ARTIGO ORIGINAL

Tratamento manipulativo osteopático musculoesquelético em mulheres com incontinência urinária não complicada

Musculoskeletal osteopathic manipulative treatment in women with uncomplicated urinary incontinence

 

Lilian de Castro Ponzoni*, Ericka Kirsthine Valentin, M.Sc.**, Fabricio Borges Carrerette, D.Sc.**, Ronaldo Damião, D.Sc.**

 

*Osteopata DO MRO Br, Policlínica Piquet Carneiro/UERJ, **Policlínica Piquet Carneiro/UERJ

 

Recebido em 14 de junho de 2018; aceito em 30 de abril de 2019.

Correspondência: Lilian de Castro Ponzoni, Av. Nossa Senhora de Copacabana, 690/701, Rio de Janeiro RJ, E-mail: lilianponzoni@gmail.com; Ericka Kirsthine Valentin: erickavalentin@gmail.com; Fabricio Borges Carrerette: carrerette2@gmail.com; Ronaldo Damião: damiao@email.com

 

Resumo

Controle eficiente dos mecanismos de fechamento uretral é essencial para continência urinária feminina, envolvendo mecanismo similar ao necessário para estabilidade sacroilíaca. Estudos demonstraram benefícios na reabilitação funcional do assoalho pélvico, após tratamento de pacientes com lombalgia, utilizando técnicas de manipulação osteopática. O objetivo primário deste estudo foi avaliar melhora da incontinência urinária após tratamento manipulativo osteopático musculoesquelético (TMO), associado com fisioterapia pélvica (FP). Participaram pacientes da divisão de fisioterapia da Policlínica Piquet Carneiro/UERJ, com diagnóstico de incontinência urinária não complicada, idade entre 21 e 65 anos, que responderam os questionários: International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form - ICIQ, Stress Urinary Incontinance Questionnaire - SUIQ, Overactive Bladder Questionnaire - ICIQ-OAB qol, e o questionário de qualidade de vida e saúde geral – EQ5D. A força perineal foi avaliada através do teste de avaliação funcional do assoalho pélvico, e as pacientes foram divididas em dois grupos: no grupo FP submetidas ao protocolo de FP por 10 semanas, e no grupo TMO submetidas ao mesmo protocolo, associado com TMO, pelo mesmo período. No presente estudo, a utilização do TMO associado à FP obteve resultados semelhantes à utilização de FP isoladamente, não acrescentando melhora na resposta ao tratamento da incontinência urinária não complicada.

Palavras-chave: manipulações musculoesqueléticas, incontinência urinária, saúde da mulher.

 

Abstract

Effective control of urethral closure mechanisms is essential for female urinary continence, involving mechanism similar to that required for sacroiliac stability. Studies have demonstrated benefits in the functional rehabilitation of the pelvic floor, after treatment of patients with low back pain, using osteopathic manipulation techniques. Primary objective of this study was to evaluate the improvement of urinary incontinence after musculoskeletal manipulation (OMT), associated with pelvic physiotherapy (PF). Patients from the Physiotherapy Division of the Policlínica Piquet Carneiro/UERJ, diagnosed with uncomplicated urinary incontinence, aged between 21 and 65 years, answered the questionnaires: International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form - ICIQ, Stress Urinary Incontinence Questionnaire - SUIQ, Overactive Bladder Questionnaire - ICIQ-OAB qol, and the quality of life and general health questionnaire - EQ5D. The perineal force was evaluated through functional evaluation of the pelvic floor. Patients were divided: in the FP group submitted to the FP protocol, and in the OMT group submitted to the same protocol, associated with OMT, for 10 weeks. In the present study the use of OMT associated with PF, obtained results similar to the use of PF alone, and did not add improvement in the response to treatment of uncomplicated urinary incontinence.

Key-words: musculoskeletal manipulations, urinary incontinence, women's health.

 

Introdução

 

A incontinência urinária (IU) é definida pela Sociedade Internacional de Continência (ICS), como qualquer perda involuntária de urina [1]. As mulheres têm uma maior prevalência de IU em comparação aos homens devido a diferenças anatômicas da pélvis e do trato urinário inferior, além da interferência de fatores hormonais [2], das gestações e dos partos que desafiam as forças e a estabilidade musculoesquelética da pélvis feminina.

O corpo e a pelve femininos são sujeitos a inúmeras mudanças estruturais durante o desenvolvimento. Após a menarca, a pelve alarga, a musculatura glútea aumenta, ocorre rotação interna das coxas e deslocamento lateral das patelas. A persistência das rotações internas coxofemorais pode levar a tensões gravitacionais alteradas, influenciando a função do diafragma pélvico, podendo contribuir para o aumento do risco de incontinência urinária. Durante atividades esportivas, mulheres jovens têm tendência a lesões de tornozelos e joelhos, atribuídas à frouxidão ligamentar resultante das influências das alterações hormonais do ciclo menstrual. Algumas destas lesões podem influenciar na marcha contribuindo também para dores e disfunções pélvicas ao longo do tempo [3]. Estas alterações mecânicas estruturais das extremidades inferiores podem se tornar mais importantes na obesidade ou durante a gravidez [4].

Teorias sobre continência são abundantes e envolvem conceitos relacionados com a transmissão de força, suporte anatômico e integridade uretral. Em um trato urogenital sadio, aumento na pressão intra-abdominal após valsalva, tosse e espirro, é igualmente transmitido para bexiga, para o colo vesical e para uretra, suportado pelo tônus do músculo elevador do ânus, dos músculos do assoalho pélvico e pelo tecido fascial pélvico [5].

Um controle eficiente da uretra é essencial para continência urinária e a força de fechamento uretral envolve um mecanismo similar àquele necessário para uma ótima estabilidade sacroilíaca. Estas estruturas e suas funções dependem de suas respostas às transferências de carga durante o movimento corporal, o que está diretamente relacionado com a eficiência muscular em produzir força de fechamento, incluindo os músculos elevador do ânus, pubococcígeo, diafragma, multífido e os músculos do assoalho pélvico [6].

Estudos recentes demonstraram benefícios na reabilitação funcional do assoalho pélvico, do diafragma e da estabilidade lombopélvica, após tratamento de pacientes com queixas de dor lombar, com a utilização de técnicas de manipulação osteopática [6,7].

Tratamento manipulativo osteopático (TMO) dirigido para a estabilização da bacia pélvica e/ou das estruturas contidas dentro dela pode prevenir ou diminuir síndromes dolorosas e sintomas de IU, através das técnicas de energia muscular, reequilíbrio de tensão ligamentar, e liberação miofascial, as quais auxiliam os músculos estabilizadores da coluna vertebral, e do assoalho pélvico, no suporte ao aumento de demanda quando em situações de alterações de pressão intra-abdominal [3].

O objetivo desta pesquisa é avaliar a melhora da incontinência urinária após tratamento manipulativo osteopático musculoesquelético associado com fisioterapia pélvica, comparado ao grupo controle tratado apenas com fisioterapia pélvica.

 

Pacientes e métodos

 

Realizamos um estudo piloto prospectivo, controlado, randomizado e cego, em 30 mulheres, com idade entre 21 e 65 anos, provenientes da Divisão de Fisioterapia da Policlínica Piquet Carneiro - UERJ, no Rio de Janeiro. Esta pesquisa foi aceita pelo comitê de ética em pesquisa do Hospital Universitário Pedro Ernesto, sob o número 1358951, em 09/12/2015.

As participantes do estudo tinham diagnóstico de incontinência urinária não complicada e concordaram em participar da pesquisa, datando e assinando o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) segundo Resolução 196/96. Os critérios de exclusão foram: comorbidades como doenças cardiovasculares e diabetes não controlados, cirurgia prévia para incontinência urinária, cirurgia radical pélvica prévia (histerectomia por câncer, exenteração pélvica, etc.), radioterapia pélvica, bexiga neurogênica, negar ou apresentar incapacidade de assinar o TCLE, relato na anamnese de infecção do trato urinário não tratada, presença de tumores malignos, fraturas ósseas em tratamento, ou alterações neurológicas.

As pacientes foram submetidas à avaliação fisioterapêutica:

 

1) Entrevista: Coletados os dados de identificação e contato, além de reavaliação dos critérios e inclusão e exclusão.

2) Avaliação pélvica dividida em 2 etapas:

 

Questionários

 

Uma fisioterapeuta cega para o tratamento manipulativo osteopático esteve ao lado das participantes para esclarecer possíveis dúvidas, enquanto elas responderam os seguintes questionários:

a) International Consultation on Incontinence Questionnaire - Short Form ICIQ – UI Short Form - é o questionário recomendado pela Organização Mundial de Saúde e pela International Continence Society, validado, autoadministrável, que quantifica e qualifica a incontinência urinária e avalia impacto na qualidade de vida. Possui um score de gravidade 0 a 21 [8].

b) Stress Urinary Incontinence Questionnaire – SUIQ – é o questionário que avalia a prevalência dos sintomas de esforço e de urgência, composto de duas questões. (http://www.iciq.net/)

c) International Consultation on Incontinence Questionnaire Overactive BladderOABq (ICIQ-OAB qol) – é o questionário para avaliação da presença de sintomas de Bexiga Hiperativa, composto de 12 questões que quantificam e qualificam esta patologia, e avaliam o impacto na qualidade de vida [9].

d) Euroqol-5D (EQ5D) – é o questionário que avalia a qualidade de vida e a saúde geral das participantes, composto de 5 questões para qualidade de vida, e uma escala analógica visual de saúde geral [10].

 

Avaliação perineal

 

As participantes foram submetidas à avaliação funcional do assoalho pélvico (AFA) utilizando a escala de Oxford [11], com graduação de 0 a 5, onde 0 é ausência de força muscular e 5 contração forte da musculatura perineal. O teste foi realizado na posição de decúbito dorsal, com os membros inferiores flexionados e pés apoiados. Esta avaliação foi realizada por uma fisioterapeuta que não foi a mesma profissional que realizou a avaliação e o tratamento manipulativo osteopático musculoesquelético.

Após avaliação inicial e perineal, as participantes foram divididas em dois grupos, de forma aleatória, de acordo com randomização prévia.

 

G1) No grupo Fisioterapia (FISIO), as participantes foram submetidas ao protocolo de tratamento fisioterapêutico pélvico, durante 10 semanas. Este protocolo é composto de dois exercícios que foram realizados duas vezes por semana, com a participante deitada em decúbito lateral ou em decúbito dorsal com os membros inferiores flexionados e os pés apoiados: contração da musculatura perineal de forma rápida, e contração da musculatura perineal de forma sustentada por até 10 segundos. As participantes foram orientadas a realizar estes exercícios diariamente em casa, três vezes ao dia, além da contração perineal para inibir urgência miccional, com três contrações rápidas seguidas de relaxamento completo da musculatura perineal, caso a paciente apresentasse este sintoma. Antes de iniciar o tratamento com fisioterapia pélvica, as participantes do grupo FISIO foram submetidas a uma avaliação osteopática musculoesquelética, sem tratamento manipulativo osteopático.

 

G2) No grupo TMO, as participantes foram submetidas ao mesmo protocolo de tratamento fisioterapêutico pélvico, e, simultaneamente, após avaliação osteopática musculoesquelética, a um tratamento manipulativo osteopático, durante 10 semanas, sendo uma consulta por semana. Estas técnicas foram realizadas pelo fisioterapeuta e osteopata:

Técnica de energia muscular – utilização de vetor muscular para recuperar a mobilidade articular, colocando o segmento a ser tratado na posição de restrição de movimento, a participante faz força contrária em direção ao movimento facilitado, e o osteopata avança em direção à barreira motriz, recuperando o movimento desejado;

Técnica em alta velocidade e baixa amplitude – utilização de vetor articular para recuperação da mobilidade, colocando as articulações superiores e inferiores em ajuste máximo de tensão ligamentar, deixando a articulação desejada em ajuste frouxo ligamentar para facilitar a recuperação da mobilidade, que acontecerá através de um movimento rápido de pequena amplitude;

Técnica fascial – utilização de movimentos suaves e superficiais através da manutenção dos tecidos em posições de maior restrição de movimento, até percepção de relaxamento tissular.

 

Avaliação osteopática e tratamento manipulativo osteopático

 

Na avaliação osteopática musculoesquelética, foram realizados testes de mobilidade para as articulações sacroilíacas, articulações da coluna vertebral, e articulações dos membros inferiores, bem como avaliação da função do músculo diafragma, com a participante em posição ortostática, sentada e em decúbito dorsal. O objetivo destes testes foi avaliar a amplitude de movimento das estruturas acima citadas, bem como relato de quadro álgico pelas pacientes.

Para o tratamento manipulativo osteopático musculoesquelético foram utilizadas técnicas osteopáticas com o objetivo de restaurar a mobilidade das articulações ou demais tecidos corporais, que apresentassem alteração em sua função. Estas técnicas foram realizadas pelo fisioterapeuta e osteopata, de forma manual, sendo elas: técnica de energia muscular, técnica em alta velocidade e baixa amplitude, e técnica fascial.

 

Reavaliação

 

A cada 30 dias foram realizadas reavaliações nos dois grupos, através dos questionários e do AFA.

 

Análise estatística

 

A distribuição dos dados foi verificada por meio do Teste de Shapiro Wilk e medidas de obliquidade e curtoses. Variáveis dependentes pré-tratamento e de caracterização da amostra foram comparadas entre os grupos TMO e FISIO por Teste t Independente. Os efeitos do TMO e FISIO foram analisados por Modelo Linear Misto (two-way) pelo método da Máxima Verossimilhança Restrita, assumindo Grupo (TMO e FISIO), tempo (Pré a Pós 4, 8 e 10 semanas de tratamento) e interação grupo*tempo como efeitos fixos e pacientes como efeito randômico. Adicionalmente, o tempo foi assumido como efeito de medidas repetidas. Quando diferenças foram observadas nos valores pré-tratamento entre os grupos, estes valores foram incluídos no modelo como covariáveis. Quando efeitos principais significativos foram observados, testes post hoc de Sidak foram aplicados para a correção dos valores de P em comparações múltiplas. O critério de significância adotado foi de 5% (P ≤ 0,05). Todas as análises foram realizadas no Software PASW statistics 18.0 (SPSS Inc., Chicago, USA).

 

Resultados

 

Participaram deste estudo 30 pacientes do sexo feminino, das quais 16 completaram o tratamento, sendo oito em cada grupo. Estas 16 pacientes foram consideradas para as análises estatísticas. Não houve diferença significativa entre os grupos para idade, massa corporal e estatura exceto para saúde geral (P = 0,03) (Tabela I).

 

Tabela I - Características dos sujeitos avaliados (n = 16).

 

TMO = Tratamento Manipulativo Osteopático; FISIO = Fisioterapia. # Valores de P para Teste t Independente.

 

Observamos melhora estatisticamente significativa nos dois grupos testados em todas as avaliações: ICIQ (Figura 1); SUIQ (Figura 2); OABq (Figura 3); EQ5D (Figura 4); AFA (Figura 5).

Após o período de tratamento, ambos os grupos demonstraram melhora da incontinência urinária conforme demonstrado por redução do: ICIQ escore do pré-tratamento para os momentos 4, 8 e 10 semanas (P < 0,001 para todos), assim como de 4 para 8 e 10 semanas (P = 0,036 e P < 0,001, respectivamente) (Figura 1A); e ICIQ questão 6 do pré para 4, 8 e 10 semanas (P = 0,001, P < 0,001 e P < 0,001, respectivamente), de 4 para 8 e 10 semanas (P = 0,021 e P < 0,001, respectivamente), assim como de 8 para 10 semanas (P = 0,005) (Figura 1B).

 

 

Figura 1 A) ICIQ escore;* <0,001 †0.036; B) ICIQ questão 6 (escore);* < 0,001 †0,021 ‡0,005

 

Ambos os tratamentos também promoveram redução na frequência semanal de perda urinária: durante o esforço do Pré para 8 e 10 semanas (P = 0,006 e P < 0,001, respectivamente) e de 4 para 10 semanas (P = 0,003) (Figura 2A); e de perda urinária sem motivo do Pré para 8 e 10 semanas (P = 0,002 e P < 0,001) (Figura 2B).

 

 

 

Figura 2A) Frequência semanal de perda urinária por esforço; *< 0,001; *† P < 0,05, B) Frequência semanal de perda urinária por urgência; *< 0,001.

 

Ambos os tratamentos reduziram o grau de desconforto em relação à: diurese diurna do Pré para 8 e 10 semanas (P = 0,002 e P < 0,001, respectivamente), e de 4 para 10 semanas (P < 0,001) (Figura 3A); diurese noturna do Pré para 8 e 10 semanas (P < 0,001 para ambos), de 4 para 8 e 10 semanas (P = 0,006 e P < 0,001, respectivamente), e ainda de 8 para 10 semanas (P < 0,001) (Figura 3B); pressa para urinar do Pré para 4 e 8 e 10 semanas (P ≤ 0,001 para todos), e de 4 para 10 semanas (P = 0,001) (Figura 3C); e perda urinária do Pré para 4, 8 e 10 semanas (P ≤ 0,001 para todos), e de 8 para 10 semanas (P = 0,035) (Figura 3D).

 

 

Figura 3 Grau de desconforto em relação à: diurese diurna (A) e noturna (B), pressa para chegar ao vaso sanitário (C) e perda urinária antes de chegar ao vaso sanitário (D); * † ‡ Diferença significativa em relação início, para 4 semanas e para 8 semanas, respectivamente (P < 0,05).

 

Conforme exposto na Figura 4, houve aumento do escore da saúde geral, no grupo TMO e no grupo FISIO. Este dado melhora, consequentemente, o escore da escala de saúde analógica, nos dois grupos.

 

 

Figura 4A) Escala analógica de saúde; *†P < 0,05. B) Saúde Geral. * < 0,001

 

Por fim, ambos os tratamentos aumentaram a força da musculatura perineal no AFA, do início para 4, 8 e 10 semanas, assim como de 4 e 8 semanas para 10 semanas (P < 0,001 para todos).

 

 

Figura 5Força do assoalho pélvico; * † ‡ < 0,05

 

Discussão

 

No presente estudo a utilização do TMO associado à FP para o tratamento de incontinência urinária não complicada em mulheres adultas obteve resultados semelhantes à utilização de FP isoladamente, em todos os parâmetros analisados.

Teorias têm sido propostas para explicar os efeitos da manipulação da coluna vertebral e de articulações com restrição de mobilidade para o tratamento de diversas alterações funcionais, dentre as quais a incontinência urinária [12].

De acordo com Collebrusco e Lombardini [13], estas alterações fisiológicas impedem o funcionamento normal do mecanismo neural, vascular e bioquímico, favorecendo alterações como incontinência urinária. Desta forma, a utilização de TMO poderia ser justificável quando pensamos em melhorar a qualidade de vida de pacientes portadoras de incontinência urinária.

Entretanto nossa hipótese de que o TMO poderia melhorar o controle urinário, diminuindo a incontinência, seja por aumentar a capacidade de contração do assoalho pélvico ou mesmo melhorar a mobilidade e velocidade de chegada ao banheiro para micção evitando a perda urinária, não se comprovou com os resultados deste estudo piloto.

Embora Franke et al. [14], numa revisão sistemática unicamente com estudos clínicos controlados e randomizados, os quais utilizaram critérios de inclusão e exclusão similares ao nosso estudo piloto, chegarem a conclusão de que os pacientes que foram submetidos a TMO tiveram melhora da incontinência urinária significante estatisticamente em comparação ao grupo de pacientes não tratados, no nosso estudo o grupo TMO obteve resultados similares ao grupo FISIO, demostrando que do TMO associado a fisioterapia pélvica (FP) em pacientes portadoras de incontinência urinária não complicada não melhorou o resultado do tratamento.

No entanto, pudemos observar uma melhora das pacientes do grupo TMO, em todas as questões que fazem parte do questionário de bexiga hiperativa. Cooperstein et al. [15] encontraram bons resultados com as técnicas manipulativas no tratamento de pacientes portadores de bexiga hiperativa, através da utilização de intervenções mecânicas e miofasciais na pélvis e na região lombar. Talvez porque o TMO possa melhorar a mobilidade, diminuindo o tempo de chegada ao banheiro.

Desta forma acreditamos que um estudo abordando apenas a incontinência de urgência em pacientes com bexiga hiperativa pode ter resultado melhor do que encontramos na incontinência urinária não complicada.

Durante nosso estudo, verificamos no AFA utilizando a escala modificada de Oxford, a mesma melhora no grupo fisioterapia e no grupo de TMO, após as 10 semanas de tratamento. Portanto também neste aspecto a TMO não somou melhora quando comparado com a FP isolada.

Após as 10 semanas de tratamento, todas as pacientes que participaram de nosso estudo piloto, nos dois grupos, demonstraram melhora na qualidade de vida e na escala de saúde analógica, conforme demonstrado nos resultados. Assim, baseado em nossos achados, o TMO associado à FP também não fez diferença neste parâmetro.

Dellaroza et al. [16] demostraram que a associação de incontinência urinária com dor crônica, aumenta o risco de quedas em idosos sem déficit cognitivo. Talvez o TMO possa contribuir para tratamento da incontinência urinária associada a dores crônicas e ou alterações de mobilidade sacroilíacas e lombares, por facilitar o deslocamento destas pacientes até o vaso sanitário, com melhora da qualidade de vida. Portanto, pacientes com este perfil poderiam se beneficiar do tratamento manipulativo osteopático independente da associação com fisioterapia pélvica.

 

Limitações do estudo

 

Das 30 pacientes que iniciaram nossa pesquisa, 2 desistiram do tratamento pela distância entre suas casas e o hospital; 8 desistiram do tratamento dizendo preferir realizar procedimentos cirúrgicos para recuperação da continência; e 4 abandonaram o tratamento sem justificativa. Portanto, tivemos limitações em nosso estudo pelo tamanho de amostra.

Embora a amostra seja pequena, existiu uma homogeneidade nas características das participantes dos dois grupos estudados. Também houve semelhança entre os dois grupos quanto à interferência da incontinência urinária na qualidade de vida dessas mulheres. Entretanto os resultados não nos motivaram a ampliar a amostra do estudo.

 

Conclusão

 

A utilização de tratamento manipulativo osteopático associado à fisioterapia pélvica não acrescentou melhora na resposta ao tratamento da incontinência urinária não complicada na mulher, em nenhum parâmetro avaliado neste estudo piloto.

 

Referências

 

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