RELATO DE CASO

Efeito da ozonioterapia na cicatrização de feridas

Effect of ozonotherapy on wound healing

 

Bruna Fuhr Marchesini*, Silene Bazi Ribeiro**

 

*Graduanda em Fisioterapia na FSG Centro Universitário, Caxias do Sul/RS, **Professora do curso de Fisioterapia na FSG Centro Universitário, Caxias do Sul/RS

 

Recebido em 21 de junho de 2019; aceito em 14 de maio de 2020.

Correspondência: Silene Bazi Ribeiro, Rua João Venzon Netto, 95/48 Bl 2, 95032-200 Caxias do Sul RS

 

Bruna Fuhr Marchesini: bruunaamarchesini@gmail.com

Silene Bazi Ribeiro: silenebazi@gmail.com

 

Resumo

Introdução: Nos últimos anos, a prevalência de feridas crônicas tem aumentado devido ao crescimento da expectativa de vida, ao aumento das doenças crônicas e das comorbidades. O fisioterapeuta desempenha um papel importante no processo de cicatrização destas feridas, através de recursos capazes de acelerar o reparo tecidual, em destaque à ozonioterapia. O ozônio age como agente terapêutico, proporcionando benefícios à restauração tecidual, além do efeito antimicrobiano, bactericida e fungicida. Objetivo: Verificar o efeito da ozonioterapia na cicatrização de uma ferida crônica em um paciente com diabetes mellitus. Métodos: O participante foi submetido a uma avaliação e a coleta de material microbiológico antes e após o tratamento com ozônio. Foram realizadas 15 sessões de ozonioterapia, que ocorreram três vezes por semana com uma duração de 10 minutos. Resultados: No presente estudo foi encontrada a bactéria multirresistente Pseudomonas aeruginosa e obteve-se uma redução de 99% de unidades formadoras de colônias e houve uma diminuição de 45,5cm² da lesão tecidual. Conclusão: O processo de cicatrização foi quantificado pela área total da lesão tratada e, neste aspecto, a ozonioterapia demonstrou um resultado positivo, acarretando a redução da ferida. No entanto, o número de amostra foi insuficiente para obter um resultado estatisticamente significativo.

Palavras-chave: ozônio, ferimentos e lesões, cicatrização, Fisioterapia.

 

Abstract

Introduction: In recent years, the prevalence of chronic wounds has increased due to an increase in life expectancy, chronic diseases and comorbidities. The physiotherapist plays an important role in the healing process of these wounds, through resources capable of accelerating tissue repair, like ozone therapy. Ozone acts as a therapeutic agent, providing benefits to the tissue restoration, besides the antimicrobial, bactericidal and fungicidal effect. Objective: To verify the effect of ozonotherapy in the healing of a chronic wound in a patient with diabetes mellitus. Methods: The participant was submitted to an evaluation and the collection of microbiological material before and after treatment with ozone. Fifteen sessions of ozonotherapy were performed, which occurred three times a week with a duration of 10 minutes. Results: In the present study the multiresistant bacterium Pseudomonas aeruginosa was detected, and a 99% reduction of colony units was obtained with a reduction of 45.5 cm² of the tissue lesion. Conclusion: The healing process was quantified by the total area of the treated lesion and, in this aspect, ozonotherapy showed a positive result, leading to reduction of the wound. However, the sample number was insufficient to obtain a statistically significant result.

Keywords: ozone, wounds and injuries, healing, Physical therapy

 

Introdução

 

As feridas acometem a população de forma geral, independente do sexo, idade ou etnia constituindo um grave problema de saúde pública no Brasil, no que diz respeito ao grande número de enfermos com alterações na pele gerando gastos públicos [1]. Nos últimos anos, a prevalência de feridas crônicas tem aumentado devido ao crescimento da expectativa de vida da população e consequentemente com o aumento das doenças crônicas e comorbidades, sendo isto um dos principais fatores de risco para o surgimento das lesões crônicas, de difícil cicatrização e que necessitam de abordagem multiprofissional [2]. No Brasil, ainda não há dados estatísticos suficientes que comprovem tal fato, devido à escassez de registros [3].

Denomina-se ferida quando há perda da integridade da pele ou ruptura do tecido, podendo ocorrer o comprometimento desde a epiderme e derme, podendo chegar a tecidos mais profundos. A manutenção da integridade da pele é complexa, pois muitos fatores influenciam no desenvolvimento adequado de suas funções, como a idade, exposição aos raios ultravioletas, hidratação, medicações e nutrição. Para identificar o melhor tratamento destas feridas precisa-se compreender o processo de cicatrização e também os aspectos biopsicossociais que envolvem esses indivíduos [3]. Estima-se que as dificuldades de cicatrização atinjam entre 1 e 2% da população mundial em geral, destinando, assim, 2% do orçamento em saúde para o tratamento destas lesões [4].

A ferida se desenvolve devido a agressão ao tecido vivo, por distúrbios clínicos ou fisiológicos e, quando se encontra lesionada, todos os benefícios estruturais e funcionais podem estar comprometidos. Podem ser classificadas como agudas ou crônicas. As agudas normalmente cicatrizam dentro do tempo previsível, conforme os estágios do processo de cicatrização, como, por exemplo, as traumáticas e as cirúrgicas. Já as feridas crônicas, são mais complexas, não evoluem de acordo com as fases de cicatrização e em geral possuem um longo período para reparo e, frequentemente, são relacionadas às comorbidades tendo como exemplo as lesões diabéticas, úlceras vasculogênicas, feridas neoplásicas, dentre outras [5].

Independente da etiologia, as lesões teciduais podem ser únicas ou múltiplas, apresentar tamanhos e localizações diferentes, acometendo, frequentemente, a porção distal dos membros inferiores [5]. Os impactos provocados pelas feridas na população são diversos, tais como: incômodo, incapacidade, sofrimento, perda da autoestima, isolamento social, gastos financeiros, afastamento do trabalho e alterações psicossociais ao paciente e aos familiares [2,5].

A fisioterapia pode desempenhar um importante papel na reabilitação da pele facilitando a cicatrização, pois possui recursos terapêuticos capazes de acelerar este processo, como, por exemplo, laser, LED, alta frequência, correntes polarizadas, entre outros. Dentre eles, destaca-se a ozonioterapia, que é citada na literatura como um recurso eficiente para a reparação tecidual, além do efeito antimicrobiano, bactericida e fungicida, evitando a progressão e suas complicações, de modo a cicatrizar em um curto período [6].

O tratamento com o ozônio é uma modalidade terapêutica reconhecida em muitos países. Descrito pela primeira vez pelo químico alemão Cristian Friedrich Schönbeins, em 1834, como um gás com alto poder oxidativo, e considerado um desinfetante importante e altamente volátil [7]. Essa modalidade foi introduzida no Brasil, em 1975, pelo médico paulista Dr. Henz Konrad, que utiliza este método até os dias de hoje [8].

A ozonioterapia é uma terapia alternativa baseada no resultado da transformação de oxigênio (O2) medicinal em ozônio (O3), apresentando um odor característico, perceptível, possuindo boa eficiência e viabilidade econômica [9]. É um potente oxidante, melhora a oxigenação sanguínea, promove o aumento da flexibilidade dos eritrócitos, facilitando a sua passagem pelos vasos capilares. Garante um melhor suprimento de oxigênio tecidual, reduzindo a adesão plaquetária, atuando como analgésico e anti-inflamatório estimulando o crescimento do tecido de granulação e, em contato com fluídos orgânicos, promovendo a formação de moléculas reativas de oxigênio, as quais influenciam eventos bioquímicos do metabolismo celular, que proporcionam benefícios à reparação tecidual, facilitando o crescimento do tecido epitelial, inibindo crescimento bacteriano, além de promover o efeito antimicrobiano e fungicida [10].

Quando o sangue é exposto ao ozônio, esse reage com a água do plasma e com os ácidos graxos insaturados presentes nas membranas das células, originando o peróxido de hidrogênio (H2O2) e produtos de oxidação dos lipídios, que estimulam a liberação de interleucinas-8, substância que auxilia na quimiotaxia, que atrai os leucócitos da circulação para os tecidos. Além disso, também estimula a liberação do fator de crescimento 1 (TGF-b1), que é importante na aceleração do reparo tecidual, ativando os linfócitos e monócitos e, também, a liberação de citocinas nos tecidos e na circulação, gerando assim uma estimulação do sistema imunológico. [11]

Com excelentes resultados curativos de menor custo e de fácil aplicação, a ozonioterapia tem sido referência no processo de reparação tecidual e pode ser administrado de forma tópica (através de bags), local ou sistêmica, variando de acordo com a indicação clínica [12]. Na América Latina e nos Estados Unidos é aplicada como uma alternativa eficiente e de baixo custo, auxiliando no tratamento de feridas de difícil cicatrização, principalmente em pacientes diabéticos e na desinfecção de feridas contaminadas [13].

Outro recurso que contribui para o cuidado da reparação tecidual é a coleta de material microbiológico que identifica e quantifica os agentes que se alojam no leito da lesão. Atualmente, o método mais utilizado para monitorar as feridas infectadas é o swab que pode ajudar a avaliar e a conduzir o tratamento adequado, minimizando as complicações para o paciente [14].

No Brasil, apesar dos avanços científicos, a aplicação da ozonioterapia ainda é pouco utilizada. Tal fato se deve à falta de estudos e ao desconhecimento desta abordagem terapêutica que serviria de suporte científico para o seu emprego no reparo cutâneo. Desta forma, o presente estudo teve como objetivo verificar o efeito da ozonioterapia na cicatrização de ferida crônica em paciente com diabete mellitus.

 

Material e métodos

 

Trata-se de um estudo descritivo intervencionista com delineamento longitudinal, em que a amostragem fora realizada de forma não probabilística, consecutiva e por conveniência. A coleta de dados foi realizada no Centro Integrado de Saúde da FSG Centro Universitário, após aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa da Instituição sob parecer de nº 2.693.116, em 05 de junho de 2018.

Previamente, foi esclarecido ao paciente quanto aos objetivos do estudo, bem como sobre a garantia do anonimato e do direito de desistir da pesquisa em qualquer fase da mesma. Além disso, o indivíduo foi instruído a não utilizar qualquer tipo de tratamento tópico que pudesse auxiliar na cicatrização da ferida a fim de evitar possíveis vieses de pesquisa. O desenvolvimento da pesquisa iniciou-se mediante avaliação, realizada através de um questionário elaborado pela pesquisadora contendo: informações sociodemográficas; condições inerentes ao paciente (etilismo, tabagismo, doenças associadas, entre outros); avaliação da lesão (etiologia, localização, mensuração, entre outros), com a finalidade de caracterizar o tipo de amostra.

Em seguida, utilizou-se a escala de PUSH [15], na qual foi possível identificar e classificar o grau de comprometimento da região em que se encontrava a ferida. Essa escala, preenchida pelo avaliador, observa três parâmetros: área da ferida (em centímetros quadrados) – relacionando a multiplicação das medidas de maior comprimento (céfalo-caudal) vs. a maior largura (em horizontal da direita para a esquerda), obtendo-se valores que variam de 0 a 24cm² e escores que variam de 0 a 10 conforme a área obtida; a quantidade de exsudato presente na ferida, classificando como ausente (escore 0), pequena (escore 1), moderada (escore 2) e grande (escore 3); e ao tipo de tecido, definida como a aparência da ferida nessa região, sendo determinada como: tecido necrótico (escore 4), de coloração castanha, marrom ou preta; desvitalizado (escore 3), tecido de coloração branca ou amarela; tecido de granulação (escore 2), de coloração rósea ou vermelha; tecido epitelial (escore 1), manifesta-se como novo tecido róseo ou brilhante que se desenvolve a partir das bordas, ou como “ilhas” na superfície da lesão (feridas superficiais); e tecido cicatrizado (escore 0), recoberta completamente por epitélio. O resultado obtido deve ser registrado a fim de observar a evolução da reparação tecidual antes e depois do tratamento.

Ao longo de todas as sessões, a ferida foi higienizada com solução fisiológica a 0,9% e seca com gaze, antes da aplicação do ozônio. Na primeira e na última aplicação da ozonioterapia fora realizada a coleta de material microbiológico através do swab, procedimento simples e de baixo custo, utilizado a fim de verificar a eficácia do ozônio na redução do crescimento bacteriano. O swab foi esfregado no leito da ferida em forma de zig-zag atingindo pelo menos dez pontos, com o cuidado de não tocar as margens, com a finalidade de evitar a contaminação da amostra. Após a coleta, o swab foi introduzido em um recipiente que o acompanha, o meio de transporte stuart, com o objetivo de preservar as bactérias. As amostras eram identificadas e encaminhadas ao Laboratório Escola de Biomedicina, situado no mesmo local da coleta, para análise do material microbiológico dentro do período de 1 hora. Por meio da técnica de rolamento, depositaram a coleta na placa pelo método de esgotamento a fim de identificar o tipo de bactéria existente na lesão. O cultivo dos micro-organismos foi realizado por meio de Ágar Muller-Hinton em uma temperatura de 37ºC e o acompanhamento do crescimento foi realizado em 12 horas e 24 horas. Em seguida ao período de incubação, a contagem da microbiota era realizada através de uma lupa para se obter o cálculo de unidade formadoras de colônia (UFC).

Os registros fotográficos para acompanhamento da evolução da ferida ocorreram no primeiro dia e ao fim do estudo utilizando a câmera do celular iPhone 7 Plus de 12 MP, em uma distância de 10 centímetros mensurados através de uma fita métrica, para verificar a evolução da reparação tecidual.

Para a execução do tratamento com ozonio foi utilizado um equipamento Oxy conforme registro da ANVISA sob nº10411520027 da marca Tonederm®. Esse equipamento consiste em um gerador de ozônio que transforma o oxigênio medicinal em gás ozônio através do efeito corona. O tratamento tópico com o gás requer um sistema fechado de circulação da mistura gasosa, ou seja, a parte do corpo onde possui a ferida é colocada dentro de uma bolsa plástica transparente (bag), feita de material ozonio-resistente, cujas bordas são vedadas através de uma faixa elástica junto à pele e, em seguida, o bag é insuflado com gás ozônio em uma concentração de 60 mg/L, conforme declaração de Madri.

 

Apresentação do caso

 

Participou deste estudo um paciente do sexo masculino com 62 anos de idade de cor branca, portador de diabetes mellitus do tipo 2 e usuário de Insulina Humana Recombinante (NPH), que possuía uma ferida de origem traumática de difícil cicatrização há 7 meses. No que se refere ao exame físico, paciente em bom estado geral, consciente, orientado, ativo, deambulando com auxílio de muleta contralateral a lesão devido à artrose de joelho, apresentando ferida de extensão média em terço distal e posterior do membro inferior esquerdo (MIE); leito da lesão com tecido de granulação; ausência de exsudato e odor; bordas bem definidas; aderidas ao leito e com pequenas áreas de fibrina; pele adjacente edemaciada, com descamação ao redor da lesão tecidual, sem queixas álgicas.

O participante foi submetido a quinze sessões de ozonioterapia, que ocorreram três vezes por semana durante o período de um mês e nove dias, pelo mesmo avaliador. O emprego da ozonioterapia era realizado após a limpeza da ferida, com um tempo de duração de 10 minutos e, ao final da aplicação, o ozônio era aspirado do bag, retirado do paciente e realizado o curativo da ferida com gaze e ataduras.

 

Resultado e discussão

 

No presente estudo pode-se verificar através da escala de PUSH a diferença entre a primeira e a última sessão. Nota-se que houve diminuição da lesão tecidual em 2 centímetros (cm) de comprimento e 3,5cm de largura, sendo assim, a área da ferida apresentou uma redução de 45,5 cm². A quantidade de exsudato manteve-se ausente na lesão. Quanto ao tipo de tecido, no primeiro dia de sessão foi encontrado tecido de granulação com uma coloração vermelho-vivo e de aspecto brilhante e, no último dia de tratamento, percebeu-se uma melhora do leito da ferida e crescimento do tecido epitelial, ou seja, uma pele nova que cresce a partir dos bordos da lesão, com coloração cor-de-rosa brilhante.

De acordo com os registros fotográficos do antes e depois de 15 sessões (figura 1), pode-se observar a melhora da cicatrização tecidual além da melhora da hidratação da pele, diminuição da escamação, que é uma característica adjacente à lesão tecidual e aumento do aporte sanguíneo local, com melhora significativa da coloração da pele. Também foi possível perceber, durante o tratamento a satisfação, melhora da autoestima do paciente e aceitação do tratamento com ozonioterapia.

 

 

Fonte: Autor

Figura 1 - Antes (A) e depois (B) do tratamento com ozonioterapia.

 

Através da análise microbiológica (Figura 2), foi encontrado a bacteria Pseudomonas aeruginosa, bactéria gram-negativa muito resistente a vários tipos de antibióticos devido à presença da membrana dupla que envolve cada célula da bacteria, impedindo a entrada dos antibióticos na célula [16]. Na primeira sessão não foi possível realizar a contagem das colônias pois o valor encontrado foi maior que 100.000/UFC, apesar de sua resistência, após 15 sessões de ozonioterapia, o valor encontrado foi menor de 350/UFC, ou seja, houve redução de contagem de colônias.

 

 

Fonte: Autor.

Figura 2 - Análise microbiológica antes (A) e depois (B) de 15 sessões de tratamento com ozonioterapia.

 

Em um estudo publicado na Revista Espanhola de Ozonioterapia no ano de 2017, participaram da análise 10 pacientes que apresentavam feridas de diferentes origens localizadas em membros inferiores com diâmetro igual ou superior a 2cm, submetidos ao tratamento com ozônio. Foram utilizadas concentrações de 60 µg/ml e de acordo com a evolução foram progressivamente reduzidas para 20 µ g/ML, o tempo de aplicação foi de 30 minutos uma vez por semana. Os autores observaram que houve uma aceleração no processo de cicatrização de úlceras cutâneas demonstrada por um aumento no tecido de granulação, maior vascularização, redução ou desaparecimento da dor, diminuição do edema, reepitelização, diminuição do diâmetro da lesão e fechamento da ferida em 3 casos [17].

De acordo com um dos primeiros estudos ilustrados com o tratamento de ozônio, publicados em Barcelona no ano de 1991, foram incluídos 34 indivíduos de ambos os sexos, com idade média de 69 anos, apresentando feridas crônicas. Ao início do tratamento, foi efetuado o cultivo do exsudato e foram encontradas Staphylococcus aureus e Pseudomona aeroginosa, e a infecção por estes patógenos foi tratada por antibioticoterapia e utilização de forma tópica do ácido acético, respectivamente. No início do tratamento foram utilizadas concentrações altas de gás ozônio (75 µg/ml), diminuindo conforme a medida do crescimento do tecido de granulação. Em uma média de 14 sessões, com duas aplicações por semana com duração de 20 min, fora observado a cicatrização completa em 33 pacientes, exceto um, pois o diâmetro da ferida era maior que 14 cm², corroborando a análise do presente estudo [18].

Conforme um estudo caso-controle realizado em 2004 no Brasil, utilizando o óleo de girassol ozonizado em ratos, para testar sua atividade antimicrobiana contra algumas cepas patológicas in vitro, como, por exemplo, Staphylococcus aureus, Pseudomonas aeroginosa, Candida albicans, S. typhimurium e Escherichia coli pelo método de difusão em ágar, o resultado mostrou ação anti-inflamatória contra todas as cepas testadas, efeitos protetores e cicatrizantes sobre o tecido conjuntivo da pele [19].

Outro importante estudo realizado com o gás ozônio na Unidade de Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental (UTECE) da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo em 2004, utilizando um modelo experimental in vitro para verificar a eficácia dos gases ozônio, dióxido de carbono e hélio sobre o crescimento bacteriano. Neste estudo foram utilizadas três cepas de Staphylococcus aureus, Escherichia coli e Pseudomonas aeruginosa as quais foram expostas por uma hora sob os fluxos dos gases e pressão constantes em 2 l/m e 11 mmHg, respectivamente. Após 24 horas em estufa, foi realizada uma leitura qualitativa e quantitativa das culturas no dia seguinte, em que o ozônio foi o único, entre os gases testados, a promover a esterilização de 100% dos laminocultivos e a inibição do crescimento bacteriano. Portanto, o uso do ozônio no tratamento da pele é benéfico, pois inibe o crescimento bacteriano acelerando o processo de cicatrização [20].

Num relato de caso com caninos que apresentavam grande perda tecidual realizado em 2016 em Canoas/RS, foi utilizada a terapia de óleo de girassol ozonizado (duas vezes ao dia) combinado com a ozonioterapia através de bag numa concentração de 40 µg/ml, por 20 minutos a cada três dias. Os autores perceberam que em 7 dias o tecido de granulação era evidente com início de contração tecidual e, semanalmente, observaram uma redução significativa na extensão e na profundidade das feridas e, em 60 dias elas encontravam-se totalmente cicatrizadas. Concluiram que a ozonioterapia é uma excelente opção de tratamento no que diz respeito à reparação dos tecidos e recuperação dos pacientes [21].

Na busca por gerar altos níveis de evidência científica, em 2010, fora publicado na China a primeira meta-análise sobre ozonioterapia para o manejo de úlceras crônicas. Constituído por três ensaios clínicos randomizados com 212 participantes comparando a terapia de ozônio com qualquer outra intervenção para úlceras do pé diabético. Um deles, com 101 participantes, comparou o tratamento com ozônio vs. terapia com antibióticos, durante um período de 20 dias, e observou-se que a terapia com o gás foi associada a uma redução maior da área da úlcera em menor tempo de internação, no entanto não afetou o número de úlceras cicatrizadas. Da mesma maneira, dois ensaios, com 111 participantes, compararam o tratamento com o gás associado à terapia convencional vs. manuseio convencional apenas. Neste caso, os resultados da metanálise não evidenciaram diferença estatisticamente significativa entre os grupos para os resultados de redução da área da úlcera e o número de úlceras cicatrizadas [22].

Da mesma forma, em uma revisão sistemática realizada na Austrália publicada neste ano, os autores incluíram ensaios clínicos randomizados, cujo objetivo foi avaliar os benefícios e os malefícios da ozonioterapia no manejo de feridas crônicas. Nove estudos com 453 pacientes foram incluídos sendo possível constatar que na maioria dos estudos analisados, houve melhora significativa na cicatrização da ferida. Esses resultados indicam a importância do ozônio como opção terapêutica no tratamento de feridas crônicas com altas taxas de melhora em tempos mais curtos [23]. Outros autores relatam a relevância do tratamento com a ozonioterapia na cicatrização de feridas crônicas, visto que o ozônio demonstrou propriedades antissépticas, acelerou a formação de tecido de granulação e o crescimento de novos vasos sanguíneos, aumentando consequentemente o fluxo sanguíneo no local da lesão tecidual diminuindo o tempo de cicatrização [24].

De acordo com um estudo caso-controle, realizado na Universidade Católica da Coreia, em 2009, cujo objetivo foi avaliar os efeitos terapêuticos do óleo de oliva e o uso do ozônio na reparação tecidual aguda, observou-se que a cicatrização das feridas no grupo de ozônio mostrou uma área significativamente menor quando comparada ao grupo do óleo e concluiu-se que o ozônio pode melhorar a cicatrização da lesão cutânea aguda. Tal fato implica que a exposição tópica do ozônio pode afetar a formação de tecido de granulação do processo de cicatrização [25].

Evidências experimentais sugerem que o processo de cicatrização nas feridas crônicas é obstruído por isquemia local devido à hipóxia, ácido lático, espécies reativas de oxigênio e citocinas pró-inflamatórias. No presente estudo, observou-se que o ozônio teve efeitos positivos sob o indivíduo portador de diabetes mellitus e, também, notou-se que o processo de cicatrização era proeminentemente acelerado ao mesmo tempo em que se pode analisar o crescimento do tecido epitelial, a regeneração do tecido adjacente e a melhora da circulação sanguínea.

Contudo, o tratamento de feridas crônicas que acompanham múltiplas comorbidades, como a descrita aqui, apresenta um considerável desafio terapêutico e requer uma abordagem multidisciplinar. O padrão de tratamento para a cicatrização de feridas crônicas já foi bem estabelecido, e a abordagem adequada e precoce é a base de tudo, visto que ferimentos superficiais podem, com o tempo, evoluir para os tecidos subcutâneos, músculos, tendões ou ossos e, consequentemente, tornar a ferida incurável, que podem, em últimos casos, exigir a amputação do membro que podem ser incapacitantes.

 

Conclusão

 

No presente estudo, o processo de cicatrização de feridas foi quantificado pela área total da lesão tratada. Neste aspecto a ozonioterapia demonstrou um resultado positivo, acarretando a diminuição desta área.

Em vários estudos a terapia com o ozônio traz resultados positivos no reparo tecidual, além de atuar de modo eficiente em outras condições patológicas e fisiológicas. Pode ser considerada uma vantagem para a saúde pública já que é uma alternativa de baixo custo que promove a aceleração do processo cicatricial e que pode ser uma alternativa complementar ao tratamento de feridas.

A cicatrização de feridas é um processo complexo; portanto, não é possível determinar com exatidão a porcentagem de ozônio responsável, mas, de acordo com a literatura, nosso relato de caso confirma um importante envolvimento da ozonioterapia no reparo tecidual quando os tratamentos tradicionais não são adequados.

Em conclusão, podemos dizer que, de acordo com a literatura, este estudo sugere um papel importante da Fisioterapia na promoção da cicatrização de feridas crônicas. De qualquer forma, outros estudos são necessários para confirmar a eficácia como adjuvante à modalidade convencional de tratamento.

 

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