ARTIGO ORIGINAL

Análise da influência da retirada do leito de idosos na UTI e da continuidade da fisioterapia na enfermaria sobre o tempo de permanência, a readmissão e a mortalidade

Analysis of the influence of bed’s withdrawal of the elderly in the ICU and the continuity of physical therapy in the ward on length of stay, readmission and mortality

 

Fabiana Amaral Abritta, M.Sc.*, Sérgio Eduardo Soares Fernandes, M.Sc.*, Ana Patrícia de Paula, D.Sc.**

 

*Servidora do Instituto Hospital de Base do Distrito Federal, **Servidora da Superintendência da Região de Saúde Centro-Norte, Distrito Federal

 

Recebido em 11 de junho de 2018; aceito em 9 de janeiro de 2019.

Endereço de correspondência: Fabiana Amaral Abritta, Setor de Áreas Isoladas Norte - SAIN,  Bloco B, Sala 09, 70770-200  Brasília DF, E-mail: fabiana.abritta@gmail.com; Sérgio Eduardo Soares Fernandes: sergioesfernandes@gmail.com; Ana Patrícia de Paula: apatriciapaula@gmail.com

 

Resumo

Objetivo: Analisar a influência da retirada do leito de idosos na UTI e da continuidade da fisioterapia na enfermaria sobre tempo de internação, readmissão e mortalidade. Métodos: Trata-se de um estudo de coorte histórico realizado por meio dos registros de idosos egressos de UTI de um hospital público. Verificou-se as características clínicas e o nível de gravidade dos pacientes pelo escore SAPS 3 (Simplified Acute Physiology Score III). Analisou-se a retirada do leito na UTI, o nível de mobilização alcançado e a continuidade da fisioterapia na enfermaria. Observou-se a relação entre essas variáveis e os desfechos ocorridos. Resultados: Os 133 idosos estudados apresentaram média de idade de 70 ±7 anos; 66,1% eram homens; 78,2% foram retirados do leito na UTI e, após a admissão na enfermaria, 51,9% receberam fisioterapia. O tempo médio de internação após a alta da UTI foi de 27,6 dias; 11,2% dos pacientes foram readmitidos em unidades críticas e 18% foram a óbito. Os idosos que não foram retirados do leito na UTI e aqueles que mantiveram o nível de mobilização após a admissão na enfermaria apresentaram maior readmissão e mortalidade. Conclusão: Parece existir menor risco de readmissão e de mortalidade em pacientes submetidos à terapêutica de retirada do leito na UTI.

Palavras-chave: idoso, unidades de terapia intensiva, deambulação precoce, continuidade da assistência ao paciente, readmissão do paciente.

 

Abstract

Objective: To analyze the influence of bed’s withdrawal of elderly in the ICU and the continuity of the physical therapy in the ward over length of stay, readmission and mortality. Methods: This is a historical cohort study carried out through the registries of elderly patients from the ICU of a public hospital. The clinical characteristics and the level of severity of the patients by the SAPS 3 (Simplified Acute Physiology Score III) were verified. The ICU bed removal, the level of mobilization achieved and the continuity of physical therapy in the ward were analyzed. It was observed whether there was a relationship between these variables and the outcomes. Results: The 133 elderly studied had mean age of 70 ± 7 years; 66.1% were men; 78.2% of the patients were removed from the hospital bed and, after ward admission, 51.9% received physical therapy. The mean length of hospital stay after discharge from the ICU was 27.6 days; 11.2% of the patients were readmitted in critical units and 18% died. The elderly who were not removed from the ICU bed and those who maintained the level of mobilization after admission to the ward presented higher readmission and mortality. Conclusion: There seems to be a lower risk of readmission and mortality in patients undergoing ICU bed removal therapy.

Key-words: elderly, intensive care units, early ambulation, continuity of patient care, patient readmission.

 

Introdução

 

O envelhecimento da população mundial e a consequente transição demográfica e epidemiológica têm provocado mudanças no perfil dos pacientes internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI) [1]. Tem sido demonstrado que aproximadamente metade das admissões em UTI é de pacientes idosos, com perspectiva de aumento nos próximos anos [2].

A evolução científica e tecnológica e a assistência multiprofissional oferecida aos pacientes internados em UTI têm provocado a redução da mortalidade destes pacientes. O fisioterapeuta é essencial na composição da equipe de profissionais que trabalham em UTI, uma vez que os benefícios da assistência fisioterapêutica, especialmente a mobilização precoce, têm sido demonstrados por diversos estudos [3-5].

Após a alta da UTI, é necessário dar seguimento ao atendimento fisioterapêutico a estes pacientes. Uma transição de cuidado de pacientes de UTI comprometida pode resultar em complicações, incluindo eventos adversos, readmissão em unidades críticas, aumento do tempo de internação e das taxas de mortalidade [6].

Diante deste contexto, os objetivos deste estudo foram descrever as características clínicas, epidemiológicas e o nível de progressão de mobilização de pacientes idosos que receberam alta de UTI de um hospital terciário público do Distrito Federal (DF), e analisar a retirada do leito na UTI e a continuidade da assistência fisioterapêutica na enfermaria e suas influências sobre o tempo de internação, a readmissão e a mortalidade.

 

Material e métodos

 

Foi realizado um estudo de coorte retrospectivo, de aspecto analítico, por meio do levantamento dos registros de idosos internados nas UTI do Hospital de Base do Distrito Federal (HBDF) no período de setembro de 2013 a agosto de 2015. O HBDF possui 740 leitos, sendo 56 destinados às UTI de adultos. Possui cinco UTI com leitos regulados por uma Central de Regulação [7]. Foram analisados os dados das UTI Cardiovascular (8 leitos), Geral (10 leitos) e Neurotrauma (20 leitos).

Foram considerados elegíveis para este estudo os pacientes idosos [8], que permaneceram mais de 48 horas na UTI, que receberam assistência fisioterapêutica e que não foram a óbito na UTI. Os pacientes que foram readmitidos em unidades fechadas, durante a mesma hospitalização, tiveram apenas os dados da primeira admissão analisados, sendo observados os desfechos finais.

O HBDF conta com duas unidades fechadas de atendimento a pacientes graves que aguardam vaga em UTI. A admissão nestas unidades de pacientes elegíveis provenientes das enfermarias também foi considerada neste estudo como readmissão, uma vez que nestes locais eles recebem cuidados intensivos enquanto há indisponibilidade de leitos na UTI.

Foram excluídos os pacientes diagnosticados como fora de possibilidade terapêutica: um paciente que veio transferido de UTI particular antes da admissão na UTI pública; dois casos que foram transferidos para unidades de saúde particulares antes da alta hospitalar; e um caso que ainda se encontrava internado ao final do período de coleta de dados.

Os números dos prontuários analisados foram selecionados por meio do Sistema Epimed Monitor®. Neste sistema encontram-se os registros de pacientes que estiveram internados nas UTI, bem como o escore SAPS 3 (Simplified Acute Physiology Score III) [9,10] de cada um deles. Após a seleção dos números de prontuários foi realizada revisão em sistema eletrônico TrakCare®, que é o sistema de prontuários da Secretaria de Estado de Saúde do DF.

As variáveis clínicas e epidemiológicas de interesse incluíram: idade (medida em anos completos e categorizada em três grupos); sexo (coletado com masculino ou feminino); diagnóstico da admissão (coletado como o texto inserido para diagnóstico de admissão na UTI registrado no Epimed®); retirada do leito na UTI (registrado como sim ou não, considerando todos os níveis de mobilização como retirada, exceto nível 1); nível de progressão de mobilização alcançado a partir de 48 horas antes da decisão de alta até o momento de saída da UTI (coletado como: 1) cinesioterapia em decúbito e posicionamento funcional no leito; 2) sedestação no leito com membros inferiores pendentes; 3) sedestação na poltrona; 4) ortostatismo; 5) marcha estacionária; 6) deambulação com auxílio; 7) deambulação independente, a partir dos registros de prontuários); atendimento fisioterapêutico realizado do momento da admissão na enfermaria (após a alta da UTI) até 48 horas após (registrado como sim ou não) e nível de mobilização alcançado neste mesmo período (caso tenha recebido atendimento fisioterapêutico); tempo de internação (na UTI, após a alta da UTI e hospitalar; medidos em dias); readmissão em unidades fechadas (registrados como sim ou não); motivo de readmissão (coletado como o texto inserido para diagnóstico de inserção no relatório de solicitação de vaga em UTI registrado no TrakCare®); tempo entre a saída da UTI e a readmissão (medido em dias), mortalidade hospitalar (registrado como sim ou não); e escore SAPS 3 na primeira hora de admissão na UTI, registrado no Epimed®.

A pontuação de nível de mobilização foi categorizada pela autora em três grupos (2 e 3: referentes ao paciente sentado; 4 e 5: paciente em pé; 6 e 7: paciente andando). O nível 1 de mobilização não foi incluído na categorização porque refere-se ao grupo que não foi retirado do leito, o que já faz parte de outra variável analisada. Foi calculada a diferença de nível de mobilização entre a admissão na enfermaria e a saída da UTI. A alteração do nível de mobilização foi categorizada em três grupos: negativa (quando houve diminuição do nível), nula (o nível permaneceu o mesmo) e positiva (o nível de mobilização foi maior que o anterior).

Os dados coletados foram tabulados e analisados nos programas de computação Excel® 2010 e SPSS® Statistics 20.0 for Windows. As variáveis contínuas foram avaliadas por meio da média e desvio-padrão segundo a presença do desfecho ou exposição. Para definição de qual teste deveria ser aplicado para avaliar a diferença entre os grupos nestas variáveis, foi realizado o teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov. Em seguida, aplicaram-se os testes paramétrico (teste T) e não paramétrico (Mann Whitney) para analisar a homogeneidade entre os grupos.

Para as variáveis categóricas, primeiramente foi realizada a análise descritiva por meio da frequência relativa. No segundo momento, empregou-se o teste qui-quadrado ou o teste exato de Fisher (conforme a distribuição dos dados) para analisar se houve associação entre exposições (idade, sexo, SAPS 3, retirada do leito, nível de mobilização, continuidade do atendimento fisioterapêutico e alteração do nível de mobilização) e desfechos (tempo de internação após a alta da UTI, readmissão e mortalidade).

Após essa etapa, foi calculado o Risco Relativo (RR) com respectivo Intervalo de Confiança a 95% para as variáveis supracitadas. Aplicou-se a regressão de Poisson Robusta para o cálculo de RR bruto. Para reduzir a possível influência de fatores confundidores, foi realizada a análise múltipla. Para o ajuste do modelo foram selecionadas as variáveis idade e sexo.

Antes da coleta de dados, o projeto de pesquisa foi apresentado ao Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde e aprovado conforme parecer consubstanciado, número 1.559.828, em consonância com o disposto na Declaração de Helsinki, na resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde. Houve dispensa do termo de consentimento livre e esclarecido.

 

Resultados

 

No período analisado pela pesquisa, 798 pacientes idosos estiveram internados nas UTI do HBDF dos quais 554 foram excluídos por não atenderem aos critérios do estudo. Em outros 104 pacientes o sistema Epimed® estava incompleto, não dispondo de informações essenciais para a pesquisa, como o escore SAPS 3. Considerando que os prontuários destes idosos não foram analisados, não é possível saber se eles atenderiam aos critérios de inclusão do estudo. Em prontuários eletrônicos de sete pacientes elegíveis para o estudo não havia evoluções de médicos e ou fisioterapeutas em algum período da internação, o que inviabilizou a participação deles na pesquisa. Dessa forma, a amostra foi composta por 133 idosos. Destes, 54 (40,6%) foram admitidos na UTI Cardiovascular, 33 (24,8%) na UTI Geral e 46 (34,6%) na UTI Neurotrauma.

Os dados clínicos e epidemiológicos da amostra estudada podem ser observados na tabela I. A média de idade encontrada foi de 70 anos (variando de 60 a 93 anos), e a mediana, de 69 anos. Foi encontrada a média de 55,7 ± 15,5 para o escore SAPS 3. A média da mortalidade esperada para este escore foi de 31%.

 

Tabela I - Características da amostra estudada (n=133). HBDF, 2013 a 2015.

Em relação aos desfechos ocorridos, o tempo médio de internação na UTI foi de 17,2 dias (variando de 2 a 133), a permanência média após a saída da UTI foi de 27,6 ± 38,6 dias, com a mediana de 14 dias, e o tempo médio de internação hospitalar de 59,7 ± 53 dias. Foi observado que 18% dos pacientes foram a óbito após saírem da UTI.

Durante a internação hospitalar, 11,2% dos pacientes estudados foram readmitidos em unidades críticas. Destes, 93,3% foram a óbito após a readmissão. Todas as readmissões ocorreram após 48 horas da saída da UTI. Os motivos mais frequentes de readmissão foram complicações pulmonares, seguidas por alterações cardíacas.

Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre as variáveis analisadas e o desfecho tempo de permanência após a alta da UTI (tabela II).

 

Tabela II - Tempo de internação após a alta da UTI e fatores associados em idosos assistidos no HBDF, 2013 a 2015 (n=133).

 

**Risco Relativo Bruto; ***Risco Relativo Ajustado por idade e gênero; Ref. = Categoria de Referência.

 

Foi possível observar que a não retirada do paciente do leito na UTI aumentou em 5,38 vezes a chance de readmissão. Este resultado foi estatisticamente significativo mesmo após ajuste por sexo e idade. Nenhum dos pacientes que apresentou nível 6 ou 7 de mobilização na UTI foi readmitido. Houve maior risco de readmissão entre os pacientes que mantiveram o nível de mobilização após a admissão na enfermaria, sendo estatisticamente significativo, inclusive após ajuste (tabela III). Dentre estes pacientes, 43,5% faziam parte do grupo nível 1 de mobilização (não foram retirados do leito) e 34,8% do nível 2, ou seja, 78,3% destes pacientes não ficaram em pé.

 

Tabela III - Readmissão em unidades críticas e fatores associados em idosos assistidos no HBDF, 2013 a 2015 (n=133).

 

*p<0,05; **Risco Relativo Bruto; ***Risco Relativo Ajustado por idade e gênero; Ref. = Categoria de Referência.

 

Os resultados do estudo demonstraram que os pacientes que não foram retirados do leito na UTI apresentaram um risco 4,23 vezes maior de mortalidade, sendo estatisticamente significativa a diferença em relação aos que saíram do leito. Esta diferença permaneceu após realizar ajuste por idade e sexo. Nenhum dos pacientes que apresentaram nível de progressão de mobilização na UTI 6 ou 7 evoluiu para óbito. Os pacientes que, ao serem admitidos na enfermaria, mantiveram o mesmo nível de mobilização alcançado na UTI apresentaram maior risco de morte, com significância estatística mesmo após ajuste (tabela IV).

 

Tabela IV - Óbito e fatores associados em idosos assistidos no HBDF, 2013 a 2015 (n=133).

 

*p<0,05, **Risco Relativo Bruto; ***Risco Relativo Ajustado por idade e gênero; Ref. = Categoria de Referência

 

Ao realizar a associação com o escore de gravidade SAPS 3, foi observada diferença estatisticamente significativa entre os pacientes que apresentaram nível de progressão de mobilização 2 ou 3 na UTI, que obtiveram, em média, maior pontuação do que os demais grupos. Também houve significância estatística no resultado relativo aos pacientes que mantiveram o nível de mobilização após a admissão na enfermaria, que apresentaram maior escore de gravidade do que os que aumentaram o nível (tabela V).

 

Tabela V - SAPS 3 e fatores associados em idosos assistidos no HBDF, 2013 a 2015 (n=133).

 

*p < 0,05

 

Discussão

 

A maioria dos idosos que fizeram parte deste estudo era do sexo masculino e tinha menos de 70 anos. Também houve predomínio de pacientes homens com idade entre 60 e 69 anos em um estudo realizado na cidade de Rio Grande/RS, com 213 idosos admitidos em UTI [11]. Foi considerado pelos autores da pesquisa que isto pode ter ocorrido devido ao viés de sobrevivência, isto é, os idosos de maior idade, que em geral apresentam doenças mais graves, já terem morrido [12].

A variabilidade de diagnósticos clínicos admissionais foi condizente com o esperado para os perfis das UTI. Considerando que não foram incluídos no estudo os pacientes que foram a óbito na UTI, não se tem conhecimento do percentual de cada sexo em relação ao total de pacientes que estiveram internados no período. Dessa forma, entende-se que não há como atribuir o predomínio de homens na amostra estudada aos perfis das unidades.

No presente estudo, o valor médio do escore SAPS 3 foi de 55,7. Foi encontrado um valor médio inferior, de 48,5, em uma pesquisa [13] realizada em hospitais brasileiros com 1.310 pacientes cirúrgicos (média de idade de 67,1 anos), dos quais 83,8% realizaram cirurgias eletivas. Considerando que o HBDF atende a pacientes que necessitam de procedimentos de alta complexidade, esperava-se um valor ainda mais alto. Porém, foram incluídos no estudo apenas os pacientes que não foram a óbito na UTI, o que pode ter influenciado neste resultado, pois é possível que fossem pacientes menos graves.

No presente estudo, 78,2% dos pacientes foram retirados do leito na UTI. O nível de mobilização mais frequente foi a sedestação no leito. Em um estudo longitudinal [14] realizado na UTI de um hospital particular de Salvador, com 91 pacientes (média de idade de 62,5 anos) submetidos à ventilação mecânica, foi encontrado valor inferior. Apenas 56% dos pacientes foram submetidos à retirada do leito durante a permanência na UTI; 34,5% foram colocados em sedestação no leito com membros inferiores pendentes.

Do total de pacientes deste estudo, 51,9% receberam assistência fisioterapêutica em até 48 horas após serem admitidos em enfermaria. Dentre os pacientes que foram atendidos, a maioria manteve ou melhorou o nível de mobilização. Em 2012, Hopkins et al. [15] analisaram 72 pacientes com média de idade de 61 anos e verificaram que o nível de mobilização e atividade física realizada na UTI reduziu em 55% dos pacientes no primeiro dia após a admissão na enfermaria.

Os autores do estudo supracitado esperavam que o nível de atividade permanecesse ou aumentasse, pois consideraram que é mais fácil mobilizar pacientes menos graves e que já foram extubados. Alguns possíveis motivos podem ser atribuídos à diminuição de mobilização entre a estada na UTI e a admissão na enfermaria, como: recusa ou fadiga do paciente, aumento na proporção do número de pacientes por profissional e comunicação sobre o status funcional do paciente ineficiente entre a equipe da UTI e a da enfermaria durante a transferência [15].

Ao analisar a relação entre a continuidade da assistência fisioterapêutica na enfermaria e os desfechos ocorridos no presente estudo, não foram encontrados resultados estatisticamente significativos. Acredita-se que o tamanho da amostra pode ter sido insuficiente para demonstrar associação. Há um número de profissionais por número de leitos significativamente inferior nas enfermarias do HBDF em relação às UTI e, por isso, os pacientes admitidos nas enfermarias passam por uma triagem de avaliação dos fisioterapeutas quanto ao grau de prioridade de atendimento. Esta triagem visa garantir que os pacientes mais graves sejam atendidos prioritariamente, mas entende-se que todos os pacientes deveriam ser assistidos após a admissão.

Em relação ao desfecho tempo de internação, foi encontrado o tempo médio de permanência na UTI de 17,2 dias, de 27,6 após a alta da UTI e no hospital de 59,7 dias. Em 2010, Schein e Cesar [11] verificaram um menor tempo médio de permanência de idosos na UTI, de 8,5 dias. Um valor um pouco mais próximo do observado no presente estudo foi encontrado em 2015 por Guia et al. [16,] que analisaram 189 pacientes com média de idade de 77 anos, que estiveram internados em outro hospital público do DF e que permaneceram na UTI, em média, 13,1 dias.

Acredita-se que tenha sido verificado tempo médio de internação maior nas UTI do HBDF em relação a outros estudos em virtude do perfil e da gravidade dos pacientes, uma vez que a UTI Trauma, onde muitos pacientes internados apresentaram diagnósticos de doenças neurológicas graves, foi a que apresentou maior média de tempo permanência e valores de SAPS 3 mais altos, fazendo com que a média se elevasse.

No presente estudo, o tempo de internação após a alta da UTI foi utilizado para as análises, pois se objetivou buscar relações entre a continuidade do atendimento fisioterapêutico da UTI para a enfermaria e os desfechos ocorridos após a admissão na enfermaria. Porém, foram encontradas correlações fracas entre a medida deste tempo e as variáveis independentes. É possível que o tamanho da amostra tenha sido pequeno para determinar associações sobre este desfecho. Soares et al. [14] analisaram, em 2010, a repercussão da retirada do leito sobre o tempo de permanência na UTI, mas os resultados do estudo também não demonstraram diferença entre o grupo de pacientes que saiu do leito e o que não foi retirado.

No presente estudo 15 pacientes (11,2%) foram readmitidos em unidades fechadas durante a mesma internação hospitalar; após a readmissão, 14 pacientes (93,3%) foram a óbito. Em 2013, Araújo et al. [17] analisaram 977 pacientes adultos em dois hospitais públicos de alta complexidade de Porto Alegre e encontraram valores semelhantes de readmissão em UTI Geral (13,7%) e em UTI Trauma (9,3%). Porém, após a readmissão os valores observados foram inferiores: 69,7% de mortalidade na primeira UTI e 48,5% na segunda.

As taxas de readmissão em menos de 48 horas da alta da UTI têm sido utilizadas como indicadores de qualidade da assistência e podem refletir qualidade de cuidado baixa e ou altas precoces da UTI [17,18], o que não ocorreu no presente estudo. A alta mortalidade entre pacientes readmitidos em UTI pode indicar uma alta prevalência de pacientes recebendo cuidados potencialmente inefetivos em enfermarias [18]. Acredita-se que a demora na identificação do agravamento do quadro clínico do paciente, bem como a demora em conseguir leitos de UTI possam ter favorecido o resultado deste estudo.

Nesta pesquisa, as razões mais frequentes de readmissão foram complicações pulmonares, seguidas por alterações cardíacas. Em revisão sistemática realizada [18], verificou-se que os problemas pulmonares são consistentemente a primeira ou segunda causa principal de readmissão, independente do tipo de UTI estudada. Pneumonias nosocomiais que se desenvolvem após a alta da UTI e insuficiência respiratória por incapacidade de realizar higiene brônquica são razões comuns de readmissão em UTI.

Foram encontradas associações entre a manutenção do nível de mobilização na enfermaria e readmissão e mortalidade, inclusive após ajuste. Estes pacientes obtiveram, em média, maior escore de gravidade em relação aos que melhoraram o nível. Pacientes que permanecem deitados, em geral, apresentam menor capacidade pulmonar e maior risco de broncoaspiração. Considerando que a principal causa de readmissão foi complicações pulmonares, pode-se justificar a associação encontrada em relação a estes pacientes.

No presente estudo, 18% dos pacientes foram a óbito após receberem alta da UTI. Este valor foi inferior ao da média da mortalidade prevista pelo SAPS 3. Em um estudo prospectivo [19] realizado com 2171 pacientes, com média de idade de 61,4 anos, foram observadas as taxas de mortalidade na UTI e na enfermaria. Em ambos os casos, o escore SAPS 3 superestimou a mortalidade.

Este estudo demonstrou que os riscos de readmissão e de mortalidade foram significativamente maiores entre os pacientes que não foram retirados do leito na UTI, mesmo após ajuste por sexo e idade. Soares etal. [14] também verificaram, em 2010, que os pacientes retirados do leito após a descontinuação da ventilação mecânica apresentaram menor mortalidade. Na presente pesquisa, nenhum dos pacientes que deambulou na UTI foi readmitido ou evoluiu para óbito após a saída desta unidade. Em relação à pontuação SAPS 3, este grupo de pacientes apresentou menor gravidade do que o grupo nível 2 e 3.

Um estudo [20] realizado em um hospital universitário terciário com 856 pacientes com 60 anos ou mais demonstrou a importância do status funcional como preditor de mortalidade. Uma alta prevalência de imobilidade foi observada entre os pacientes que morreram e, após análise multivariada, este diagnóstico foi considerado como um fator independente associado com maior mortalidade. A idade também apresentou correlação positiva com óbito. Porém, em uma revisão sistemática [21], outros autores sugeriram que esta deixa de ser um fator significante após status funcional e clínico serem considerados. No presente estudo, a idade também não apresentou correlação negativa com os desfechos ocorridos.

Neste estudo, podem-se identificar limitações relativas ao seu desenho clínico, por ser retrospectivo, e ao tamanho da amostra. Outras limitações incluem falta de dados referentes aos motivos de não ter sido realizado fisioterapia ou de o nível de mobilização do paciente ter diminuído na enfermaria. Não foi mensurada a quantidade de atendimentos de fisioterapia realizados e não foi avaliada a continuidade da fisioterapia na enfermaria após as 48 horas da admissão até os desfechos. Além disso, o trabalho analisou as disfunções agudas, ou seja, o impacto do estado funcional prévio à hospitalização não foi considerado.

 

Conclusão

 

Diante do exposto, parece existir menor risco de readmissão em unidades críticas e de mortalidade hospitalar em pacientes submetidos à terapêutica de retirada do leito na UTI, o que reforça a importância do fisioterapeuta nesta unidade. Pacientes que deambularam antes de sair da UTI não foram readmitidos nem morreram.

Houve perda de continuidade da assistência fisioterapêutica entre a saída da UTI e as primeiras 48 horas após a admissão na enfermaria para cerca de metade dos pacientes. São necessários novos estudos sobre a continuidade do cuidado fisioterapêutico entre UTI e enfermaria e sua relação com os desfechos hospitalares, envolvendo uma amostra maior de pacientes idosos com perfis mais homogêneos.

 

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