINAL

Efeitos do ultrassom de alta potência (ultracavitação) em seroma encapsulado

Effects of high-power ultrasound (ultracavitation) on encapsulated seroma

 

Rodrigo Marcel Valentim da Silva, Ft., M.Sc.*, Amanda Caroline Muñoz Costa, Ft.**, Leila Simone Medeiros Figueirêdo, Ft.**, Natiele Pereira Cavalcante, Ft.**, Patrícia Froes Meyer, Ft., D.Sc.***

 

*Docente do Curso de Fisioterapia da Faculdade Maurício de Nassau, Natal/RN, **Universidade Potiguar, ***Docente da Universidade Potiguar (UnP)

 

Recebido em 2 de fevereiro de 2017; aceito em 12 de dezembro de 2017.

Endereço para correspondência: Rodrigo Marcel Valentim da Silva, Rua Nossa Senhora de Fátima, 312b, Alecrim, 59030080 Natal RN, E-mail: marcelvalentim@hotmail.com; Patrícia Froes Meyer: patricia.froesmeyer@gmail.com; Natiele Pereira Cavalcante: natielecavalcantefisio@gmail.com; Amanda Caroline Muñoz Costa: munozamanda@gmail.com; Leila Simone Medeiros Figueirêdo: leilamedeirosfisio@gmail.com

 

Resumo

Introdução: O seroma consiste em uma coleção líquida de características exudativas geralmente formado logo após cirurgias plásticas, devido ao espaço morto e acúmulo de líquido na região submetida ao procedimento cirúrgico. A alta concentração de energia fornecida pela ultracavitação favorece uma ruptura dos envoltórios de fibrose na região do seroma, bem como promovem a absorção e emulsão do líquido existente. Objetivo: Avaliar os efeitos da ultracavitação em pacientes com seroma encapsulado. Material e métodos: Trata-se de um estudo quase experimental. Cinco voluntários com diagnóstico de seroma foram submetidos ao tratamento de ultracavitação durante 7,5 minutos por ERA, potência de 30 Watts, 50% da potência emitida. A avaliação foi realizada através do exame de ultrassonografia, realizado antes e após o tratamento. Foram realizadas quatro sessões, sendo uma por semana. Resultados: Em todos os pacientes deste estudo foi verificada qualitativamente e quantitativamente uma redução do seroma encapsulado após o tratamento com a ultracavitação. Conclusão: A ultracavitação diminuiu as áreas de seroma encapsulado, constituindo uma possibilidade de tratamento não invasivo.

Palavras-chave: complicações pós-operatórias, cirurgia plástica, Fisioterapia, terapêutica.

 

Abstract

Introduction: Seroma consists of a net collection of exudative features usually formed soon after plastic surgeries, due to the dead space and the accumulation of fluid in the region submitted to the surgical procedure. The high concentration of energy provided by ultracavitation favors a rupture of the fibrous sheaths in the seroma region, as well as promotes the absorption and emulsion of the existing liquid. Objective: To evaluate the effects of ultracavitation in patients with encapsulated seroma. Methods: This is a quasi-experimental study. Five volunteers diagnosed with seroma were submitted to ultracavitation for 7.5 minutes per ARR, 30 Watts power, 50% of emitted power. The evaluation was performed through ultrasonography (US), performed before and after treatment. Four sessions were held, one per week. Results: A reduction of the encapsulated seroma after treatment with ultracavitation was verified qualitatively and quantitatively in all patients in this study. Conclusion: Ultracavitation reduced the areas of encapsulated seroma, constituting a possibility of non-invasive treatment.

Key-words: postoperative complications, surgery plastic, Physical Therapy, therapeutics.

 

Introdução

 

O seroma consiste em uma coleção líquida de características exudativas geralmente formado logo após cirurgias plásticas, devido ao espaço morto e o acúmulo de líquido na região submetida ao procedimento cirúrgico [1]. A ocorrência do seroma é determinada por vários fatores, como: tipo e tempo de cirurgia, uso ou não de dreno, repouso, uso de cintas após a cirurgia, entre outros. O excesso de líquido no seroma pode levar a um aumento de pressão local, podendo ocasionar o aparecimento de necroses, infecções, deiscências, e até um aspecto antiestético. A manutenção do seroma pode provocar o surgimento de uma cápsula fibrosa ao seu redor, o que causa um processo de contração e que deforma a região [2,3].

A fisioterapia têm utilizado diferentes recursos para promoção do tratamento do seroma. Dentre esses, destacamos o uso do ultrassom, em uma modalidade conhecida como ultracavitação, a qual consiste em um ultrassom de alta potência. Sugere-se que as ondas mecânicas com o ultrassom de alta intensidade geram um efeito de cavitação instável, promovendo a implosão de células ao redor [4-6]. O mecanismo que sugere o uso de ultracavitação no tratamento de seromas está baseado no efeito tixotrópico. Nesse caso, o conteúdo do seroma trata-se de um gel que necessita ser absorvido e através deste efeito tixotrópico provavelmente obtém-se esta ação. O uso de terapias com ultracavitação tem encontrado referência para a redução da viscosidade e de liquefação de géis, seu efeito inicial inclui a formação eficiente de emulsões que combinam as propriedades mecânicas de cavitação acústica com mecanismos de dispersão e de coagulação [7].

A alta concentração de energia fornecida pela ultracavitação favorece uma ruptura dos envoltórios de fibrose na região do seroma, bem como promovem a absorção e emulsão do líquido existente [8,9]. Existe uma carência de pesquisas que discorram sobre outros efeitos da ultracavitação e sua aplicabilidade em pacientes com seroma encapsulado após cirurgia plástica. Diante do exposto o objetivo deste estudo é avaliar os efeitos da ultracavitação em pacientes com seroma encapsulado.

 

Material e métodos

 

Trata-se de estudo quase-experimental, realizado na Clínica Biofisio, Natal/RN. Os voluntários foram convidados a participar voluntariamente do estudo, e foram incluídos aqueles que aceitaram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Potiguar, UnP, com parecer de número 228/2010.

Foram avaliados cinco pacientes, que deveriam ter sido submetidos a uma intervenção cirúrgica plástica de abdominoplastia associada com lipoaspiração e apresentaram como complicação seroma encapsulado devidamente diagnosticado por ultrassonografia. Foram excluídos os voluntários portadores de qualquer tipo de doença hepática (contraindicado para uso da ultracavitação) ou não comparecimento às avaliações e ao tratamento em todas as datas agendadas.

Inicialmente, todos os voluntários foram avaliados através do Protocolo de Avaliação dos Níveis de Fibrose Cicatricial (PANFIC), no qual se avalia o nível de fibrose dos indivíduos e seu estado de pós-operatório. Após esta avaliação, foi realizada a ultrassonografia (US) na Clínica Serviço de Imagem Potiguar – SIP. O aparelho utilizado foi da marca Medison Accuvix V 10 com transdutor linear, eletromultifrequencial - variando de 6 a 12 Hz, para mensuração do tecido adiposo e dos septos fibrosos. Foi realizada a US antes e após a aplicação da ultracavitação.

Esse exame permitiu medir a distância entre a pele e a gordura e entre a gordura e o músculo por meio de ondas sonoras que são transmitidas através do tecido. Para assegurar a otimização da energia ultrassônica, os pacientes foram posicionados de acordo com as recomendações do fabricante.  Delimitou-se a área a ser investigada com o paciente em postura ortostática. A área demarcada foi de 10 cm2, na região abdominal, em que se verificava a presença do seroma. O transdutor foi posicionado de forma pendente, sem fazer pressão na pele e deslocado sobre a área tratada [18]. O exame avaliou o estado do tecido subcutâneo, presença de seroma encapsulado e fibrose, além de mensurar o diâmetro do seroma horizontal e vertical, na região abdominal.

Após a avaliação da ultrassonografia, os voluntários foram tratados com o aparelho de ultracavitação Liposonic High Power Ultrasound, Meditea, Argentina. O tratamento seguiu os seguintes parâmetros: 15 minutos por área tratada (7,5 minutos por cada ERA), potência de 30 Watts, 50% da potência emitida, uma sessão realizada por semana. Após 8 sessões, foi feita uma reavaliação similar à avaliação inicial. A área tratada correspondia à região abdominal com presença de seroma.

Foi realizada uma análise descritiva com a apresentação dos valores de média e desvio padrão das medidas da área dos seroma. A análise inferencial foi utilizando o programa SPSS 22.0 (Statistical Package for the Social Science - Version 22.0). Para a comparação entre a avaliação inicial e final, foi utilizado o teste t-pareado. Foi adotado o nível de significância de 5% (p < 0,05).

 

Resultados

 

Os voluntários deste estudo foram numerados por ordem de início na realização dos procedimentos experimentais: V1 (Voluntário 1 ) à  V5 ( Voluntário 5). Havia 04 voluntários do sexo feminino e 01 do sexo masculino, apresentando idade média de 36,7 anos. Todos haviam realizado tratamento de pós-operatório de cirurgia de abdominoplastia anteriormente (PO) e apresentavam classificação N2 do PANFIC da fibrose avaliada. O diagnóstico de seroma encapsulado foi dado pelo médico ultrassonografista após o exame do tecido fibroso.

O V1 realizou cirurgia de abdominoplastia e lipoaspiração há aproximadamente 03 meses e apresentava fibrose na região supra-abdominal. Já havia sido realizado tratamento PO de fisioterapia que constou do uso do ultrassom, drenagem linfática manual e massoterapia (totalizando 35 sessões). Ultrassom, drenagem linfática manual e massagens (35 sessões), mas havia uma fibrose persistente e não estava satisfeita com o resultado (sic).  A comparação dos resultados dos exames de US da V1 antes e após a intervenção com ultracavitação, estão apresentados na figura 1.

 

 

Figura 1 - A: Imagens de US da região abdominal antes. B: Depois do tratamento com ultracavitação na voluntária 1.

 

O V2 realizou cirurgia de lipoaspiração associada a abdominoplastia há aproximadamente 02 meses e apresentava fibrose na região supra-abdominal. Já havia realizado tratamento PO de fisioterapia em que utilizou o ultrassom, radiofrequência, drenagem linfática manual (30 sessões), mas havia uma fibrose persistente e também não estava satisfeita com o resultado (sic). A comparação dos resultados dos exames de US da V2, antes e após a intervenção com ultracavitação, estão apresentados na figura 2.

 

 

Figura 2 - A: Imagens de US da região abdominal antes B: depois do tratamento com ultracavitação na voluntária 2.

 

O V3 realizou cirurgia de lipoaspiração há aproximadamente 55 dias e apresentava fibrose na região infra-abdominal. Já havia realizado tratamento PO de fisioterapia que constou de ultrassom, radiofrequência, drenagem linfática manual, endermologia (20 sessões), mas havia uma fibrose persistente e bastante incomoda esteticamente, resistente ao tratamento realizado (sic). A comparação dos resultados dos exames de US da V3, antes e após a intervenção com ultracavitação, estão apresentados na figura 3.

 

 

Figura 3 - A: Imagens de US da região abdominal antes B: depois do tratamento com ultracavitação na voluntária 3.

 

O V4 realizou cirurgia de lipoaspiração, após 01 ano realizou uma cirurgia de abdominoplastia associada à lipoaspiração. Em ambos os períodos de pós-operatório observou-se a formação de seroma e foram necessárias várias retiradas pelo médico com seringa. No momento que foi avaliada por este estudo, apresentava-se com 02 meses de pós-operatório e apresentava fibrose na região infra-abdominal. Já havia realizado tratamento PO de fisioterapia que constou de ultrassom, radiofrequência, drenagem linfática manual (25 sessões), mas havia uma fibrose persistente antiestética, resistente ao tratamento realizado (sic). A comparação dos resultados dos exames de US da V4 antes e após a intervenção com ultracavitação, estão apresentados na figura 4.

 

 

Figura 4 - A: Imagens de US da região abdominal antes B: depois do tratamento com ultracavitação na voluntária 4.

 

O V5 realizou cirurgia de lipoaspiração há aproximadamente 70 dias e apresentava fibrose na região lateral de tronco, próximo a axila. Já havia realizado tratamento PO de fisioterapia que constou de ultrassom, drenagem linfática manual, endermologia (35 sessões), mas havia uma fibrose persistente e maleável, resistente ao tratamento realizado (sic). A comparação dos resultados dos exames de US da V5, antes e após a intervenção com ultracavitação, estão apresentados na figura 5.

 

 

Figura 5 - A: Imagens de US da região abdominal antes B: Depois do tratamento com ultracavitação na voluntária 5.

 

A tabela I apresenta as medidas da área medidas no exame de ultrassonografia antes do tratamento que revelavam seromas encapsulados, com o seu valor após o tratamento com ultracavitação. Observou-se uma redução significativa da área do seroma com p < 0,01.

 

Tabela ITamanho das lesões antes e após o uso da ultracavitação através da ultrassonografia (média de três aferições considerando comprimento e largura da lesão).

 

*Existiu diferença significativa com p<0,05.

 

Discussão

 

Em todos os pacientes desse estudo foi verificada qualitativamente e quantitativamente uma redução do seroma encapsulado após o tratamento com a ultracavitação. Silva et al. [10] realizaram um estudo com aplicação da ultracavitação na redução da adiposidade localizada e encontraram redução de medidas significativas na região abdominal. Acredita-se que estes resultados ocorreram porque a UC promove a formação de bolha de maneira focal no tecido, promovendo à lise celular e danificando tecidos. Essa destruição do tecido é feita de maneira seletiva, sem danos aos tecidos adjacentes. A manutenção da integridade dos vasos e nervos permitindo uma melhor absorção da coleção de líquidos retidos na região do seroma, dispersando-os pelo espaço intersticial [9-11].

Segundo Ding et al. [12] e Rangraz et al. [13], a fibrose acumulada no tecido é reduzida pela ação mecânica das ondas ultrassônicas que quebram as pontes de ligações das fibras colágenas em sua constituição proteica, associado ao efeito mecânico a concentração energética promove um efeito térmico que favorece a desnaturação proteica, consequentemente, das fibras colágenas que formam a camada de fibrose que encapsula o líquido presente no seroma, justificando dessa forma, a dissolução dessa complicação encontrada nos nossos resultados.

As limitações desse estudo consistem no baixo número amostral, dificultando assim a inferência dos resultados obtidos. Sugere-se a realização de novos estudos, com um número maior de voluntário e com outros parâmetros de aplicação.

 

Conclusão

 

Portanto conclui-se que o tratamento com ultracavitação diminuiu as áreas das lesões de seroma encapsulado decorrentes de complicações cirúrgicas estéticas, evidenciados por meio de exames ultrassonográficos.

 

Referências

 

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  3. Stewart KJ, Stewart DA, Coghlan B, Harrison DH, Jones BM, Waterhouse N. Complications of 278 consecutive abdominoplasties. J Plast Reconstr Aesthet Surg 2006;59(11):1152-5.
  4. Silva RMV, Silva LM, Ramos MLVS, Silva ACF,  Meyer PF. Investigação sobre o encaminhamento médico aos tratamentos fisioterapêuticos de pacientes submetidos à cirurgia plástica estética. Cadernos da Escola de Saúde 2012;8:13-26.
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  10. Silva RMV, Meyer PF, Santos BR,  Felix JLO, Ronzio OA . Efectos del ultrasonido de alta potencia en la adiposidad localizada. Fisioterapia (Madrid. Ed. impressa). 2014;36(1):1-5.
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  13. Rangraz P, Behnam H, Tavakkoli J. Nakagami imaging for detecting thermal lesions induced by high-intensity focused ultrasound in tissue. Proc Inst Mech Eng H 2014;228(1):19-26.