REVISÃO

Desmame prolongado da ventilação mecânica: revisão sistemática e proposição de um fluxograma de condução

Weaning long-term mechanical ventilation: systematic review and proposal of a driving flow chart

 

Graziele de Souza Tavares, Ft*, Ana Paula Azeredo Teixeira, Ft.**, Isabella Diniz Faria, Ft., M.Sc.***

 

*Especialista em Fisioterapia Respiratória pela ASSOBRAFIR, pós-graduada pelo Programa de Residência Multiprofissional em Saúde na área de Urgência e Trauma do Hospital Municipal José Lucas Filho, especialista em Saúde Coletiva (UFMG), **Especialização em Fisioterapia Respiratória, Terapia Intensiva e Reabilitação (UNIBH), especialista profissional em Terapia Intensiva Adulto e Neonatal pela ASSOBRAFIR, ***Especialista em Fisioterapia Respiratória pela UFMG e ASSOBRAFIR, especialista em Terapia Intensiva Adulto pela ASSOBRAFIR, Especialista em Preceptoria no SUS pelo Hospital Sírio Libanês, Doutoranda em Ciências da Reabilitação (UFMG)

 

Recebido em 16 de maio de 2018; aceito em 12 de agosto de 2018.

Endereço para correspondência: Graziele de Souza Tavares, Rua Adelina Patricia de Carvalho, 174 Diamante 30660-312 Belo Horizonte MG, E-mail: grazieletavares@yahoo.com.br; Ana Paula Azeredo Teixeira: paulaateixeira@hotmail.com; Isabella Diniz Faria: isabelladinizfaria@yahoo.com.br

 

Trata-se de um trabalho de conclusão de curso apresentado ao Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da área de concentração Urgência e Trauma, realizado no Hospital Municipal José Lucas Filho, em Contagem/MG

 

Resumo

Introdução: Na literatura corrente, há escassez de estudos que propõem protocolos de desmame direcionados aos pacientes em Ventilação Mecânica Prolongada (VMP), ou seja, pacientes em ventilação mecânica ≥ 21 dias e mais de 6 horas/dia. Objetivo: Realizar revisão sistemática sobre VMP e elaborar uma proposta de protocolo de desmame prolongado direcionado aos pacientes em VMP. Material e métodos: Trata-se de uma revisão sistemática para o desenvolvimento de um protocolo de desmame para pacientes em VMP. As bases de dados: BVS, Medline e PEDro foram utilizadas para pesquisa dos artigos. Resultados: Foram encontrados 1546 artigos nas bases consultadas. Desses, somente seis foram incluídos na análise do estudo, por terem relação com a VMP. Um fluxograma com padronização das ações foi construído levando em consideração os achados mais prevalentes nos estudos. Conclusão: O desmame da VM é um processo complexo, que envolve várias etapas sujeitas a grande variabilidade, e sua padronização por meio de protocolos resulta em redução do tempo de VM. Estudos que avaliam a eficácia e o impacto do uso de protocolos em pacientes com VMP são incipientes. É de suma importância a existência de uma equipe multidisciplinar no tratamento das deficiências multifatoriais dos pacientes de VMP.

Palavras-chave: desmame do ventilador, protocolos clínicos, traqueostomia, unidades de terapia intensiva, respiração artificial.

 

Abstract

Introduction: In current literature, there is a shortage of studies that propose weaning protocols for patients undergoing Long-Term Mechanical Ventilation (LTMV), that is, patients with Mechanical Ventilation (MV) ≥ 21 days and more than 6 hours/day. Objective: To carry out a systematic review on LTMV and to elaborate a proposal of a protocol of extended weaning directed to the patients in LTMV. Methods: This is a systematic review for the development of a weaning protocol for LTMV patients. The databases: BVS, Medline and PEDro were used to search the articles. Results: 1546 articles were found in the databases consulted. Of these, only six were included in the analysis of the study, because they are related to LTMV. A flow chart with standardization of actions was constructed taking into account the most prevalent findings in the studies. Conclusion: MV weaning is a complex process, involving several stages with great variability, and its standardization through protocols results in reduced MV time. Studies evaluating the efficacy and impact of protocol use in patients with LTMV are incipient. The existence of a multidisciplinary team in the treatment of the multifactorial deficiencies of LTMV patients is very important.

Key-words: ventilator weaning, clinical protocols, tracheostomy, intensive care units, respiration, artificial.

 

Introdução

 

A Ventilação Mecânica (VM) é necessária em aproximadamente 90% dos pacientes críticos internados nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI) [1]. O seu uso prolongado pode gerar lesão pulmonar, pneumonia associada à VM, sinusites (na presença de intubação nasotraqueal ou orotraqueal), fraqueza da musculatura respiratória, polineuropatia do paciente crítico, hemorragia gastrointestinal, aumento da mortalidade e aumento dos custos hospitalares [2].

Deste modo, houve nos últimos 20 anos, uma preocupação na produção científica focada em reduzir o tempo de exposição dos pacientes a VM, aperfeiçoando o processo de retirada do suporte mecânico ventilatório, denominado "desmame" [3].

O processo de desmame da VM é definido como um período de transição do suporte mecânico ventilatório total ou parcial à ventilação espontânea, podendo ser abrupta ou gradual [2,3]. Este processo dura em média 40% do tempo total de VM, e pode ser mais prolongado nos pacientes com Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) e com Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC), consumindo respectivamente em média 59% e 48% do tempo total da VM [1,4]. De um modo geral, esse processo inicia quando a causa da falência respiratória do paciente foi totalmente controlada ou parcialmente controlada e, finaliza quando há sucesso na interrupção da VM (extubação em pacientes intubados ou retirada definitiva do suporte ventilatório em pacientes traqueostomizados) [5].

As estratégias para auxiliar no processo de desmame e limitar a exposição do paciente à ventilação invasiva incluem: a retirada diária da sedação; prevenção do delirium; avaliação dos critérios fisiológicos ou parâmetros de desmame; Teste de Respiração Espontânea (TRE); métodos para reduzir o suporte em pacientes que não passaram no TRE; e mobilização precoce [6,7].

O processo de desmame da ventilação mecânica inclui um número sistemático de etapas que envolvem examinar os pacientes para reverter a causa inicial da falência respiratória, o TRE, e a avaliação da permeabilidade das vias aéreas [8]. Mas essa avaliação depende da habilidade, experiência e filosofia do médico com o processo de desmame, ocasionando um potencial de variação na condução do mesmo [3]. Deste modo, tem-se expandido drasticamente a necessidade e o interesse em padronizar as melhores práticas de cuidado com o uso de protocolos [8]. Os protocolos reduzem as variações da prática com o propósito de melhorar sua eficiência, reduzindo a influência da subjetividade do julgamento e procurando aplicar objetividade [6]. Em recente revisão sistemática, Blackwood et al. [3] compararam a prática usual de desmame sem protocolo com a prática com protocolo, e os resultados apontaram que o uso de protocolos de desmame padronizados em UTI reduziu o tempo médio de VM em 26%, a duração do desmame da VM foi reduzido em 70% e o tempo de internação nas UTI reduziu em 11%. Esses desfechos são mais prováveis de ocorrer em UTI clínicas, cirúrgicas e mistas, mas não nas neurocirúrgicas.

No entanto, na literatura corrente, há escassez de estudos que propõe protocolos de desmame direcionados aos pacientes em Ventilação Mecânica Prolongada (VMP), ou seja, pacientes em VM ≥ 21 dias e mais de 6 horas/dia [9]. Neste sentido, o presente trabalho tem como finalidade realizar uma revisão sistemática sobre desmame prolongado da ventilação mecânica e construir um fluxograma de condução das ações, direcionados aos pacientes em VMP.

 

Material e métodos

 

Trata-se de uma revisão sistemática para o desenvolvimento de uma proposta de protocolo/fluxograma de condução das ações para desmame prolongado da VM.

O desenvolvimento metodológico seguiu três etapas, sendo elas: 1) busca e análise de artigos científicos; 2) apreciação e descrição dos resultados; 3) construção do fluxograma.

A busca de artigos científicos foi realizada nas bases de dados: BVS, Medline e PEDro com os seguintes descritores: ventilator weaning; clinical protocols; tracheostomy; intensive care units; respiration, artificial. Os critérios de inclusão dos artigos no estudo foram: estudos disponíveis em inglês, espanhol e/ou português; que selecionaram pacientes que preenchiam a definição de VM prolongada e que tinham sido submetidos à TQT. Foram excluídos estudos com crianças e adolescentes (< que 19 anos). Parâmetros clínicos, fisiológicos e método terapêutico usado nos estudos foram avaliados para a construção da proposta do protocolo de desmame da VMP.

 

Resultados e discussão

 

A Figura 1 descreve o processo de seleção dos estudos por meio de um fluxograma.

 

 

Fonte: Dados da pesquisa.

Figura 1Processo de seleção dos estudos.

 

Os seis artigos que foram incluídos nesta revisão estão resumidos na Tabela I. Apenas um artigo trata-se de um ensaio clínico aleatorizado, ressaltando a necessidade de mais estudos e com melhor qualidade metodológica para esta população específica, permitindo que seus resultados possam ser extrapolados para populações de outros centros.

Os estudos de Sheinhorn et al. e Chao e Scheinhorn [10,11] ocorreram na mesma instituição e, portanto, apresentam o mesmo protocolo de desmame da VM. Os primeiros descreveram o resultado da implantação do protocolo de desmame e compararam os resultados com os dois anos anteriores. Já os últimos, determinaram qual melhor ponto de corte do Índice de Respiração Rápida e Superficial (IRRS) para que os pacientes alcancem mais rapidamente o TRE no protocolo de desmame.

 

As instalações de desmame

 

Os locais onde os estudos aconteceram foram em instalações especiais como Hospitais de Cuidados de Longa Permanência (HCLP) e Centros de Desmame (CD), como pode ser visualizado no Quadro I. Estas instalações não fazem parte da realidade do hospital para o qual este protocolo foi concebido. Contudo, as experiências destas unidades especializadas em desmame são bastante positivas à redução de custos, uso mais racional dos recursos, além de fornecer organização e profissionais especializados voltados à atenção deste grupo de pacientes [5]. Assim, estas instalações podem, no futuro, ser necessárias à realidade local. Além disso, as mesmas são uma alternativa para a crescente demanda por leitos e em conjunto, recursos cada vez mais limitados das UTI [3].

 

A avaliação do desmame

 

O Quadro II mostra os critérios que os artigos analisados apresentaram para avaliar a prontidão do paciente em iniciar o processo de desmame da VM. Houve grande variação dos parâmetros adotados e dos pontos de corte desses parâmetros. Os critérios respiratórios como Fração Inspirada de Oxigênio (FiO2), Saturação Periférica de Oxigênio (SpO2), Pressão positiva expiratória ao final da expiração (PEEP), IRRS foram os mais citados pelos autores, seguido dos hemodinâmicos como ausência de infusão de medicação de uso contínuo e/ou drogas vasopressoras, pressão arterial (PA) e frequência cardíaca (FC). Deste modo, devido à grande variabilidade dos parâmetros descritos pelos autores e a necessidade em adaptar esses critérios ao protocolo proposto, foi optado seguir como referência os parâmetros descritos no Consenso de Desmame da VM [5]. Sabe-se que todos os pacientes devem passar por uma avaliação diária para avalição da aptidão ao desmame da VM. O paciente necessita cumprir critérios de estabilidade hemodinâmica, gasométrica, respiratória e térmica [10-13].

As mensurações da mecânica ventilatória citadas nos estudos foram o IRRS, Pressão Inspiratória Máxima (PImáx), Pressão Expiratória Máxima (PEmáx), Pressão Inspiratória Máxima Sustentada (PIms); Complacência e Resistência do sistema respiratório. O IRRS foi o mais citado, como pode ser visualizado na Tabela II. O mesmo é o mais aceito mundialmente na prática clínica por ser de fácil aplicação e interpretação [14]. A grande maioria dos estudos que o utilizam tem por finalidade prever o sucesso do desmame e evitar a reintubação, que é um dos desfechos clínicos associado ao aumento da mortalidade nas UTI. Porém, o seu uso isolado, sem levar em consideração outros parâmetros, tem sido questionado por vários autores [16].

 

Quadro I - Resumo dos estudos de desmame da VM em adultos criticamente doentes.

 

 

Quadro II - Critérios de avaliação clínica para iniciar o desmame.

 

FC = Frequência Cardíaca; FIO2 = Fração Inspirada de Oxigênio; FIM = Medida de Independência Funcional; FR = Frequência Respiratória; IRRS = Índice de Respiração Rápida e Superficial; PAS = Pressão Arterial Sistêmica; PEEP = Pressão Positiva Expiratória Final; PImáx = Pressão Inspiratória Máxima; SO2 = Saturação de Oxigênio; SR = Sistema respiratório; VT = Volume Corrente; Fonte: Elaborado pela autora com os dados da revisão sistemática.

 

O último Consenso Internacional de Desmame da VM e o Consenso Brasileiro de VM, ambos em 2007, e as Diretrizes Brasileiras de Ventilação Mecânica em 2013 [5,17,18], incentiva seu uso associado a outros parâmetros e especialmente, nos casos de difícil decisão para se realizar o TRE. Entretanto, vale ressaltar que os estudos clínicos utilizando preditores de desmame na população em VMP são em menor número quando comparados aos de pacientes em UTI, e que a dependência do suporte ventilatório na população de VMP parece ser multifatorial, e relacionada principalmente à alta prevalência de comorbidades [9].

Os autores Chao e Scheinhorn [11] propuseram o IRRS como um critério para acelerar o processo de redução do suporte ventilatório em pacientes em VMP por meio de um protocolo implementado pelo terapeuta respiratório. O IRRS prevê ao paciente que alcançar o ponto de corte desejado no protocolo, seja ele capaz de tolerar 1 hora de TRE. Estes autores identificaram que o melhor ponto de corte do IRRS é de 97 respirações/min/L, podendo ser arredondado para 100 respirações/min/L com o mínimo de perda de especificidade e sensibilidade.

O estudo de Verceles et al. [19] avaliou o valor prognóstico do IRRS em prever o desmame bem sucedido da VM em pacientes com VMP em um HCLP, usando o ponto de corte de ≤ 105 respirações/min/L. Os autores observaram que não houve diferenças significativas no IRRS avaliado na admissão dos pacientes que tiveram desmame bem sucedido comparado aos que falharam no desmame, e que um IRRS dentro do ponto de corte estabelecido pelo estudo não foi associado ao desmame bem sucedido (60% daqueles que tiveram sucesso no desmame tinham um IRRS ≤ 105 comparado com 67% dos que falharam no desmame e que também tinham IRRS ≤ 105). Contudo, quando o índice foi analisado ao longo de um período, foi observada redução significativa no IRRS no grupo de desmame bem sucedido em relação ao grupo que falhou no desmame. Assim, uma única mensuração do IRRS não foi considerada um bom preditor de desmame bem sucedido. Porém a análise de medidas sequenciais mostrou que as tendências decrescentes e menor variabilidade dos IRRS estão associadas a sucesso de desmame. Neste sentido, para o protocolo deste estudo, IRRS será utilizado como um preditor de tolerância da desconexão da VM por 1 hora, e as análises sequenciais dos valores encontrados terão valor prognóstico para desmame bem sucedido. Será mantido o ponto de corte conforme descrito por Yang e Tobin [20] por entender que características clínicas da população do estudo são bastante distintas das estudadas por Chao e Scheinhorn [11], sendo necessários estudos futuros para determinar qual melhor ponto de corte.

 

Os métodos de condução do desmame

 

Os métodos de condução do desmame mais comuns nos artigos analisados foram reduções gradativas na Ventilação em Pressão de Suporte (VPS) e aumento gradativo no tempo de desconexão (TRE) como pode ser visualizado no Quadro III. Porém, houve grande variabilidade da forma como é feita a redução da VPS e de como são determinados os progressivos tempos de desconexão (TRE). Como apenas três artigos descreveram essas alterações de modo completo e sistemático, construiu-se um protocolo conforme a experiência desses autores [10,11,21]. A SIMV também foi usada como meio de condução do desmame da VM [10,11]. Entretanto, esse método foi desestimulado por vários autores por apresentar resultados insatisfatórios quando comparados a VPS e ao TER [2] e, assim, não incluído neste estudo.

 

A avaliação da tolerância ao desmame

 

A avaliação da tolerância do paciente frente à redução do suporte e/ou desconexão da VM foi no geral descrita de forma breve em quatro dos seis estudos analisados [19,21-23]. Dois artigos foram produzidos no mesmo HCLP e utilizaram o mesmo protocolo, no entanto, descreveram os critérios de tolerância de forma mais detalhada [10,11]. Para estes autores, os sinais de intolerância a redução/ desconexão da VM seria comprovada pelo aumento na FR, redução do Volume Corrente (VT), dessaturação, aumento da FC e uso de musculatura acessória. Foi retirado o VT da avaliação deste estudo por considerar suficientes e seguros os outros parâmetros, pois eles permitem, de forma rápida, detectar sinais de estresse respiratório do paciente.

Cabe ressaltar que no Consenso de Desmame da Ventilação Mecânica escrito por Boles et al. [5], foram citados esses parâmetros com diferentes pontos de corte. Há outros parâmetros mencionados no consenso, mas, alguns dependem da análise de gases arteriais comparativos de antes e durante desmame.

 

Quadro III - Métodos de condução do desmame.

 

AVD = Atividade de vida diária; CPAP = Pressão Positiva Contínua na via aérea; O2 = Oxigênio; SIMV = Ventilação Mandatória Intermitente Sincronizada; TRE = Teste de Respiração Espontânea; TQT = Traqueostomia; VM = Ventilação Mecânica; VPS = Ventilação por Pressão de Suporte; Fonte: Criado pela autora.

 

O sucesso do desmame

 

Como pode ser visualizado no Quadro III, o sucesso do desmame foi considerado na maioria dos estudos, quando o paciente foi capaz de ficar sem suporte ventilatório por até 7 dias, conforme estabelecido em Consenso da National Association for Medical Direction of Respiratory Care (NAMDRC) [9]. Porém, no consenso de desmame da ventilação mecânica, o sucesso do desmame foi definido como extubação e ausência de suporte ventilatório 48 horas seguidas a extubação [5]. Regra que excluiu os pacientes traqueostomizados, que podem permanecer com a prótese ventilatória sem necessitar de suporte ventilatório mecânico. As Diretrizes Brasileiras de VM definiu com sucesso na extubação, incluindo pacientes traqueostomizados, a tolerância em permanecer após o tempo de desconexão do respirador (TRE), não necessitando de reconexão nas próximas 48 horas [18]. No entanto, cabe ressaltar que, como já citado por MacIntyre et al. [9], os critérios adotados nas UTI de 48-72 h podem não ser adequados aos pacientes em VMP devido a recuperação mais lenta do sistema respiratório e da coexistência de comorbidades.

 

A importância da equipe multidisciplinar

 

Interessante mencionar que três artigos mostram em seu plano de cuidado equipe multidisciplinar composta por médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, terapeutas respiratórios (no Brasil equivalente ao fisioterapeuta respiratório), fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, nutricionistas, farmacêutico clínico, assistentes sociais e psicólogos [19,22,23]. No local desse estudo, a equipe multidisciplinar é formada por médicos intensivistas, enfermeiros, técnicos de enfermagem e fisioterapeutas. Há uma equipe de suporte composta por médicos nutrólogos, médicos gastroenterologistas, cirurgiões gerais, cirurgiões torácicos e outros. Porém os planos de cuidado na UTI são segmentados, divergindo das experiências citadas pelos autores supracitados. Foi observado, que nos estudos analisados, as causas primárias da falência respiratória dos pacientes estiveram relacionadas a fatores respiratórios, cerebrovasculares, e/ou neuromusculares e também exibiram múltiplas comorbidades. Estes achados vão ao encontro ao citado por McIntryne et al. [9]. Eles mencionaram que a alta prevalência de comorbidades está associada à falha no desmame da VM e a piores resultados, principalmente em doentes de substituição renal; doentes com isquêmica cardíaca, desnutrição e doenças que afetam o nível de consciência.

Boles et al. [5] mencionaram a importância de planos de reabilitação tanto na fase aguda quanto crônica, justificada pelo fato que os pacientes sobreviventes da fase aguda da doença apresentam incapacidades físicas incluindo neuropatias, perda de força muscular, fatigabilidade, deformidades articulares, contraturas e outros danos relacionados a órgãos e sistemas. Além disso, a dependência do ventilador na UTI expõe o paciente a cargas adicionais como inflamação sistêmica contínua e catabolismo combinado com limitada mobilidade e subnutrição.

Deste modo, devido a complexidade dos fatores relacionados à dependência do ventilador nos pacientes em VMP, justifica a necessidade de equipes de cuidado multiprofissionais no sentido de otimizar a retirada da VM o mais cedo possível.

 

O fluxograma

 

O fluxograma com a padronização da redução do suporte ventilatório (Figura 2) foi construído para servir como um exemplo de padronização do desmame da VMP. Vale ressaltar que melhorias contínuas futuras deverão ser feitas à proposta do protocolo de desmame da VMP e ao fluxograma, amparadas pelas evidências científicas atualizadas disponíveis. Estudo comparativo após implantação do instrumento é sugerido para avaliar seu impacto na duração da VM nos pacientes em VMP.

 

 

Fonte: Elaborado pela autora.

Figura 2 - Fluxograma: modelo de protocolo para desmame da VMP.

 

Conclusão

 

O desmame da VM é um processo complexo, que envolve várias etapas sujeitas a grande variabilidade. No entanto, sua padronização por meio de protocolos resulta em redução do tempo de exposição dos pacientes a VM.

Estudos que avaliam a eficácia e o impacto do uso de protocolos em pacientes com VMP ainda são incipientes e de baixa qualidade metodológica. É de suma importância a existência de uma equipe multidisciplinar no tratamento das deficiências multifatoriais dos pacientes de VMP, auxiliando no processo de remoção da VM.

Sugere-se que as instituições hospitalares adotem a implantação de protocolo desmame da VMP específicos, como método de melhoria contínua de assistência ao paciente crítico, e que se embasem em indicadores concretos para avaliar sua eficácia.

O fluxograma aqui proposto é um modelo construído embasado cientificamente, mas faz-se necessária a realização de estudos científicos para avaliar seu impacto nos pacientes em VMP.

 

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