ARTIGO ORIGINAL

Correlação entre pressão plantar e força muscular respiratória

Correlation between plantar pressure and respiratory muscle strength

 

Ana Carolina Ansaloni *, Patricia Luciene da Costa Teixeira, M.Sc.**

 

*Graduada pelo Curso de Fisioterapia do Centro Universitário de Barra Mansa/RJ, **Docente do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário de Barra Mansa/RJ

 

Recebido em 4 de outubro de 2018; aceito em 5 de setembro de 2019.

Correspondência: Patricia Luciene da Costa Teixeira, Curso de Fisioterapia, Centro Universitário de Barra Mansa (UBM), Rua Ver. Pinho de Carvalho, 267, 27330-550 Barra Mansa RJ

 

Patricia Luciene da Costa Teixeira: palufelix@gmail.com

Ana Carolina Ansaloni: carol.ansaloni@hotmail.com

 

Resumo

Existem evidências de que alterações posturais possam influenciar no funcionamento da caixa torácica. Além disso, para uma respiração adequada, é necessária boa postura e equilíbrio muscular. O objetivo do presente estudo foi verificar se existe correlação entre a pressão plantar e a força muscular respiratória, visto que ambas sofrem interferência das alterações posturais. Foram avaliados 30 funcionários de uma instituição de Ensino Superior do Médio Paraíba, com idade média de 43,43 ± 13,29 anos, subdivididos em 2 grupos: Grupo experimental (I) e Grupo Controle (II). O grupo I foi submetido a 30 sessões de treinamento muscular respiratório; e ao final da intervenção, ambos os grupos foram reavaliados. Os resultados mostraram que algumas pressões plantares sofreram interferência significativa, com p < 0,05 da força muscular respiratória (PImáx e PEmáx), após o protocolo de exercício, confirmando nossa hipótese sobre a possível associação entre a força muscular respiratória e a pressão plantar, pela correlação positiva apresentada por algumas variáveis avaliadas.

Palavras-chave: sistema respiratório, pressão expiratória máxima, pressão inspiratória máxima, postura e equilíbrio.

 

Abstract

There are evidences that postural alteration may influence the functioning of the thoracic cage. However, proper breathing requires good posture and muscle balance. The present study aim was to verify whether there is correlation between a plantar pressure and respiratory muscle strength, as both suffer interference of the postural alterations. We evaluated 30 employees from an a higher Education Institution with the average age between 43,43 ± 13,29 years subdivided into two groups: Experimental group (I) and Control group (II). Group I underwent 30 sessions of respiratory muscle training and at the end of the intervention both groups were reevaluated. The results showed that some plantar pressures undergo significant interference with p < 0.05 in respiratory muscle strength (PEmáx e PEmáx) after exercise protocol confirming our hypothesis about the possible association between respiratory muscle strength and plantar pressure by the positive correlation presented by some variables evaluated.

Key-words: respiratory system, maximum expiratory pressure, maximum inspiratory pressure, posture and balance.

 

Introdução

 

Segundo Lianza [1], déficits posturais são caracterizados pelo conjunto de alterações relacionadas com a formação e equilíbrio do sistema locomotor, podendo acarretar em hábitos inadequados, que podem gerar um aumento da tensão nas estruturas de sustentação [2].

O pé é um dos componentes mais importantes, quando se trata da sustentação do corpo humano, especialmente para o complexo postural. Podemos caracterizá-lo como suporte final desse complexo, e o intermédio de junção com o solo; dessa forma, ele tem que se adaptar às avarias advindas do meio interno e externo [3].

A respiração constitui o equilíbrio do corpo mediante as forças internas e externas [4]. Sendo assim, a capacidade respiratória ideal depende de boa postura e equilíbrio muscular adequado e qualquer alteração no equilíbrio pode gerar fraqueza levando a alterações nos volumes e pressões que podem ser obtidas e mantidas [5]. Ademais, déficits na posição corporal e na força atuante da gravidade levam a mudanças no sistema respiratório em diferentes intensidades, podendo estar associadas a inúmeras patologias [6].

A baropodometria computadorizada é um dos métodos utilizados para análise da pisada, a qual possui o intuito de avaliar a distribuição do peso ou pressão, como também análise postural. Essa ferramenta é precisa, quando se relaciona com a triagem adequada ao tratamento, tanto para avaliação da pisada quanto para avaliação postural [7,8]. Já a manovacuometria é utilizada para mensuração da força dos músculos respiratórios [9,10]. A mensuração dessas forças é dada por um teste simples e rápido, que é avaliado por duas medidas: pressão inspiratória máxima (PImáx), na qual verifica-se o quantitativo de força da musculatura inspiratória, e pressão expiratória máxima (PEmáx), em que se verifica o quantitativo de força da musculatura expiratória, avaliando respectivamente a maior pressão gerada durante uma inspiração e expiração máxima, contra uma via aérea que encontra-se ocluída [10,11].

Existem evidências de que inúmeros fatores podem influenciar no funcionamento da caixa torácica, entre eles as alterações posturais [12,13]. A capacidade respiratória ideal depende de uma postura e equilíbrio muscular bom [5].

Almeida et al. [14] mostraram a existência de correlação entre as variáveis de postura e força muscular respiratória, onde os músculos respiratórios exercem grande influência no processo de estabilização corporal. Por outro lado, Melvin et al. [15] comprovaram que discrepâncias na estrutura do pé evidenciam associações com déficits de funcionalidade, quando relacionadas às posturas estáticas ou dinâmicas da pisada.

Apesar de vários estudos já terem mostrado a influência da postura sobre a respiração do indivíduo, ainda não foi descrito na literatura nacional se existe associação entre a pressão plantar e a força muscular respiratória ou vice-versa. Assim sendo, delineamos o presente estudo, com o objetivo de verificar se existe correlação entre a pressão plantar e a força muscular respiratória, uma vez que ambas sofrem interferência das alterações posturais.

 

Material e métodos

 

Estudo transversal de natureza quantitativa. A amostra de conveniência foi constituída por 30 funcionários de uma instituição de ensino superior do Médio Paraíba, com faixa etária entre 18 e 70 anos, de ambos os gêneros, que concordaram em assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário de Barra Mansa, sob o protocolo n° CAAE: 59697416.1.0000.5236.

Critérios de exclusão: indivíduos dependentes de aparelhos auxiliares da locomoção, e/ou com déficit de equilíbrio estático; com deformidades osteoarticulares; úlceras plantares; amputação total ou parcial dos pés; diagnóstico prévio de doença neurológica que afetassem o equilíbrio; com doença pulmonar conhecida; diminuição da parte cognitiva, da acuidade visual e/ou auditiva; pós-operatórios nos últimos 12 meses; instabilidade hemodinâmica detectada previamente à avaliação; que não assinaram o TCLE.

Inicialmente, foi realizada uma anamnese, com o preenchimento de um questionário constituído de perguntas abertas e fechadas, relacionadas a dados demográficos e socioeconômicos. Após este procedimento, foi realizada a avaliação antropométrica e avaliação postural, a qual foi constituída por avaliação da cabeça, tronco, coluna, pelve, joelhos e pés. Dando continuidade ao protocolo, foram realizadas avaliações através da baropodometria e manovacuometria, descritas a seguir, e os dados exportados para uma planilha de Excel, para posterior análise.

A manovacuometria foi realizada por meio do manovacuômetro, equipamento que gradua a funcionalidade e força dos músculos respiratórios [9] através das pressões inspiratórias máximas (PImáx) e pressões expiratórias máximas (PEmáx), valores graduados em cmH2O. A PImáx é mensurada a partir do Volume Residual (VR), ou seja, uma inspiração máxima a partir de uma expiração máxima, enquanto a PEmáx é mensurada a partir da Capacidade Pulmonar Total (CPT), após o indivíduo realizar uma inspiração máxima [11]. Para a análise dos dados, foi registrado o valor mais alto.

O sistema de baropodometria computadorizada consiste em mensurar as pressões exercidas na face plantar dos pés, em vários pontos anatômicos, mostrando medidas exatas, permitindo uma avaliação concreta via sensores pressóricos [16]. A avaliação por meio do baropodômetro proporciona dados quantitativos, em relação às pressões que são exercidas na face plantar [17]. O aparelho foi calibrado com tempo de tomada de 06 segundos, para a execução dos procedimentos, os quais foram repetidos por 2 vezes em diferentes momentos: antes e após treinamento muscular respiratório.

Para fazer o teste acima mencionado, utilizamos Baropodômetro ArkipélagoFootwork, equipamento composto por uma plataforma sensível a pressão, com sensores de alta concepção e tecnologia, que reconhecem as informações do apoio plantar conservando a mobilidade natural. As aquisições das imagens são precisas, instantâneas, reproduzíveis e não invasivas [18]. O aparelho foi conectado a um computador, utilizando um software para a visualização de imagens coloridas e dados estatísticos, medidos em superfície por cm2 e carga em %.

A pesquisa ocorreu em três momentos diferentes: no primeiro momento, os voluntários assinaram o TCLE, e foram submetidos à coleta de dados de forma individualizada e em local reservado; no segundo momento, todos os indivíduos que aceitaram participar do estudo, foram avaliados pelo sistema de baropodometria computadorizada, manovacuometria e avaliação postural; após a avaliação, os indivíduos da amostra de conveniência foram alocados por meio de sorteio, em dois grupos de 15 indivíduos. Grupo I (grupo experimental) e Grupo II (grupo controle). Os voluntários do Grupo I foram submetidos a 30 sessões de fisioterapia respiratória em grupo. Após o término das sessões, os mesmos foram reavaliados através do sistema de baropodometria computadorizada, manovacuometria e avaliação postural. Já os voluntários do Grupo II foram avaliados através da baropodometria computadorizada, manovacuometria e avaliação postural, mas não foram submetidos ao treinamento muscular respiratório. Ao final do tratamento do Grupo I, os voluntários pertencentes aos dois grupos foram reavaliados.

A avaliação por meio do baropodômetro proporciona dados quantitativos, em relação às pressões que são exercidas na face plantar [17]. Os dados foram coletados na posição bipodálica, com o indivíduo sobre a plataforma e os braços no prolongamento do corpo. Para esta avaliação, o participante permaneceu descalço e foi instruído a executar o teste com os olhos abertos. Em todos os casos, o aparelho foi calibrado com tempo de tomada de 06 segundos para a execução dos procedimentos.

Com o indivíduo na posição sentada, tronco em ângulo de 90º e os pés apoiados no chão, o mesmo foi orientado a segurar com uma das mãos o manovacuômetro, para avaliação da funcionalidade e força dos músculos respiratórios [9]. Foi solicitado que o participante envolvesse todo o lábio no bocal, utilizando um clipe nasal para vedar as narinas, para que as pressões respiratórias máximas fossem determinadas. Para determinação da PImáx, foi solicitada uma inspiração máxima a partir de uma expiração máxima, enquanto para determinação da PEmáx, foi solicitada a realização de uma expiração máxima [11]. Para a análise dos dados, o valor mais alto atingido dentre as 3 medidas foi registrado.

Como intervenção fisioterapêutica, os indivíduos passaram por 30 sessões de fisioterapia respiratória em grupo. Estas sessões foram compostas por três exercícios respiratórios de fácil execução, descritos a seguir, incluindo duas técnicas de manobras reexpansivas, para aumento do volume pulmonar [19], melhora da mobilidade da caixa torácica e do diafragma [20], a fim de que a musculatura se alongasse anteriormente ao experimento, para que a resposta reflexa fosse mais intensa [21]; e estímulo proprioceptivo diafragmático para aumento da força muscular respiratória [22].

A primeira técnica ocorreu com os indivíduos em posição sentada no tatame com o tronco em ângulo de 90º, pés apoiados no chão e membros superiores estendidos ao longo do corpo. Durante a inspiração, os membros superiores foram elevados lateralmente em amplitude articular total de abdução dos ombros com cotovelos estendidos inclinando o tronco lateralmente e, na expiração os membros superiores e o tronco voltavam à posição de partida. Na segunda técnica reexpansiva, os indivíduos permaneceram na mesma posição anterior, porém os membros superiores foram elevados anteriormente no momento da inspiração, com amplitude total de movimento da flexão anterior dos ombros inclinando levemente o tronco para trás, na expiração retornava à posição de partida. A terceira técnica para estímulo proprioceptivo diafragmático foi realizada com os indivíduos em decúbito dorsal num colchonete, membros superiores ao longo do corpo, em semiflexão de coxofemoral e joelhos, os indivíduos foram instruídos a posicionar uma das mãos na região média do reto abdominal fazendo uma leve pressão e a outra mão sobre a região do esterno, foi realizada uma inspiração lenta pelo nariz, para que fosse possível sentir a mão que estava sobre a região abdominal se elevar gradativamente. Essa técnica possui o intuito de estimular o diafragma por meio da propriocepção, favorecendo o padrão ventilatório diafragmático [23].

Os dados das características clínicas foram expressos por média ± desvio padrão (DP), para variáveis contínuas e valores absolutos (n), ou percentuais (%), para variáveis categóricas. O software utilizado para as análises estatísticas e preparação das figuras foi o GraphPadPrism (versão 5, Califórnia - EUA). Foi utilizado o Teste t pareado, para comparação dos momentos pré e pós-intervenção e Mann-Whitney para comparação entre os grupos. A correlação entre as variáveis foi verificada, com o teste de correlação de Pearson e o nível de significância adotado foi de 5%.

 

Resultados

 

Foram selecionados inicialmente 30 indivíduos, dos quais 4 foram excluídos do Grupo I, em função de desistência durante a intervenção. Assim sendo, apenas 26 voluntários realizaram o estudo em sua totalidade.

Para comparação entre os dados de variáveis da força muscular respiratória, PImáx, PEmáx e baropodometria observadas nos momentos pré e pós-intervenção, observamos que houve significância estatística com valor de P < 0,05, nas pressões avaliadas pela manovacuometria, como também na pressão média do pé direito e esquerdo, e pressão média da máxima do pé direito avaliadas pela baropodometria.

Foram observados ganhos significativos da PImáx e da PEmáx (Fig.1), bem como nas pressões médias do PD (pé direito) e PE (pé esquerdo), e na pressão média da máxima do PD (Fig.2), após intervenção fisioterapêutica.

 

 

A = PImáx nos momentos pré e pós-intervenção. B = PEmáx nos momentos pré e pós-intervenção mostrando valores estatisticamente significativos *P < 0,05 e **P < 0,01. Fonte: Dados do estudo.

Figura 1 - Distribuição representativa das variáveis estudadas pela manovacuometria.

 

 

A = pressão média do PD; B = pressão média do PE; C = pressão média da máxima do PD, mostrando valores estatisticamente significativos; *P < 0,05; **P < 0,01. Fonte: Dados do estudo.

Figura 2 - Distribuição representativa dos dados avaliados pela baropodometria, nos momentos pré e pós-intervenção.

 

Nossa hipótese sobre a associação entre a força muscular respiratória e a pressão plantar pode ser evidenciada pela correlação positiva apresentada por algumas variáveis avaliadas.

Nos dados correlacionados à força muscular expiratória máxima, os que apresentaram correlação significativa foram: superfície do pé direito no momento pré-intervenção (Fig.3), correlação positiva regular r = 0,57, r2 = 0,35, p = 0,01; pressão média máxima do pé esquerdo pós-intervenção (Fig. 4) mostrou correlação positiva forte r = 0,65, r2 = 0,42, p = 0,02 [24].

Quanto aos dados correlacionados à força muscular inspiratória máxima, a pressão média do pé esquerdo pós-intervenção (Fig.5) apresentou uma correlação forte r = 0,64, r2 = 0,42, p = 0,03; já a pressão média da máxima do pé direito pós-intervenção (Fig.6), apresentou uma forte correlação com r = 0,73, r2 = 0,53, p = 0,01.

Os resultados obtidos também evidenciaram uma forte correlação entre a pressão plantar e a PI máxima, quando somamos pressões médias máximas do pé direito e esquerdo pós-intervenção (Fig.7), sendo estas respectivamente r = 0,77, r2 = 0,59, p = 0,003. Esta hipótese pode ser confirmada, quando reavaliamos o grupo controle, composto por voluntários que não sofreram nenhum tipo de intervenção. Nesta reavaliação não foi encontrada correlação significativa, ressaltando a importância da intervenção fisioterapêutica, no que tange a força muscular respiratória e a pressão plantar.

 

 

Fonte: Dados do estudo.

Figura 3 - A associação positiva entre a PEmáx (força muscular expiratória máxima) pré e a superfície % do PD (pé direito) pré-intervenção.

 

 

Fonte: Dados do estudo.

Figura 4 - Correlação forte entre a PEmáx (força muscular expiratória máxima) pré e a pressão média da máxima do PE (pé esquerdo) pós-intervenção.

 

 

Fonte: Dados do estudo.

Figura 5 - Correlação forte entre a PImáx (força muscular inspiratória máxima) e a pressão média do PE (pé esquerdo) pós-intervenção.

 

 

Fonte: Dados do estudo.

Figura 6 - Correlação forte entre a PImáx (força muscular inspiratória máxima) e a pressão média da máxima do PD (pé direito) pós-intervenção.

 

 

Fonte: Dados do estudo.

Figura 7 - Correlação forte entre a PImáx (pressão inspiratória máxima) e a soma das pressões média da máxima do PD (pé direito) e PE (pé esquerdo) pós-intervenção.

 

Discussão

 

Da coleta e avaliação dos resultados, identificamos dois voluntários que não apresentaram alterações nas pressões inspiratórias pós-intervenção. A primeira voluntária, do gênero feminino, com 56 anos, baixo peso e tabagista; o segundo voluntário, do gênero masculino, com 46 anos, apresentando sobrepeso; ambos sedentários, com moderado risco para doença cardiovascular (DCV) ( R: C/Q: 80 cm e R: C/Q 90 cm); ao exame postural, apresentaram hipercifose torácica. A voluntária do gênero feminino, também não apresentou alteração na pressão expiratória pós-intervenção; porém, apresentou grande aumento em relação à pressão média do pé esquerdo.

Quirino et al. [25], ao realizarem um estudo que relatou os efeitos de um protocolo de exercícios, baseados no método Pilates, sobre as variáveis respiratórias, mostraram que os exercícios respiratórios baseados nesse método, podem gerar um aumento significativo tanto na PImáx quanto na PEmáx.

Já um voluntário do gênero masculino, 21 anos, tabagista e etilista, eutrófico e moderado risco para DCV, em seu exame postural, apresentou ombros deprimidos e hiperlordose lombar; não apresentou alterações na pressão expiratória, bem como na pressão média do pé direito pós-intervenção.

Alguns estudos demonstraram diferenças nas características musculoesqueléticas entre tabagistas e não tabagistas, como, por exemplo, a porcentagem e o diâmetro das fibras musculares tipo I, que se encontram em menores quantidades, como também a capacidade oxidativa dos músculos esqueléticos, tendo como característica o decréscimo da atividade enzimática mitocondrial [26]. Apesar desses achados, Freitas et al. [27] disseram ainda não haver clareza na literatura, se a influência do tabagismo realmente interfere na musculatura respiratória.

 Um voluntário do gênero masculino, 24 anos, tabagista, etilista, sedentário com obesidade grau I e alto risco DCV, nos chamou bastante a atenção, uma vez que apresentou diminuição na PImáx, e na pressão média do pé esquerdo pós-intervenção.

Harik-Khan et al. [28] relataram que o peso tem efeito positivo sobre a PImáx, devido a sua relação com o comprimento dos diferentes grupos musculares em isometria, afetando assim a massa muscular diafragmática. Alterações progressivas ocorrem na função pulmonar, advindo do acréscimo de gordura corporal que reveste a cavidade torácica, tanto dentro quanto sobre a cavidade abdominal [29]. No entanto, a alteração mais importante é a que acarreta a diminuição da capacidade residual funcional (CRF), acredita-se que a obesidade reduza a CRF à medida que algumas vias aéreas começam a fechar [30].

Schlederer et al. [31], ao realizarem um estudo mostrando a capacidade cardiorrespiratória de indivíduos obesos, relataram que estes possuem tendências a apresentarem diferenças nas pressões respiratórias máximas, bem como um padrão respiratório apical, podendo estas alterações ocorrerem devido à compressão extrínseca de tecido adiposo, localizada em maiores quantidades nas regiões basais em relação às regiões apicais.

Por outro lado, o voluntário que apresentou diminuição na pressão expiratória no momento pós-intervenção apresentou aumento na pressão média do pé direito, sendo este também do gênero masculino, 30 anos, etilista e ex-tabagista. De acordo com a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia [32], quanto maior a intensidade do tabagismo (mesmo para aqueles indivíduos ex-tabágicos), maior a tendência ao comprometimento da função pulmonar, podendo acarretar em doenças obstrutivas que restringem o fluxo expiratório. Em seu exame postural constatamos ombros deprimidos, tórax assimétrico e hiperlordose lombar. Katz [33] conclui que a posição corporal influencia na fisiologia pulmonar bem como nos resultados dos testes de função pulmonar. Em similaridade com este estudo, Milanesi [34] aponta que a ocorrência de hiperlordose lombar está associada aos baixos níveis de atividade física, principalmente a força de músculos que rodeiam a coluna, como os abdominais. Vale acrescentar que este mesmo voluntário, apesar de sedentário apresentou peso normal, porém, com risco moderado para DCV, detectado pela avaliação de seu IMC e RC/Q e CC, que influenciam desfavoravelmente na mecânica respiratória e na postura do indivíduo. Collins et al. [35], ao comparar os volumes pulmonares com a RC/Q, mostraram que há uma diminuição na capacidade pulmonar total, em indivíduos com a RC/Q elevada, ficando evidente principalmente naqueles do gênero masculino.

Em relação às pressões médias dos pés direito e esquerdo, um paciente do gênero masculino, 55 anos, com sobrepeso e alto risco para DCV, também nos chamou a atenção, pois apresentou aumento nas pressões de ambos os pés. Estudos relatam que indivíduos acima do peso, apresentam maiores picos de pressão plantar, quando comparados com indivíduos de peso normal; a influência do IMC em relação à pressão plantar pode acarretar em consequências estruturais para os pés, bem como para os membros inferiores, Hlavácek et al. [36], contradizendo o trabalho de Filippin et al. [37], que demonstraram que a massa corporal apresenta correlação baixa com a pressão média, explicando pouco sobre as variações da pressão plantar, entre indivíduos acima do peso, quando comparados com aqueles de peso normal.

Dois outros voluntários do gênero masculino, por terem apresentado grande aumento na pressão inspiratória no momento pós-intervenção, também mereceram destaque. Apesar de serem de idades diferentes, ambos eram sedentários e apresentaram a mesma alteração no exame postural, hipercifose torácica, acarretando em leve flexão de tronco e assimetria de tórax. Um com 53 anos e eutrófico, porém com risco moderado para DCV, e o outro com 68 anos e baixo peso. Cardoso et al. [38] evidenciaram que podem ocorrer déficits de força muscular respiratória, oriundos da diminuição de amplitude torácica, advindos da postura em flexão de tronco, acarretando assim em uma limitação da elevação das estruturas torácicas, bem como da expansibilidade pulmonar. Apesar desses achados, vale destacar que o voluntário com baixo peso também apresentou aumento na pressão expiratória pós-intervenção. Estes achados corroboram o que há na literatura, mostrando que a fisioterapia respiratória tem sido cada vez mais requisitada, para aprimorar o aumento das pressões respiratórias, uma vez que são utilizadas técnicas capazes de proporcionar uma melhora na mecânica respiratória, bem como na reexpansão pulmonar e no auxílio para a higiene brônquica [39].

 

Conclusão

 

Analisando conjuntamente os dados citados acima, podemos inferir que existe uma possível associação entre a força muscular respiratória e algumas variáveis de pressão plantar, avaliadas pela baropodometria. Além disto, nossos resultados demonstraram que os exercícios de reexpansão pulmonar, associados ao exercício diafragmático para aumento da força muscular respiratória, parecem ter sido capazes de influenciar diretamente estas variáveis. Entretanto, devemos considerar como limitação, o fato de termos estudado uma amostra reduzida e bastante heterogênea, como também a carência de publicações com o mesmo objetivo deste estudo, fazendo com que o caráter exploratório deste também se tornasse outra potencial limitação. Contudo, os estudos qualitativos envolvendo a utilização da baropodometria são reduzidos quando comparados aos quantitativos. Assim sendo, seria interessante que se fizessem futuros estudos sobre esta temática, com a utilização de uma amostra mais robusta e homogênea, uma vez que há grande divergência entre os dados secundários, os quais podem estar relacionados à heterogeneidade da amostra estudada.

 

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