ARTIGO ORIGINAL

Avaliação das funções cognitivas e mentais de crianças com distúrbios neuromotores: estudo preliminar

Assessment of cognitive and mental functions in children with neuromotor disorders: preliminary study

 

Gil Domingos de Oliveira Bezerra Lima*, Edna Karla Ferreira Laurentino*, Renan Alves da Silva Júnior**

 

*Discente do Curso Bacharelado em Fisioterapia nas Faculdades Integradas de Patos, **Doutorando, Mestre e Professor do Curso de Fisioterapia das Faculdades Integradas de Patos – FIP

 

Endereço para correspondência: Renan Alves da Silva Júnior, Faculdades Integradas de Patos, Rua Horácio Nóbrega, S/N, Bairro Belo Horizonte, 58704-000, Patos PB, Email: renanasjr@hotmail.com; Gil Domingos de Oliveira Bezerra Lima: gilzinhoblz@hotmail.com; Edna Karla Ferreira Laurentino: ednakarlaferreira@hotmail.com

 

Resumo

Introdução: O rastreio em relação ao desenvolvimento cognitivo infantil tem incentivado várias pesquisas que avaliam o nível intelectual infantil em diferentes idades, visto que a cognição representa variável determinante na estruturação e desempenho do desenvolvimento global da criança e podem proporcionar indicativos acerca do seu desempenho futuro. Através dos resultados obtidos no Mini Exame do Estado Mental (MEEM) foi possível rastrear até mesmo déficits escolares e de aprendizagem além das alterações cognitivas. Objetivos: Avaliar se há presença de disfunção cognitiva e mental em crianças com distúrbios neuromotores. Método: Trata-se de um estudo observacional aplicado, transversal, com abordagem quantitativa. A população foi constituída por 31 crianças do setor de fisioterapia pediátrica de uma clínica escola do sertão da Paraíba, sendo a amostra por conveniência 16 crianças com faixa etária de 3 a 14 anos. Para coleta de dados foi utilizado o MEEM que é composto por 11 itens e conta com uma pontuação total de 0 a 30 pontos. Resultados preliminares: Foram obtidos resultados preliminares da pesquisa, onde o MEEM foi aplicado até o momento em 7 crianças, dentre elas 4 apresentaram resultados excelentes, 1 regular e 2 insuficientes, de acordo com os pontos de corte e escolaridade de cada uma.

Palavras-chave: avaliação, cognição, distúrbios neuromotores.

 

Abstract

Introduction: Screening for child cognitive development has encouraged a number of research studies that assesses the intellectual level of children at different ages, since cognition is a determinant variable in the structuring and performance of the child's overall development and can provide indications about their future performance. Through the results obtained in the Mini Mental State Examination (MMSE) it was possible to track school deficits and learning beyond the cognitive alterations. Objectives: To evaluate the presence of cognitive and mental dysfunction in children with neuromotor disorders. Method: This is a cross-sectional observational study with a quantitative approach. The population consisted of 31 children from the pediatric physiotherapy sector of a school clinic in the sertão of Paraíba, and the sample for convenience was 16 children aged 3 to 14 years. For data collection the MEEM was used, which is composed of 11 items and counts with a total score of 0 to 30 points. Preliminary results: Preliminary results of the study were obtained, where the MMSE has been applied so far in 7 children, of which 4 presented excellent results, 1 regular and 2 insufficient, according to the cutoff points and schooling of each one.

Key-words: evaluation, cognition, neuromotor disorders.

 

Introdução

 

O desenvolvimento humano tem uma coerência biológica e organizada que surge no instante da concepção, matura e evolui em conformidade a interação com o ambiente e a estimulação. Durante o nascimento e a idade adulta o organismo humano gera profundas transformações, e as capacidades motoras das crianças evoluem abundantemente conforme sua idade e chegam a ser cada vez mais variadas, completas ou complexas [1].

A cognição pode ser apontada como um termo global empregado para referir as habilidades cognitivas ou o funcionamento mental que origina a capacidade para sentir, pensar, perceber, lembrar, raciocinar, formar estruturas complexas de pensamento e a aptidão para produzir respostas às necessidades e aos estímulos externos [2].

Diversos fatores podem prejudicar o desenvolvimento da criança, dentre as principais causas estão: prematuridade, baixo peso, infecções (meningite), distúrbios neurológicos (hidrocefalia, espinha bífida, anencefalia, microcefalia, Paralisia Cerebral), distúrbios cardiovasculares, respiratórios, entre outros. Assim quanto mais são os fatores, maior será a possibilidade do atraso no desenvolvimento da criança [3]. Algumas crianças manifestam comportamento motor com alteração, não devido à falta de controle sobre a força muscular, mas sim por falta de aprendizado motor devido à presença de disfunção perceptiva tais como: apraxia, agnosia visual ou agnosia espacial unilateral. Esses problemas são atribuídos devido a incapacidade de organizar corretamente os estímulos. As crianças que apresentam comportamento motor deficiente resultam de disfunção cerebral decorrente da incapacidade de conciliar a intenção à ação [4].

É constatado que a limitação motora pode acarretar déficits no desenvolvimento da comunicação com o meio, assim como obstáculos na construção do espaço e suas relações, repercutindo no desenvolvimento cognitivo. As crianças que nascem prematuras apresentam déficits cognitivos múltiplos, principalmente nas funções que requerem raciocínio lógico e de orientação espacial [5,6]. No desenvolvimento cognitivo e motor existe uma relação entre os dois, mesmo que não tão acentuado. A amplitude topográfica do comprometimento motor é uma condição que causa interferência nas características cognitivas. Todavia mais importante que esta familiaridade, os ambientes que essas crianças se desenvolvem e crescem causam influência no seu desenvolvimento devido às pessoas que neles estão [7].

O rastreio em relação ao desenvolvimento cognitivo infantil tem incentivado várias pesquisas que avaliam o nível intelectual infantil em diferentes idades, visto que a cognição representa variável determinante na estruturação e desempenho do desenvolvimento global da criança e podem proporcionar indicativos acerca do seu desempenho futuro [8]. E por meio do Mini Exame do Estado Mental (MEEM) que foi adaptado e validado para ser usado em crianças com idade entre 3 e 14 anos por Jain e Passi e através de scores serão avaliadas as funções cognitivas: Orientação espacial e temporal, memória imediata, atenção e cálculo, memória, linguagem e praxia construtiva [9].

 

Material e métodos

 

Tratou-se de um estudo observacional, corte transversal, de natureza aplicada com o objetivo exploratório, abordagem quantitativa, de natureza aplicada, pois foi voltada para obtenção de conhecimentos que podem contribuir para a amplificação do conhecimento científico e propor novas questões a serem averiguadas. Com o objetivo exploratório com finalidade de proporcionar maior familiaridade com o distúrbio, descritiva tendo como alvo apontar possíveis relações entre variáveis [10]. Classifica-se como um estudo de abordagem quantitativa, pois se fez uso de instrumento para coleta de informações e garantindo a exatidão dos resultados, evitando distorções de análise e interpretação [11]. A pesquisa foi realizada no setor de pediatria de uma clínica escola de fisioterapia localizada no sertão da Paraíba.

A população foi constituída por 31 crianças que são atendidas no referido setor. A amostra foi composta por 16 crianças de ambos os gêneros que tinham a faixa etária de 3 a 14 anos. Foram incluídos no estudo todos que estavam dentro dos critérios de elegibilidade para a realização da pesquisa. Os critérios de exclusão foram crianças que não estavam na faixa etária citada e que apresentavam déficits cognitivos graves e transtorno do espectro autista (TEA).

Para coleta de dados foi utilizado a escada do Mini Exame do Estado Mental (MEEM) que foi modificada por Jain e Passi para rastrear de forma simples e rápida o desempenho cognitivo de crianças. O MEEM é composto por 11 itens, que exige respostas sobre orientação temporal, orientação espacial, memória imediata, atenção e cálculo, memória, linguagem e capacidade construtiva.

Tratou-se de um teste breve de rastreio cognitivo para identificação de alterações cognitivas e mentais. A pontuação máxima é de 30 pontos. A nota de corte padrão foi de 13 pontos para indivíduos não alfabetizados, para pessoas com baixa/média escolaridade de 13 a 18 pontos e para indivíduos sem alterações e com mais de 8 anos de escolaridade é de 26 pontos a 30 pontos. Os dados (Escores obtidos no MEEM) foram tabulados no programa Microsoft Excel onde foi realizada a análise estatística, atribuindo-se média e desvio padrão aos indivíduos avaliados. Através dos resultados obtidos foi possível rastrear até mesmo déficits escolares e de aprendizagem além das alterações cognitivas.

Esse estudo foi conduzido com base na Resolução n° 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, sobre a ótica da bioética [12]. Foi submetido ao comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos nas Faculdades Integradas de Patos (CEP/FIP) via Plataforma Brasil, e sua execução teve início somente após a aprovação pelo CEP. Foi também solicitada a autorização institucional para a realização da pesquisa. A preservação da privacidade do sujeito está garantida mediante a assinatura dos Termos de Compromisso do Pesquisador Responsável. Número do parecer: 2.207.467.

 

Resultados preliminares

 

Neste artigo apresentamos os resultados preliminares da pesquisa em andamento, o MEEM foi aplicado até o momento em 7 crianças de ambos os gêneros com idades de 3 a 14 anos. Dentre as 7 crianças avaliadas, 4 apresentaram resultados excelentes, 1 regular e 2 insuficientes, de acordo com os pontos de corte e escolaridade de cada um (Tabela I).

 

Tabela I - Descrição dos escores e resultados do MEEM de cada participante da pesquisa.

 

Fonte: Resultados da Pesquisa.

 

Discussão

 

Um primeiro ponto essencial é que a avaliação de crianças tem algumas especificidades em relação com os de avaliação de adultos. Tendo como exemplo, não se pode deixar de acreditar que a criança é um ser em desenvolvimento, em outras palavras, expõe características diferentes dependendo da idade. Para observar esse evento, as escalas ou instrumentos de avaliação aplicados na infância devem apresentar versões específicas para diferentes faixas etárias [13].

O Mini Exame do Estado Mental (MEEM) foi idealizado para fazer parte da avaliação clínica do estado cognitivo em pacientes geriátricos. Foi titulado “mini” porque centraliza apenas aspectos cognitivos da atividade mental e excluí humor e atividade mentais atípicas que são avaliados por outro instrumento, a Escala de Demência de Blessed [14].

A adequação do Mini Exame do Estado Mental (MEEM), feita por Jain e Passi se fez eficaz para rastrear de forma simples e rápida o desempenho cognitivo de crianças, é importante salientar que esse instrumento pode ser usado como procedimento cotidiano em atendimentos pediátricos [15].

Da Rocha et al. [16] avaliaram 89 crianças pré-escolares de ambos os sexos com idade de 4 a 5 anos através da Escala de Maturidade Mental Colúmbia (EMMC), essa fornece uma aproximação da capacidade cognitiva de indivíduos de 3 anos e 6 meses a 9 anos e 11meses de forma especifica, a maioria (50,60%) das crianças de quatro anos (46,7%) e cinco anos (54,5%) apresentou classificação médio superior para maturidade cognitiva, sendo que, do total, apenas uma criança de quatro anos apresentou classificação inferior. Diante dos resultados puderam observar uma boa estimulação nesta área.

Lorenzon [17] verificou o desempenho de crianças em uma rede de ensino em Porto Alegre RS, com idades de 6 a 11 anos, estudantes da 1ª a 6ª série de 10 escolas sendo 378 do sexo masculino e 400 do sexo feminino através da aplicação do Mini Mental State Examination (MMSE), através dessa avaliação, observou que de acordo com o desenvolvimento normal entre 6 e 11 nos apresentam pontuação progressiva o total do MMSE e atenuante na pontuação entre 8 e 9 anos, sugerindo um progresso cognitivo através dos anos escolares.

Um estudo de Xavier et al. [18] aplicou o MEEM em 8 crianças de 07 a 14 anos com alterações hemisféricas comprovadas pelo quadro clínico motor (hemiparesias e/ou plegias), por exame de imagem (tomografia computadorizada) e diagnóstico confirmado de lesão unilateral (direito ou esquerdo), como resultados foi obtido que as alterações cognitivas variavam-se conforme o hemisfério lesionado, notou-se que as crianças com alterações no hemisfério esquerdo apresentou déficit relacionados a orientação espacial, memória, cálculo e linguagem, já no direito observou-se déficits na capacidade construtiva visual, em ambos hemisférios constatou-se déficit na orientação espacial, enfatizando a dificuldade de realizar esse tipo de estudo devido a carência de estudos envolvendo o tema abordado, tendo confirmado nesse estudo até o momento que das 7 crianças avaliadas, a grande maioria obteve score não satisfatório nos quesitos orientação temporal, orientação espacial, atenção e cálculo e confirmo a falta de estudos com utilização desse instrumento observada durante a realização dessa pesquisa, pois a grande maioria dos artigos encontrados com o objetivo de avaliar o cognitivo com uso do MEEM foram avaliações cognitivas em idosos.

 

Conclusão

 

No Brasil, é evidente a carência de instrumentos padronizados e atualizados no âmbito da saúde mental infantil que tenham sido adequadamente traduzidos, adaptados e testados em nossa realidade. Através do instrumento de avaliação utilizado no presente estudo, o MEEM, é possível rastrear até mesmo déficits escolares e de aprendizagem além das alterações cognitivas.

Através das avaliações feitas até o momento, os itens que foram observados maiores déficits, foram nos quesitos de orientação temporal, orientação espacial, atenção e cálculo. Durante a avalição das crianças foi observado que as patologias que os acometem não prejudicam tanto suas funções cognitivas e mentais, mas sim uma provável falta de acompanhamento dos mesmos nas escolas, pois muitos apresentaram déficit em orientação temporal, atenção e cálculo, também durante a avaliação notou-se uma super proteção dos pais com os mesmos, que possivelmente os impedem de ter uma maior interação com o meio, assim prejudicando o seu desenvolvimento cognitivo, principalmente nos quesitos orientação espacial e temporal, como também uma provável falta de melhor acompanhamento pedagógico.

 

Referências

 

  1. Neto FR. Manual de avaliação motora. Artmed; Porto Alegre, 2002.
  2. Adriana CBS; Taiane SB; Neméia AC. Avaliação cognitiva infantil nos periódicos científicos brasileiros. Psicologia: Teoria e Pesquisa 2015;31(1).
  3. Aline W; Camila CFA; Juliana OF. Desenvolvimento motor na infância: influência dos fatores de risco e programas de intervenção. Rev Neurocienc 2009;17(1):51-6.
  4. Shepherd BR. Fisioterapia em Pediatria. 3 ed. São Paulo: Santos;1995. p.338-43.
  5. Rizzo AMPP. Psicologia em Paralisia Cerebral: experiência no setor de psicologia infantil da AACD. Ferrareto I, Souza AMC. Paralisia Cerebral: aspectos práticos. 2ª ed. São Paulo: Memnon;2001. p.297-317.
  6. Dieter W et al. Cognitive status, language attainment, and prereading skills of 6 years old very preterm children and their peers: the Bavarian Longitudinal Study. Developmental Medicine & Child Neurology 1999;41(2):94-109.
  7. Renata HHV; Regiane HV. Correlação entre a função motora e cognitiva de pacientes com Paralisia Cerebral. Rev Neurocienc 2010;18(3):380-5.
  8. Maria BMB, Maria BML, Salim MJ. Aspectos cognitivos e comportamentais na média meninice de crianças nascidas pré-termo e com muito baixo peso. Psicologia: Teoria e Pesquisa 2001;17(1):49-57.
  9. Jain M, Passi GR. Avaliação de uma Escala Mini-Mental modificada para funções cognitivas em crianças. Pediatria indiana 2005;42(9):907.
  10. Antonio CG. Como elaborar projetos de pesquisa. 5 ed. São Paulo: Atlas; 2010.
  11. Fabiano MR, Ilse MB. Metodologia da pesquisa aplicável às ciências sociais. Como elaborar trabalhos monográficos em contabilidade. Teoria e prática 2003;3:76-97.
  12. Brasil. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Diário Oficial da União, 2013.
  13. Cristiane SD, Isabel ASB. Instrumentos de avaliação. Rev Bras Psiquiatr 2000;22:55-8.
  14. Folstein MF, Folstein SE, Mchugh PR. Mini-estado mental: um método prático para classificar o estado cognitivo dos pacientes para o clínico. J Psychiatry Res 1975;12:189-98.
  15. Peterson MOA et al. Perfil cognitivo, déficits motores e influência dos facilitadores para reabilitação de crianças com disfunções neurológicas. Rev Paul Pediatr 2011;29(3):320-7.
  16. Rocha FF et al. Análise do desempenho motor e maturidade cognitiva de pré-escolares de Maringá (PR). Saúde e Pesquisa 2017;9(3):507-15.
  17. Lorenzon SFS. Utilização do instrumento "mini-mental state examination" em crianças escolares de 6 a 11 anos da rede de ensino particular de Porto Alegre, RS, Brasil. [Dissertação]. Porto Alegre: UFRGS; 2001.
  18. Xavier EL et al. Avaliação das funções cognitivas em crianças com lesões hemisféricas: um estudo comparativo. Temas em Saúde 2016 (supl).