ARTIGO ORIGINAL

A equoterapia como recurso fisioterapêutico junto a indivíduos com diagnóstico de paralisia cerebral

Equine-assisted therapy as a physiotherapy research next to individuals with diagnosis of cerebral paralysis

 

Victor Hugo de Jesus Freire*, Náthila Lorrana Silva Cardoso*, Layane Andressa Martins Ramos*, Jaqueline Pinheiro da Silva*, Ana Cristina Vidigal Soeiro, D.Sc.**

 

*Acadêmicos do Curso de Fisioterapia da Universidade do Estado do Pará (UEPA), Campus CCBS II, **Psicóloga, Docente do Curso de Fisioterapia da Universidade do Estado do Pará (UEPA)

 

Recebido 8 de julho de 2019; aceito 15 de dezembro de 2019.

Correspondência: Victor Hugo de Jesus Freire, TV. Jutaí, 06 Coqueiro 67120-184 Ananindeua PA

 

Victor Hugo de Jesus Freire: vicctorfreire@gmail.com

Náthila Lorrana Silva Cardoso: nathilalorrana@hotmail.com

Layane Andressa Martins Ramos: layane.andressa.18@gmail.com

Jaqueline Pinheiro da silva: Jacquelinepinheiro2017@gmail.com

Ana Cristina Vidigal Soeiro: acsoeiro1@gmail.com

 

Resumo

Introdução: A equoterapia é um método terapêutico utilizado na reabilitação e educação de pessoas com necessidades especiais e/ou portadoras de deficiência, caracterizado pelo uso do cavalo e por uma abordagem multidisciplinar, voltada ao desenvolvimento biopsicossocial do indivíduo. Objetivo: Compreender as repercussões biopsicossociais da equoterapia na reabilitação de indivíduos diagnosticados com paralisia cerebral, tomando como eixo de análise os ganhos físicos, sociais e psicológicos. Métodos: Estudo exploratório, observacional e descritivo, com delineamento quanti-qualitativo, realizado no Centro Interdisciplinar de Equoterapia (CIEQ-PA), em Belém/PA, mediante a aplicação de questionários com 10 responsáveis/acompanhantes, 6 profissionais da equipe multiprofissional e 1 fisioterapeuta. Os dados foram analisados com estatística descritiva simples e através da organização das respostas por categorias empíricas. Resultados: A pesquisa revelou que a equoterapia trouxe benefícios físicos, psicológicos e sociais às pessoas com diagnóstico de PC, com destaque para a melhora da postura e equilíbrio, bem como das interações sociais, o que reflete sua importância como uma estratégia para potencializar a inclusão social desses indivíduos. Conclusão: Os achados demonstram que se trata de uma modalidade terapêutica transversal e um campo de atuação da fisioterapia com impactos positivos na reabilitação biopsicossocial e no desenvolvimento global dos indivíduos.

Palavras-chave: terapia assistida por cavalos, paralisia cerebral, Fisioterapia, interdisciplinaridade.

 

Abstract

Introduction: Equine therapy is a therapeutic method for the rehabilitation and education of people with special needs and/or disabled, using the horse in a multidisciplinary approach, focused on the biopsychosocial development of the individual. Aim: To understand the biopsychosocial repercussions of equine therapy in the rehabilitation of individuals diagnosed with cerebral palsy, taking physical, social and psychological gains as their axis of analysis. Methods: An exploratory, observational and descriptive study was carried out with a quantitative-qualitative design, held at the Interdisciplinary Center for Equine Therapy (CIEQ-PA), in Belém/Pará, through the application of questionnaires with 10 responsible/accompanying persons, 6 professionals from the multiprofessional team and 1 physiotherapist. The data were analyzed using simple descriptive statistics and by organizing the answers by empirical categories. Results: The research revealed that equine therapy is an important therapeutic strategy that brings physical, psychological and social benefits to PC patients, with emphasis on improved posture and balance, as well as social interactions, which reflects its importance as a strategy for enhancing social inclusion of these individuals. Conclusion: The findings demonstrate that this is a cross-sectional therapeutic modality and a field of physical therapy with positive impacts on biopsychosocial rehabilitation and overall development of individuals.

Keywords: equine-assisted therapy, cerebral palsy, physical therapy specialty, interdisciplinarity.

 

Introdução

 

As pesquisas científicas envolvendo a equoterapia se intensificaram desde 1969, com a publicação do primeiro trabalho sobre a temática, pelo Hospital Universitário de Salpêtrière, em Paris. Naquela época, a publicação já representava o prenúncio de uma modalidade de intervenção que progressivamente ganharia visibilidade em várias partes do mundo, embora os benefícios terapêuticos proporcionados pelo ato de cavalgar já fossem conhecidos há muito tempo [1,2].

O termo “equoterapia” vem do latim equus e do grego therapeia, e foi registrado no Brasil em 1989, quando foi fundada a Associação Nacional de Equoterapia (ANDE-BRASIL), uma instituição com objetivos terapêuticos, educativos e culturais, com sede em Brasília. Atualmente, a entidade mantém convênio com várias instituições públicas e privadas em diferentes países [2], tendo assumido um importante papel na criação de diversos centros de equoterapia em território nacional.

 

Equoterapia, Reabilitação em Saúde e Fisioterapia

 

A equoterapia é considerada um método de reabilitação e educação de pessoas com necessidades especiais ou portadoras de algum tipo de deficiência, caracterizado por uma abordagem multidisciplinar, que inclui a utilização de cavalos com o intuito de promover o desenvolvimento motor e biopsicossocial do indivíduo [3]. Como modalidade de intervenção terapêutica, melhora o equilíbrio, a postura e a psicomotricidade, estimulando maior consciência corporal. Dependendo da condição clínica, tais progressos ocorrem devido à melhora da visão vertical do mundo, haja vista que o indivíduo consegue compreender com maior facilidade as informações e estímulos que lhe são apresentados [4].

A fim de viabilizar o caráter terapêutico da equoterapia, o cavalo é treinado para adotar um comportamento dócil e passivo durante a interação com o praticante. Trata-se de uma modalidade de intervenção na qual a presença do animal é introduzida de forma intencional e direcionada a objetivos previamente definidos, como uma estratégia que estimula ganhos físicos e psicológicos, incluindo melhora nos vínculos afetivos, elevação da autoestima e autoconfiança [3,5]. O próprio contexto no qual as atividades são realizadas, longe do ambiente restrito das clínicas e mais próximo da natureza, promove uma atmosfera relaxante e prazerosa, com positivas repercussões nas condições emocionais [6,7].

De acordo com a ANDE-Brasil, existem quatro programas básicos dentro do método: hipoterapia (o praticante não possui capacidade para manter-se sozinho sobre o cavalo); educação e reeducação (o praticante tem condições de exercer alguma atividade sobre o animal, mas com limitação); pré-esportivo (o praticante possui total domínio sobre o cavalo); e esportivo (o praticante tem total capacidade de exercer provas e atividades mais especificas e elaboradas sobre o animal) [7]. Assim, cada método é planejado de acordo com as metas a serem alcançadas, considerando-se também a condição física e as características do praticante.

Em 27 de março de 2008, o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO), através da Resolução nº 348, aprovou o uso da equoterapia no exercício das atividades profissionais. Segundo as recomendações do referido documento, o profissional deverá atuar com base no diagnóstico cinético-funcional, em consonância com a Classificação Internacional de Funcionalidade, e de acordo com os objetivos terapêuticos específicos de sua área de atuação [8].

 

Paralisia cerebral: um campo de possibilidades para uso da equoterapia

 

A PC é uma condição caracterizada por dificuldades decorrentes de uma lesão não progressiva que ocorre no cérebro ainda imaturo, resultando em limitações funcionais. Esta lesão pode ocorrer antes, durante ou logo após o nascimento (neonatal), mas também há casos em que ela se manifesta após o primeiro mês de vida (adquirida). Em cada 1000 nascidos vivos, 3 indivíduos são acometidos pela doença [9,10].

As pessoas diagnosticadas com PC apresentam distúrbios motores que incluem alterações neuromusculares, permanência de reflexos primitivos, rigidez, espasticidade, entre outros. Frequentemente, tais distúrbios são acompanhados de alterações de controle postural, sensibilidade, percepção, cognição, comunicação e comportamento, além de problemas musculoesqueléticos secundários [10].

O tratamento inclui intervenções medicamentosas, cirúrgicas e clínicas. O objetivo principal é o aumento da independência por meio da melhora da capacidade funcional. Outra meta importante do tratamento é o desenvolvimento da psicomotricidade e da reeducação postural, através da melhora da consciência corporal do indivíduo, para que o mesmo seja capaz de conseguir sustentar o corpo como um todo, passando assim a manter sua postura automática e com alinhamento ereto, sendo a equoterapia uma das terapias utilizadas para atingir este objetivo [11].

As metas primordiais da equoterapia são diversas e incluem os ganhos na qualidade de vida e na inclusão social, por meio da interação entre o praticante e o cavalo, como também entre o praticante e toda a equipe multiprofissional. Neste aspecto, a integração da equipe e o trabalho coletivo são fundamentais, além disso, o contato contínuo dos praticantes entre si é importante para a expansão do convívio social e os laços afetivos do indivíduo diagnosticado com PC [12,13].

A escolha da temática como objeto da presente discussão foi motivada pela necessidade de conhecer as atividades desenvolvidas em um centro de reabilitação localizado na região metropolitana da cidade de Belém, de modo a compreender as repercussões biopsicossociais da equoterapia na reabilitação de indivíduos diagnosticados com paralisia cerebral, tomando como eixo de análise os ganhos físicos, sociais e psicológicos, sob a ótica de responsáveis e acompanhantes, como também da equipe de saúde, incluindo a Fisioterapia.

 

Material e métodos

 

Trata-se de um estudo exploratório, observacional e descritivo, realizado após aceite institucional e aprovação prévia por parte do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) através do parecer 2.852.639.

O ambiente escolhido para a coleta de dados foi o Centro Interdisciplinar de Equoterapia (CIEQ-PA), órgão que presta atendimento público à população, sendo utilizado também como local de treinamento da cavalaria da polícia militar. Nele, são realizados os quatro programas básicos da equoterapia, voltados para atender a diferentes demandas. O público a quem se destinam as atividades é composto majoritariamente por pessoas com síndrome de Down e paralisia cerebral, mas no local também são atendidas pessoas com outras necessidades especiais. Os frequentadores geralmente obtêm conhecimento do centro e do serviço oferecido por meio de outras pessoas que já realizaram o atendimento.

O estudo teve início com uma visita ao centro visando a obtenção de informações prévias sobre a estrutura e funcionamento das atividades, incluindo a agenda de sessões de cada praticante e a disponibilidade dos profissionais. No contato inicial, quando foi feita a abordagem aos potenciais participantes, eram fornecidas informações gerais sobre a natureza e os objetivos da pesquisa, e a necessidade de assinatura do Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE).

Após o aceite, os participantes foram convidados a responder a um questionário semiestruturado, e planejado para atender aos objetivos da pesquisa. Como o estudo envolvia a percepção dos responsáveis/acompanhantes e da equipe multiprofissional, foram feitas adaptações no instrumento de forma a contemplar as diferentes perspectivas de investigação, mas com conteúdo semelhante, a fim de manter o foco de análise. O questionário incluía informações sobre a importância da equoterapia e os benefícios biopsicossociais observados no cotidiano dos praticantes que frequentavam o centro. Como todos os praticantes eram menores de idade, a pesquisa priorizou a participação de responsáveis e acompanhantes dos menores, já que era previsto que os mesmos teriam melhor condição de descrever as repercussões, em função do contato contínuo e prolongado com os mesmos.

No total, foram incluídos 10 responsáveis/acompanhantes de crianças e adolescentes com paralisia cerebral, que realizavam sessões de equoterapia no CIEQ-PA à época da coleta de dados. Como integrantes da equipe multiprofissional, participaram 6 profissionais, sendo 1 psicólogo, 1 equitador, 1 terapeuta ocupacional, 2 fonoaudiólogas e 1 fisioterapeuta. O quadro I apresenta a composição e perfil da equipe multiprofissional. A maioria dos profissionais atuava exclusivamente no local, possuindo considerável tempo de prática na modalidade.

 

Quadro I – Características da equipe multiprofissional.

 

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

 

Resultados

 

Os responsáveis/acompanhantes das crianças e adolescentes tinham faixa etária entre 31 e 60 anos, com grau de parentesco materno (80%) e paterno (20%). Na avaliação da equoterapia como uma modalidade de tratamento, 90% das respostas classificaram seu efeito como excelente e 10%, como bom, o que revelou uma satisfação em relação aos benefícios alcançados.

Os acompanhantes/responsáveis justificaram suas respostas afirmando que o contato com o animal torna a reabilitação mais atraente, gerando resultado mais rápido quando comparada à fisioterapia convencional. Acrescentaram ainda que as melhoras não são só físicas, mas também psicossociais, já que ocorre o desenvolvimento de várias habilidades. Entretanto, como os praticantes que frequentam as sessões estão submetidos a múltiplas abordagens e atividades terapêuticas, foi difícil para eles precisar quais efeitos são diretamente decorrentes da equoterapia e não de uma somatória de intervenções.

Embora não tenha sido possível definir com precisão, a equoterapia, em seu aspecto técnico, destacou que o uso do cavalo é uma característica diferencial do método em relação a outras abordagens, já que 80% apresentaram melhoras após o início das sessões de equoterapia, com impacto nas condições de vida. Dentre os resultados mencionados pelos acompanhantes/responsáveis, merece destaque a melhora na postura (100%), equilíbrio (90%), interações sociais (80%), humor (80%) e autoconfiança (80%). Alguns participantes também citaram a melhora da autoestima, além de maior autonomia e independência emocional.

Como os praticantes são todos menores de idade, também frequentam atividades escolares, e a melhora nas interações sociais também se fez presente nesse espaço, a exemplo do desempenho na apresentação de trabalhos e na interação com os colegas. Além disso, a melhora da comunicação com outras pessoas, maior segurança e diminuição na frequência de choros, também foram aspectos comportamentais descritos como indicadores de um progressivo incremento nas habilidades relacionais. Em relação às expectativas futuras sobre os resultados da equoterapia, 70% das respostas convergiram para a expectativa de que os praticantes consigam andar.

Quanto à percepção dos resultados da equoterapia por parte dos profissionais, constatou-se que eles são mais técnicos ao descreverem os resultados. De forma geral, classificaram a equoterapia como uma estratégia de tratamento muito importante no atendimento a indivíduos diagnosticados com PC (100%), justificando que se trata de um método terapêutico que abrange o desenvolvimento global do praticante, na dimensão motora, funcional e emocional. A fisioterapeuta justificou sua resposta afirmando que a equoterapia proporciona uma potencialização dos efeitos terapêuticos da cinesioterapia tradicional, visto que o trabalho é realizado nos três planos e eixos de movimento do corpo.

O quadro II demonstra os benefícios relatados pelos profissionais, alguns dos quais corroboram os achados anteriormente descritos pelos responsáveis/acompanhantes.

 

Quadro IIBenefícios da equoterapia segundo a opinião dos profissionais.

 

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

 

No questionário direcionado à equipe multiprofissional, 100% dos profissionais apontaram a interdisciplinaridade como uma das principais características da modalidade, por congregar uma diversidade de profissionais que atuam de forma integrada visando objetivos comuns. Além disso, também foi relatada a importância da discussão dos casos no planejamento conjunto das atividades. Quando solicitados a caracterizar sua função na equipe, os participantes descreveram as atividades desenvolvidas, conforme apresentado no quadro III.

 

Quadro III Relação dos profissionais e suas áreas de atuação.

 

Fonte: Dados da Pesquisa, 2019.

 

Dentre os integrantes da equipe multiprofissional, 80% dos profissionais consideraram o profissional de fisioterapia como muito importante, em função principalmente dos conhecimentos essenciais para utilização terapêutica do cavalo, em especial para evitar que os praticantes sejam expostos a riscos desnecessários durante as atividades. Além disso, também foi relatado que o fisioterapeuta juntamente com o psicólogo e o instrutor de equitação são o tripé inicial do atendimento. Segundo a fisioterapeuta da equipe, além de potencializar os efeitos da cinesioterapia, a equoterapia melhora a funcionalidade e as relações sociais, variáveis que estão diretamente relacionadas aos objetivos da reabilitação fisioterapêutica.

 

Discussão

 

Quando indagados sobre o grau de parentesco das crianças e adolescentes com PC, houve significativa prevalência de mães como as principais cuidadoras no âmbito familiar. A presença materna pode ser influenciada por variáveis históricas e culturais, mas também pelo vínculo potencializado pela experiência da maternidade, que faz com que muitas mães se sintam responsáveis pelo cuidado aos filhos [14].

Em relação ao perfil dos profissionais, a experiência na área justifica a precisão e refinamento das respostas e os argumentos técnicos usados para se referir à equoterapia. Neste aspecto, todos os profissionais convergiram em suas definições, apontando a equoterapia como um método de tratamento interdisciplinar para a reabilitação e educação de pessoas com alguma necessidade especial ou deficiência, e que utiliza o cavalo como meio para obtenção dos benefícios biopsicossociais [15].

Os responsáveis/acompanhantes destacaram o uso do cavalo como característica diferencial do método, mas foram pouco precisos em descrever o que é a equoterapia. Os achados do presente estudo corroboram os dados de Silva, no qual a maioria das mães entrevistadas apresentaram dificuldades em conceituar a equoterapia, embora tenham sido enfáticas em descrever os ganhos decorrentes [14].

As avaliações positivas em relação às consequências biopsicossociais da equoterapia são inquestionáveis, o que foi refletido na alta porcentagem de respostas favoráveis a sua relevância como modalidade terapêutica. Estes achados corroboram o estudo de Nunes e Caberlon [17,18], ao questionarem os pais sobre a importância da equoterapia no tratamento dos filhos, eles afirmaram que, se fosse possível, iriam mais vezes às sessões e a indicariam a outras crianças.

A equoterapia tem como característica a possibilidade de atuação conjunta de profissionais provenientes de diferentes áreas, com o objetivo de obter o melhor resultado global do praticante. Segundo Strochein e Rodrigues [19], o contato com o animal promove benefícios neuropsicomotores, mas também repercute em diferentes aspectos do desenvolvimento, daí a importância de que cada membro da equipe identifique sua contribuição ao optar pelo uso dessa modalidade de intervenção.

A presença de vários profissionais é defendida pela ANDE-Brasil, ao afirmar que as atividades equoterapêuticas devem ser desenvolvidas por equipe multiprofissional, e com representação de maior número possível de categorias profissionais, incluindo os campos de educação e equitação [7,19].

Atualmente, o fisioterapeuta integra a equipe mínima da equoterapia, que deve ser composta por um fisioterapeuta, um psicólogo e um equitador. Além disso, a prática está condicionada a um parecer favorável da equipe médica, psicológica e fisioterapêutica [15,20]. Entretanto, segundo a fisioterapeuta da equipe, a presença desse profissional é fundamental, pois ele é o responsável pela abordagem motora e funcional do paciente [21]. Além disso, em se tratando de PC, as orientações e cuidados prestados pela fisioterapia são de grande importância na promoção da saúde e na prevenção dos agravos decorrentes das limitações funcionais.

O profissional fisioterapeuta acompanha o atendimento caminhando ao lado do cavalo, que é guiado pelo equitador, realizando orientações verbais e intervenções, de acordo com as necessidades de cada praticante [22]. Como a PC ocasiona uma série de disfunções motoras, sendo a mais aparente o controle postural e, consequentemente, o equilíbrio, causa um alto índice de dependência. Esse contexto merece ser considerado diante dos ganhos motores obtidos, dentre eles a melhora do equilíbrio, citada pelos participantes como um dos principais benefícios [4,10].

Em se tratando dos achados oriundos da presente pesquisa, não foi possível estabelecer uma relação entre o tempo de prática e a percepção dos benefícios pelos participantes deste estudo, mas os resultados sugerem que após o primeiro mês, alguns indicadores de melhora já puderam ser identificados. Ademais, os ganhos obtidos com a equoterapia provavelmente também são favorecidos pela idade do praticante, sendo a faixa etária de 1 a 8 anos considerada a mais adequada para receber estimulação precoce [14].

Além das melhoras físicas, as alterações psicológicas na percepção de si também têm um potencial de produzir impactos no cotidiano de vida de pessoas com diagnóstico de PC [23]. Nesse contexto, foi destacada a melhora do humor e o aumento da confiança. Os resultados podem ser explicados pelo fato de que, ao ser capaz de se sustentar no cavalo, o praticante passa a desenvolver maior segurança, o que influencia diretamente seu estado emocional e sua qualidade de vida [4].

Em termos psicossociais, ganhos relacionados à interação social foram registrados por 80% dos participantes, despontando como uma das principais evoluções obtidas com a equoterapia. Certamente, o estabelecimento do vínculo com o animal serve de modelo para o desenvolvimento de outras formas de interação, auxiliando o praticante a melhorar sua competência nas relações interpessoais. Os resultados obtidos revelaram melhoras da interação no próprio ambiente de tratamento, como também em outros espaços do cotidiano de vida [1,6].

Embora os resultados positivos da equoterapia tenham sido perceptíveis em significativa parcela das respostas, é necessário considerar que cada indivíduo reage de forma singular, assim, cada conquista é vivenciada de modo pessoal, com diferentes impactos sobre o contexto de vida [24]. Na opinião dos profissionais, apesar da convergência de respostas, é necessário levar em consideração a evolução de cada caso, já que alguns ganhos podem ser mais expressivos e rápidos em algumas pessoas do que em outras.

A fisioterapeuta que integra a equipe ressaltou que a equoterapia tem um impacto mais rápido devido à potencialidade do exercício e realização simultânea nos três planos e eixos de movimento do corpo, o que explica a percepção dos resultados em um curto espaço de tempo. Esta potencialização se deve ao movimento tridimensional originado pela marcha natural do cavalo que se assemelha muito à marcha do caminhar humano, fato que fundamenta a justificativa da fisioterapeuta quanto à potencialização dos efeitos cinesioterapêuticos tradicionais [21].

Outro aspecto a ser ressaltado refere-se ao fato de que a equoterapia promove a estimulação dos sistemas vestibular, proprioceptivo, tátil e motor, por meio do movimento produzido pelo passo do cavalo, que solicita constantes ajustes posturais, que combinados à dissociação das cinturas pélvica e escapular, provocam reações de retificação do tronco e ajustes tônicos. Assim, eles atuam dinamicamente na busca pela estabilidade e controle postural, interferindo positivamente na qualidade de vida desses indivíduos e revelando que para além dos ganhos físicos, há uma diversidade de benefícios psicossociais que precisam ser considerados [11].

 

Conclusão

 

Pode-se constatar que a equoterapia proporciona ganhos biopsicossociais em indivíduos com diagnóstico de PC, reafirmando a sua importância como recurso fisioterapêutico. Ademais, de acordo com os dados obtidos na presente pesquisa, pode-se afirmar que a equoterapia assume uma característica integrativa, sendo retratada como uma técnica mais eficiente quando comparada às terapias convencionais, fato este associado ao vínculo afetivo formado entre o praticante e o cavalo.

Os dados demonstram que a atuação do fisioterapeuta como integrante da equipe é de suma importância, haja vista que seus conhecimentos sobre a equoterapia proporcionam a utilização correta do método para além de seu caráter recreativo. Ademais, a relação com outros integrantes da equipe multiprofissional se faz necessária na concretização de uma abordagem holística do praticante, na qual todos os integrantes assumem importante papel.

Considerando a relevância dos dados obtidos, sugere-se a realização de mais estudos na área, de modo a alcançar maior visibilidade sobre o tema, em especial no que tange a sua utilização no cenário da reabilitação fisioterapêutica. Certamente, a ampliação e criação de novos centros de equoterapia merece ser um assunto prioritário na agenda da saúde, o que certamente trará importantes benefícios a seus praticantes.

 

Referências

 

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